Download Navegar - labimi
Document related concepts
no text concepts found
Transcript
ISSN: 2447-6374 Navegar Revista de Estudos de E/Imigração Vol. 1 - nº 1, Jul.-Set. 2015 ISSN: 2447-6374 Navegar Revista de Estudos de E/Imigração Vol. 1 - nº 1, Jul.-Set. 2015 Dossiê: E-imigração espanhola e espanhóis na diáspora Jul.-Set. 2015 Editora Lená Medeiros de Menezes Responsável pelo número Érica Sarmiento da Silva Conselho Editorial Interno André Nunes de Azevedo; Angela Roberti Martins; Érica Sarmiento da Silva; Lená Medeiros de Menezes; Luiz Reznik; Maria Teresa Toríbio Lemos; Mônica Leite Lessa; Syrléa Marques Pereira Conselho Editorial Externo (External Editorial Board) Angelo Trento (Università degli Studi di Napoli) Chiara Vangelista (Università di Genova, AREIA) Daniel Campi (Universidad Nacional de Tucumán) Fernando de Sousa (Universidade do Porto, CEPESE) Ismênia de Lima Martins (Universidade Federal Fluminense) Laurent Vidal (Université de La Rochelle) Luiz Fernando Beneduzi (Universitá Ca’Foscari di Venezia) Maria Beatriz Rocha-Trindade (Universidade Aberta de Lisboa) Maria de Nazaré Sarges (Universidade Federal do Pará) Maria Izilda Santos de Matos (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) Maria Luisa Tucci Carneiro (Universidade de São Paulo) Nadia De Christóforis (Universidad de Buenos Aires) Óscar Álvarez Gila (Euskal Herriko Unibertsitatea) Oswaldo Truzzi (Universidade Federal de São Carlos) Paulo Cesar Gonçalves (Universidade Estadual Paulista) Pilar Cagiao (Universidade de Santiago de Compostela Renata Siuda-Ambroziak (Uniwersytet Warszawski) Ruy Farías (Universidad Nacional de General Sarmiento) Susana Serpa Silva (Universidade dos Açores) Roseli Terezinha Boschilia (Universidade Federal do Paraná) Vittorio Cappelli (Università della Calabria) Xosé Manoel Núñez-Seixas (Ludwig-Maximilians-Universitat München) Conselho Consultivo Adriano de Freixo (Universidade Federal Fluminense); Alexandre Belmonte (Universidade do Estado do Rio de Janeiro); Baldomero Estrada Turra (Universidad Catolica de Valparaiso); Chiara Pagnotta (Universitá de Genova, AREIA); Isilda Braga da Costa Monteiro (Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti/CEPESE); Letícia Calderón (Instituto Mora); Maria Cristina Dadalto (Universidade Federal do Espírito Santo); Maria Luisa Ugarte Pinheiro (Universidade Federal do Amazonas); Oswaldo Munteal Filho (Universidade do Estado do Rio de Janeiro); Rosana Barbosa (Saint Mary´s University); Yvonne Dias Avelino (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo); Zeila Demartini (Universidade Metodista de São Paulo) Projeto gráfico e Apoio Técnico Operacional Carlos Marcelo M. Paes (Bolsista Qualitec) Correspondência: Rua São Francisco Xavier, 524, sala 9002 – A, Maracanã , Rio de Janeiro – RJ CEP: 20550-013. Tel: (21) 2334-0988 E-mail: [email protected] Sumário Apresentação 7-8 Dossiê: E-imigração espanhola e espanhóis na diáspora A través del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el País Vasco en Argentina María Eugenia Cruset 9-26 Diplomacia para la propaganda y la esperanza. El gobierno vasco en el exilio en Nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila Eneko Sanz Goikoetxea 27-48 El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis 49-71 El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías 72-98 O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé M. Núñez Seixas 100-121 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal - Finais do século XIX e inícios do XX Fernanda Paula Sousa Maia Isilda Braga da Costa Monteiro 122-149 Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar 150-173 Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Alfredo Moreno Leitão Maria Izilda de Santos Matos 174-192 Resenha de livros ARRUDA, J. J; FERLINI, V. L. A.; MATOS, MATOS, M. I.; SOUSA, F.(org.). De colonos a imigrantes. 193-202 MATTOS, Maria Izilda Santos de. 203-204 I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes de Azevedo Portugueses: Deslocamentos, Experiências e Cotidiano– São Paulo nos séculos XIX e XX Andréa Telo da Côrte TUCCI CARNEIRO, Maria Luiza. Cidadão do Mundo. 205-208 Sobre os autores 209-213 O Brasil diante do Holocausto e dos judeus refugiados do nazifascismo 1933-1948 Marlen Eckl In Memoriam O Laboratório de Estudos de Imigração da Universidade do Estado do Rio de Janeiro dedica este primeiro número da Navegar à historiadora Núncia Santoro de Constantino, Professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Pesquisadora renomada no campo dos estudos migratórios, Núncia, para além da saudade, nos deixou obras referenciais sobre a imigração italiana no Brasil. Apresentação Os estudos migratórios desenvolveram-se consideravelmente a partir da virada do milênio, invadindo a academia e tornando-se tema de relevo para vários campos do conhecimento. No caso da história, apropriaram-se das novas abordagens culturais, possibilitando um grande enriquecimento no estudo tanto das práticas quanto das representações. Em mundo que se tornou “menor” pelo impacto das novas tecnológicas, o estudo de processos desenvolvidos no “lá” e no “cá” foram enriquecidos com a diversificação das fontes e com estudos comparativos que venceram facilmente as distâncias. Complexo e interdisciplinar por excelência, o tema das migrações impôs-se no mundo acadêmico, refletindo um tempo no qual os deslocamentos humanos, por causas variadas, tornaram-se pauta permanente na esfera política e midiática, com o “outro” tornando-se, mais uma vez na história, objeto de atenção, de vigilância e de discriminação, com as marcas da intolerância, em muitos casos, transformando a imigração em drama do tempo presente. A criação da Navegar, Revista de Estudos de E-Imigração, do Laboratório de Estudos de Imigração (LABIMI), vinculado aos Departamentos e aos Programas de Pós-graduação em História e em Relações Internacionais, insere-se nessa conjuntura de visibilidade temática e de revolução nas comunicações, apresentando-se, em última instância, como resultado dos estudos em rede que vêm sendo patrocinados pelo LABIMI, envolvendo pesquisadores europeus e latino-americanos, com vocação para o estreitamento de laços com os outros continentes. No grande tema das migrações, a revista compõe-se por artigos, escritos por especialistas do tema, resenhas e entrevistas de imigrantes, aceitando trabalhos escritos em português, espanhol, italiano, inglês e francês, considerando-se as interconexões que a caracterizarão, bem como a composição trasnacional do LABIMI. Esse primeiro número, organizado por Érica Sarmiento da Silva, reúne trabalhos escritos por autores referenciais no tema da e-imigração espanhola. O dossiê “Eimigração espanhola, diáspora e exílio” contempla não só deslocamentos de espanhóis em direção a vários continentes e países quanto destaca a questão do exílio, em uma visão ampla que se coloca como importante caminho para através da comparação, melhor pensar a imigração e a presença espanhola no Brasil. Referência obrigatória para os estudiosos da emigração e, em especial, para os estudiosos de emigração galega, Xosé Manuel Seixas aborda a questão do exílio galego em diferentes países da Europa, enquanto Oscar Álvarez Gila e Eneko Sanz Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015, pp. 7-8 Apresentação Goikoetxea discutem o governo basco no exílio em Nova York. Os demais destacam a imigração e o exílio na Argentina. Nessa espacialidade, Maria Eugenia Cruset aborda a ação política dos grupos nacionalistas irlandeses; Ruy Farias analisa a questão do associativismo galego e Nádia Andrea De Cristóforis nos brinda com o tema do fomento tardio da emigração para Buenos Aires. A sessão de artigos está composta por três trabalhos. O primeiro, escrito por Fernanda Maia e Isilda da Costa Monteiro, pesquisadoras do Centro de Estudos de Economia, População e Sociedade (CEPESE), da cidade do Porto, trata da questão da emigração do norte de Portugal para o Brasil, analisando, dentre outras possibilidades temáticas, a atuação de “brasileiros” de torna-viagem. O segundo artigo é de autoria de Vanessa Bivar aborda a presença francesa em São Paulo, demonstrando, para além de sua face glamorosa, a existência de facetas que aproximavam franceses de imigrantes de outras nacionalidades, especialmente com relação ao binômio pobreza-emigração. Por último, Alfredo Leitão e Maria Izilda de Matos tratam da participação política de imigrantes portugueses em São Paulo, desconstruindo a visão tradicional de sua passividade frente a italianos e espanhóis. Três resenhas fecham a edição. A primeira, escrita por André Nunes Azevedo, apresenta o livro De Colonos a Imigrantes, organizado por José Jobson Arruda, Vera Lucia Ferlini e outros, que tem por tema central a e-imigração portuguesa. Segue-se o trabalho de Andréa Telo da Côrte sobre o livro Portugueses: Deslocamentos, Experiências e Cotidiano – São Paulo nos séculos XIX e XX, de Maria Izilda de Matos, que destaca, dos fluxos orientados de Portugal para o Brasil, às experiências cotidianas. A terceira e última, de autoria da tradutora da obra para o alemão, tem por objeto de análise o livro Cidadão do Mundo. O Brasil diante do Holocausto e dos judeus refugiados do nazifascismo 1933-1948, de Maria Luiza Tucci Carneiro, em edição publicada na Alemanha. Gratificante foi o trabalho de composição da revista, que terá circulação digital e reivindica tornar-se referência no campo dos estudos migratórios. Esperamos que sua aceitação pelo leitor também seja a da gratificação e que a publicação estreite ainda mais os laços entre pesquisadores conectados em rede, colaborando para estudos comparativos nos planos espacial e temporal, na busca por uma melhor compreensão de um fenômeno que vem marcando a história humana nos últimos séculos. Lená Medeiros de Menezes Érica Sarmiento da Silva 8 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015, pp. 7-8 Dossiê: E-imigração espanhola e espanhóis na diáspora A través del Espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el País Vasco en Argentina María Eugenia Cruset Universidad Nacional de La Plata Resumo: A partir da década de 1990, o conceito de transnacionalismo foi introduzido no marco dos estudos migratórios, como marco teórico, bem como o de Diáspora como ator internacional. Desse modo, se tem uma visão mais dinâmica e totalizadora do fenômeno. Não obstante, ainda que tenha sido utilizada por antropólogos, sociólogos e politólogos, são poucos os trabalhos históricos que estudam a ação dos emigrantes, de forma simultânea, tanto na origem como no destino. Neste trabalho nos propomos a estudar, de forma comparativa, a ação política dos grupos nacionalistas irlandeses e bascos na Argentina, para conhecer suas diferenças e similitudes - tanto na teoria como na praxis – e se existiram contatos entre eles em nível institucional, que les permitissem colaboração. PALAVRAS-CHAVE: Migração – Irlanda – País Basco - Argentina. Resumen: A partir de la década de 1990 se ha introducido en el marco de los estudios migratorios el concepto de transnacionalismo , como marco teórico, y el de Diáspora como actor internacional . De este modo, se tiene una visión más dinámica y totalizadora del fenómeno. No obstante, aunque ha sido utilizada por antropólogos, sociólogos y politólogos, son pocos los trabajos históricos que estudian la acción de los emigrantes, tanto en origen como en destino, de forma simultánea. En este trabajo nos proponemos estudiar de forma comparativa la acción política de los grupos nacionalistas irlandeses y vascos en Argentina, para conocer sus diferencias y similitudes - tanto en la teoría como en la praxis –y si existieron contactos a nivel institucional entre ellos que les permitiera una colaboración. PALABRAS CHAVE: Migración – Irlanda – País Vasco - Argentina. Abstract: Since the early 1990s migration studies have been enriched with the introduction of transnational view: migrants act in an active way- although unequal- both in destination as in origin, and this together with the concept of Diaspora as an international actor. In this work we propose to study comparatively the political action of the Irish and Basque nationalist groups in Argentina, to know their differences and similarities- both in theory and in practice and if there were institutional contacts between them to enable them a collaboration. KEYWORDS: Migration – Ireland – Basque Country – Argentina. Desde la proclamación oficial de su independencia en 1816, la República Argentina se vio envuelta en una serie de luchas, tanto exteriores –para consolidar por completo la independencia de España– como interiores, tratando de resolver la cuestión de la organización definitiva del país. La llamada Generación del 80 será la encargada de diseñar este nuevo Estado a partir de las premisas de un orden conservador en lo político y liberal en lo económico. En este sentido, será imperioso insertar al país dentro de la división internacional del trabajo como proveedor de materias primas (básicamente cereales y carnes), convirtiéndose en Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 9-26 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset socio de Gran Bretaña. Para lograr este cometido era fundamental el incentivo a la inmigración. Tanto vascos como irlandeses comparten en Argentina el ser grupos de inmigración temprana y minoritaria. Por otro lado, y en referencia al trabajo del historiador, son grupos difíciles de reconocer en los documentos oficiales, al figurar como ciudadanos españoles, franceses o ingleses. Esta circunstancia es la que ha obligado a los investigadores a tratar de identificarlos a partir del origen de sus apellidos, con todas las dificultades que esto implica. Este es el marco en el que se inserta este trabajo, en torno a la relación entre los nacionalismos vasco e irlandés y sus respectivas Diásporas en Argentina. La etapa abordada específicamente es el período comprendido entre 1862 y 1922. Tanto la fecha inicial como la final del periodo estudiado están relacionadas con el proceso histórico argentino. El 5 de octubre de 1862 fue elegido presidente de la República el General Bartolomé Mitre, comenzando de este modo las llamadas “Presidencias Históricas”, que implicaron la reunificación del país a partir de una Constitución, el fin de las guerras civiles y el comienzo del modelo creado por la Generación del 80. 1922 es el año de finalización del primer período presidencial del Dr. Hipólito Yrigoyen, el primer mandatario elegido con la Ley Sáenz Peña (1912) de voto secreto, universal y obligatorio. Además, al otro lado del Atlántico, ese año entra en vigor el tratado que crea el Estado Libre Irlandés y comienza la Guerra Civil en la isla y en España se vive la crisis del reinado de Alfonso XIII, dando lugar un año después a la dictadura de Primo de Rivera, que supone un cambio importante en la estrategia del nacionalismo vasco, imposibilitado de actuar como lo había venido haciendo durante la Restauración alfonsina. Un año antes se había producido la escisión entre moderados y radicales, dentro del nacionalismo vasco, que en parte tiene relación con lo que sucede casi a la vez en Irlanda. El Espejo irlandés Los movimientos nacionalistas tienen en común seguir sus fines estratégicos a través de una doble acción, interna y externa. La acción externa la concretan difundiendo en el extranjero la imagen de “Nación sin Estado” y la consecución de aliados. Tanto la forma como la intensidad de estas actividades dependen del grado de desarrollo de los movimientos nacionalistas, de su cultura política y orientación ideológica, y del contexto interno e internacional. Así, en muchos de estos movimientos, los intentos de inserción internacional se afianzaron en la búsqueda de colaboración con partidos o grupos nacionalistas de otros lugares, intentando su articulación para lograr mayor presión estatal. De este modo, su política exterior fue una interacción de imágenes y realidades, mitos 10 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset ideológicos y pragmatismos políticos. La relación de solidaridad entre pueblos “oprimidos”, formaba parte de sus discursos y les dieron una legitimidad extra.1 Así, aunque los dos nacionalismos identitarios que estamos estudiando (el irlandés y el vasco) tenían aspectos en común, hasta el punto de que uno trataban de reflejarse en el otro, como en un espejo, las diferencias entre ambos son casi más importantes que sus semejanzas. Dado que el nacionalismo irlandés ha sido tradicionalmente para al vasco un espejo donde ha intentado mirarse (al ser visto como un movimiento fuerte y triunfante, ante los ojos vascos), vamos a analizar ahora con mayor profundidad qué se reflejaba en ese espejo según los distintos sectores y qué se hacía con esa imagen entre los vascos que vivían en Argentina. 1. El reflejo: lo irlandés en lo vasco El Nacionalismo vasco moderno tiene su origen ideológico en Sabino Arana y Goiri. A su muerte en 1903 y a partir de finales de la década de 1910, el Partido Nacionalista por él fundado entró en una crisis profunda, por la división entre sus sectores moderados y radicales. Aunque a partir de 1906 se llegó a un consenso mínimo entre ambos sectores, los problemas internos pronto volvieron a aparecer. En 1921 el partido se dividió entre un ala más radical, liderada por Luis Arana (hermano de Sabino, que ya había sido expulsado del partido en 1916) y por las Juventudes presididas por Eli Gallastegi, y otra más pragmática y conservadora en cuanto a los objetivos. Así, el partido quedó dividido en dos: Comunión Nacionalista Vasca por un lado y Aberri por el otro. Mientras el primer sector llegó a reducir sus objetivos políticos a una autonomía del País Vasco y a una forma de lograrlo a través de acuerdos con Madrid; el segundo por su parte conservó el inicial ideario radical de su fundador. Como ya hemos señalado, esta escisión solo se cerró con la reunificación de ambos grupos, ya en noviembre de 1930. Fue precisamente el sector radical o aberriano el que desarrolló una mayor simpatía hacia Irlanda, lo que se tradujo no solo en una mayor presencia de la cuestión nacional irlandesa en la prensa sino sobre todo en contactos, más personales que institucionales. Precisamente algunos dirigentes del Sinn Féin que visitaron el País Vasco y se entrevistaron con líderes de Aberri habían realizado una intensa labor dentro de la Diáspora irlandesa en Argentina. Así sucedió con Ambrose O`Daily o con Ginnell. A raíz de estos contactos, el nacionalismo aberriano hizo más hincapié en el papel de la mujer y en la inclusión de la Diáspora como herramienta política y ello se reflejó, en primer lugar, en la fundación en mayo de 1922 de Emakume-Abertzale-Batza (Asociación de la Mujer Patriota), a ejemplo la Cumann na mBan, la organización de mujeres irlandesas creada en 1914.2 11 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset En cuanto a la importancia de la Diáspora, no cabe duda de que los dirigentes aberrianos conocían el papel fundamental de los emigrantes irlandeses en Estados Unidos, en relación con el movimiento pro independencia en la isla3. No es casualidad que precisamente en 1924 se formara Acción Nacionalista Vasca de la Argentina, con el fin de organizar a los nacionalistas residentes en el país y a otros americanos, y para dar a conocer la problemática vasca. Aunque ya antes había habido centros sociales claramente nacionalistas dentro de la diáspora vasca en Argentina, ninguno tuvo el carácter directamente político de Acción Nacionalista Vasca, ni tampoco su trascendencia. Prueba de ello es que su portavoz, Nación Vasca, se publicó ininterrumpidamente hasta 1943.4 Lo que ocurría en Europa se replicaba de este lado del Atlántico, y la mezcla de curiosidad y admiración por Irlanda también estaba presente en la Diáspora, incluso antes de que ésta fuera mayoritariamente nacionalista. Por ejemplo, a mediados de 1907, La Baskonia publicó un extenso y profundo artículo donde desarrollaba el tema de la actitud del Primer Ministro Gladstone y el Home Rule para Irlanda.5 El artículo, que elogiaba extensamente la visión política de Gladstone, seguramente fue muy bien recibido por los lectores del periódico, ya que expresaba dos ideas importantes: un Estado podía conceder algún grado de autonomía a una de sus provincias y esto se podía lograr por la vía de la negociación. Por tanto, este texto reflejaba, como ya hemos comentado, que La Baskonia estaba inmersa en las mismas diferencias internas que sufría el Nacionalismo en Euskadi. A pesar de estos comentarios, la atención de la Diáspora vasca en Buenos Aires a Irlanda fue mínima. Así, después de esa nota aparecida en 1907, La Baskonia solo volvió a hacer referencia a Irlanda en 1913, cinco años después, con motivo de la visita de dos representantes de la isla a Argentina. Eso sí, una vez más, se tomaba a Irlanda como modelo para que el País Vasco lograra un mayor autogobierno. Esa visita también fue de importancia para los hiberno-argentinos. The Southern Cross envió a un periodista al hotel donde se alojaban los parlamentarios para hacerles un extenso reportaje. Después de las palabras de cortesía por parte de Mr. Redmond, sobre la belleza de la ciudad y comentar que él leía el periódico en Irlanda –dato que, de ser verdad, más allá de la mera amabilidad, confirmaría la estrecha relación entre los irlandeses emigrados– se le hizo una extensa entrevista sobre su opinión en relación con el Home Rule. Para el parlamentario era casi un hecho que pronto se concretaría, pero resaltó la importancia de contar con el apoyo internacional, incluido el argentino: 12 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset We are fighting for the democracies of the world as well as for Ireland… Home Rule will be the first bill to come under the operation of the Parliament set, and when it passes, the House of Lords will be practically as dead as Queen Anne. Moreover, we have the sympathy of every democratically-constituted country in the world with which we have come in contact and I have no fear that the liberty-loving Argentine people will prove not to be an exception.6 William Redmond no era un personaje menor. No solo fue parlamentario por treinta y cuatro años, sino que también fue líder del Partido Nacionalista y, desde esa posición, negoció durante los enfrentamientos por la tierra. Entre 1903 y 1911 viajó por la Diáspora, principalmente la que se encontraba en los Dominios Británicos,7 para hacerla participar en la lucha por el autogobierno. La alta presencia de irlandeses en estos Dominios explica por tanto la importancia del viaje de Redmon y el interés con que The Southern Cross informó de su misión. En un artículo posterior al evento se resaltó el éxito que tuvo y se sugirió organizar otra conferencia con una mayor propaganda. A pesar de los problemas de organización, el periódico irlandés en Buenos Aires reconoció el éxito, más allá de toda expectativa, tanto en lo social como en lo económico, pues se llegaron a recaudar 1.800 libras, aportando algunas familias 100 cada una: Practically all of us now hold the opinion that Home Rule can be won for Ireland if the Irish Parliamentary Party are helped over the last fence, and for this reason is it a wise and patriotic policy to support the Irish Parliamentary Party and clear and road for the great day that is coming. 8 Los parlamentarios continuaron con esta serie de conferencias, con el mismo apoyo, por las ciudades del interior donde había una colonia irlandesa, como en Pergamino, Salto, Mendoza y Mercedes. Algunas de estas charlas se dieron en la Iglesia local, lo que reflejaba bien la implicación del clero irlandés con su comunidad y con la causa de su pueblo. Un hecho particularmente dramático en la lucha de Irlanda por su libertad fue la muerte del Alcalde de Cork, en una cárcel británica, después de 74 días de huelga de hambre. Ese hecho sirvió como una llamada de atención sobre la verdadera situación que se estaba viviendo en Irlanda. El periódico comunitario le dedicó una extensa nota, publicando los actos en su honor que se llevarían a cabo en distintas ciudades. Así, en Mercedes se haría un acto masivo “Pro independencia de Irlanda” y la bandera se colocaría a media asta; en Rosario una misa; en Arrecifes, Salto y Capitán Sarmiento, actos políticos: “MacSweeny is the victor as well as the victim. The body has suffered but the brave, invincible spirit has conquered. He has taught the admiring nations how Irish heroes can die. Amongst his last words were those: 13 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset “Now you will be witnesses of the fact that I die like a soldier of the Irish Republic”.9 Esta muerte tuvo enorme trascendencia entre la colectividad irlandesa en Argentina. A la viuda se le envió un telegrama de pésame, firmado por las personas más destacadas, comenzando con Monseñor Ussher y finalizando con el diputado O`Farrell. El mismo apoyo y solidaridad se manifestó en el seno del movimiento nacionalista del País Vasco, donde el Consejo Nacional de la Comunión Nacionalista Vasca (en un momento en que Aberri aún no se había escindido de la Comunión) remitió a la viuda un telegrama semejante a los enviados por los irlandeses de Argentina: Comunión Nacionalista Vasca celebrado hoy en Bilbao (Bizkaya) solemne función religiosa en sufragio alma lord-alcalde Cork y demás mártires de la Patria Irlanda /…/; concurrentes acto expresan a usted y a patriotas irlandeses vivos sentimientos de afecto y admiración y fervientes deseos de su inmediato triunfo. Presidente Euzkadi-Buru-Batzar.10 Además del telegrama, se realizaron varios actos y un funeral en el Carmelo de Begoña, al que asistieron representantes de las distintas facciones del nacionalismo vasco y miembros de la colonia irlandesa radicada en el País Vasco. Por otro lado, la dirección de Comunión Nacionalista sugirió a las juntas municipales organizar veladas donde se explicara el nacionalismo irlandés y se rindiera homenaje a sus héroes. Sin duda este hecho fue visto con mayor simpatía por todos los sectores del nacionalismo vasco que el Alzamiento de Pascua de 1916 que había sido recibido con división de opiniones entre los radicales de Aberri y los moderados de la Comunión. Por el contrario, ante una lucha basada en la resistencia pasiva, como la del alcalde de Cork, la unanimidad fue la nota predominante en el nacionalismo vasco. Esto permite, además, remarcar una diferencia importante en cuanto a la praxis política entre nacionalistas irlandeses y vascos. Mientras que, para algunos dirigentes irlandeses, la vía armada era aceptable si servía para lograr la concreción de sus objetivos, no lo era para los nacionalistas vascos, aunque un sector más radicalizado, representado sobre todo por las juventudes, podía pensar en el martirio como herramienta de acción política.11 Por eso, creemos no tiene sentido –puesto que no tiene base en las fuentes– el que algunos autores hablen del nacionalismo vasco, desde Sabino Arana hasta nuestros días, como de una “religión política de la violencia”.12 14 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset Significativamente, La Baskonia no mencionó siquiera el caso del alcalde de Cork. Por el contrario, en el entonces único periódico nacionalista de la Diáspora vasca en Argentina, Irrintzi, sí encontramos el eco –o mejor “el reflejo”– de esa noticia: Nosotros, los Vascos Nacionalistas, compañeros en desgracia de los nobles y heroicos irlandeses, que aspiran a lo que es justo y les pertenece, rogamos a Dios que ilumine el entendimiento de los hombres que gobiernan a Inglaterra, para que todos los nacionalistas del mundo le aplaudan su justo proceder y enseñe al mismo tiempo a otros gobernantes.13 En una página posterior, Irrinzti trascribía el mensaje dirigido por el alcalde de Cork, a los cuarenta días de ayuno, agradeciendo el apoyo recibido por diferentes sectores.14 En resumen, en estos años, aunque en la Diáspora vasca en Argentina hay una simpatía con la causa irlandesa, plasmada en momentos concretos en La Baskonia, en realidad solo los nacionalistas vascos muestran un entusiasmo real por la lucha irlandesa por su independencia. Pero incluso entre estos, ese entusiasmo se veía lastrado por el excesivo radicalismo utilizado en su lucha por algunos sectores del nacionalismo irlandés, y por las disputas internas entre moderados y radicales dentro del nacionalismo vasco. Así, es muy significativo el análisis del contenido del periódico Nación Vasca, órgano de Acción Nacionalista Vasca en Argentina, fundado en 1924. Dado que la Dictadura de Primo de Rivera tenía maniatado al nacionalismo vasco en España, Acción Nacionalista Vasca organizó diversos actos propagandísticos en Buenos Aires, envió al País Vasco folletos de propaganda y abrió suscripciones para socorrer a los perseguidos por la Dictadura. Ante la división del nacionalismo, Nación Vasca fue un periódico de tendencia aberriana, con multitud de proclamas en contra de la Dictadura y a favor de la independencia de Euskadi, los “mártires por la independencia”, el anticapitalismo y el antimilitarismo, pero intentó tender lazos hacia la Comunión.15 Pero, a pesar de su cercanía a Aberri, más que a Comunión, apenas hizo caso al espejo irlandés. Durante los dos primeros años de su existencia, esta publicación hizo frecuentes referencias a la “triple Alianza” entre gallegos, catalanes y vascos, que se había firmado entre sus sectores radicales en 1923, justo antes del golpe de Estado de Primo de Rivera.16 Nación Vasca también mencionó frecuentemente a otros movimientos nacionalistas europeos, como el polaco o el checo, e incluso se refirió a la independencia de Suiza. Sin embargo, en sus números de 1924-1925 no hay ni una sola referencia a Irlanda, tal vez por el apoyo mayoritario de Acción Nacionalista Vasca de Argentina a la moderada Comunión Nacionalista frente al 15 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset radical Aberri que, como hemos dicho, era el que más entusiasmo mostraba por la lucha irlandesa. 1. El Espejo invertido Como acabamos de ver, a pesar del interés que el nacionalismo vasco (y en especial sus sectores radicales) tenía por Irlanda, en Argentina la Diáspora vasca vivió políticamente a espaldas de las reivindicaciones irlandesas. Más allá de la simpatía que los vascos tenían a Irlanda, en el día a día tenían muchos otros aspectos de los que ocuparse y de ahí que su prensa apenas hablara de Irlanda. Si vemos esta relación desde el otro lado del espejo (es decir, cómo los irlandeses veían el nacionalismo vasco), la situación muestra un alejamiento mucho más acentuado. Por ejemplo, la prensa irlandesa del primer tercio del siglo XX no mencionaba para nada el País Vasco; para la diplomacia del Estado Libre de Irlanda, el elemento importante en política exterior en la Península Ibérica era España, y no tenían apenas ningún interés en el caso vasco.17 No obstante, ello no significa que no hubiera cierto interés en el caso vasco por parte de Irlanda. Desde antes de 1921 ésta mantenía con mucho sacrificio una Irish Publicity Agency en Madrid, a cargo de Miss O´Brien, quien no tenía recursos suficientes y hasta debía compartir su apartamento. Sin embargo, destacaba la importancia de España, por ser vínculo con América Latina y contar con un sector muy a favor de la causa irlandesa, sobre todo en el clero. Un informe irlandés de 1921 resaltaba la afinidad y los contactos que habían establecido en el País Vasco y en Cataluña, pero señalaba que esa relación podía llegar a ser contraproducente con lo que realmente interesaba a la naciente diplomacia irlandesa, que no era otra cosa que lograr buenas relaciones con España: (d) Attempt made and with certain success to confound Irish case and Irish movement with that of Viscaya and Catalonia, and even to represent the I.R.A. as akin to the Socialist and Anarchical party of Barcelona, this is a factor that works on prejudices with the Church and Catholic Party. (e) Hence although possibly the great popularity of the Irish movement in Barcelona and Viscaya is an impediment to its interests in Madrid it could nevertheless probably be utilised for commercial purposes. Sota the head of the Great Shipping Company of Bilbao (Sota y Anans18) one of the great leaders of the Basque movement. His son Manuel de la Sota (whom I did not meet though he called on me) most enthusiastic in the Irish Cause.19 Este interesante informe mostraba la dificultad de la diplomacia irlandesa. Aunque quería aprovechar en la medida de lo posible la simpatía nacionalista vasca con Irlanda (especialmente presente en el líder aberriano Manuel de la Sota Aburto) y 16 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset planeaba establecer consulados en Barcelona y Bilbao, estaba más interesada en que esa relación no estropeara las buenas relaciones con España y con la Iglesia católica española. Esta situación se repite en Argentina donde, al enviar su informe, el delegado irlandés P. J. Little hacía constar de forma clara las raíces vascas del presidente Yrigoyen, aunque de este hecho no se desprendía un especial vínculo entre vascos e irlandeses: The President of A.[rgentine] Republic Irregoyen [sic], of Basque extraction is head of Radical Government and a most determined opponent. Irregoyen's Government tho' favourable to us, would not involve the country in diplomatic entanglements by recognising Republic - A resolution of sympathy and support might be got through after Loan is well on its way.20 Sin embargo, en este mismo informe, enviado el 4 de octubre de 1921 desde Buenos Aires, Little reconocía que los nacionalistas vascos eran “amigos” de Irlanda (“Our friends are Representatives of small nations here (Basques, etc.) and strongly Argentine Nationalists and Priests”), pero del contexto de la nota se deduce que esta amistad no afectaba al conjunto de la comunidad vasca ni tenía una gran influencia política. De hecho, se reconocía que, a pesar de esos apoyos, “English power is very great here” y “The Irish Question is not intensely alive among general public and working classes”.21 En la práctica, los dirigentes políticos irlandeses en Argentina no prestaron especial atención a los vascos. Así, la ya mencionada visita de Ginnell (al que le interesaba cultivar el contacto con otras Diásporas con aspiraciones nacionalistas como la catalana, la gallega y, aún con mayor interés y éxito, la vasca) fue más bien una excepción a la regla general de no excesiva relación entre ambas. Es cierto que, junto a los banquetes protocolarios que hemos visto, sí se buscaron en esa ocasión reuniones más reducidas con la dirigencia comunitaria. Por esta razón, The Southern Cross publicó una información muy optimista del encuentro auspiciado por el “Comité Argentino pro libertad de Irlanda”,22 del que fueron muy elogiadas las palabras del Dr. Otaegui.23 Esta referencia es muy importante, pues es la única vez –que nosotros hayamos localizado – que The Southern Cross menciona a la comunidad vasca, en el marco cronológico que estamos estudiando. Esta mención aislada confirma que la escasa atención prestada por el nacionalismo irlandés al caso vasco se repite en la Diáspora en Argentina. Ya hemos indicado anteriormente la trascendencia de Tomás Otaegui en el débil movimiento nacionalista vasco en Argentina. Este abogado, nacido en Pergamino, provincia de Buenos Aires, en 1870, fue secretario del Laurak Bat y publicó, entre 17 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset otros trabajos, Derecho Foral de Vizcaya (1918) y Nacionalismo Basko (1922). Justamente en este último recurre al ejemplo de Irlanda y Polonia para ilustrar sus ideas: Existen dos ejemplos: Irlanda y Polonia. Irlanda la verde isla de los viejos tiempos, la tierra de los santos y de los doctores, la maestra de la civilización nórdica, pueblo consecuente de gran fuerza espiritual, que dominado por la pujante Inglaterra desde el siglo XII siempre se mantuvo altiva; siempre sus hijos conservaron su esencia de su nacionalidad, oponiéndose con fe, como dura roca, a los embates de la ola avasalladora del conquistador, y que hoy a través de los siglos se levanta soberbia, inmaculada en un gran derecho, aureolado por la justicia que proclamando su libertad de frente, de igual a igual al que domina, le hace acallar su gran demanda, recoger su sarcasmo, doblar su cerviz y temblar ante la imposibilitada de una solución fraterna que borre odios, que destruya rencores y que proclame la paz eterna para el bien de ambos pueblos /…/. Irlanda y Polonia se levantaron de sus cenizas, y ellas han triunfado porque desde los primeros instantes en que fueron esclavizadas sus hijos vivieron su vida en paralela espiritual, es decir que al lado de su actividad tendiente a alcanzar las satisfacciones morales y materiales de su existencia, se desenvolvía en saturación patriótica su nacionalismo, en recordación constante del derecho vejado, del deber cumplir, y en esa forma, viviendo vida de hombres, la vivían en la ciudadanía espiritual de la patria perdida y deseada. 24 Es verdad que en esa visita, junto a los contactos políticos que se pudieran lograr, era prioritario para el delegado irlandés conseguir un buen apoyo económico para la causa. La colectividad irlandesa tenía un número significativo de familias acomodadas, junto a un sector más numeroso de una clase media y media alta. Por otro lado, existía una larga tradición de colaboración, que se remonta en líneas generales a la década de 1880 y la participación del Irish Relief Found (Fondo de alivio para Irlanda). Este fondo pretendía paliar las consecuencias económicas negativas que aún se vivían a partir de la Gran Hambruna. Los aportes pueden ser seguidos a través del periódico comunitario, con nombres de los donantes y cantidades donadas. Se trata de una actividad muy habitual en la Diáspora irlandesa, pues algo parecido se encuentra en Australia o Estados Unidos.25 Lo mismo ocurría con el dinero que se enviaba para la “Liga Gaélica”, así como tras el fracaso del Alzamiento de Pascua. Con estos antecedentes, en esta ocasión se lanzó un bono con el cual se esperaba recaudar una suma significativa. El aval del mismo era, junto con la figura delegada de Irlanda, representantes notorios de la colectividad, los mismos que respaldaron económicamente todas sus actividades sociales. Entre ellos los más importantes eran, entre otros, Patricio Dowling, Charlie y John Duggan, Dr. O´Farrell, Tom y Eugenio Moore y Mons. Ussher (aunque este último no participa del bono, tal vez 18 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset por su condición sacerdotal). Junto a la dirigencia de primera línea, como hemos visto, se encuentra el clero y un reducido grupo de notables laicos, pero también otras personas. Entre ellos destaca (por no ser irlandés sino posiblemente, por su apellido, vasco) el nombre de Fermín Salaberry26. Pero, una vez más, incluso si fuera realmente vasco, se trata de una excepción, un solo nombre aislado, lo que demuestra que las relaciones políticas entre vascos e irlandeses en Argentina eran casi inexistentes. 3. Juego de espejos Las Diásporas irlandesas y vascas no son muy diferentes en sus procesos migratorios, al ser dos movimientos tempranos, no ser numerosos y llegar a Argentina a través de cadenas migratorias. Sus procesos de asimilación son también similares, por lo exitosos, y por su ascenso social debido a la ocupación agraria, primeramente lanar y luego vacuna. Sin embargo, sí hay algunas variables donde se marcan profundas diferencias entre las comunidades de vascos e irlandeses en Argentina, como el marco asociativo y su acción política (doméstica y externa). A diferencia del caso irlandés, las discrepancias internas e ideológicas tan marcadas en los centros vascos, no permitieron el surgimiento de un único liderazgo fuerte, capaz de encolumnar a la Diáspora tras de sí. Las energías puestas en función de una búsqueda de identidad común llevaron a un nivel de actividad menor y a una dispersión de objetivos comunitarios.27 El nacionalismo irlandés y el vasco comparten –junto a otros movimientos sociales y políticos de distinta índole– la utilización de lo simbólico para la concreción de objetivos. En este sentido los recursos ideacionales han ayudado a difundir valores o intereses. Esta clase de recursos se pueden definir como “el conjunto de elementos cognitivos, culturales, simbólicos e ideológicos que posibilitan el tránsito de un grupo humano indiferenciado a otro organizado y dispuesto a hacer valer su influencia en las arenas social, política y cultural”.28 En ese sentido son importantes la bandera tricolor irlandesa o la ikurriña. Son emblemas que gráficamente manifiestan reivindicaciones y que cargan con un potente ascendente entre sus seguidores. Dentro de este contexto, no es menor la figura del héroe-mártir patriótico, quien se convierte en el que encarna la lucha de su pueblo, llegando hasta las últimas consecuencias. Es la expresión de la mayor generosidad al derramar su sangre por la causa. Su muerte se constituye en parte sustantiva del mito fundacional de una 19 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset nación y, como bien describe Anderson, sus cenotafios son altares civiles para el culto patrio. Su presencia viene de la tradición cristiana, que asegura que la sangre de los mártires fecunda la tierra que sembrará nuevos creyentes. Es, por antonomasia, signo de fecundidad. No es raro pensar que en los nacionalismos irlandés y vasco, tan fuertemente enraizados en la tradición católica y donde, sobre todo en el primer caso, religión y lucha nacional fueron de la mano, se las “sincretizara”.29 El héroe necesita su contrapartida del antihéroe, enemigo del pueblo. En cierta forma la presencia del “imperio invasor” (Inglaterra y España) asume este papel. El héroe-mártir, para el caso irlandés, tiene una doble dimensión que no solo lo coloca en la actitud pasiva de entregar la vida sino que también retiene la activa del combatiente. Los revolucionarios del Alzamiento de Pascua de 1916 fueron a su vez luchadores y mártires. Esta fecha es importante, al convertir la derrota en calvario, muerte y resurrección. Algo parecido ocurre con los que protestaban en huelga de hambre, como el Alcalde de Cork. El liderazgo dentro de la comunidad irlandesa estaba representado por el clero – cuya posición no se discutía y que venía ya desde el lugar de origen– y por un sector fuertemente unido a él de laicos integrantes de la alta burguesía porteña, con intereses económicos centrados en el agro y el comercio, ricos e influyentes. Estos líderes comunitarios representaban un grupo bien educado con intereses y conexiones en Irlanda y Argentina. Mientras los sacerdotes debían mantener los contactos por razones jurídico-eclesiásticas, los laicos lo hacían por familiares y económicas. Al mismo tiempo, la labor pastoral creó redes de comunicación entre ciudad y campo, que permitieron una rápida reacción en los momentos necesarios. La visión política de dirigentes como Monseñor Dillon fomentó la participación política local y así numerosos irlando-argentinos fueron jueces de paz en la campaña u ocuparon distintos cargos públicos civiles y militares. El mismo Dillon creó un partido político, por el cual llegó a ser electo diputado. El grupo dirigente ocupaba un triple liderazgo: el interno de las asociaciones comunitarias, el político local y el laical dentro de las estructuras católicas. La Diáspora vasca fue mucho más numerosa que la irlandesa y, al mismo tiempo, con un liderazgo mucho más fragmentado. La pertenencia a las asociaciones comunitarias era restringida por lugar de procedencia y grado de “vasquitud”. Al principio era necesario no solo contar con los dos apellidos de origen vasco sino también haber nacido en las provincias históricas, aunque con el tiempo los hijos de vascos nacidos en Argentina se fueron incorporando. Además, el liderazgo dentro de ellas estaba fuertemente discutido. El caso del Laurak Bat es la expresión 20 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset más visible de esta situación y de los enfrentamientos por razones políticas entre “vascos” y “vascongados”. Difícilmente esta dirigencia podía comprometer a todo el conjunto vasco en una estrategia a largo plazo.30 En realidad, en Argentina se repetía lo que acontecía en el País Vasco, con las diferencias en primer lugar entre carlistas y nacionalistas, y –más tarde– en las propias divisiones en el seno del nacionalismo vasco. Por otro lado, estas diferencias ideológicas se daban en el sector dirigente, pues la mayoría del colectivo no dio en esta etapa el salto del nacionalismo cultural al político, permaneciendo en una identidad vasca, compatible con la española, que se asemejaba a la que había en el propio territorio vasco hasta la llegada del nacionalismo político, de la mano de Sabino Arana. En este sentido, hay que destacar cómo el nacionalismo vasco se fijó desde el principio en Irlanda, a quien sentían afín por historia, situación política y creencias religiosas. En la etapa posterior a la muerte de Arana, fueron los sectores más radicales del Partido los que profundizaron en el ejemplo de Irlanda, estableciendo incluso algún contacto esporádico, principalmente con miembros del Sinn Féin. Algo similar ocurrió en Argentina, donde a través de La Baskonia se seguía de cerca el proceso de otorgamiento del Home Rule, o temas de cultura celta partir de los artículos de Campión. Sin embargo, entre ambos nacionalismos y sus respectivas Diásporas existen diferencias políticas significativas: a) Participación en foros internacionales. Los irlandeses comprendieron desde muy temprano que debían involucrar a las Diásporas en sus reivindicaciones, en particular a la poderosa colectividad irlandesa en Estados Unidos. Tanto los Fenianos, como los partidarios de Parnell y el Home Rule y el Sinn Féin llevaron a cabo esa política. En ese sentido, era importante participar en todos los foros internacionales posibles para lograr apoyo y voz a sus reivindicaciones. Para esto se hicieron acompañar, nuevamente, de sus Diásporas en distintas partes del mundo. Así sucede, por ejemplo, con la labor de Ginnell para que los hiberno-argentinos participaran en la Primera Reunión Mundial de la Raza irlandesa en París en 1922. Uno de sus mayores logros fue la incorporación del Estado Libre de Irlanda a la Sociedad de las Naciones el 6 de diciembre de 1922. De este modo obtuvo la capacidad para abrir representaciones diplomáticas en otros Estados, negociar y firmar tratados, y poder emitir pasaportes para sus ciudadanos. Por el contrario, la incorporación del PNV a los foros internacionales fue mucho más tardía. Solo entre 1929 y 1930 se incorporaron al Congreso de Nacionalidades Europeas. Además, esta incorporación, de escasa importancia real, se produjo sin que hubiera una llamada a los vascos del exterior para incorporarse a esta presencia internacional del nacionalismo, como sí la hubo por parte de los irlandeses. 21 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset b) Apoyo financiero. Los irlandeses apoyaron de forma sistemática desde Argentina las distintas iniciativas surgidas en la isla. Desde los fondos enviados a la Land League, o la Celtic League, hasta los remitidos a los combatientes del Alzamiento de Pascua o el Bono patriótico impulsado por Ginnell. Existían flujos de fondos incentivados y recogidos en las páginas del periódico The Southern Cross. En el caso vasco, La Baskonia y el Laurak Bat (por mencionar solo a dos de las publicaciones periódicas de la Diáspora vasca en Argentina) siempre sufrieron de problemas de financiación. Siempre hubo dificultades para conseguir el pago de las suscripciones del periódico y la cuota social del centro vasco. En estas condiciones era difícil pretender el envío de dinero para apoyar actividades políticas. Además, la propia heterogeneidad política de la Diáspora vasca, en comparación con la argentina, imposibilitaba una acción conjunta suya para ayudar a financiar el movimiento nacionalista en territorio vasco. c) Apoyo a los grupos armados. Los grupos más radicales dentro de la Diáspora irlandesa comenzaron a organizarse a partir de 1910 y estaban nucleados a partir del periódico Fianna de Padraig MacManus. Su sobrino, Eamon Bulfin, va a convertirse en la pieza clave del apoyo a los grupos armados en Irlanda. Participó en el Alzamiento de Pascua y, de regreso en Argentina, fue nombrado representante del clandestino gobierno irlandés. Desde su posición, y trabajando junto a Ginnell, estableció una red de contactos con responsables gubernamentales y líderes argentino-irlandeses, creando un Fondo irlandés y negociando cargamentos de municiones para el IRA. Por el contrario, nada hay similar para el caso vasco en esa época. Además de que la llegada del nacionalismo político es posterior, incluso cuando ya existían células nacionalistas vascas en Argentina, estaban lejos de plantear la lucha armada. Por otro lado, el mismo PNV sufría de divisiones internas y no encontraba un camino estratégico común. Dentro de estas divisiones, en esta etapa siempre los nacionalistas vascos en Argentina optaron por las vías moderadas y pacíficas. Ello explica que la prensa vasca en ese país ni siquiera mencionara el Alzamiento de Pascua de 1916. Una de las estrategias más efectivas que tienen las Diásporas para lograr sus objetivos, es la de involucrar a los países de acogida, tanto a los grupos políticos como a la sociedad civil. En el caso de los sectores políticos, a través de lobbies – incluidos los aportes económicos– o la propia participación e inclusión, ocupando cargos administrativos y de gobierno; y en cuanto a la sociedad civil, la prensa es el mejor medio para involucrar a sus diversos sectores. Los irlando-argentinos tenían como ventaja comparativa ser una colectividad rica y bien dirigida, con fuertes influencias en los sectores de poder. Su propia inclusión en la política nacional argentina le permitió conseguir beneficios internos. Sin embargo, su principal dificultad la constituía el poder de Gran Bretaña en 22 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset Argentina. Si no consiguieron mayores logros no fue por falta de acción, sino por la de su rival, así como por el contexto histórico en el que se desarrollaba. Para el caso vasco, las dificultades fueron más internas que externas. No se trataba de oponerse a un enemigo exterior (puesto que realmente España no cumplía el mismo papel que Gran Bretaña con respecto a Irlanda) sino de difundir el todavía débil sentimiento nacional vasco dentro de la propia comunidad, que durante mucho tiempo hizo compatible su vasquismo con su españolidad. Pero si, a pesar de todo, Irlanda siguió siendo un espejo donde el nacionalismo vasco podía mirarse (por el éxito de su propuesta, por su religiosidad católica, etc.), no hubo nunca un camino de ida y vuelta. Es decir, los irlandeses apenas se preocuparon por el nacionalismo vasco, un movimiento menos exitoso que el suyo. nacionalistas apenas se relacionaban entre sí en sus respectivos territorios, tampoco lo hacían al encontrarse en Argentina. Al no existir contactos, no existen tampoco iniciativas en conjunto. Las imágenes que proyectan son distintas porque los espejos que utilizan no son los mismos. Por eso, ambas Diásporas vivieron, en la época que nos ocupa, de espaldas entre ellas y la colectividad vasca nunca pudo convertirse en el instrumento de paradiplomacia que sí fue para Irlanda su Diáspora americana. Notas e referências Xosé M NÚÑEZ SEIXAS. “Relaciones exteriores del nacionalismo vasco (1895-1960)”, en Santiago DE PABLO (Ed.). Los Nacionalistas. Vitoria-Gasteiz: Fundación Sancho el Sabio. 1995, pp. 381-417. 2 Mercedes UGALDE SOLANO. “Mujeres y nacionalismo vasco”, en DE PABLO (ed.), 1995; Mercedes UGALDE SOLANO. Mujeres y nacionalismo vasco. Génesis y desarrollo de Emakume Abertzale Batza (1906-1936). Bilbao: Universidad del País Vasco/ Emakunde, 1993. 3 Los dirigentes irlandeses tenían una gran experiencia involucrando a la Diáspora norteamericana en las luchas políticas de la isla. En la década de 1880 El defensor del Home Rule, Parnell viajó por el país buscando apoyo para la causa. Y, en 1916, se fundó en Nueva York The Friends of Irish Freedom, para apoyar el Alzamiento. Llegaron a juntar 350.000 dólares. Mucho hay escrito sobre el papel de la Diáspora irlandesa en Estados Unidos y su papel en la Independencia de Irlanda. Para ver su repercusión en Argentina, ver: María Eugenia CRUSET. Diplomacia de las Naciones sin estado y de los estados sin nación. Argentina e Irlanda: una visión comparativa. La Plata: Ediciones IRI, 2007. 4 Reyes MÁRQUEZ ORTIZ. “Colectividad vasca y Asociacionismo en Argentina”. Congreso Internacional de Historia de América VI, Vitoria-Gasteiz, 1994, pp. 123-136. 5 La Baskonia, 20 de junio de 1907. 6 The Southern Cross, 21 de noviembre de 1913. “Nosotros estamos peleando por la Democracia del mundo, tanto como la de Irlanda. El proyecto de ley del “Home Rule” 1 23 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset está siendo considerado por el Parlamento y cuando pase la Cámara de los Lores, esta estará tan muerta como la Reina Ana. Además, tenemos la simpatía de todo país democráticamente constituido en el mundo con el que hemos entrado en contacto y no tengo dudas que los argentinos amantes de la libertad nos demostrarán no ser la excepción”. 7 El uso de la palabra “Dominio” data del siglo XVI, pues fue usada para describir a Gales desde 1535. Como título oficial, fue conferido por primera vez a Virginia, hacia 1660 y a Nueva Inglaterra en 1686. Estos dominios nunca tuvieron un estatus semiautónomo o autónomo. Canadá recibió este título en la confederación en 1867. En la Conferencia Colonial de 1907 fue la primera vez que la las colonias autónomas de Canadá y la Mancomunidad de Australia serían referidas colectivamente como "Dominios". Otra colonia autónoma fue Nueva Zelanda, a quien se le concedió el título ese año. Fueron seguidas por Sudáfrica (1910) y el Estado Libre Irlandés (1922). El estatus de Dominio era otorgado a las “colonias blancas” y le permitían un cierto grado de autonomía. Por lo general el Monarca seguía siendo cabeza del Estado, quien nombraba un Gobernador General que lo representaba. 8 The Southern Cross, 5 de diciembre de 1913. “Prácticamente todos somos de la opinión que el Home Rule puede ser ganado para Irlanda si el Partido Parlamentario de Irlanda es ayudado en la próxima contienda, y por esta razón es que es una sabia y patriótica política apoyar al Partido Parlamentario y clamar por el gran día que se acerca”. 9 The Southern Cross, 29 de octubre de 1920. “MacSweeny es tanto el vencedor como la víctima. El cuerpo ha sufrido pero el valiente, invencible espíritu ha conquistado. Ha enseñado a las admiradas naciones como los héroes irlandeses pueden morir. Entre sus últimas palabras estuvieron: ‘Ahora serán testigos de que moriré como un soldado de la República de Irlanda’”. 10 Citado en NÚÑEZ SEIXAS. “Nacionalismo y Política Exterior: España y la política de minorías de la Sociedad de las Naciones (1919-1936)”, Hispania, LV/189, 1995, nota 214, pág. 284: “En Begoña. Por el alma del alcalde de Cork”. Euzkadi, 2762, 1 de noviembre de 1920. 11 Este tema ha sido analizado recientemente a partir de las nuevas teorías sociológicas de movilización de recursos (TMR), para estudiar la eficiencia de los movimientos sociales. En este sentido, el martirio tiene una fuerte connotación simbólica, cambiando en el grupo sentimientos negativos como rabia, impotencia, miedo, vergüenza; por otros de valencia positiva como gratitud, esperanza, orgullo, entusiasmo. Para el caso vasco de la segunda mitad del siglo XX, es la figura que los simpatizantes de ETA denominan gudari (combatiente) caído, la que mejor especifica esta idea. Así sucede por ejemplo con el miembro de ETA José Miguel Beñaran, Argala, asesinado por grupos paramilitares en 1978. Jesús CASQUETE. Agitando emociones. Cuadernos Bakeaz, 81, 2007. 12 Antonio ELORZA. La religión política. «El nacionalismo sabiniano» y otros ensayos sobre nacionalismo e integrismo. San Sebastián: Haranburu, 1995. 13 Irrintzi, 15 de Julio de 1921. 14 Irrintzi, 15 de Julio de 1921. 24 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset Santiago DE PABLO; Ludger MEES y José Antonio RODRÍGUEZ RANZ. El péndulo patriótico. Historia del Partido Nacionalista Vasco. I, 1895-1936. Barcelona: Crítica, 1999, pp. 179-180. 16 Xosé ESTÉVEZ. De la Triple Alianza al Pacto de San Sebastián (1923-1930). Antecedentes del Galeuzca. San Sebastián: Universidad de Deusto, 1991; José Luis DE LA GRANJA, José Luis. “Las alianzas políticas entre los nacionalismos periféricos en la España del siglo XX”. Studia Historica. Historia Contemporánea, 18, 2000, pp. 149-175. 17 Santiago DE PABLO. “El aliado ausente: La política exterior irlandesa y el nacionalismo vasco”, en prensa. Este autor basa su estudio en el análisis de documentación inédita de los National Archives of Ireland. 18 Se refiere a la Naviera Sota y Aznar, propiedad del nacionalista Ramón de la Sota y del monárquico Eduardo Aznar. 19 Robert BRENNAN. Documents of Irish Foreign Policy, Dublín, vol. 1, nº 107. NAI DFA ES Spain. Memorandum entitled 'Ireland and Spain', Sept. 1921 (http://www.difp.ie/docs/Volume1/1921/107.htm, consultado el 11 de septiembre de 2012): “He hecho el intento y con cierto éxito de unificar el caso Irlandés y el movimiento irlandés con aquel de Vizcaya y Cataluña e incluso presentar al IRA como semejante al Partido Socialista y Anarquista de Barcelona, es un factor que podría perjudicar la relación con la Iglesia Católica. Aunque posiblemente la gran popularidad del movimiento Irlandés en Barcelona y Vizcaya sea un impedimento a los intereses de Madrid, no obstante podría ser utilizado para fines comerciales. Sota, líder de la gran compañía de barcos de Bilbao (Sota y Anans) es uno de los grandes líderes del movimiento basco. Su hijo Manuel de la Sota (con quien no me he reunido a pesar de que me ha llamado) es un gran entusiasta de la causa Irlandesa”. 20 P. J. LITTLE No. 109 NAI DE 5/21, “Précis of a report on Argentina by P. J. Little”, Buenos Aires, 4 October 1921 (http://www.difp.ie/viewdoc.asp?DocID=109, consultado el 11 de septiembre de 2012): “El presidente de la República Argentina Yrigoyen, de origen basco es el líder del gobierno radical y el más determinado opositor. El gobierno de Yrigoyen, aunque favorable para nosotros, no involucrará al país en un enredo diplomático reconociendo a la República. Una resolución de simpatía y apoyo puede llegar a ser obtenida luego de que el préstamo esté en su camino.” 21 P. J. LITTLE. No. 109 NAI DE 5/21, “Précis of a report on Argentina by P. J. Little”, Buenos Aires, 4 October 1921 (http://www.difp.ie/viewdoc.asp?DocID=109, consultado el 11 de septiembre de 2012). 22 Aunque con denominación similar, Friends of Irish Freedom, no queda claro que el comité argentino estuviera relacionado con este otro grupo de origen irlando-americano, fuertemente nacionalista que apoyó activamente el Alzamiento de Pascua y que tenía sus raíces en los grupos más radicalizados de la Diáspora en Estados Unidos. 23 The Southern Cross, 7 de octubre de 1921. 24 Tomás OTAEGUI. Nacionalismo Basko. Buenos Aires, 1922. p. 46. 25 Joseph DENIEFFE. A Personal Narrative of the Irish Revolutionary Brotherhood. New York: Gael Publishing, 1906. 15 25 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Através del espejo: imágenes cruzadas de Irlanda y el país vasco em Argentina María Eugenia Cruset María GONZÁLEZ ROUCO. Inmigración a la Argentina: Testimonios y Literatura (18501950) (http://www.argentinauniversal.com/mar07/extras/literat/nota_21.pdf, acceso 31 de enero de 2013) lo califica como “español”, sin especificar más. 27 Como ha estudiado Núñez Seixas, comparando a gallegos e irlandeses, a pesar de un cierto discurso “celtista” que los uniría y de la admiración hacia el movimiento nacionalista irlandés, la diversidad asociativa –con la consecuencia de falta de un liderazgo centralizado y fuerte–, junto a las diferencias ideológicas, lo colocan en una situación menos exitosa a la hora de concretar objetivos y agendas comunes. NÚÑEZ SEIXAS. “Galegos e irlandeses na diáspora (1830-1950): elementos para unha comparanza”. Galicia 21: Journal of Contemporary Galician Studies, 1, 2010, pp. 92-108; también: Ruy. FARÍAS. “Migration, Collective Organization and Social-Political Intervention: Notes of the Role of the Galician Community in Argentine in the Modernisation of Galicia (1900-1936)”, en María Eugenia CRUSET (ed.). Migration and New International Actors. Cambridge, Cambridge Scholars Publishing, 2012, pp. 109-130. 28 Jesús CASQUETE. “Agitando emociones”. Cuadernos Bakeaz, 81, 2007. 29 En la antigua tradición celta el ayuno tenía particular importancia. La Ley de Brehon comenta dos nombres para el ayuno: el "troscad" y "cealacha". Troscad se entiende como "ayunando contra otra persona" y el cealacha como "alcanzando la justicia por el hambre" y “cealacha” “obteniendo justicia mediante el ayuno”. El troscad estaba abierto a cualquier miembro de la sociedad celta, por lo que cualquiera (druidas, guerreros, campesinos, hombres y mujeres) podían ejecutarlo. De hecho, el troscad era uno de los medios más eficaces que alguien de una posición social más baja podía utilizar para solicitar justicia contra alguien de una posición social más alta. La ejecución del Troscad se llevaba a cabo mediante la notificación del reclamante sobre su propósito a aquél al que reclamaba justicia para después sentarse frente a su puerta y permanecer sin comer hasta que se resolviera el tema. Un ejemplo de la naturaleza sobrenatural de este rito se puede rastrear buscando en los principios del primer cristianismo celta pues se efectuaba de igual manera este ayuno, llamado en este caso Aíne Frithaire. Se dice que el mismo san Patricio ascendió al monte Crochan Aigli, lugar en el que se supone que paso sus años de esclavitud, y permaneció en ayuno cuarenta días y cuarenta noches. 30 Óscar ÁLVAREZ GILA. “Vascos y Vascongados”: Luchas ideológicas entre Carlistas y Nacionalistas en los Centros Vascos del Río de la Plata (1900-1930)”, en ESCOBEDO MANSILLA, Ronald, ZABALLA BEASCOECHEA, Ana de y ÁLVAREZ GILA, Óscar (eds.). Emigración y redes sociales de los vascos en América. Vitoria-Gasteiz, Universidad del País Vasco, 1996, pp. 176-192; Mikel EZKERRO. Historia del Laurak Bat de Buenos Aires. Vitoria-Gasteiz, Gobierno Vasco, 2003. ; Begoña CAVA MESA.; Luis Fernando CONTRERAS y Francisco Javier PÉREZ. Sociedad «Laurak Bat» de Buenos Aires. Sociedad «Laurak Bat» de Buenos Aires. Vitoria-Gasteiz: Gobierno Vasco, 1992. 26 26 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê: E-imigração espanhola e espanhóis na diáspora Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio en Nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila Eneko Sanz Goikoetxea Euskal Herriko Unibertsitatea (Universidade dos Países Bascos) Resumo: Este artigo apresenta uma visão geral da criação, evolução, atividades e desaparecimento da delegação que o governo autonômo basco manteve em Nova York nas décadas de 1940 e 1950, com uma intenção paradiplomática 1) de justificar a postura do próprio governo e dos partidos que o formaram na Guerra Civil Espanhola, 2) de conseguir apoios externos para o esforço bélico, primeiro e, depois, para a reinstauração das liberdades democráticas na Espanha e a autonomia vasca; y 3) de estreitar os laços de colaboração e suscitar a sustentação econômica do governo basco no exilio entre a diáspora emigrante basca, principalmente no continente americano. Após um período inicial no qual a atividade foi intensa, a mudança da situação política mundial e a formação de blocos na Guerra Fria levaria a um paulatino reingresso da Espanha franquista nos foros internacionais, fazendo, finalmente, inviável os objetivos políticos da delegação. PALAVRAS-CHAVE: Exílio - Paradiplomacia Governo Basco - Estados Unidos – Espanha. Resumen: Este artículo presenta una visión general de la creación, evolución, actividades y desaparición de la delegación que el gobierno autonómico vasco mantuvo en Nueva York en las décadas de 1940 y 1950, dentro de un intento paradiplomático 1) de justificar la postura del propio gobierno y los partidos que lo formaron en la Guerra Civil española, 2) de concitar apoyos exteriores para el esfuerzo bélico, primero, y para la reinstauración de las libertades democráticas en España y la autonomía vasca después; y 3) de estrechar los lazos de colaboración y suscitar el sostenimiento económico del gobierno vasco en el exilio entre la diáspora emigrante vasca, principalmente en el continente americano. Tras un inicial periodo en el que la actividad fue intensa, el cambio de la situación política mundial y la formación de los bloques en la Guerra Fría llevaría a un paulatino reingreso de la España franquista en los foros internacionales, haciendo finalmente inviable los objetivos políticos de la delegación. PALABRAS CLAVE: Exilio - Paradiplomacia Gobierno Vasco - Estados Unidos – España. Abstract: This article aims to present a general overview of the birth, evolution, activities and termination of the Basque autonomous government's delegation to the United States, in New York city, in the decades of the 40s and 50s of the 20th century. This was a clear example of paradiplomatic attempt to: a) justify the alignment of the Basque government for the Republic during the Spanish Civil War; b) promote external support for the effort of the war, at the beginning, and for the struggle for the recovery of the democratic freedom in Spain and the home rule in the Basque Country, afterwards; and c) strengthen the ties with and look for economic aid from the Basque colonies abroad, mainly in the Americas. After a starting moment in which the activity was intensive, the reverse of the political situation during the Cold War brought to a steady recognition of the Spanish Francoist regime in the international forums with the support of the United States, thus making it inviable any of the political objectives of the Basque delegation. KEYWORDS: Exile - Paradiplomacy - Basque Government - United States - Spain Navegar, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 27- 48 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea Introducción Es, en gran medida, la realidad geopolítica del los últimos años de la década de 1930 la que explica que fuera Estados Unidos el primer país americano en el que el Gobierno Vasco en el exilio implantara una delegación, poco tiempo tras el final de la Guerra Civil española. Esta contienda, que se inició con el alzamiento de parte del ejército español acantonado en el protectorado de Marruecos, acabó tras tres años de contienda no solo con la primera experiencia democrática que se ensayaba en España en el siglo XX, sino también con el intento de dar una solución a la cuestión de las nacionalidades dentro con la descentralización política del estado mediante la creación de diversos gobiernos autónomos. En el caso del País Vasco, los vaivenes de la política a lo largo del quinquenio de vida parlamentaria de la Segunda República española hizo que su estatuto de autonomía no fuera aprobado hasta varios meses después de iniciada la guerra, jurando como lehendakari (presidente) del primer ejecutivo autonómico el nacionalista José Antonio de Aguirre en octubre de 1936. Apenas pocos meses más tarde, tras la ocupación del territorio vasco por las tropas franquistas, este ejecutivo iniciaría un exilio, por España, Europa y América, que no acabaría hasta la década de 1980. Ya desde su mismo nacimiento, el nuevo gobierno autonómico desarrolló una intensa labor exterior, dirigida tanto a buscar el apoyo material e ideológico al propio gobierno en el esfuerzo bélico, como posteriormente, a estrechar los lazos con las colectividades vascas del exterior como medio de sostenimiento de la reivindicación permanente de la recuperación del autogobierno.1 Todo este conjunto de actividades encajaría en el concepto, desarrollado en las últimas décadas, de la paradiplomacia, toda vez que nos encontramos ante el caso de la proyección exterior de un gobierno no-central en un ámbito internacional.2 El origen de la delegación de Nueva York. El lehendakari Aguirre había así iniciado contactos con personajes relevantes de la vida política religiosa y económica de Estados Unidos, que se hallan en la base del surgimiento de la idea de crear una delegación en este país. En este proceso sería una figura clave Manuel de Ynchausti,3 un empresario filipino-americano de origen vasco afincado en San Sebastián que, cuando estalla la guerra civil, se había trasladado a Ustaritz, en el País Vasco-francés, desarrollando allí diversas acciones en favor de los exiliados. Bajo su amparo, a lo largo del primer semestre de 1938 el Gobierno Vasco en el exilio dará los pasos para crear la delegación en Estados Unidos, cuya sede estaría situada, no en la capital política del país, sino en la ciudad de Nueva York. El propio José Antonio Aguirre reconocía así el trabajo realizado por Manuel de Ynchausti: Todo este trabajo es menester coordinarlo perfectamente y nuestro gran 28 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea Intxausti, que está realizando una labor admirable en New York, ha acogido con verdadero entusiasmo el proyecto , y como cuando hay fe en una persona es menester dotarle de todas aquellas facultades precisas, él ha quedado encargado de realizar todo este vasto programa de organización universa. Había que empezar por abajo y hoy vamos ascendiendo. El fruto lo veremos conseguido dentro de algún tiempo. No nos falta ni entusiasmo ni carácter de hacerlo. El propio Sr. Intxausti, aparte de labor realizada por la labor que realiza entre elementos religiosos y eclesiasticos, con trabajo y constancia pero con seguridad en el triunfo, ha organizado una suscripción para todos los vascos de toda América para regalar a los Ejércitos aliados unas ambulancias sanitarias...4 De este modo, durante varias semanas Ynchausti elaboraría una lista con los posibles contactos que pudieran ser útiles para su causa. Al mismo tiempo, el Gobierno establecería las bases de la actuación de la delegación vasca en Estados Unidos, cuyo objetivo primordial sería "llevar a cabo un trabajo de información, estudio de ambiente y posibilidades de actuación con vista a una nueva Comisión que saldrá en el momento que el señor presidente del Gobierno de Euzkadi5 lo determine".6 Los primeros representantes de la delegación vasca llegarán a Nueva York el 19 de agosto de 1938. Aguirre había estimado inicialmente la candidatura de Ynchausti para dirigirla, pero desistió ante la imposibilidad de que un ciudadano norteamericano ocupara un cargo de tales características. Dirección y organización de la Delegación. La primera delegación estaría compuesta, por lo tanto, por el nacionalista Antón de Irala como delegado, acompañado en sus tareas por Ramón de la Sota Mac Mahon, Manuel de la Sota y Aburto (tío del anterior), el periodista Juan de Aranburu, el sacerdote Eustasio Arritola y Jose de Urresti que estaría encargado de la Secretaria y de la Hacienda de la delegación.7 Al poco tiempo se incorporarían Jesús de Galíndez, Jon Bilbao, Jon Oñatibia y Cipriano Larrañaga8. La delegación abrió su oficina en el New Weston Hotel, en pleno Manhattan (calle 50 Este). Algo después se trasladaría al Elysée Hotel, también en Manhattan. La composición de la delegación - que incluía militantes nacionalistas, empresarios con experiencia en el mundo anglosajón, y sacerdotes católicos - dejaba entrever cuáles iban a ser sus principales campos de actividad. Anton de Irala fue el delegado hasta 1939, cuando se trasladó a Europa9 para organizar el entramado de la delegaciones en Latinoamérica. Fue reemplazado temporalmente por Manuel de la Sota Aburto, entre 1939 y 1942,10 procedente del sector más radical del nacionalismo, quien acabó por afianzarse en el cargo debido a la imposibilidad de retorno de Irala: copado por el avance alemán en Francia, quien tuvo que permanecer oculto en Pau y Bétharram hasta que finalmente pudo huir en 1942. Manuel de la Sota estuvo auxiliado por otros pesos pesados del 29 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea nacionalismo vasco: Ramón de la Sota Mac Mahon11 (secretario general, buen conocedor del mundo anglosajón por haberse licenciado en Cambridge y especialista en relaciones internacionales, principal enlace con el Departamento de Estado)"12 y el ya mencionado Manuel María de Ynchausti. La sede de la Delegación se acabaría instalando en el número 30 de la Quinta Avenida. Durante esta época, aparte del auxilio a los exiliados, se intentaba captar el apoyo de los emigrantes vascos en Estados Unidos y la propia opinión pública norteamericana. Para ello estaban convencidos que mostrando la historia y la cultura vasca conseguirían hacerse con la simpatía opinión pública: A mis tareas de la Delegación se une el que estoy dando todos los sábados un ciclo de conferencias en el Centro Vasco sobre Historia de la Civilización Vasca, y para ello tengo que andar revolviendo libros en la Biblioteca Pública (una de las legitimas maravillas del mundo) lo que me lleva mucho tiempo. Pero estas tareas me llenan de satisfacción, porque a nuestros compatriotas de aquí, sumidos en la ignorancia patria, les estoy descubriendo un extraordinario mundo vasco que ellos desconocían. Y basta una exposición excueta (sic) de nuestra historia, para que se hayan hecho todos nacionalistas. Me he convencido que la mejor propaganda nacionalista es la historia vasca.13 En lo que se refiere a la financiación, parece ser que durante estos años la delegación instalada en la ciudad de los rascacielos no estuvo falta de recursos, aunque sí parece que pudieron crearse pequeñas discrepancias en el seno del Gobierno vasco por los asuntos económicos: …Y seguiré en mi puesto aunque tenga mucho trabajo y pocos ingresos. A Dios gracias, nunca me ha preocupado el dinero, ni he ambicionado tenerlo, Dios Proveerá…En espera de que Koldo me mande las mil libras que le ha ordenado Torre comentario de V.: “Ya puede espera sentado” o de que Lucio me comunique las instrucciones que trae Eliodoro, esta Delegación vive gracias a $350 mensuales que por partes iguales me dan Intxausti y Marino. Creo que debe V. escribirles oficialmente dándoles las gracias. 14 Una vez que el lehendakari Aguirre reapareció públicamente en 1941, tras su periplo por la Europa ocupada por los Nazis,15 lo primero que hizo fue reorganizar las actividades de la delegación, dando su opinión sobre lo que han hecho en su ausencia. En lo referente a Nueva York indicaría en critica a Irujo por su excesivo gasto que: Habláis de estrecheces. Las comprendo y quisiera evitarlas Pero tened en cuenta que todos los desastres económicos de aquí y de ahí nos han colocado en situación económica difícil. Vosotros gastáis más que cuatro veces que la delegación de Nueva York desde la que dirijo nuestra causa. Yo tengo más personal que Manu que hace de todo. Y esto es ya demasiado 30 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea comprenderéis que si vosotros hablaís de dignidad yo podría hacerlo con mayor motivo. Sin mi modesto sueldo de la Universidad, yo tendría que pedir limosna. Por eso es menester reducir los gastos. Hacedlo así y enviadme un presupuesto lo más reducido posible hasta que las circunstancias mejoren.”16 Con la instalación del propio presidente Aguirre en Nueva York, en cierto modo entre 1942 y 1945 se confunden las actividades de la Delegación y del propio Gobierno Vasco, ya que aunque sus miembros se hallaron diseminados por diversos países la sede efectiva del Gobierno estuvo realmente situada en la ciudad elegida por el lehendakari para residir. No obstante, se mantuvo una diferenciación orgánica, y así en 1943, tras su retorno a Estados Unidos, Antón de Irala sería puesto nuevamente al frente de la Delegación. En 1946, además, se unió al plantel de la Delegación un personaje que alcanzaría prontamente notable relevancia. Procedente de Santo Domingo, Jesús de Galíndez, antiguo delegado en Madrid y en la República Dominicana, llegaba a Estados Unidos como doble refugiado, huido de España primero, y del país caribeño después, con la enemistad de dos dictadores a sus espaldas. Las dotes de Galíndez, unidas a su experiencia en el terreno de la paradiplomacia - a pesar de su juventudpronto lo auparon a lo más alto de la Delegación. Durante años ejercería de subdelegado de Irala, responsabilizándose junto con éste de las tareas de propaganda, y estableciendo numerosos lazos en el mundo académico y los lobbies de la política norteamericana. En 1949, con el traslado de Antón de Irala a Europa, pasaría a ejercer sus funciones de manera provisional. … ha llegado de Nueva York, acompañado de su familia, el delegado del Gobierno de Euzkadi en Estados Unidos don Antonio Irala; que pasará una temporada en Laburdi. Durante su ausencia estará al frente de la Delegación Vasca en Nueva York, el subdelegado Jesús de Galíndez, quien recientemente regresó a aquella capital después de una estancia de varios meses en Europa. 17 El viaje familiar de Irala no fue, sin embargo, temporal, ya que finalmente decidiría afincarse con su familia en San Juan de Luz. En su lugar, ocuparían sucesivamente la cabeza de la Delegación, de un modo casi provisional, otros miembros de la misma como José Urresti, Juan Aramburu y Eustacio Arritola18 Esta situación acabaría, finalmente, en 1950 con el nombramiento de Jesús de Galíndez como titular, cargo que desempeñó hasta su desaparición en 1956.19Al igual que el lehendakari Aguirre durante su estancia en Estados Unidos, Galíndez fue también contratado como profesor invitado de la Universidad Columbia de Nueva York, comenzando en el año académico 1951-1952; encargo en el que además resultaba evidente que, además de su conocimiento del País Vasco, durante los años de exilio había adquirido una notable experiencia sobre la historia política de 31 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea Latinoamérica.20 Tras Galíndez, ocuparían dicho puesto durante su último decenio de existencia Jon Oñatibia (nombrado provisionalmente mientras se aclaraba el caso Galíndez), Jon Bilbao y Pedro Beitia. En 1966 cesaba en sus funciones el último delegado y se clausuraba definitivamente la Delegación. América: la gran esperanza en los años de guerra. Los años de la Segunda Guerra Mundial marcan la primera etapa de más intensa actividad política de la Delegación de Nueva York. Desde Nueva York, sostenido económicamente por un contrato docente en la Universidad de Columbia financiado por Ynchausti, el lehendakari Aguirre desarrollaría durante su estancia en Estados Unidos el embrión de un sistema de relaciones que, según sus esperanzas, debían servir para afianzar y dar unidad al exilio vasco, al tiempo que permitiría una visibilidad del problema vasco en el marco de la lucha de los aliados contra los regímenes totalitarios del Eje.21 En este contexto, Estados Unidos se presentaba como la potencia líder del bando de quien se esperaba que traería de vuelta a los exiliados a su tierra, una vez derrotado Franco y erradicado su régimen. La continuidad del Gobierno Vasco como institución, según el lehendakari, otorgaría un plus de legitimidad y una más sencilla recomposición del entramado de autogobierno vasco tan difícilmente obtenido, ya que, como el mismo Aguirre transmitiría a Monzón, "instrumentos de esta clase no se improvisan".22 Estos esfuerzos cristalizarían en dos importantes líneas. Por un lado, la Delegación y el propio lehendakari acentuaron las vinculaciones del Gobierno Vasco con los servicios de inteligencia norteamericanos, poniendo, como ya hemos visto y es conocido, la red de personas de confianza creadas en torno al entramado de las Delegaciones al servicio del esfuerzo bélico y la contra-propaganda de los aliados, permitiendo al mismo tiempo el sostenimiento, sin excesivos agobios, de todo el personal a ellas adscrito en una época en la que el Gobierno se hallaba desprovisto de todo tipo de recursos propios.23 El propio lehendakari marcaba las líneas de esta política en su mensaje de Gabon (Navidad) de 1941: Como era previsto, las potencias del Eje han declarado la guerra a Estados Unidos de América. Para nosotros, la guerra ha sido declarada a toda América, porque el respeto a la dignidad humana y a las libertades públicas tienen en este continente su asiento más firme. Y contra ellas va el ataque. Los que lo hemos sufrido sabemos que es así. Nuestra posición de 1939 queda hoy ratificada y es deber de todo vasco prestar su concurso activo a la causa de la libertad allá donde ésta necesite de nuestra asistencia. Será una manera más de agradecer a América la inolvidable y generosa acogida que tanto a mí como a todos los vascos nos ha dispensado con especial afecto. 24 En segundo lugar, el lehendakari y la Delegación realizaron una intensísima 32 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea campaña de lavado de imagen por el alineamiento con los republicanos españoles de las instituciones autonómicas vascas, entre la opinión pública católica de los Estados Unidos, que ya para entonces ejercía como un poderoso lobby en la conformación del poder norteamericano. La escalada bélica propiciada por Hitler y secundada por Mussolini en Europa, habiendo sido ambos mandatarios totalitarios los propiciadores del ascenso de Franco al poder, permitía que las tesis defendidas por el Ejecutivo vasco pudieran tener un mayor eco entre los medios y los creadores de opinión del mundo católico estadounidense; algo que se vería amplificado tras la entrada de Estados Unidos en la guerra. Franco ya no podría ser considerado más como solamente el paladín del catolicismo y la religión frente a la amenaza comunista - como había sido la postura oficialmente aceptada por la Iglesia norteamericana-, sino que pasaba a ser el aliado y amigo de los principales enemigos de la patria americana. La coyuntura no podía ser más propicia. De este modo, el lehendakari Aguirre llegaría a presentarse como: José Antonio Aguirre, jefe de la resistencia católica vasca, [que] ha desarrollado una campaña en Europa occidental y en Estados Unidos: en Washington, Nueva York y en América Latina organizando la acción antifranquista. Presidente de la República vasca de poca duración, dijo a funcionarios del Gobierno norteamericano que contaba con el apoyo de dos jefes de gobiernos católicos: Bidault de Francia y De Gasperi de Italia. 25 La actividad propagandística así iniciada por el Gobierno Vasco fue apoyada por la propia representación diplomática del gobierno de la República Española. Al poco tiempo de la instalación de la Delegación vasca en Nueva York, sus miembros: … se entrevistaban en Washington con el embajador de la República, Fernando de los Ríos, a quien exponen su plan de actuación. El embajador se muestra conforme siempre que le tengan al tanto de sus gestiones. Al menos en apariencia, las relaciones tanto con el embajador como con el cónsul principal de Nueva York fueron siempre cordiales y francas. Y es que además, los representantes republicanos sabían que el campo de actuación principal de los vascos -el mundo católico- estaba vedado para ellos.26 La guerra de la opinión fue, así, una de las que más abiertamente emprendió durante aquellos años la Delegación, en un esfuerzo en el que fue secundado por otras fuerzas democráticas vascas y españolas. Entre las principales realizaciones en este terreno, destaca la publicación de la revista Basques. Bulletin of the Basque Delegation in the USA. Escrito íntegramente en inglés, con artículos firmados por pensadores y políticos vascos traducidos prontamente a la lengua inglesa, se presentaba -a diferencia de otras iniciativas editoriales de otras Delegaciones- no como un emprendimiento hacia el interior de la colectividad vasca, sino como un escaparate hacia la opinión pública norteamericana. Entre marzo de 1943 y agosto de 1944 se publicarían seis números de esta revista, de muy corta existencia, pero 33 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea constituyendo sin duda una de las más cuidadas y elaboradas iniciativas editoriales de las delegaciones vascas en América. El periodo de Galíndez y la batalla por las Naciones Unidas En 1950 el presidente vasco decidía reinstalar la sede de su gobierno en el exilio nuevamente en Europa.27 A pesar del retorno del lehendakari Aguirre a París, y la marcha de Antón de Irala al País Vasco francés, la Delegación de Nueva York no perdió, sin embargo, su importancia capital en el conjunto del entramado paradiplomático del Gobierno Vasco. Nueva York se había constituido, desde la elección de dicha ciudad como sede de la naciente Organización de las Naciones Unidas, en un remedo de capital mundial, en la que se estaba gestando en gran medida el nuevo orden internacional surgido tras la Guerra Mundial. El Gobierno Vasco, como otras instituciones del exilio republicano, veía en la ONU el organismo que debía conseguir, mediante las armas del aislamiento y la presión internacional, aquello que las armas no habían conseguido: la derrota del régimen franquista y el retorno de la legitimidad gubernamental, encarnado en los gobiernos de la República, la Generalitat catalana y el Gobierno Vasco. La notoriedad adquirida por la figura de Galíndez en el ámbito de la política latinoamericana28 hizo que la Delegación vasca en Nueva York pudiera cultivar de modo especial una proyección del problema vasco en diversos foros culturales y políticos del continente (sin olvidar las puertas que se le abrieron por su colaboración en el FBI). De hecho, desde su puesto en la Universidad de Columbia, Galíndez había desarrollado una serie de actos académicos, de notable repercusión pública, en torno a cuestiones de la historia y la actualidad de Latinoamérica. Si bien todas estas actividades no se hallaban directamente ligadas a su labor como Delegado, lo cierto es que Galíndez aprovechaba cualquier ocasión para ligar ambas facetas de su vida. Así, por ejemplo, en 1950 OPE daba cuenta de que El delegado de los Estados Unidos Don Jesús de Galíndez dio hace unos dias una conferencia en el seminario latino-americano de la facultad de historia de Columbia University; que dirige el profesor Frank Tannembaum, sobre el tema "Intervención de los Vascos en la independencia de América". A continuación hubo un animado debate en el que intervinieron entre otros: Dr. Frank Tannembaum (EEUU). Dr. Federico Onis (Casa Hispanica), Dr. German Arceniegas (Colombia), Dr. Picon (Venezuela), Dr. Portuondo (Cuba).29 De hecho, Galíndez destacaría durante los años en los que ocupó la Delegación por ser uno de los más conocidos conferencistas expertos en temas latinoamericanos, aspecto reflejado en las publicaciones del propio Gobierno Vasco en el exilio. En una ocasión, por ejemplo, se informaba de que “el banquete celebrado el pasado día 19 por la Panamerican Women Associaton D. Jesús de 34 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea Galíndez (delegado de Euzkadi) se refirió al estado de intranquilidad del Caribe achacando a la existencia de varias dictaduras.”30 En noviembre de 1949, por ejemplo, “pronunció una conferencia en la Columbia University en su seminario latinoamericano de la facultad de historia”31 y pocos días más tarde impartía “en la École Lire des Hautes Etudes de Nueva York /.../ el curso de conferencias /.../ sobre el tema de la realidad jurídica y social sobre América del sur.”32 No resulta así extraño, por lo tanto, que algunos de sus más sonoros éxitos diplomáticos vinieran de la mano de diversas legaciones y representaciones de estados latinoamericanos, que apoyaron mediante reconocidos gestos la labor y presencia del Gobierno Vasco y su delegación. Asi, por ejemplo, fue importante la ayuda prestada por diversos gobiernos latinoamericanos, que ampararon la presencia de la representación vasca en la ONU a través de sus propias legaciones, desde las que ofertaron apoyo logístico y propiciaron la relación directa del Delegado vasco con miembros del cuerpo diplomático acreditado ante la organización internacional. Así, por poner un ejemplo, en 1955: … el profesor Jesús de Galíndez, delegado Vasco en Estados Unidos asistió a la recepción ofrecida en las Naciones Unidas para homenajear al ministro de negocios extranjeros del Uruguay Señor Ropani, con asistencia de muchos delegados ante las Naciones Unidas y diversas personalidades de la vida cultural, social y política newyorkina. Asistió también el Sr. Galíndez al banquete celebrado en el Hotel Commodore para festejar la elección, como dirigente del partido demócrata en uno de los barrios de la ciudad. El señor Jon Argiano acompañó al delegado vasco.33 La Delegación vasca en Nueva York llegó a estar presente, de hecho, en actos de marcado carácter político e institucional en diversos países latinoamericanos, a un nivel de representación equiparable en la práctica al de los representantes diplomáticos legítimos. Tal fue el caso, por ejemplo, de la toma de posesión del nuevo presidente costarricense en 1953: El Sr. Galíndez, profesor de Asuntos Latinoamericanos en la Universidad de Columbia y Delegado de Euzkadi en los Estados Unidos, ha sido invitado como huésped especial del Gobierno de Costa Rica para asistir a las ceremonias de la toma de posesión del nuevo presidente Sr. Figueres. La invitación personal del presidente electo ha sido transmitida por el Ministro de Relaciones Exteriores de Costa Rica.34 Los contactos hicieron que, al menos hasta mediados de la década de 1950, el lehendakari Aguirre siguiera siendo recibido como una personalidad política "interesante" en el aparato administrativo de los Estados Unidos35. No obstante, el 35 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea centro de atención de la Delegación no se hallaba tanto en América como en Europa. Franco y su legitimidad eran el caballo de batalla de la propaganda pública del Delegado. Nada más constituirse las Naciones Unidas, el Gobierno Vasco se juntó con el resto de voces de las fuerzas democráticas que exigían -y finalmente consiguieron- la exclusión del régimen de Franco y el establecimiento de una serie de sanciones internacionales, que comenzaron por la recomendación de retirar los embajadores en Madrid. La argumentación dada para conseguir estas sanciones se centrarían en la evidente implicación del régimen franquista con los países del Eje, ya que si bien no había llegado a participar directamente en la Guerra, Franco se había atrevido, en los momentos en que Alemania parecía imparable, a sacar al Estado español de la neutralidad y hacerse "no beligerante", un modo de expresar sus simpatías por el Eje. El Gobierno Vasco, a través de los miembros de la Delegación, contribuía con datos y cifras a poner en evidencia la participación española en la guerra, aún de forma indirecta, contra las naciones aliadas y los Estados Unidos: He leído la reproducción parcial que ha hecho el Diario de Nueva York de la carta dirigida al New York Times por el agregado cultural de la embajada franquista en Washington. Para la debida información de sus lectores, mucho le agradecería de las siguientes citas oficiales. El informe del subcomité de investigación de las Naciones Unidas sobre el problema español se firmó con esta fecha 31 mayo de 1946: Los puertos españoles se pusieron a disposición de Alemania, como bases de submarinos y para el aprovisionamiento de sus destructores (documentos 9 y10 del Libro Blanco americano). Aunque esto se hizo en Octubre y Diciembre de 1940, sin embargo el 21 de junio 1942 el ministro español de negocios extranjeros hizo una declaración pública negando estas acusaciones. Los submarinos alemanes y otros barcos eran reparados y obtenían repuestos en numerosos puertos españoles, entre ellos; Vigo, San Jurjo (Marruecos), Las Palmas y Tenerife. (declaraciones de Kraper y Benner, transmitidos por la URSS) el informe de la delegación de Inglaterra, fechada el 30 de marzo de 1946, confirma el uso de puertos españoles para submarinos y otros barcos del eje, y enumera los siguientes puertos donde los barcos del Eje obtuvieron ayuda y repuestos: Algeciras, Cádiz, Cartagena, El Ferrol, Pasajes, Gijón, Vigo, Las Palmas, Tenerife y Sevilla.36 De hecho, con esta perspectiva, por aquellos mismos años se iniciaban los intentos de derrocar al régimen mediante la acción armada, preludio de una insurrección, a través de los conocidos "maquis"; sobre todo de la mano de los grupos de la izquierda española. En el caso de Euskadi, la huelga general de 1947 se presentó, por parte del Gobierno Vasco como una muestra de la vitalidad y del deseo de recuperación de las libertades por parte de la resistencia del pueblo vasco. De hecho, "Antonio Irala, delegado del Gobierno Vasco en New York explicó cómo 36 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea se falsificó el referéndum en Euzkadi", ligando de este modo el proceso huelguístico con el malestar político causado por el remedo de referéndum mediante el cual Franco quiso presentar su régimen en el concierto internacional con unas bases pseudo-democráticas37 Pero la victoria obtenida en 1946 estaba lejos de suponer, como en un alarde de optimismo pensaron todos los representantes legítimos de la legalidad republicana, la antesala a la definitiva caída del régimen de Franco. Muy tempranamente, los representantes de la Delegación vasca tuvieron que hacer frente a las crecientes voces, alentadas por la propaganda de la delegación oficiosa del régimen español en los Estados Unidos,38 que abogaban por una reconsideración de las sanciones respecto a España. Así, por ejemplo, en 1950: … al terminar la sesión del comité político especial en el que se aprobó la propuesta para modificar la resolución de 1946 sobre la España franquista, un periódico preguntó su opinión al delegado vasco de Estados Unidos, don Jesús de Galíndez, quien declaró: Nos hemos opuesto a la proposición porque, pese a los argumentos alegados por las delegaciones que la presentaron, no nos convencen las razones técnicas que han sido manejadas; y estamos seguros de que Franco tratara de aprovechar este resultado en su propaganda política. Pero lo importante es que ninguna de las delegaciones amigas del franquismo se han atrevido siquiera a defender el régimen español y a otras delegaciones que han votado favorablemente han tenido buen cuidado de afirmar que al hacerlo así no expresaban ningún juicio favorable a ese régimen, que casi todos ellos han condenado expresamente. La resolución de 1946, sin más modificación que ha introducido por los dos puntos concretos de su disposición final, sigue vigente, incluyendo el extenso preámbulo fue presentado en 1946 por los Estados Unidos y ha sido ratificado esta mañana en el dicurso pronunciado ante el comité especial por su delegado, senador Sparkman. 39 Durante algún tiempo, los contactos establecidos con el aparato político norteamericano sirvieron para hacer frente en la opinión pública a estos intentos. La guerra y las alianzas pasadas del régimen franquista siguieron siendo el leivmotiv principal de las argumentaciones: Ya es sabido que el diplomático norteamericano señor Herbert Pelt acusó al gobierno franquista de haber facilitado asistencia a los submarinos alemanes durante la gran guerra. El agregado cultural franquista, ha tratado, sin conseguirlo, denegar la veracidad de la acusación. Pero ha terciado en el debate Jesús de Galíndez, dirigiendo sendas cartas a los directores del The New York Times y de Diario de Nueva York. En nuestro próximo boletín publicaremos dicha carta.40 A esto se añadía, además, la vinculación de la defensa de la postura vasca ante el contencioso de la España franquista,41 con el naciente mundo de las organizaciones 37 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea defensoras de los Derechos Humanos, que habían constituido una de las declaraciones fundacionales de las Naciones Unidas. El régimen franquista no sólo debía ser condenado por su pasado filo-nazi, sino también por su presente contrario al espíritu de respeto de los Derechos Humanos en toda su extensión: Invitado por uno de los capítulos de ADA (American for Democratic Action) en la ciudad de Nueva York, el delegado vasco en los Estados Unidos tras una alocución en contra del régimen de Franco fue seguido de un prolongado aplauso seguido de preguntas y discusión. La casi totalidad de los asistentes estuvieron conformes en condenar el pacto, por entender que las razones morales y políticas son superiores a las ventajas estratégicas concedidas.42 Estos esfuerzos contarían incluso con la participación a más alto nivel del propio lehendakari, que se desplazaría desde París a Nueva York a fin de reafirmar el compromiso con los derechos humanos y la denuncia respecto a este particular de la España franquista. En febrero de 1950, por ejemplo, el lehendakari Aguirre acudió a una de las reuniones de ADA, acompañado del delegado Galíndez, en la que participaron, entre otros, el senador demócrata Lehman, un miembro de la comisión de Relaciones Exteriores del congreso, y el propio presidente de ADA, así como diversos representantes de la España republicana y la Generalitat catalana.43 Como se refleja además en esta última cita, la Delegación del Gobierno Vasco también cultivó las relaciones con otras fuerzas democráticas de la Península Ibérica. Galíndez, por ejemplo, fue asiduo orador en la principal sociedad española de Beneficencia de Nueva York, "La Nacional", en los que actuaba específicamente en su calidad de Delegado.44 También fueron intensas las vinculaciones con el grupo Galeuzca, siguiendo en esto las indicaciones emanadas por el propio Gobierno Vasco.45 En el fondo, detrás de toda esta campaña se hallaba el deseo nunca escondido de obtener algún tipo de reconocimiento al más alto nivel internacional, si no del Gobierno Vasco, sí al menos de una entidad que permitiera a éstos expresarse con su voz propia en el concierto mundial. Como señala Ugalde Zubiri: Galíndez propone la creación de un Organismo Internacional Vasco reconocido ante las NN.UU. Al menos en dos ocasiones, 1950 y 1956, Galíndez sugirió la creación de una Organización No Gubernamental que adquiriese la categoría de ONG consultiva ante las NN.UU. y que sirviese de instrumento de acceso a otras organizaciones internacionales y de complemento a la acción exterior del Gobierno Vasco. Citaba como ejemplos a seguir la Liga Internacional de Derechos del Hombre y el Congreso Mundial Judío. En mayo de 1950 propuso reorganizar la Liga Internacional de Amigos de los Vascos (LIAV) ya que "hoy su existencia es más simbólica que efectiva; y en esas condiciones no podemos aspirar a que sea reconocida". Para ello tres eran los pasos a dar: puesta en marcha de las 38 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea secciones nacionales de la LIAV en varios países europeos y americanos; reactivación general de la LIAV; y tramitación de su reconocimiento ante el Comité Económico y Social de NN.UU. Pedía que se meditase sobre la "repercusión internacional" que supondría que "su representante, acreditado oficialmente ante la ONU como tal, puede realizar en múltiples aspectos sociales, culturales, humanitarios y políticos; y sobre todo su empuje decisivo el día de mañana, cuando nuestro problema político cobre nueva actualidad internacional.46 La relación con la colectividad vasca La labor de la Delegación, además, también se dirigía preferentemente hacia la propia colectividad vasca local, de la que se seguía buscando la adhesión y colaboración, como también se había llegado a intentar, en un momento anterior, en las zonas del Oeste de los Estados Unidos con una mayor presencia de inmigrantes vascos. A pesar de que Nueva York no podía ser considerada representativa de la situación de la colonia vasco-norteamericana, ni por número ni por el carácter socio-profesional de sus miembros, los vascos de Nueva York gozaban sin embargo de una mayor organización, propia de su carácter urbano. La estrategia intentaba hacer de la Delegación, en primer lugar, un elemento más de la vida social vasco-neoyorkina. De este modo, tanto los delegados como otros miembros de su equipo procuraban hacerse presentes en todo tipo de actos sociales de la colectividad, ya fueran de carácter más o menos público o privado: Anteayer tarde se celebró la boda del Sr. Andoni Aguirre con la Señorita Irene de Renteria, ambos funcionarios de la Delegación del Gobierno de Euzkadi en esta capital. La ceremonia religiosa tuvo lugar en la iglesia de Santa Isabel en presencia de muchos vascos de la colonia local. A continuación se celebró una animada fiesta, amenizada de txistu y orquesta. 47 En todo caso, eran sobre todo las grandes festividades de carácter nacional, aquellas en las que más incidiría la presencia pública de la Delegación. Muy tempranamente, la Delegación comenzó a colaborar con el Centro Vasco de Nueva York en la celebración anual del Aberri Eguna,48 a la que - sin olvidar su clara raigambre nacionalista - se le procuró dotar de un carácter más comprensivo y lúdico. Anualmente, los Aberri Egunas se convertirían, con el paso del tiempo, en el momento cumbre de las actividades anuales del Centro Vasco, con el apoyo de la Delegación: La colonia vasca de Nueva York celebrará la festividad del Aberri Eguna con dos semanas de retraso debido a dificultades de local. El acto preparado comprende el baile anual de centros vascos americanos, y una exhibición de grupo de danzas que dirige el maestro Jon de Oñatibia, entre los que harán su presentación el nuevo grupo de niños. El delegado vasco en Estados Unidos (Sr Galíndez) pronunciará unas palabras alusivas a la festividad. 49 39 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea El pasado sábado se celebró el festival del Centro Vasco de Nueva York, con que conjuntamente se conmemora la festividad recién pasada de Aberri Eguna. El maestro Oñatibia presentó con esa oportunidad su nuevo grupo de niños de dantzaris; la artista vasca de ópera Libe de Ibarrondo entona varias canciones en Euzkera y el delegado de Euzkadi Sr. Galíndez pronunció unas palabras alusivas al acto patriótico. Asistieron muchos miembros de la colonia vasca local y la fiesta concluyó con un baile de romería50 Además, desde la delegación se impulsaría también una nueva serie de festividades vascas, destacando la del Día del Euskera en el mes de diciembre, coincidiendo con el santoral católico de San Francisco Javier. El Día del Euskera se convertiría en el acto público más importante desarrollado desde la Delegación para la colonia vasca de Nueva York: El pasado domingo se celebró el "día del Euzkera" en esta capital, con un banquete en el restaurante vasco Jai Alai, al que asistieron numerosos vascos de la colonia local. Entre ellos se hallaba el decano de la misma Don Valentín de Aguirre, quien pronunció un discurso en Euzkera, al igual que el señor Jon de Oñatibia, director de Argia. Presidió el delegado en funciones D. Jesús de Galíndez. Al final del acto se hizo una colecta para ayudar a los propósitos de los organizadores de esta fiesta.51 La figura de Valentín Aguirre resulta igualmente imprescindible para comprender el desarrollo de las relaciones entre la Delegación y la colonia vasca. Aguirre había sido durante décadas el verdadero "consulado vasco" en Nueva York. Desde su Hotel, vigilaba el desembarco en el puerto neoyorquino de los vascos que llegaban como emigrantes, a quienes alojaba y ayudaba en los preparativos de su viaje por tren cruzando todo el continente, durante días, sin conocer ni palabra de la lengua inglesa. Aguirre, de origen vizcaíno, había sido uno de los primeros en ofrecer su apoyo a la naciente Delegación, usando ésta su predicamento y ascendiente en la colonia vasca local para hacer más fácil y sencilla la introducción de sus miembros en las actividades de los vascos. Su fallecimiento en 1953 hizo que el Gobierno Vasco buscase su reconocimiento: Ha fallecido Don Valentín de Aguirre, propietario del Hotel Santa Lucia y del Restoran Jai Alai, tan conocido por todos los Vascos que han pasado por esta ciudad. Valentin de Aguirre, nacido en Busturia hace ochenta y tres años llevaba unos sesenta en los EEUU y por esta circunstancia y por el espíritu paternal con que trató y protegió siempre era considerado como el patriarca de los vascos. Su muerte ha sido muy sentida por la colonia, así como por las numerosas relaciones americanas que le habían valido sus dotes personales, sus múltiples negocios y sus largos años de residencia en el país. 40 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea El presidente Aguirre y el gobierno de Euzkadi estarán representados en el entierro por el delegado Señor Galíndez. 52 Se completaba todo esto con las visitas del propio lehendakari vasco, quien hubiera establecido también toda una red de amistades y relaciones entre la colectividad vasca. Estas visitas cumplirían el doble propósito de hacer visible la figura del Gobierno Vasco, cada vez más debilitado a medida que el exilio se prolongaba, y al mismo tiempo, ofrecer a la Delegación una ocasión para acrecentar los lazos entre ésta y los vascos de Nueva York: El pasado viernes por la noche llegó a Nueva York, procedente de Caracas, el presidente Aguirre, y el sábado fue obsequiado con un banquete ofrecido por el centro Vasco y la colonia de esta ciudad. Presidieron junto al Señor Aguirre, Presidente del centro vasco Alberto Uriarte y el delegado de Euzkadi en Estados Unidos Jesús de Galíndez. En este homenaje se hallaban entre los presentes; la directiva en pleno del centro Vasco, el delegado de Euzkadi en Estados Unidos y todas las personalidades de la colonia vasca newyorkina. 53 La Delegación, también desarrollaría a inicios de la década de 1950 una intensa labor lobbística en torno a los debates sobre la inmigración vasca, y en concreto a la aprobación de la enmienda McCarran que permitía el ingreso anual de un cupo de pastores vascos con destino a los estados del Oeste: El senado americano ha aprobado y enviado a la cámara de representantes un proyecto de ley por el que se conceden unos visados especiales para que entren en el país 250 pastores, la mayor parte de los cuales son vascos de ambas vertientes pirenaicas, predominando los peninsulares: Los pastores vascos - dijo el senador McCarran al tratarse el proyecto de ley en el Senado - han sido admitidos anteriormente en Estados Unidos, y han demostrado plenamente estar dotados de aptitudes especiales para este trabajo; tienen un temperamento especial y además han resultado unos excelentes ciudadanos, respetuosos cumplidores de la ley y muy fieles.54 El "caso Galíndez" La intensa labor de propaganda y el entramado de relaciones que Galíndez había desarrollado en el mundo político e intelectual norteamericano se vendría abajo por un hecho totalmente inesperado, que sin tener relación alguna con su labor como delegado, sino con su historia personal, truncaría abruptamente su vida y obra. El 12 de marzo de 1952, en pleno centro de la ciudad de Nueva York, Galíndez desaparecía sin dejar rastro, generando la preocupación entre sus allegados dado que, a todas luces, no se trataba de una desaparición voluntaria, sino forzada. Las mismas fuentes del Gobierno Vasco en París, al recoger la noticia y relatar las 41 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea primeras pesquisas efectuadas en torno a esclarecer el caso por la policía neoyorquina, apuntaban ya al más que probable autor de aquella desaparición: Don Jesús de Galíndez, profesor de Derecho Internacional hispano americano en Columbia University ha desaparecido de su domicilio. La desaparición se remonta al día 12 del corriente. El Sr. Galíndez había residido varios años en Santo Domingo, donde ejerció también funciones docentes hasta que el presidente Aguirre le llamó a Nueva York para representar aquí al Gobierno Vasco en el exilio, en cuyo cometido se ha distinguido siempre por su celo e inteligencia. En los sectores hispanoamericanos de Nueva York, donde el desaparecido contaba con grandes amistades, se recuerda que el profesos Galíndez, adversario irreductible de toda dictadura, había recibido grandes amenazas, y se comentó que el día 27 de febrero, o sea unos días antes de su desaparición había obtenido brillantemente el doctorado en filosofía y ciencia política defendiendo con grande éxito su tesis titulada "Trujillo´s Dominican Republic" (Republica Dominicana de Trujillo), extenso trabajo objeto de 700 páginas mecanografiadas que iba a ser publicado en español y en ingles. En los medios vascos no se conoce otra circunstancia que explique la desaparición. Hasta ahora, no han dado resultado las investigaciones practicadas por los policias de 13 estados de Norte América.55 Durante los días siguientes, el boletín gubernamental OPE seguiría incidiendo en la conexión dominicana para explicar el ya calificado abiertamente como secuestro del Delegado: La policía ha estado en el N 30 de la Quinta Avenida examinando los locales de la delegación vasca, donde el profesor Galíndez tenia su domicilio, sin que el registro haya servido para conocer la suerte que ha podido conocer el delegado del gobierno de Euzkadi en el exilio. Los amigos del desaparecido no ocultan su pesimismo, pues recuerda que el señor Galíndez, que residió en la Ciudad Trujillo hasta hace diez años, estaba amenazado de muerte. Así lo ha confirmado don Germán Arceniegas, exministro de educación en Colombia y profesor igualmente de la universidad de Columbia University, que recordó aquella circunstancia al ver que en tres días de diligencias infructuosas no había podido obtener noticias de su amigo y colega. Otra de las personas que primero se alarmaron fue Mr. Stanley Ross, director del Diario de Nueva York periódico de lengua española en el que el desaparecido colabora con exacta regularidad. La alarma se extendió al confirmarse que el profesor tampoco había acudido a la reunión quincenal que en el Hotel Great Northern suele celebrar la asociación de poetas y escritores iberoamericanos a la que el desaparecido pertenecía. Mr. Ross ha declarado que el Sr Galíndez era un ferviente liberal y había recibido tales amenazas de muerte, por correo y teléfono, que hace un año dio cuenta de ello al FBI. 42 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea El N.Y. Times recuerda que el señor Galíndez se había manifestado públicamente como miembro del Partido Nacionalista Vasco, de inspiración demócrata cristiana y por lo tanto enemigo de toda dictadura. Entre las amistades del desaparecido nadie duda que sus actividades políticas son la explicación de su secuestro.56 Lo cierto es que enemigos no le faltaban a Galíndez, y uno de los más evidentes sospechosos, aparte de la dictadura dominicana, no era otro sino el régimen de Franco, a quien tan arduamente había combatido en las lides internacionales durante diez años. El propio New York Times, citando fuentes diplomáticas y policiales, descartaba sin embargo esta posibilidad, apuntando también -en coincidencia con los medios de información vascos, así como de varios países latinoamericanos- al dictador Trujillo como el más probable responsable.57 La enemistad, como hemos visto, se había generado durante los tiempos de residencia de Galíndez en la isla caribeña, período en el que se había involucrado en cuestiones de libertad y justicia internas de la política de Santo Domingo58. Las investigaciones para esclarecer la desaparición de Galíndez, una vez finalizadas las esperanzas de un reaparición sano y salvo del delegado, no avanzaron sin embargo con la rapidez necesaria, a pesar de que las sospechas eran cada vez más fundadas, tal y como reflejaban prestigiosos diarios americanos como el New York Times.59 El final de la Delegación. Lo cierto es que, detrás de este aparente desinterés, latía el inicio del fin de la Delegación vasca. La Guerra Fría había orientado definitivamente la balanza estadounidense del lado del régimen de Franco como un aliado en la lucha contra el bloque soviético y el avance del comunismo, haciendo suya la propaganda que el propio dictador había difundido desde el inicio de la propia Guerra civil. El Gobierno Vasco había pasado de ser un instrumento apetecible, y aún aliado, a ser un problema que podría, si no poner en peligro, sí al menos herir las susceptibilidades de los nuevos aliados españoles. Las bases de Morón, Rota o Zaragoza valían mil veces más que todas las promesas y declaraciones rimbombantes en torno a la democracia y los derechos humanos. La Delegación, con la desaparición de Galíndez, había perdido también la puerta directa con el mundo político estadounidense. La propia Delegación, de hecho, se vio privada de su documentación, al haberse hallado incautada por orden judicial, durante todo el proceso en torno a la desaparición de Galíndez y la disposición de sus bienes. Por disposición de la magistrado Mr. Joseph A. Cox y a instancias del señor Aguirre como presidente del Gobierno Vasco y del señor Oñatibia, como su delegado en Estados Unidos el tribunal testamentario ha ordenado que sean devueltos a la referida delegación los archivos y documentos que en calidad 43 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea de delegado de Euzkadi tenia en su poder el desaparecido profesor, Jesús de Galíndez y consisten en unos cincuenta bultos y diez archivos ficheros. Los efectos personales del profesor Galíndez, que habitaba en el mismo local de la delegación vasca, siguen bajo la custodia del tribunal testamentario.60 La desaparición de Galíndez marcaría, de este modo, el inicio de la decadencia de la Delegación, en gran medida ante la imposibilidad de llevar a cabo los fines para los que había sido creada debido al radical cambio de la política exterior norteamericana en relación a España. El Gobierno Vasco se vio así abandonado por la potencia en la que había puesto sus mayores esperanzas para una pronta recuperación de la legalidad democrática y el ansiado retorno de las instituciones representativas del pueblo vasco. Las razones de la realpolitik, una vez más, se imponían a la fuerza de los ideales. La firma de varios acuerdos de cooperación política, económica y militar entre los gobiernos español y norteamericano, con el espaldarazo de la visita oficial a Madrid del presidente Dwight Eisenhower en abril de 1959, señalaban el inicio de la normalización del régimen de Franco en el contexto de la Europa occidental y el sistema de alianzas de Estados Unidos. La democracia y la libertad política de los españoles, así como el retorno del autogobierno de los vascos, tuvieron aún que posponerse dos décadas. Notas e referências Alexander UGALDE ZUBIRI. "Las relaciones internacionales del nacionalismo vasco (1890-1936) y del primer Gobiero Vasco (1936-1939)", in KEATING, Michael y Francisco ALDECOA (coords.). Paradiplomacia. Las relaciones exteriores de las regiones. Madrid: Marcial Pons, 2001, pp. 183-202. Sobre la formación del entramado de delegaciones del Gobierno Vasco en el exilio, Óscar ÁLVAREZ GILA; Eneko SANZ GOIKOETXEA. "El exilio institucional. El Gobierno autonómico vasco y sus delegaciones en el exterior (1937-1965)". Estudios Migratorios Latinoamericanos, Buenos Aires, 69, 2010, pp. 337-370. 2 Panayotis SOLDATOS. "Cascading subnational paradiplomacy in an interdependent and transnational world". States and Provinces in the International Economy, Berkeley, 1993, pp. 6592. 3"Manuel de Ynchausti nació el 19 de octubre de 1900, en el seno de una acaudalada familia vasca de comerciantes marítimos afincada en Filipinas, cuando la colonia española estaba bajo el mando de los Estados Unidos. Tenía 6 años cuando realizó la primera visita a Europa, y con 20, al fallecer su padre, cursó sus estudios superiores de Derecho en Madrid". En 1926 regresó a Manila tras casarse con la donostiarra Ana Belén Larrauri, pero "con la llegada de los hijos, a partir de 1933, la familia abandona Manila y se establece en San Sebastián hasta la guerra de 1936". Claude LARRONDE. "Manuel de Ynchausti (1900-1961) Un mécène inspiré". Euskonews&Media, nº 14, 1998, disponible en http://www.euskonews.com/0014zbk/frgaia.htm. 1 44 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea Fundación Sabino Arana - Archivo del Nacionalismo Vasco, en lo sucesivo AN; GE-463-2. Carta de José Antonio de Aguirre a José Ignacio Lizaso. París, marzo 5, 1940. Original. ESPAÑA (Bilbao). También Iñaki GOIOGANA; Xabier IRUJO y Josu LEGARRETA. Un nuevo 31. Ideología y estrategia del Gobierno de Euzkadi durante la Segunda Guerra Mundial a través de la correspondencia de José Antonio Aguirre y Manuel de Irujo. Bilbao: Sabino Arana fundazioa, 2008, p. 195. 5 El nombre de "Euzkadi" para referirse al territorio del País Vasco es un neologismo propuesto por el fundador del Partido Nacionalista Vasco, y es de uso común para denominar al primer gobierno autonómico vasco. 6 AN. "Informe de la gestión realizada por la delegación de los Estados Unidos de Norte América desde 19 de agosto de 1938 hasta enero de 1939" (mecanografiada), Nueva York, 1939. 7 Koldo SAN SEBASTIÁN. El exilio vasco en América. 1936/1946 - Acción del Gobierno. San Sebastián: Txertoa, 1988, p. 53. 8 Gloria TOTORICAGUENA. The Basques of New York: A Cosmopolitan Experience.VitoriaGasteiz: Gobierno Vasco, 2003, p. 203. Señala erróneamente que todos los miembros eran igualmente "delegados", lo que no es del todo correcto. 9 Alexander UGALDE ZUBIRI. La actuación internacional del Gobierno Vasco en el exilio (19391960). Programa de Becas Postdoctorales de Perfeccionamiento del Personal Investigador, Universidad del País Vasco, pro manuscripto, 1997. Señala este autor que a su regreso a Estados Unidos en 1942, Irala cumpliría un importante papel en la Delegación. 10 SAN SEBASTIÁN, 1988, p. 50. 11 En el final de la etapa de Ramón de la Sota, su tío señalaba: “Ramón como quiere casarse pronto, se dedica a hacer negocios marítimos. Por eso ya no pertenece mas que nominalmente a esta delegación y apenas se ocupa de ella . Además hace tiempo tiene arreglado su viaje a Cuba, donde va al servicio de nuestros amigos, y donde al mismo tiempo desarrollará sus negocios particulares. Pero todo los días está para irse, y nunca se va. Por lo tanto yo tengo que hacer solito el trabajo de esta Delegación, de lo que no me quejo pues lo hago con gusto. Creo que no podemos pensar en el propio bienestar cuando hay tanto compatriota sufriendo.” Carta de Manuel de la Sota a Manuel de Irujo, en New York, febrero 18, 1941. Original. AN-GE-504-1. 12 UGALDE ZUBIRI, 1997. 13 Carta de Manuel de la Sota a Manuel de Irujo, en New York, Febrero 18, 1941. Original. AN-GE-504-1. 14 Carta de Manuel de la Sota a Manuel de Irujo, en New York, Febrero 18, 1941. Original. AN-GE-504-1. 15 El relato de su escape desde la Europa ocupada por los nazis hasta su reaparición pública en Montevideo, lo publicó en su obra De Gernika a Nueva York pasando por Berlín, reeditada en José Antonio AGUIRRE LECUBE. Obras Completas. San Sebastián: Ed. Sendoa, 1981, 2 tomos. 16 Carta de José Antonio Aguirre a José Ignacio Lizaso y Manuel Irujo. Nueva York, diciembre 3, 1941. Original. AN-GE-465-2. 17 "Viaje del delegado vasco en Estados Unidos"Oficina de Propaganda de Euskadi (en lo 4 45 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea sucesivo OPE), nº 530 París. 3 de Junio 1949, p. 5. LEKUONA ILUNDAIN eta Iñaki GARRIDO YEROBI. Arbolaren erbesteko sustraiak, Euzkadiko lehenengo jaurlaritzako burukideen bizitzak Oñati. IVAP, 2006, p. 146. 19 "Entirerro de Don Valentin de Aguirre". OPE, nº 1439, París, 6 de Febrero 1953, p. 4 20 "El Señor Galíndez, Profesor de la Universidad de Columbia " OPE, nº 1020 París, 18 de Mayo de 1951. En concreto, Galíndez fue encargado de dictar varios cursos que tenían en común la cuestión latinoamericana: "América Latina en la política internacional", "Organización constitucional y partidos políticos en Sud-América", e "Historia de la civilización hispanoamericana". Se hallaba adscrito a los departamentos de Hispanic Studies y Political Science. 21 María Ángeles ORDAZ ROMAY. "El FBI y los vascos del exilio de 1939 en Estados Unidos", en Emigración y Redes Sociales de los Vascos en América. Vitoria: Universidad del País Vasco, 1996. 22 AGUIRRE LEKUBE, cit., II, p. 42. El viaje del Lehendakari por Latinoamérica en 1942 fue organizado por el coronel William Donovan, de la OSS, con una finalidad propagandística pero también para que diera instrucciones precisas a sus delegados para colaborar con la inteligencia norteamericana. "Para concretar esta organización, el secretario general de la Presidencia, Antón de Irala, realizará a su vez una gira por los países que antes había visitado Aguirre" (SAN SEBASTIÁN, 1988, p. 67). 23 María Ángeles ORDAZ ROMAY. "La delegación vasca en Nueva York. Una década bajo el punto de mira del FBI (1938-1947)". Estudios de Historia Social y Económica de América. Alcalá, 12, 1995, pp. 179-198. 24 UGALDE ZUBIRI, 1997. 25 "Las gestiones del presidente Aguirre y la derrota de la enmienda Mc Carran", OPE, París, 8 de Mayo de 1950, p. 3. 26 Koldo SAN SEBASTIÁN (comp.). The Basque Archives. Vascos en Estados Unidos (19381943). Donostia-San Sebastián: Txertoa, 1991, p. 34. 27 "La estancia del Señor Aguirre en Nueva York". OPE, nº 737, París. 3 de Abril 1950, p. 3. 28 "Otras Actividades del delegado Vasco". OPE, nº 1115, París, 9 de Noviembre 1950 p. 4 29 "Una conferencia del Señor Galíndez ". OPE, nº 884, París, 7 Noviembre 1950. 30 "Una conferencia del Señor Galíndez ". OPE, nº 733, París, 28 Marzo 1950, p. 11 31 "Una conferencia del Señor Galíndez " OPE, nº 635, París, 4 Noviembre 1949, p. 4. 32 "Una conferencia del Señor Galíndez " OPE, nº 648, París, 24 Noviembre 1949. También tuvo actuaciones destacadas en el mundo editorial: "Un libro del Galíndez ". OPE, nº 1794, París, 26 de Agosto 1954. "La editorial American Publishing Co. una nueva obra de Jesús Galíndez, en la que el citado profesor desarrolla en 650 páginas uno de sus cursos de la Columbia University. Se trata de un libro de texto para universidades norteamericanas y su titulo es "Iberoamerica: su evolución política, económico social, cultural e internacional." 33 "Actividades de la delegación Vasca en Nueva York". OPE, nº 2002, París, 22 Junio 1955, p. 4. 34 "El Sr. Galíndez, huésped especial de Costa Rica". OPE, nº 1603, París, 30 Octubre 1953, p. 4 18Aitziber 46 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea Procedente de Venezuela, el presidente Aguirre llegó el dia 19 a Nueva York donde le esperaban el delegado del Gobierno Vasco en Nueva York, y el presidente y el secretario y otros compatriotas. Acompañado del delegado, Señor Galíndez, se trasladó a Washinton donde fue recibido en el Departamento de Estado, celebrando varias entrevistas con altos funcionarios del mismo, y siendo obsequiado con una cena por varios elementos oficiales de la capital. El dia 21 regresó el lehendakari Aguirre a Nueva York para tomar allí el avión a París, después de haberse interesado por el proyecto de construir un nuevo centro ("La estancia del Presidente Aguirre en Venezuela". OPE, nº 2118, París, 28 Deciembre 1952, p. 4. 36 "El delegado vasco aporta un testimonio irrefutable". OPE, nº 847. París, 14 de Septembre 1950, p. 3. 37 "En torno al referendum franquista (en New York)". OPE, nº 66, París, 01 de Agosto 1947. 38 María Ángeles ORDAZ ROMAY. "La imagen de España y el régimen de Franco a través de la prensa anglosajona de Estados Unidos en 1950", en Javier TUSELL, ed.; El régimen de Franco, 1936-1975: política y relaciones exteriores. Madrid: UNED, 1993, pp. 415-429. 39 "Unas declaraciones del delegado vasco en Estados Unidos". OPE, nº 882, París, 03 de Noviembre 1950. 40 "Una carta del Gobierno Vasco en Norteamerica". OPE nº 846, París, 13 Septembre 1950. El Delegado vasco también atacaba los intentos de penetración "cultural" del régimen franquista, que usaba giras de destacados artistas como medio de incidir en la propaganda a su favor ("Protesta contra el falangismo filarmonico". OPE, nº 1520, París, 09 Junio 1953). 41 "Una conferencia del Señor Galíndez". OPE, nº 1115, París, 09 de Octubre 1951: "El delegado del Gobierno de Euzkadi en los Estados Unidos ha inaugurado el ciclo de conferencias que anualmente organiza la sociedad española de Nueva York La Nacional. tema de disertación del Señor Galíndez ha sido: “La quinta columna que se bautizó en Madrid”, resultando muy interesante". 42 "Conferencia del Señor Galíndez ". OPE, nº 1650. París, 08 de Enero 1954. 43 "Las gestiones del presidente Aguirre en Washington". OPE, nº 712. París, 27 de Febrero 1950, p. 4. Más aún, en 1952 Jesús de Galíndez fue designado "miembro de la junta directiva de la liga internacional de los derechos del hombre y que preside el señor Roger Baldwin. A la misma, están adheridas numerosas asociaciones nacionales de Europa y América y otros continentes; y las Naciones Unidas han otorgado categoría de entidad no gubernamental con carácter consultivo, lo que le concede derecho de opinar en cuanto atañe a los derechos humanos". 44 "Una conferencia del Sr Galíndez". OPE, nº 668, París, 22 de Noviembre 1949, p. 3 45 "Homenaje a Castelao". OPE, nº 1189, París, 25 de Enero 1952, p. 4: "La Casa de Galicia ha organizado una sesión necrológica en que el profesor Emilio González López ha recordado al dirigente Gallegista. D. Alfonso R. Castelao y el presidente señor López. Se ha adherido al acto el delegado del Gobierno Vasco Pro. Jesús Galíndez y se ha proyectado una película de la estancia del Sr. Castelao en Nueva York". 46 UGALDE ZUBIRI, 1997. 47 "Boda vasca en Nueva York ". OPE, nº 534. París, 10 de Junio 1949. 35 47 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê Paradiplomacia para la propaganda y la esperanza. El Gobierno Vasco en el exilio em nueva York (1940-1955) Óscar Álvarez Gila/Eneko Sanz Goikoetxea "Día de la Patria Vasca", festividad reivindicativa que comenzó a celebrar el nacionalismo vasco en la década de 1930, y que coincidía con el Domingo de Resurrección en el calendario litúrgico católico. 49 "Aberri Eguna en Nueva York". OPE, nº 980, París, 28 de Marzo 1951, p. 3. 50 "Aberri eguna en Nueva York". OPE, nº 994, París, 17 de Abril 1951, p. 4. 51 "El día del Euzkera en Nueva York". OPE, nº 659. París,9 de Diciembre 1949, p. 3. 52 "Muerte de Don Valentin de Aguirre". OPE, nº 1435, París, 02 de Febrero 1953, p. 4. 53 "Homenaje a Oñatibia". OPE, nº 1234. 54 "Vascos en Estados Unidos". OPE, nº 783, París, 13 de Junio 1950, p. 4. 55 "Desaparición de profesor Galíndez". OPE, nº 2178, París, 22 de Marzo 1956, p. 3 56 "La desaparición del Señor Galíndez ". OPE, nº 2180. París, 26 de Marzo 1956. En el número del día siguiente, se señalaba que "Siguen sin dar resultado las investigaciones acerca de la desaparición del Sr. Galíndez delegado vasco en Nueva York, que fue visto por último en la noche del lunes 12, con motivo de su lección habitual en la Columbia University". "La desaparición del Señor Galíndez ". OPE, nº 2181, París, 27 de Marzo 1956. 57 "El New York Times comenta la desaparición del Sr Galíndez". OPE, nº 2184, París 03 de Abril 1956. "...No parece que puedan abrigarse sospechas respecto a la España de Franco a pesar de que el doctor Galíndez es el representante en EEUU del Gobierno Vasco en el exilio. El Doctor Galíndez acababa de presentar su tesis doctoral sobre el régimen de Trujillo en la República Dominicana de la que se había recibido ciertas amenazas de algunos dominicanos es lo que Mr. Norman Thomas y otros induce a apuntar con el dedo a la República Dominicana, de la que sospechan /.../ En nombre de 248 organizaciones cívicas, sociales y fraternales pedimos a su departamento haga todos los esfuerzos necesarios para investigar la desaparición de Jesús de Galíndez, prominente líder cívico y diplomático". 58 "La desaparición del Sr Galíndez". OPE, nº 2188, París, 9 de Abril 1956. 59 "Sobre la desaparicion de Galíndez". OPE, nº 2204, París, 1956. 60 "Devolución de los archivos de la delegación de Euzkadi en Nueva York". OPE, nº 2780. París, 21 de Octubre, 1958. 48 48 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez.2015 Dossiê: E-imigração espanhola e espanhóis na diáspora El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones1 Nadia Andrea De Cristóforis Universidad de Buenos Aíres Resumo: Desde a chegada do Juan D. Perón ao poder (1946), a Argentina incentivou abertamente a imigração de espanhóis. A atração desses refletiu-se na assinatura do Acordo de Migração Franco-Perón de 1948. As condições favoráveis à chegada de espanhóis foram mantidas até o início da década de sessenta, sendo reforçadas nesta última conjuntura, com a assinatura de um novo acordo de migração (Franco-Frondizi, 1960). Se as premissas e as implicações do primeiro acordo têm sido bastante analisadas, as características do segundo ainda não o foram suficientemente. Por esta razão, nos propormos a examinar os princípios orientadores deste último acordo, no contexto das políticas de migração global, apoiadas pelo Estado argentino e espanhol. Serão utilizadas fontes oficiais ou institucionais (registros ou boletins, por exemplo), memórias e obras preparadas por funcionários da época. PALAVRAS-CHAVE: Imigração - Acordos de migração - Políticas de migração. Resumen: A partir de la llegada de Juan D. Perón al poder (1946), la Argentina comenzó a favorecer abiertamente la inmigración de españoles. La atracción de los mismos se plasmó en la firma del Acuerdo de Migración Franco-Perón de 1948. Las políticas proclives a la llegada de peninsulares se mantuvieron hasta comienzos de la década del sesenta, reforzándose incluso en esta última coyuntura, con la firma de un nuevo convenio de migración (el de FrancoFrondizi, de 1960). Si bien las premisas y consecuencias del primer acuerdo han sido bastante analizadas, las características del segundo aún no han sido suficientemente indagadas. De allí que en este artículo nos propongamos examinar los principios rectores de este último convenio, en el contexto de las políticas migratorias más globales, sustentadas por el Estado español y argentino. Para ello, nos basaremos en fuentes oficiales o institucionales (expedientes o boletines, por ejemplo) y en las memorias y obras elaboradas por los funcionarios de la época. PALABRAS CLAVE: Inmigración –Convenios de Migración – Políticas Migratorias. Abstract: Since the arrival of Juan D. Perón to power (1946), Argentina began to openly encourage the immigration of Spaniards. The attraction of these ones was reflected in the signing of the Franco-Perón Migration Agreement of 1948. Policies prone to the arrival of Spanish citizens were kept until the beginning of the 1960´s, becoming even stronger at this time, with the signing of a new migration agreement (Franco-Frondizi, 1960). While the premises and implications of the first agreement have been enough analyzed, the characteristics of the second one have not yet been sufficiently researched. For that reason, in this article we propose to consider the guiding principles of this last agreement, in the context of more general migration policies, supported by the Spanish and Argentine State. Therefore we will draw on official or institutional sources (records or bulletins, for example) and in the memories and works prepared by civil servants of the time. KEYWORDS: Immigration - Migration Agreements - Migration Policies. Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 49-71 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis Introducción Luego de la disminución registrada entre 1936 y 1945, la emigración peninsular hacia el exterior se revitalizó, alcanzando las magnitudes que poseía antes del desencadenamiento de la Guerra Civil. Las principales regiones emigratorias españolas fueron Galicia, Canarias y Cataluña (en orden decreciente). Galicia presentó además la tasa de emigración más elevada, en comparación con el resto de las regiones (Palazón Ferrando, 1995: 294).2 Entre 1946 y 1960 los principales destinos latinoamericanos de estas corrientes fueron Argentina y Venezuela, y los secundarios, Brasil y Uruguay. El primer país absorbió a cuatro de cada diez españoles en la mencionada etapa y el segundo, a tres. Argentina mantuvo el primer lugar como país receptor de la inmigración española dentro de América Latina, tal como había ocurrido en los años previos al inicio de la Guerra Civil. En cambio, Venezuela, que era un destino periférico entonces, cobró un importante protagonismo luego de la Segunda Guerra Mundial, debido al crecimiento económico que experimentó por la exportación de hidrocarburos (Palazón Ferrando, 1995: 303). La emigración española hacia la Argentina creció hasta alcanzar un punto álgido en el año 1950 (ver el Gráfico 1 en el Anexo), para luego declinar progresivamente, aunque con notorios altibajos.3 A lo largo de la década de 1960 el país sudamericano fue perdiendo atractivo como ámbito de destino de las corrientes peninsulares, las cuales comenzaron a reorientarse preponderantemente hacia el Continente Europeo. Desde el punto de vista de la sociedad argentina, la llegada de los inmigrantes españoles tras el fin de la Segunda Guerra Mundial se produjo en un contexto de recuperación progresiva de los flujos europeos en general, que habían disminuido notablemente en la década de 1930.4 Aunque esta reactivación de las corrientes provenientes del Viejo Continente no alcanzó las dimensiones de las del período masivo,5 tuvo una importancia relevante, como parte de la estrategia de desarrollo económico y social puesta en marcha por el primer gobierno de Juan D. Perón (1946-1952). A partir de la llegada del peronismo al poder, la Argentina comenzó a favorecer abiertamente la inmigración de españoles (y también italianos). La atracción de los primeros se sustentó en ideas migratorias específicas y se plasmó en el Acuerdo de Migración Franco-Perón de 1948. Las políticas proclives a la llegada de peninsulares se mantuvieron hasta comienzos de la década del sesenta, reforzándose incluso en esta última coyuntura, con la firma de un nuevo convenio 50 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis de migración (el de Franco-Frondizi, de 1960). Si bien las premisas y consecuencias del primer acuerdo han sido bastante analizadas,6 las características del segundo aún no han sido suficientemente indagadas. De allí que en este artículo nos propongamos examinar los principios rectores de este último convenio, en el contexto de las políticas migratorias más globales, sustentadas por el Estado argentino y español. En este sentido, nos interesará reconocer las semejanzas y novedades planteadas en los dos acuerdos de migración mencionados, deteniéndonos especialmente en la puesta en marcha del segundo, es decir, en sus resultados concretos. Tengamos presente que a fines de la década del cincuenta tanto el Estado peninsular como el argentino promovieron políticas de selección y regulación de las corrientes migratorias, que condujeron a la intervención de numerosos organismos nacionales e internacionales, encargados de encauzar los flujos humanos. Trataremos de evaluar en qué medida dichas ideas se llevaron a la práctica, en el caso de unas corrientes inmigratorias de larga tradición en la Argentina. Para ello, nos basaremos fundamentalmente en documentación oficial, como la que resguarda la Dirección Nacional de Migraciones (Argentina), el Archivo del Ministerio de Asuntos Exteriores y el Archivo General de la Administración (España). También emplearemos fuentes secundarias, como memorias y boletines públicos, o libros y discursos elaborados por funcionarios españoles y argentinos de la época. Las políticas migratorias del franquismo y del peronismo entre 1946 y 1956 En el caso español, la recuperación de las corrientes emigratorias a partir del fin de la Segunda Guerra Mundial, impulsó al gobierno a restablecer la Ley de emigración de 1924. Esta última había prescripto la facultad de todo peninsular de emigrar, asignando al Estado un rol tutelar y fiscalizador sobre los flujos, que involucraba la aplicación de limitaciones y garantías al derecho de emigrar.7 La puesta en vigencia de la citada normativa otorgó al Ministerio de Trabajo la responsabilidad de elaborar una política oficial en materia de emigración, al tiempo que insertó la cuestión de la movilidad espacial humana en el marco de las políticas sociales, alejándola de su vinculación con el control policial de fronteras. A partir de 1946, y en función del accionar de los miembros del Departamento de Emigración del mencionado Ministerio, se fue modelando una imagen negativa del emigrante, como un sujeto ignorante e ingenuo que quedaba expuesto a los abusos y explotación de los reclutadores (ganchos) o de las compañías navieras y aeronáuticas.8 Hasta su aspecto físico formaba parte de esa concepción pesimista. Según el Director del Departamento de Emigración del Ministerio de Trabajo, 51 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis Mariano González-Rothvoss y Gil: “La simple presencia física de los emigrantes, su magro equipaje, su rusticidad y a veces hasta su compostura y aseo personal, denuncian al que emigra …”9 En vistas del elevado grado de vulnerabilidad que parecían presentar los que deseaban partir del país, el Estado español se veía obligado a intervenir en los procesos emigratorios. Esta intervención estaba encaminada a proteger y asistir a los que abandonaban el territorio nacional y debía comenzar en el momento previo al embarque, extendiéndose hasta el posible retorno de los expatriados. El dirigismo estatal debía orientarse a planificar, seleccionar y canalizar el flujo peninsular, conforme a las necesidades del país.10 En este sentido, el Estado español debía condicionar la composición de las corrientes, privilegiando la salida de los desempleados, para descomprimir las presiones que existían sobre el mercado laboral, en un contexto de implementación de políticas autárquicas que no satisfacían los requerimientos de empleo de la población local. Además, las salidas selectivas se justificaban por las estrechas relaciones culturales e históricas que habían unido a España con los países latinoamericanos y por el imperativo de seguir perpetuando la presencia hispánica en esos territorios unidos por vínculos de “sangre”. El problema que se generaba era cómo compatibilizar las necesidades de los potenciales países de destino (como los latinoamericanos), que demandaban técnicos y mano de obra especializada, con las del mercado laboral de España, que justamente necesitaba ese tipo de trabajadores. Ello generaba tensiones, como las desatadas cuando los consulados uruguayos en Bilbao y Gijón abrieron una lista de inscripción de obreros de la construcción, metalúrgicos y mineros, tarea que tuvo que ser suspendida, por no estar autorizada por las autoridades españolas.11 En opinión de González-Rothvoss y Gil, nadie podía objetar “la licitud de poner limitaciones al derecho a emigrar de algunos obreros o técnicos especializados si ello puede producir la paralización de una industria, con el consiguiente paro de multitud de trabajadores no especializados”.12 En pocas palabras, en estos primeros años de la posguerra las políticas migratorias españolas eran ambiguas: si por un lado buscaban canalizar la emigración hacia el exterior, por otro, intentaban restringir la salida de la mano de obra más capacitada. Estas ambivalencias quedaron reflejadas en el Convenio de Emigración suscripto con el gobierno argentino en octubre de 1948. Por una parte, en el artículo 1º se autorizaba la libre emigración de españoles a la Argentina (y la consecuente libertad de inmigración para los peninsulares, en el país austral), pero por otra parte, en el artículo 5º se otorgaban amplias facultades al gobierno español para decidir sobre 52 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis la salida o no de las personas y en caso de autorizárseles la partida, se establecía la obligación, por parte de las autoridades argentinas, de aceptar su ingreso en el país: Art. 5: Cuanto se refiere a las pruebas de competencia profesional, estado sanitario o cualquiera otra que los Gobiernos español y argentino consideren de importancia, será resuelta en España antes que el emigrante abandone el territorio. Una vez autorizada la emigración de una persona, familia o grupo, no podrá ser rechazada su entrada al territorio de la República Argentina por cualquiera de las causas anteriormente apuntadas.13 En teoría, el Estado español era entonces el encargado de regular las corrientes hacia el exterior y seleccionar sus componentes. Esta tendencia fiscalizadora del Estado se mantuvo en los años siguientes,14 con el matiz de que la concepción negativa del emigrante y de la emigración fue cambiando hasta adquirir connotaciones positivas. Desde el punto de vista de las políticas inmigratorias peronistas, y en lo atinente a la procedencia étnica de los recién llegados, los grupos privilegiados fueron los españoles e italianos. De allí que en 1946 las dos únicas sedes de la Delegación Argentina de Inmigración en Europa se instalaran en Italia y España. Los españoles en particular no sólo eran bien ponderados por sus creencias católicas, su afinidad idiomática y su proximidad cultural, sino también, por su importancia originaria en la “formación del tipo humano argentino”, por haber sido “tronco del linaje de la familia argentina”.15 En palabras de Santiago Peralta, Director de Inmigración y del Instituto Étnico Nacional: la inmigración española no podía “ser clasificada como extraña, sino como propia, como cosa interna, sangre del mismo cuerpo”.16 Tomando en consideración el conjunto de la inmigración europea arribada a la Argentina en la segunda posguerra, resulta fácil advertir que los italianos constituyeron el principal grupo inmigratorio, seguido por los españoles.17 Pero el protagonismo de estas corrientes mediterráneas no respondió necesariamente a las políticas migratorias del peronismo, sino a un conjunto variado de motivaciones, entre las que se encontraban la tradicional afinidad entre Italia, España y la Argentina, como países expulsores y receptor de inmigración, respectivamente; o la presencia de familiares y paisanos de las dos primeras naciones, en el Río de la Plata, capaces de alentar y favorecer el traslado transoceánico de sus congéneres, entre las más importantes. Las innovaciones en las políticas migratorias españolas entre 1956 y 1965 A partir de la liberalización económica del régimen franquista, que se fue produciendo a lo largo de la década del cincuenta, empezó a cobrar fuerza la idea de que la emigración podía contribuir al desarrollo económico, no sólo 53 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis amortiguando los efectos más negativos de los planes de estabilización (en especial, las elevadas tasas de desempleo), sino también estimulando el crecimiento, a través de la llegada de remesas, que significaban un importante aporte de divisas para la economía española.18 En esta coyuntura donde existía un importante consenso para fortalecer el papel del Estado en la canalización de la emigración española hacia el exterior, en función de objetivos de desarrollo más generales, algunos sectores del ala más liberal y modernizadora del régimen franquista y la Iglesia promovieron el surgimiento de un organismo estatal encargado de asumir el conjunto de competencias en materia de emigración, por fuera de la férula del Ministerio de Trabajo (al menos inicialmente). Por Ley de 17 de julio de 1956 fue creado el Instituto Español de Emigración (IEE), que finalmente fue adscripto al Ministerio de Trabajo, a partir del 9 de mayo de 1958. Según lo establecido por la Ley de 1956, el IEE tenía la finalidad de realizar la política emigratoria del gobierno, promoviendo en cada momento las medidas necesarias y una acción tutelar en beneficio de los españoles que decidieran migrar. En este sentido, el IEE debía ocuparse de estudiar los problemas ligados a la emigración, asesorar al gobierno sobre las disposiciones a adoptarse en la materia, organizar los flujos colectivos y las repatriaciones, facilitar a los emigrantes la obtención de medios económicos e instrumentos de trabajo, intervenir en la contratación de pasajes, proporcionar gratuitamente la documentación necesaria para el traslado y asistir a los migrantes en su lugar de destino.19 El IEE contaba con dos entidades colaboradoras para el desarrollo y ejecución de planes y programas migratorios: la Organización Sindical, en lo que se vinculaba a los emigrantes temporales y fronterizos, y la Comisión Católica Española de Migración (CCEM), en lo atinente a los procesos de reagrupación familiar. Estos últimos habían concitado la atención del gobierno desde tiempo atrás, cuando eran percibidos como el mejor mecanismo para estimular los flujos de españoles hacia el exterior. En efecto, ya desde 1948, momento en que se discutían las condiciones para la firma del Convenio de Emigración con la Argentina, surgieron dentro de las órbitas oficiales argumentos a favor de una emigración basada en el “llamado” de un emigrante establecido en ultramar, al resto de su familia o a sus paisanos. Las razones que se esgrimían en ese entonces para favorecer este tipo de corriente eran varias: el hecho de que los emigrantes trasladados en virtud de un llamado gozarían de libertad y de mejores informaciones para buscar un trabajo, dentro de la sociedad de destino (evitando caer en manos de empleadores especuladores, como los que podían actuar en el caso de la emigración contratada); la asistencia y ayuda que podían ofrecer los ya establecidos en ultramar, al recién llegado (favoreciendo 54 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis una integración no traumática al ámbito de acogida); o el beneficio que supondría para el Estado español no tener que correr con los gastos de posibles repatriaciones, en la medida en que aquel que se desplazaba por el llamado de un pariente o conocido podía encontrar en estos últimos redes de contención para su inserción en la nueva sociedad.20 Los programas de reagrupación familiar puestos en marcha por el IEE tenían como finalidad declarada atender a imperativos económicos, morales, penales, de orden público y financiero. Se sostenía que el alejamiento del cabeza de familia de la tierra de origen, aún sobre la base de que el mismo enviara periódicamente remesas, repercutía en el equilibrio del presupuesto de la familia que quedaba en la península. Desde un punto de vista moral, se argumentaba que la separación relajaba los vínculos familiares, siendo frecuente el hecho de que los hombres solos en sus ámbitos de emigración contrajeran lazos ilegítimos, relegando u olvidando a su progenie y esposa legítimas. También se creía que la desarticulación de la familia generaba problemas penales (prostitución, corrupción, criminalidad), de orden público (perturbación de la tranquilidad y difusión de doctrinas antisociales) y financieros (incremento de los gastos públicos en policía, beneficencia y prisiones).21 Además, a mediados de la década de 1950 la preocupación del gobierno por las repatriaciones de quienes habían partido solos había crecido, desde el momento en que una ley del 18 de julio de 1956 responsabilizó al Estado español de la repatriación de los emigrantes que así lo demandaban, con el único requisito de que estos últimos demostraran que no poseían medios económicos para financiarse el viaje por sí mismos.22 Los planes de reagrupación familiar estuvieron encaminados a revitalizar las corrientes humanas hacia Francia y hacia distintos países americanos. El programa relacionado con estos últimos logró un amplio alcance y se institucionalizó por un acuerdo entre el IEE y el Comité Intergubernamental para las Migraciones Europeas (CIME),23 en 1956. Contó desde sus inicios con la colaboración de la CCEM, que a través de sus Delegaciones Diocesanas, quedó a cargo de localizar a las personas reclamadas, informarlas y orientarlas hasta el momento de su embarque. El espacio de acción privilegiado por la Iglesia, para llevar adelante estas tareas, fue la parroquia: en ella reclutaba a sus asistentes (en general, mujeres que ayudaban en la búsqueda de las personas reclamadas) y difundía su pastoral sobre la emigración. Para la puesta en marcha del Programa de Reagrupación Familiar, la CCEM dispuso de sesenta y cuatro oficinas diocesanas, tres provinciales, ocho de asistencia en puertos de embarque y una Oficina Central en Madrid, todos ellas 55 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis destinadas a preparar social y moralmente al emigrante que deseaba partir.24 Además, unas 20.000 parroquias españolas prestaron su colaboración. Los curas párrocos fueron importantes en el desempeño de diversas tareas: la solución de problemas en la documentación necesaria para que el reclamado pudiera partir, la organización de la colecta anual que se llevaba a cabo en ocasión del “Día del Emigrante” o la información y asesoramiento a los potenciales migrantes, entre otras. También actuaron como intermediarios entre estos últimos y sus familiares en ultramar. En efecto, como afirmó María Emelina Martín Acosta, muchas veces las esposas de los emigrantes que se encontraban en situación crítica en su tierra natal, por la falta de recursos económicos, acudían al párroco, pidiéndole ayuda para localizar a su marido en ultramar. El cura escribía entonces a la oficina de la Comisión Episcopal de Madrid, informando del domicilio presuntivo del emigrado. En la Comisión consultaban las listas de los párrocos de las Diócesis americanas y enviaban una carta a aquel religioso que supuestamente estaba próximo al emigrado, con el fin de que lo visitara y lo convenciera de la necesidad de reagruparse con los suyos.25 Sin embargo, y más allá de cómo se gestara el ‘llamado’, el Programa de Reagrupación Familiar suponía la sucesión de algunos pasos formales: el emigrante instalado en América reclamaba a su/s pariente/s en el Consulado español correspondiente (de manera espontánea o impulsado por el cura de su parroquia de procedencia y/o resto de su familia, como acabamos de señalar). El Ministerio de Asuntos Exteriores de Madrid entregaba las cartas de llamada recibidas a la Oficina Central de la CCEM. Esta última trataba de conectarse con los reclamados, a través de las Delegaciones diocesanas y las parroquias. El IEE, la Dirección General de Seguridad y las representaciones diplomáticas de los países americanos en España debían colaborar con la tramitación de la documentación, en especial, cuando la obtención de esta última se tornaba compleja, en el caso de las mujeres solas o con menores, que se trasladaban por el llamado de sus maridos, padres u otros parientes. Una vez preparados para la partida, los reclamados debían ser conducidos al puerto, recibiendo la adecuada asistencia en lo referente al hospedaje y a los últimos trámites antes del inicio del viaje. Las listas de los embarcados eran enviadas por avión al puerto de destino, donde las Comisiones Católicas de Inmigración o los capellanes de emigrantes estaban responsabilizados de conducir a los recién llegados junto a sus familiares o conocidos, con el objeto de favorecer su adaptación dentro de la nueva sociedad.26 Desde 1956 y hasta 1965 la CCEM colaboró con el reagrupamiento familiar de unos 67.498 españoles, que se dirigieron a los diferentes países americanos beneficiados con el programa (Venezuela, Brasil, Argentina, Uruguay, Colombia, 56 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis Chile y Paraguay),27 según las cantidades consignadas en el Cuadro 1 del Anexo. Como queda de manifiesto en este último, los destinos que recibieron más migrantes del Plan de Reagrupación Familiar, a lo largo de casi una década, fueron Venezuela y Brasil.28 Ahora bien, resulta interesante señalar que los balances realizados en los primeros años de este programa indicaron que la Argentina fue inicialmente el principal espacio receptor de los embarcados (ver el Cuadro 2 del Anexo) lo que podría ser la expresión de un fenómeno de reagrupación familiar que contó en una primera etapa con un gran desarrollo en relación con el país sudamericano, para luego fortalecerse en naciones como Venezuela y Brasil, al compás de las variables condiciones económicas, sociales y políticas prevalecientes en cada una de ellas. Hacia fines de la década del cincuenta, cuando la emigración española hacia el Continente Europeo había iniciado su expansión, el IEE tenía sólidas razones para estimular dichas corrientes: por un lado, el espontaneismo que había caracterizado las migraciones ultramarinas parecía obstaculizar la puesta en marcha de una política franquista interesada en planificar y regular los flujos. El “llamado’ de algún familiar o paisano seguía siendo el principal mecanismo de desplazamiento hacia los países americanos y ello contrastaba con las lógicas más impersonales y gubernamentales que primaban en los flujos que se dirigían al Viejo Continente, facilitando el control estatal sobre los mismos. Por otro lado, la emigración ultramarina venía atrayendo a emigrantes de una zona geográfica bastante restringida: la fachada atlántica (en especial, la región gallega), mientras que la emigración continental afectaba más indistintamente a todas las regiones y provincias de España, incluyendo a Andalucía o Extremadura, donde las salidas de personas podían descomprimir el problema del desempleo y las tensiones sociales. Por último, la emigración americana presentaba un carácter más “permanente” que la continental, siendo esta última de índole más “temporaria”. El primer rasgo no era valorado positivamente por el gobierno franquista, dado que en la medida que el emigrante se establecía definitivamente del otro lado del Océano Atlántico, tendía a reducir o paralizar el envío de remesas a la península, las que constituían una fuente de ingreso muy importante para la economía española.29 Sin embargo, y más allá de la creciente tendencia del IEE a favorecer el flujo continental, algunas motivaciones de índole histórica e ideológica lo condujeron a no desatender sus políticas migratorias con respecto a ultramar. Como han puesto de relieve María José Fernández Vicente y Axel Kreienbrink,30 la ‘vocación americana’ de España implicaba tener en consideración las necesidades de las “Repúblicas hermanas de América”. En virtud de esta premisa, el régimen franquista debía enviar al Continente Americano trabajadores calificados, para 57 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis contribuir al desarrollo de la región, garantizar su presencia dentro de la misma, dinamizar y rejuvenecer la colonia peninsular allí instalada y consolidar un mercado exportador que acusaba síntomas de debilidad. La renovada preocupación por los destinos emigratorios ultramarinos condujo a la organización del II Congreso de la Emigración Española a Ultramar, que tuvo lugar entre el 3 y 12 de octubre de 1959 en distintas ciudades de Galicia. Contando con el patrocinio del IEE y del Instituto de Cultura Hispánica, este evento se llevó a cabo en vistas de conmemorar los cincuenta años de la realización del I Congreso de la Emigración Española a Ultramar, que se celebró en Santiago de Compostela en septiembre de 1909. En el II Congreso mencionado las ponencias oficiales trataron los siguientes temas: las causas y efectos de la emigración, las ventajas e inconvenientes de la misma, la preparación y orientación del emigrante, los Tratados de Emigración, la vinculación del emigrado con España, la seguridad social del emigrante y el caso de las corrientes gallegas en particular.31 El principio que inspiraba las discusiones, y que quedó plasmado en las exposiciones, era que la emigración constituía un derecho humano, que debía ejercerse libremente, pero bajo la férula del Estado, que debía brindar al emigrante información y medios para trasladarse e insertarse en la sociedad de acogida. A ello se agregaba una segunda presunción: debía evitarse por todos los medios que la emigración tuviera como causa la necesidad, mejorando las condiciones de vida de los habitantes de la península. En esta dirección, una vez más el Estado español debía responsabilizarse de llevar a cabo una política tendiente a elevar el nivel de vida de sus ciudadanos, contribuyendo a evitar las salidas de las personas forzadas por la pobreza.32 En la ponencia sobre los Tratados de Emigración, presentada por el Sr. Gaspar Gómez de la Serna y Scardovi, se advertía que las migraciones que se producían a mediados del siglo XX eran diferentes de las que habían tenido lugar en el tránsito del siglo XIX al XX. Según el orador, las circunstancias de los nuevos tiempos exigían acuerdos de emigración entre los Estados emisores y receptores de las corrientes, que fueran capaces de canalizar, ordenar y tutelar los movimientos migratorios. Esos Tratados de Emigración debían complementarse con Convenios de Seguridad Social y con Tratados de doble nacionalidad (en el caso de la emigración hacia Latinoamérica) para garantizar los derechos laborales y políticos de los emigrantes. Estas conclusiones preconizaban la celebración de nuevos Tratados de Emigración con Brasil, Chile, Paraguay, Uruguay y Venezuela, al tiempo que impulsaban la revisión del antiguo Convenio Hispano Argentino sobre Emigración de 1948, al que ya aludimos anteriormente.33 58 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis Las recomendaciones del II Congreso de la Emigración Española a Ultramar fueron recogidas en una nueva Ley migratoria española (la 93/1960, del 22 de diciembre, aprobada por el decreto 1000/1962, de 3 de mayo). En los considerandos de esta normativa se afirmaba que a partir de la creación del IEE se había iniciado una nueva orientación en la política emigratoria española. Anteriormente, las salidas de personas eran concebidas como un fenómeno con efectos meramente negativos para el país de origen. Estas consecuencias no deseadas debían ser paliadas “adoptando medidas precautorias y mediante una cierta protección benéfica de angostos límites y concretada a favor del emigrante en los momentos de salida y de posible retorno”.34 En cambio, a partir de mediados de la década de 1950, la emigración había pasado a ser un … amplio campo de posibilidades abiertas ante la libertad del individuo y al propio tiempo, una fuente poderosa de vínculos y relaciones entre pueblos que puede proporcionar resultados beneficiosos /…/ no sólo al que emigra y a sus familiares, sino en a los países de origen como de establecimiento. 35 Estas mutaciones en el fenómeno migratorio y en sus interpretaciones eran clarificadas ampliamente por el Ministro de Trabajo, D. Fermín Sanz-Orrio, en su discurso de presentación de la Ley 93/1960, ante las Cortes Españolas: En época anterior la emigración no traspasaba la esfera de preocupaciones privadas. Siempre que se cumpliesen determinadas garantías de orden público y sanitario, los gobiernos se limitaban a vigilar éstas y a otorgar una limitada protección a los emigrantes necesitados. Hoy los Estados no pueden adoptar una actitud negativa; han de cuidar la situación y los movimientos de sus estructuras demográficas a través de una compleja acción en la que participan organismos tanto internacionales como nacionales, siguiendo orientaciones y normas de uno y otro ámbito, basadas en la defensa de la dignidad y libertad humanas y en la cooperación de los países en la tarea de procurar la mejor distribución de las poblaciones en consonancia con los recursos disponibles al objeto de lograr el pleno empleo de la fuerza laboral y la elevación del nivel general de vida.36 Tal como se había puesto de manifiesto en el ‘II Congreso de la Emigración Española a ultramar’, en la Ley 93/1960 se sostenía que la emigración era un derecho humano, “sin más limitaciones que las establecidas en las leyes y las derivadas de la protección al emigrante y de las altas conveniencias del interés nacional”.37 Frente al hecho emigratorio, la acción del Estado resultaba indeclinable, no sólo desde el punto de vista de la asistencia de las personas que debían ser amparadas espiritual y materialmente, sino también, desde una perspectiva más global, 59 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis garantizando la correcta planificación de las salidas. La protección del emigrante por parte del Estado se jalonaba en diferentes etapas: debía iniciarse con su correcta información sobre las condiciones del viaje, la gestión de la documentación necesaria para su traslado y el otorgamiento de posibles créditos; debía continuarse durante el viaje del emigrante, especialmente, mediante la intervención oficial en la contratación del transporte; y tenía que prolongarse en el país de acogida, mediante el accionar de las Representaciones diplomáticas y consulares de España en el exterior, compuestas por funcionarios especializados, las Agregadurías Laborales y las asociaciones de emigrantes.38 La intervención estatal en el proceso migratorio era competencia exclusiva del Ministerio de Trabajo, quien debía realizar su política a través del IEE. Este último regularía las corrientes hacia el exterior mediante Convenios o Tratados con los países de recepción,39 tal como se había anunciado en el “II Congreso de la Emigración Española a Ultramar”. Además, se debía privilegiar el sistema de operaciones emigratorias asistidas por el Estado, en detrimento de los flujos espontáneos, que si bien no se descartaban, quedaban en un segundo plano.40 La regulación de las corrientes peninsulares hacia la Argentina luego de mediados de la década de 1950 Ahora bien, en el contexto de las ideas y normativas migratorias españolas que reseñamos en el apartado anterior, ¿cuál era la situación concreta de las corrientes que se dirigían hacia la Argentina? ¿Cómo se venían desarrollando? ¿Cuáles eran los problemas más acuciantes en relación con las mismas, en especial, en lo vinculado con su integración en la sociedad sudamericana? Los informes de inmigración española, del Embajador y del Cónsul General de España en Buenos Aires, dirigidos al Ministro de Asuntos Exteriores en Madrid, dan cuenta de las condiciones de las corrientes peninsulares a fines de la década de 1950. En ellos se advertía sobre el progresivo deterioro de la economía argentina, debido a los procesos inflacionarios y el aumento del costo de vida. Por ello se consideraba adecuado no fomentar indiscriminadamente la inmigración española en la Argentina, sino tan solo la colocación de posibles excedentes de mano de obra especializada.41 Ello coincidía con el criterio defendido desde la Dirección Nacional de Migraciones, de alentar la llegada de inmigrantes con determinadas profesiones y oficios, que hallarían inserción dentro de las industrias que se buscaban desarrollar dentro del país (en especial, la de tipo pesada).42 Según el Cónsul General de Buenos Aires, Miguel de Lojendio, pese a la situación económica crítica general, en Argentina existía una demanda insatisfecha de trabajadores capacitados y además, el personal semicalificado de los países 60 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis europeos o de España podría pasar por mano de obra especializada en la nación sudamericana, dada las condiciones del mercado de trabajo local.43 En cuanto a los mecanismos de traslado, el Embajador de España, José María Alfaro, afirmaba que la mayor parte de los inmigrantes españoles llegaban a la Argentina mediante la carta de llamada de un familiar ya radicado, realizándose la casi totalidad de estas reclamaciones a través de la Oficina del CIME en Buenos Aires.44 En opinión de este funcionario, este sistema reportaba indudables ventajas al … reducir el importe del pasaje a costear por el propio emigrante, sin que ello suponga cargo para el Tesoro, ya que la aportación del Estado se costea con bonos de emigración. Asimismo, se asegura el llamado medios de subsistencia suficientes”.45 En función de lo antedicho, el Cónsul General en Buenos Aires subrayaba que este tipo de inmigración individual y mediante llamada del peninsular ya asentado, era la más indicada, no siendo recomendable el sistema de grupos colectivos de emigrantes, por razones de costo (no se podría esperar colaboración financiera por parte del Estado argentino en la coyuntura económica adversa imperante) y por los riesgos concomitantes (el peligro de que una gran mayoría del grupo inmigratorio estuviese conformado por personas con el único propósito de realizar el viaje a la Argentina en condiciones más favorables, sin atenerse cabalmente a la normativa y políticas migratorias vigentes).46 Hacia fines de 1956, un funcionario de la Embajada de España en Buenos Aires, que suscribía sólo como “Manolo’, había advertido al Ministerio de Asuntos Exteriores de Madrid, en una nota confidencial y secreta, sobre los aspectos y derivaciones negativas de las inmigraciones en grupo de peninsulares: Aunque no es necesario que te lo diga puesto que tu sabes más que yo en estas cosas, no te he de ocultar que las inmigraciones en grupo, tipo colonización agrícola, suelen ser algo peligrosas y que últimamente hemos “padecido” algún caso análogo aunque no en este país. Y me escama el proyecto de granja piloto en las cercanías de La Plata, pues si bien es una zona donde se pueden cultivar verduras con un mercado cercano, existen los restos de otra que en su tiempo se llamó Garibaldi y donde metieron a unas familias italianas que abandonaron aquellos territorios y dejaron simplemente la estatua de Garibaldi.47 Los preceptos plasmados en el Convenio de Migración Franco-Frondizi, suscripto el 8 de julio de 1960 entre España y Argentina, en parte se ajustaron y en parte se alejaron de las recomendaciones emanadas de los representantes del gobierno 61 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis peninsular en el país sudamericano, antes señaladas.48 Por un lado, las partes contratantes convenían en favorecer el establecimiento de técnicos y titulados españoles en la Argentina, es decir, trabajadores calificados, tal como había sostenido el Cónsul General de España en Buenos Aires.49 Pero por otra parte, los mecanismos de traslado propiciados incluían variadas formas (no sólo la inmigración por carta de llamada y a través del CIME) y además, se enfatizaba la necesidad de fomentar la emigración planificada y asistida. Según el art. 8, del capítulo 1, del Título II: La emigración de españoles a la República Argentina podrá efectuarse por cualquiera de los siguientes procedimientos: 1. Iniciativa espontánea, 2. Carta de llamada de residentes en territorio argentino, formulada bien directamente o bajo la asistencia de un Organismo nacional o internacional, 3. Contrato de trabajo individual y directo, 4. Programas colectivos de Sociedades o Asociaciones de españoles residentes en la Argentina, aprobados por los Organismos competentes de emigración de las dos Altas Partes contratantes, 5. Operaciones colectivas concertadas directamente entre los Organismos de emigración competentes de las dos Altas Partes contratantes. 50 Como vemos, los programas y operaciones colectivos, que no eran bien ponderados por los representantes del gobierno español en la Argentina, en este convenio eran tomados en consideración, bajo el supuesto de que posteriormente, un Acuerdo Administrativo complementario determinaría “los detalles de aplicación relativos al procedimiento de la emigración espontánea, por cartas de llamada, por contratos de trabajo y por operaciones colectivas organizadas”.51 En líneas generales, el Convenio de Emigración entre España y Argentina implicaba el compromiso de ambos gobiernos de “permitir y facilitar la emigración y establecimiento de los súbditos españoles que deseen instalarse en el territorio argentino, al objeto de ocupar en él un empleo o para reunirse con sus familiares residentes en dicho país”.52 A los emigrantes españoles debían concedérseles en el país sudamericano los mismos derechos sociales que a los nativos y todos aquellos privilegios y derechos que pudieran gozar otros grupos de extranjeros.53 Además, se establecía que los organismos competentes en materia administrativa migratoria serían la Dirección Nacional de Migraciones (por el lado argentino) y el IEE (por el lado español).54 ¿Qué efectos produjo la firma de este acuerdo Franco-Frondizi en las prácticas migratorias concretas de los peninsulares que se dirigían hacia la Argentina? Por un lado, provocó algunas consecuencias políticas no deseadas por las autoridades 62 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis españolas; pero por otra parte, varias fuentes revelan que en realidad, su impacto sobre la conformación de los flujos fue bastante relativa o secundaria, tal como había ocurrido con el convenio de migración hispano-argentino de 1948. En relación con el influjo político no buscado, podía ocurrir que el convenio en cuestión terminara favoreciendo el traslado de sujetos no adeptos al franquismo, que difundieran ideas contrarias al régimen dentro de la Argentina. Así sucedió en el caso del primer emigrante que se desplazó en el marco del citado acuerdo, quien al llegar a Buenos Aires en el vapor Yapeyú realizó unas declaraciones críticas con respecto a la situación de España. Al ser entrevistado por los periodistas del diario La Razón, que se publicaba en la ciudad porteña, ese primer emigrante, llamado Félix Pascual Herraiz, afirmó que había resuelto migrar a Sudamérica por la “desocupación y miseria que hay en España”. Además de reconocerse como “antifalangista”, comentaba que la clase media de su país vivía en una situación difícil y la clase baja, en condiciones aún peores.55 Una vez difundidas estas declaraciones, el Embajador de España en Buenos Aires, José María Alfaro, instó al Cónsul General en dicha ciudad a que se pusiera en contacto con Herraiz, con el fin de que este último se retractara de las opiniones vertidas. El caso debió alarmar al Embajador, quien solicitó a los funcionarios encargados de la selección de los migrantes acogidos al acuerdo, que tuvieran especial cuidado en dicho proceso: … lo ocurrido hace resaltar la extrema conveniencia de que los beneficiarios del reciente Convenio de Migración Hispano-Argentino, y principalmente los que integren las primeras expediciones, reúnan condiciones sobresalientes de todo orden, que les hagan trasladarse a este país, no con el propósito de unirse a los elementos hostiles que no escasean, sino con el limpio deseo de acogerse a unas posibilidades que el Gobierno español ha negociado en su favor.56 Ahora bien, más allá de este llamativo incidente, veamos cuáles fueron los alcances concretos del acuerdo, en lo vinculado al arribo de los inmigrantes españoles a la Argentina. A un nivel cuantitativo, el Gráfico 1 demuestra que las corrientes peninsulares con dirección al país sudamericano crecieron levemente a partir de 1960 y hasta 1962, pero luego iniciaron un movimiento de descenso y estancamiento. Creemos que este comportamiento observable a partir de la suscripción del convenio migratorio no respondió tanto a la implementación del mismo, sino a una tendencia de más largo plazo puesta de manifiesto por estos flujos desde 1950: una declinación progresiva, con altibajos. Por otra parte, el Cónsul General de España en Buenos Aires ponía de relieve en 1961 el hecho de que la inmigración peninsular llegaba ‘con cuentagotas’ al Río de la Plata, mientras que la de otras procedencias europeas arribaba sin limitaciones 63 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis algunas. En su percepción, el emigrante español quería trasladarse a la Argentina, sin embargo, las corrientes peninsulares se dirigían mayoritariamente a Australia y Brasil. ¿Cuál era el motivo de esta predilección? Según sus averiguaciones, la disminución de los flujos españoles se debía a las dificultades que oponían los funcionarios argentinos de emigración radicados en España, quienes parecían interpretar erróneamente las reglamentaciones vigentes. Mientras que la tramitación de un permiso para ir a Australia o Brasil tardaba quince días o un mes, en el caso de la Argentina, demoraba alrededor de seis meses. Asimismo, en relación con el destino sudamericano se exigían requisitos onerosos y de difícil obtención, como la certificación de salud de todos los parientes de los emigrantes.57 Además de estos obstáculos burocrático-administrativos, otro factor de gran peso terminaba desalentando los desplazamientos hacia el país austral: el deterioro irrefrenable y evidente de su economía. Según el Cónsul de España en Rosario: “se repite con alguna frecuencia el caso de españoles que al llegar aquí se encuentran con una realidad económica que en modo alguno corresponde al cuadro que se les había descripto”.58 La depresión económica sumada al proceso inflacionario restringía el poder adquisitivo salarial, afectando a nativos y extranjeros. Por ello, el funcionario peninsular instalado en Rosario aconsejaba que sus congéneres fueran bien informados sobre la situación local sudamericana, antes de partir de su tierra natal. Además, planteaba la necesidad de que se exigiera una mayor solvencia económica y moral a los “llamantes”, para evitar que los emigrantes reclamados se enfrentaran con graves problemas de subsistencia al llegar al país austral. La degradación de las condiciones materiales también era remarcada por el Agregado Laboral en Buenos Aires, quien en un informe elevado a las autoridades españolas, en febrero de 1973, llegaba a sostener que para la realización de una nueva política de fomento de una emigración cualificada y selecta, había que aguardar una coyuntura económico-política más favorable.59 Reflexiones finales Como es sabido, tras el fin de la Segunda Guerra Mundial el régimen franquista atravesó una etapa de fuerte aislamiento internacional, que se acompañó de una importante debilidad en su legitimidad interna y externa. En dicha coyuntura, la Argentina fue uno de los pocos países que mantuvo y consolidó sus vínculos bilaterales con España, lo que se tradujo en el fomento del intercambio mutuo de mercancías y personas. En efecto, la emigración peninsular hacia el país austral fue estimulada por ambos Estados, hecho que quedó plasmado en la suscripción de un acuerdo de migración en el año 1948. Los dos gobiernos estaban dispuestos a 64 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis intervenir en los procesos migratorios, canalizando y controlando las corrientes, en la convicción de que la etapa de los desplazamientos libres y desregulados había concluido. Además, tanto el franquismo como el peronismo se habían comprometido con políticas selectivas de los componentes de dichas corrientes, en función de las necesidades de sus respectivos mercados laborales. Ello generaba en primera instancia algunas contradicciones, pues el país sudamericano demandaba, además de la ya tradicional figura del agricultor-colono, a los técnicos y trabajadores cualificados que requería una estructura productiva más diversificada y orientada a profundizar la industrialización, mientras que España no podía permitirse perder estos recursos humanos de manera indiscriminada. A mediados de la década del cincuenta el Estado español delegó en el recién creado IEE la responsabilidad de gestionar las políticas migratorias y ello ocasionó un mayor grado de planificación en las emigraciones hacia el exterior. Una de las primeras medidas que adoptó el IEE, y que logró amplios resultados, fue el estímulo a los procesos de reagrupación familiar en ultramar. Contó para ello con la colaboración de otras instituciones abocadas a los problemas migratorios (el CIME o la CCEM) y con la fortaleza y eficiencia de las redes personales, que impulsaban ya por sí mismas, y de manera espontánea y tradicional, los eslabonamientos humanos. La suscripción de un segundo convenio de migración entre el gobierno de Franco y el de Frondizi estaba destinada a inaugurar un nuevo ciclo de la inmigración española en la Argentina. Sin embargo, las condiciones en el país sudamericano ya no propiciaban el desarrollo de estas corrientes. A los históricos obstáculos administrativos, generados por las burocracias argentinas encargadas de controlar el desenvolvimiento de los flujos, de ambos lados del Océano Atlántico, se sumaba la realidad de una economía caracterizada por una creciente estanflación, que afectaba negativamente a nativos y extranjeros. La inmigración española se encontraba en una fase de declinación desde comienzos de la década del cincuenta y el convenio migratorio de 1960 no logró revertir esta tendencia, que estaba motivada en condiciones estructurales irreversibles. 65 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis Gráfico 1: Emigración española transoceánica y hacia la Argentina (1946-1965)* 70000 60000 50000 40000 30000 20000 10000 0 Emigración española… Emigración española… * En el período analizado, se entiende por “emigración transoceánica” la que se dirigía a América. Fuente: César Y. Gallardo. La emigración española a América (S XIX y XX). Dimensión y características cuantitativas, Colombres, Fundación Archivo de Indianos, 1994, p. 37, 38 y 76. Cuadro 1: Personas trasladadas dentro del Plan de Reagrupación Familiar, según países de destino (1956-1965) Países de destino Nº personas reagrupadas Venezuela 24.344 Brasil 18.588 Argentina 15.259 Uruguay 6.037 Colombia 1.630 Chile 1.331 Paraguay 171 Panamá 78 Costa Rica 55 Ecuador Total 5 67.498 Fuente: “Reagrupación familiar en ultramar”. Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración. Madrid: CCEM, nº 109: 7, marzo-abril 1957. 66 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis Cuadro 2: Personas trasladadas dentro del Plan de Reagrupación Familiar, según países de destino (1956-1959) Países de destino Nº personas reagrupadas Nº familias reagrupadas Argentina 10.626 4.938 Venezuela 9.004 4.331 Brasil 7.335 3.800 Uruguay 3.129 1.441 Colombia 677 379 Chile 559 293 79 33 3 2 31.412 15.217 Paraguay Costa Rica Total Fuente: AR. “Resumen del Plan R. F.”. Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración. Madrid: CCEM, nº 39: 7, enero 1960. Notas e referencias Este trabajo forma parte de los siguientes proyectos de investigación: UBACyT 20020110100073 y UBACyT 20020100100435 (UBA); PIP 112-201101-00607 (CONICET); PICT 2008, Nº 1150 (ANPCyT); Proyecto “Redes, poder y territorialidad en la historia argentina de los siglos XVIII-XX”, Programa de Incentivos a docentes– investigadores (CESAL – UNICEN); HAR2009-11081 (Ministerio de Ciencia e Innovación de España). 2 La tasa media anual de emigrantes transoceánicos por cada diez mil habitantes censados en 1950, alcanzó en Galicia a 76, mientras que en Canarias fue de 73 y en Cataluña, del 13. Salvador PALAZÓN FERRANDO. Capital humano español y desarrollo económico latinoamericano. Evolución, causas y características del flujo migratorio (1882-1990). Valencia: Institut de Cultura “Juan Gil-Albert”, 1995, p. 294. 3 Aclararemos que las estadísticas sobre emigración española ultramarina hacia la Argentina, que se disponen en España (del Instituto Geográfico y Estadístico Español y del Ministerio de Trabajo), difieren entre sí, en el número de emigrantes anuales contabilizados. A su vez, existen importantes contrastes entre las cifras de “emigrantes” registrados al salir de España y las de “inmigrantes” españoles ultramarinos, que contienen las estadísticas argentinas. En el Gráfico 1 nos basamos en las cifras españolas que brinda YÁÑEZ GALLARDO. Cfr. César YÁÑEZ GALLARDO. La emigración española a América (S XIX y XX). Dimensión y características cuantitativas. Colombres: Fundación Archivo de Indianos, pp. 37,38 y 76) y no en las argentinas, 1994, pp. 37-38 y 76. 1 67 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis Mientras que el promedio anual de inmigrantes arribados entre 1930 y 1939 fue de 42.780, entre 1945 y 1960 esa cifra ascendió a 61.693. Cfr. ARGENTINA. Dirección Nacional de Migraciones (en adelante: DNM). Estadísticas del Movimiento Migratorio, Buenos Aires, 19301939; 1945-1960. 5 Recordemos que el promedio anual de inmigrantes llegados entre 1890 y 1914 fue de 138.271. ARGENTINA. DNM. Memorias Anuales, Buenos Aires, 1890-1914. 6 En esta dirección cfr. el trabajo pionero de Mónica QUIJADA MAURIÑO. “Política inmigratoria del primer Peronismo. Las negociaciones con España”. Revista Europea de Estudios Latinoamericanos y del Caribe. Amsterdam: CEDLA, n° 47, 1989, pp. 43-64. 7 PÉREZ-PRENDES y José Manuel MUÑOZ-ARRACO. El marco legal de la emigración española en el constitucionalismo (Un estudio histórico-jurídico). Colombres: Fundación Archivo de Indianos, p. 136. Capítulo II y III, Ley de Emigración, Madrid, 20 de diciembre de 1924. España. Ministério de Trabajo y Previsión [1929], 1993, pp. 6-12. 8 María José FERNÁNDEZ VICENTE. “En busca de la legitimidad perdida. La política de emigración del régimen franquista, 1946-1965”. Estudios Migratorios Latinoamericanos. Buenos Aires: CEMLA, año 19, nº 56, 2005, pp. 3-28. 9 GONZÁLEZ-ROTHVOSS y Mariano GIL. Los problemas actuales de la emigración española. Madrid: Instituto de Estudios Políticos, 1949, p. 24. 10 Vicente BORREGON RIBES. La emigración española a América. Vigo, 1952, pp. 55 y 114. 11 GONZÁLEZ-ROTHVOSS Y GIL, 1949, p. 87. 12 GONZÁLEZ-ROTHVOSS Y GIL, 1949, p. 41. 13 FERNÁNDEZ VICENTE, 2005, pp. 442-443. 14 Carlos Ma. R. de VALCÁRCEL. Conferencia. In: Instituto Español de Emigración. II Congreso de la emigración española a ultramar. Madrid, 1960, p. 50; Álvaro RENGIJO CALDERÓN. Emigración y empresas privadas. Conferencia pronunciada en la Cámara Oficial de la Industria de la provincia de Madrid, 18 de noviembre de 1965, 1995, p. 2; ES. Archivo del Ministerio de Asuntos Exteriores (en adelante: AMAE). R 9621, Exp. 7 (1958-1967). 15 ARGENTINA. Editorial. “Facilidades a la inmigración”. La Nación. Buenos Aires, 4 y 20. 10. 1948. 16 ESPAÑA. AMAE. R 1731, Exp. 2, “Entrevista con el Director de Migración Argentina”, Madrid. Madrid, 20 de diciembre de 1946. 17 María Inés BARBERO y María Cristina CACOPARDO. “La inmigración europea a la Argentina en la segunda posguerra: viejos mitos y nuevas condiciones”. Estudios Migratorios Latinoamericanos. Buenos Aires: CEMLA, año 6, n° 19: 291-321, 1991, pp. 305-306. 18 María José FERNÁNDEZ VICENTE, 2005, pp. 83-93. 19 ESPAÑA. Ministerio de trabajo. Memoria de la labor realizada en 1958. Libro IV. Madrid: Instituto Español de Emigración, 1960, p. 10. 20 ESPAÑA. AMAE. R 2052, Exp. 39, José María de Areilza (Embajador de España en la Argentina): Sobre proyecto relativo a la emigración española en la Argentina, Buenos Aires, 3 de marzo de 1948; AMAE, R 1731, Exp. 3, Informe s/f. 4 68 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis GONZÁLEZ-ROTHVOSS Y Mariano GIL. Familia y Emigración. Madrid: Consejo Superior de Investigaciones Científicas, 1959, pp. 14-15. 22 Ma. Emelina MARTÍN ACOSTA. Emigración canaria a Argentina: algunos ejemplos de la Comisión Católica Española de Migración, a mediados del siglo XX. In: Pilar CAGIAO VILA y Eduardo REY TRISTÁN (eds.). De ida y vuelta. América y España: los caminos de la cultura. Simposio Internacional de la Asociación Española de Americanistas, Santiago de Compostela 2 y 3 de septiembre de 2005. Santiago de Compostela: Universidad de Santiago de Compostela, 2007, p. 393. 23 El CIME tuvo su origen en una Conferencia reunida en Bruselas en diciembre de 1951, en la cual se resolvió crear un instrumento para restaurar el equilibrio entre las “naciones superpobladas” y las “insuficientemente pobladas” por medio de la migración organizada y asistida de los europeos. La participación de España en el CIME fue producto de largas negociaciones, que se iniciaron en 1952 y se prolongaron por varios años. Cfr., entre otra documentación: ESPAÑA. AMAE. R 5283, Exp. 16 (1945-1957), Dirección General de Asuntos Consulares, Participación de España en el Comité Intergubernamental provisional para los movimientos migratorios de Europa, 21 de abril de 1952; AMAE, R 5283, Exp. 16 (1945-1957), Dirección General de Política Económica, Participación de España en el Comité Intergubernamental provisional para los movimientos migratorios de Europa, Madrid, 28 de mayo de 1952. 24 ESPAÑA. Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración. Madrid: CCEM, nº 11: 8-10, sept. 1957. 25 MARTÍN ACOSTA, 2007, p. 396. 26 ESPAÑA. “Plan de reagrupación de familias”. Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración. Madrid: CCEM, nº 26: 6, dic. 1958. 27 Cabe aclarar que con el transcurso del tiempo, otros países quedaron incluidos de manera más informal dentro del plan (por ejemplo: Panamá, Costa Rica y Ecuador). 28 Por el momento no podemos reconstruir el número anual de españoles embarcados dentro del Plan de Reagrupación Familiar, según los diferentes países de destino, por lagunas existentes en las fuentes de información disponibles. 29 María José FERNÁNDEZ VICENTE; Axel KREIENBRINK. Las relaciones del IEE con los países de ultramar. In Luís M CALVO SALGADO; María José FERNÁNDEZ VICENTE; Axel KREIENBRINK; Carlos SANZ DÍAZ; Gloria SANZ LAFUENTE. Historia del Instituto Español de Emigración. La política migratoria exterior de España y el IEE del Franquismo a la Transición. Madrid: Ministerio de Trabajo e Inmigración, 2009, pp. 232-233. 30 FERNÁNDEZ VICENTE et al., 2009, pp. 233-234. 31 ESPAÑA. “II Congreso de la Emigración Española a Ultramar”. Boletín del Gabinete de Estudios. Madrid: Ministerio de Trabajo-Instituto Español de Emigración, nº 7: 54-56, dic. 1959. 32 ESPAÑA. Archivo General de la Administración (en adelante: AGA). Sección 6, Sindicatos, Inv. 55.1, Caja R 2241, Exp. Delegación Nacional de Sindicatos-Servicio de Relaciones Exteriores Sindicales-II Congreso de la Emigración Española a Ultramar, 21 69 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis “Claridad de Pensamiento”. Ultramar. Boletín del II Congreso de la Emigración Española a Ultramar. nº 2: 1-2. 33 ESPAÑA. AGA. Sección 6, Sindicatos, Inv. 55.1, Caja R 2241, Exp. Delegación Nacional de Sindicatos-Servicio de Relaciones Exteriores Sindicales-II Congreso de la Emigración Española a Ultramar, Tema V: Tratados de Emigración. In: Ponencias oficiales. Proyecto de Conclusiones, p. 17. 34 ESPAÑA. Ley 93/1960, de 22 de diciembre, sobre bases de ordenación de la emigración. Boletín Oficial del Estado. nº 307: 17.602, 23 de diciembre de 1960. 35 ESPAÑA. Ley 93/1960, de 22 de diciembre, sobre bases de ordenación de la emigración. Boletín Oficial del Estado. nº 307: 17.602, 23 de diciembre de 1960. 36 Fermín Sanz-Orrio, Ante las Cortes Españolas, sobre la Ley 93/1960 de bases de ordenación de la emigración. In: España. Ministério de Trabajo – Secretaría General Técnica. Política española de la emigración. Madrid, 1961, p. 22. 37 ESPAÑA. Ley 93/1960, Art. 1º, Base primera, Capítulo I, p. 17.603. 38 ESPAÑA. Ley 93/1960, Base sexta a decimoquinta, pp. 17.604-17.606. 39 ESPAÑA. Ley 93/1960, Arts. 1º y 2ª, Base cuarta y Art. 3º, Base tercera, Capítulo II. cit., p. 17.604. 40 ESPAÑA. Ley 93/1960, Art. 1º, Base tercera, Capítulo II., p. 17.603. 41 ESPAÑA. Emigración, Leg. 6218, Exp. 42, Informe de inmigración del Ministro Encargado de los Asuntos Consulares, al Ministro de Asuntos Exteriores en Madrid, Buenos Aires, 8 de agosto de 1959, ff. 1-2. 42 ESPAÑA. Emigración, Leg. 6218, Exp. 42, Nota de la Comisión Asesora sobre Migraciones (Dirección Nacional de Migraciones), al Jefe de la Misión CIME en Argentina, Buenos Aires, 29 de mayo de 1959, s./f. Entre otras, las profesiones y oficios demandados eran los siguientes: ingenieros; físicos; geólogos; agrónomos; perforadores de pozos de petróleo y gas; carpinteros; operadores de hornos y del tratamiento térmicos de metales; ajustadores, montadores, reparadores y operadores de máquinas; plomeros y fontaneros; mecánicos electricistas; operadores de hornos y secadores de cerámica y otras especialidades en cerámica; trabajadores en vidrio, sopladores y moldeadores; operadores en ocupaciones químicas diversas; curtidores de cuero y pieles; preparadores tintoreros y aparadores de cuero; operadores de hornos para la fabricación de electrodos; mineros; torneros, fresadores y pulidores; técnicos para la industria de celulosa y papel. 43 ESPAÑA. AMAE. Emigración, Leg. 6218, Exp. 42, Informe de inmigración del Ministro Encargado de los Asuntos Consulares, al Ministro de Asuntos Exteriores en Madrid, Buenos Aires, 30 de enero de 1959, f. 3. 44 ESPAÑA. AMAE. Emigración, Leg. 6218, Exp. 42, Nota del Embajador de España, al Ministro de Asuntos Exteriores en Madrid, Buenos Aires, 23 de agosto de 1958, ff. 1-2. 45 ESPAÑA. AMAE. Emigración, Leg. 6218, Exp. 42, Nota del Embajador de España, al Ministro de Asuntos Exteriores en Madrid, Buenos Aires, 23 de agosto de 1958, f. 1. 46 ESPAÑA. Emigración, Leg. 6218, Exp. 42, Informe de inmigración del Ministro Encargado de los Asuntos Consulares, al Ministro de Asuntos Exteriores en Madrid, Buenos Aires, 30 de enero de 1959, f. 5. 70 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El fomento tardío de la emigración española hacia la Argentina: expectativas y limitaciones Nadia Andrea De Cristóforis ESPAÑA. AMAE. Leg. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Nota de “Manolo” (Embajada de España en Buenos Aires), al Director General de Asuntos Consulares del Ministerio de Asuntos Exteriores de Madrid, Buenos Aires, 16 de noviembre de 1956, f. 2. 48 El mencionado convenio formó parte de un conjunto más amplio de Tratados de Emigración firmados por España, desde mediados de la década de 1950, con República Dominicana (1956), Brasil (1960), Chile (1961) y Paraguay (1965). Julio HERNÁNDEZ BORGE (1999). La política migratoria española con Iberoamérica durante el gobierno de Franco. In: AAVV. Professor Joan Vilà Valentí / El seu mestratge en la geografia universitària. Barcelona: Universitat de Barcelona, pp. 640-643. 49 ESPAÑA. AMAE. Leg. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Convenio de Emigración entre España y la República Argentina, art. 19, Cap. 8, Título II, f. 5. 50 ESPAÑA. AMAE. Leg. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Convenio de Emigración entre España y la República Argentina, Art. 8, Cap. 1, Título II. Op. cit., ff. 2 y 3. 51 ESPAÑA. AMAE. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Convenio de Emigración entre España y la República Argentina, Art. 21, Título III. Op. cit., f. 5. 52 ESPAÑA. AMAE. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Convenio de Emigración entre España y la República Argentina, Art. 1, Título I. Op. cit., f. 1. 53 ESPAÑA. AMAE. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Convenio de Emigración entre España y la República Argentina, Art. 2 y 3. Op. cit., f. 1. 54 ESPAÑA. AMAE. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Convenio de Emigración entre España y la República Argentina, Art. 4. Op. cit., f. 1. 55 ESPAÑA. AMAE. Leg. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, “Resolví venir por la Desocupación y Miseria que hay en España, manifiesta el inmigrante Nº 1 por el reciente Pacto `Frondizi-Franco´”. La Razón. Buenos Aires, 8 de septiembre de 1960. 56 ESPAÑA. AMAE. Leg. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Nota del Embajador de España en Buenos Aires, al Ministro de Asuntos Exteriores de Madrid, Buenos Aires, 12 de septiembre de 1960. 57 ESPAÑA. AMAE. Leg. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Nota del Cónsul General de España en Buenos Aires, al Director General de Asuntos Consulares en Madrid, Buenos Aires, 1961. 58 ESPAÑA. AMAE. Leg. R 6219, Exp. 8, Asuntos agregados laborales en Argentina, Nota del Cónsul General de España en Rosario, al Ministro de Asuntos Exteriores de Madrid, Buenos Aires, 1961. 59 FERNÁNDEZ VICENTE; KREIENBRINK, 2009, pp. 241-242. 47 71 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê: E-imigração espanhola e espanhóis na diáspora El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías CONICET/ Univ. Nacional de General Sarmiento Museo de la Emigración Gallega en la Argentina Resumo: O associativismo de alcance microterritorial é um fenômeno distinto do coletivogalego na Argentina. Ao longo do primeiro terço do século XX proliferaram no país múltiplas instituições do tipo. Para além do já conhecido caso de Buenos Aires, as associações microterritoriais galaicas também fizeram sua aparição no vizinho Partido de Avellaneda. Este trabalho constitui uma primeira aproximação com estas formas de sociabilidade étnica no município. Nele e através da combinação da documentação produzida por estas sociedades, a imprensa étnica e outras fontes geradas pela sociedade receptora, é possível analizar algunas de suas características, dando visibilidade tanto às semelhanças quantodiferenças com outras instituições de igual naturaza desenvolvidas no territorio argentino. PALAVRAS CHAVE: Argentina – Imigração galega - Partido de Avellaneda – Microassociativismogalego. Resumen: El asociacionismo de alcance microterritorial es un fenómeno distintivo del colectivo gallego en la Argentina. A lo largo del primer tercio del siglo XX proliferaron en el país múltiples instituciones de este tipo. Fuera del ya transitado caso de Buenos Aires, las asociaciones microterritoriales galaicas también hicieron su aparición en el vecino Partido de Avellaneda. El presente trabajo constituye un primer acercamiento a estas formas de sociabilidad étnica en el municipio. En él, y a través de la combinación de la documentación producida por dichas sociedades, la prensa étnica y otras fuentes generadas por la sociedad receptora, hemos abordado algunas de sus características distintivas, desentrañando tanto similitudes como diferencias con otras instituciones de igual naturaleza desarrolladas en el territorio argentino. PALABRAS CLAVE: Argentina - Inmigración gallega - Partido de Avellaneda – Microasociacionismo galego. Abstract: A distinctive characteristic of the Galician community in Argentina is its organization around micro-territorial mutualaid associations. These kind of institutions proliferated in the country during the first third of the 20th century. Besides the wellknown case of Buenos Aires, these Galician micro-territorial associations were also present in the neighboring county of Avellaneda. This paper provides a first approach to forms of sociability in this municipality. In order to establish some of their distinctive characteristics, I have analyzed the documentation produced by the mutual-aid associations, as well as local newspapers –including those produced by Galician community in Argentina - and official documents such as marriage certificates. This documentation has also served to established similarities and differences with similar contemporary institutions. KEYWORDS: Argentina - Galician migration Avellaneda County - Galician micro mutualaid associations. Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 72-98 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías Introducción: asociacionismo español y gallego en la Argentina Uno de los cambios más notables tras la batalla de Caseros (1852), que desalojó del poder a Juan Manuel de Rosas, Gobernador de la Provincia de Buenos Aires, y abrió el camino a la organización institucional del país, fue el surgimiento de una intensa vida asociativa en los grupos migrantes europeos en la Argentina urbana, beneficiada por la autorización para la libre asociación y expresión de ideas que el nuevo clima y marco jurídico permitían.1 La fundación de la primera sociedad de inmigrantes españoles genérica data de aquel mismo año; un lustro después surgirían el Club Español, la Asociación Española de Socorros Mutuos de Buenos Aires (la principal entidad hispana del país por casi 80 años) y la Sociedad Española de Beneficencia. Hacia la Primera Guerra Mundial el asociacionismo hispánico de ayuda mutua en la Argentina era ya un enorme entramado institucional, existiendo entonces unas 250 asociaciones con 110.000 miembros.2 Sin embargo, teniendo en cuenta que los gallegos representan a lo largo del período 1857-1960 la mitad de todos los españoles llegados al país, es probable que detrás de la denominación de “española” de una sociedad como aquellas se ocultarse una mayoría galaica entre sus dirigentes y afiliados.3 Por otra parte, dentro del contexto panhispánico afloró también una verdadera constelación de instituciones propiamente gallegas.4 En la Argentina los inmigrantes galaicos desarrollaron prácticamente todas las posibilidades de asociacionismo étnico, combinando la procedencia geográfica (regional, provincial, comarcal, municipal o parroquial) con los objetivos -a veces múltiples- que cada institución perseguía: mutualistas médicas, beneficencia, culturales, recreativos, deportivos, etc.5Aunque el asociacionismo gallego en el país tiene precedentes en el período tardocolonial (1776-1810), su eclosión tuvo lugar tras la aparición de las grandes instituciones mutualistas españolas genéricas, y de manera contemporánea al inicio de la emigración transoceánica masiva en las últimas dos décadas del siglo XIX. En 1879 se fundó en la capital argentina el primer Centro Gallego del país, pero su vida fue breve, desapareciendo en 1892.6 Tras su extinción, Buenos Aires no contó por 15 años con ninguna gran sociedad mutualista de ámbito gallego, pero a cambio nacieron algunas asociaciones recreativo-culturales (como los diversos orfeones) y la Unión Gallega. Sin embargo, en 1907, coincidiendo con el arribo de las mayores oleadas de inmigrantes galaicos entre 1904 y el estallido de la Gran Guerra, surgió un nuevo Centro Gallego de Buenos Aires, que poco tiempo después reformó sus estatutos y acentuó su carácter benéfico-mutualista, lo que hizo posible el comienzo de un notable crecimiento institucional, como lo refleja el 73 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías explosivo aumento de sus socios,7 que en la década de 1930 superaron a los de la Asociación Española de Socorros Mutuos de Buenos Aires [AESMdeBA] y convirtieron a la entidad galaica en la mutual más grande de la América hispana.8 Junto a ella, a lo largo de las siguientes cinco décadas, brotaron también varias sociedades regionales (asilos, centros culturales, políticos y otros por el estilo) y cuatro centros provinciales (uno por cada provincia gallega). Sin embargo, como sintetizara Xosé Manoel Núñez Seixas, uno de los fenómenos que más particularizan al colectivo galaico dentro del contexto hispánico, es la aparición de un tipo de tejido asociativo que Vicente Peña Saavedra denominó microterritorial.9Estas formas institucionales reproducen como marco de referencia ámbitos territoriales de relación e interacción social de origen de los emigrantes inferiores al de la provincia: la parroquia, pero también de la comarca y el municipio. Las solidaridades locales pervivieron en la otra orilla del océano, y fueron en un comienzo de carácter más inmediato y vinculante que las “regionales” (gallega) o “nacionales” (española). Eso se reflejaba -y al mismo tiempo tenía su causa- en la propia estructura de las cadenas migratorias y en la reproducción de las redes de paisanaje para procurar colocación laboral, protección inmediata al recién llegado, espacios para el esparcimiento, etc. El inmigrante gallego –generalmente procedente del medio rural- sufría al desembarcar en la populosa y cosmopolita Buenos Aires de comienzos del siglo XX un importante choque cultural. Ese contraste lo empujaba a la solidaridad étnica con sus coterráneos, a fin de amortiguar el impacto y acomodarse mejor a las nuevas condiciones. El recién llegado tendía a buscar la compañía de sus convecinos, a organizar su sociabilidad y tiempo libre –preferente aunque no únicamente- con ellos y, por esa vía, a fundar o unirse a una sociedad comarcal, local o parroquial para reproducir en su nueva tierra los espacios de interacción social que le eran familiares. Además, la pervivencia de esas solidaridades locales, sumada al alto promedio de retornos y al generalmente corto período de estancia de los emigrantes allende el mar en la etapa anterior al estallido de la Guerra Civil Española (1936-1939), favoreció la preservación de los vínculos con las comunidades de origen. En muchas ocasiones, el mantenimiento de estos lazos hizo que las sociedades de emigrados en la Argentina (y en la América toda) incluyeran entre sus objetivos no sólo el socorro mutuo y/o la recreación para sus miembros, sino también la coordinación de esfuerzos para llevar a cabo iniciativas diversas en Galicia.10 La fundación o dotación de establecimientos educativos en sus lugares de origen fue una de las principales finalidades de estas sociedades, y se concretó abundantemente en varias zonas de la geografía gallega.11 Por otra parte, el mutualismo irá perdiendo 74 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías importancia a medida que las grandes instituciones benéfico-asistenciales (en particular el centro gallego porteño) se vayan asentando y desarrollando, de modo que a la larga las asociaciones microterritoriales acabarán concentrándose en las actividades recreativas.12 Entre la fundación en 1904 de la primera sociedad microterritorial conocida en Buenos Aires (La Concordia, asociación parroquial de los naturales de Fornelos da Ribeira, Salvaterra de Miño, Pontevedra) y 1936, surgió en la capital argentina todo un enjambre de instituciones gallegas de ámbito parroquial, municipal y comarcal, con un período de máxima intensidad entre 1907 y 1925. Aunque resulta difícil establecer con precisión su número (los cambios de nombre son tan frecuentes como las fusiones y divisiones), tan sólo en aquella ciudad habrían existido no menos de 327, siendo las contabilizadas para el conjunto del país hasta 1933 unas 476. Además, desde la década de 1910 se sucedieron varios proyectos federativos que buscaban impulsar iniciativas que superaran el localismo de la actuación de estas entidades, y que se plasmaron en iniciativas comunes de apoyo al movimiento agrarista galaico. En 1921 surgió la Federación de Sociedades Gallegas, Agrarias y Culturales (influida primero por el socialismo y el agrarismo, y más tarde por el nacionalismo gallego), que –pese a sufrir una escisión en 1929- fue capaz de intervenir de manera decidida en la política gallega durante la Segunda República Española (1931-1939), enviando a la Península delegados que participaron en las elecciones del período apoyando candidaturas republicanas y galleguistas, algunos de los cuales alcanzaron incluso el rango de diputados en el parlamento español.13 El estallido de la guerra en España provocó una importante transformación del marco asociativo gallego (y español). Expresión del cisma de la comunidad emigrada (que no terminará con el final de la contienda, sino que persistirá durante varias décadas), obligó al posicionamiento de las diferentes instituciones étnicas a favor o en contra de los bandos enfrentados. Mientras las grandes instituciones de carácter panhispánico se alinearon con los sublevados, las pequeñas entidades comarcales o locales gallegas se mantuvieron en general fieles al bando republicano. Por otra parte, como consecuencia de la importante caída de los flujos migratorios a la Argentina desde comienzos de la década de 1930, desaparecieron algunas sociedades y, al mismo tiempo, se dio un proceso de unificación de otras de un mismo ámbito territorial, una dinámica que se acelerará durante y después del conflicto antedicho.14 Con todo, son muchas las instituciones microterritoriales que han conservado una larga vida hasta el día de hoy. Aún cuando desde 1939 la nueva situación política española restringió sus posibilidades de actuación a favor de sus comunidades locales de origen (circunscribiéndolas prácticamente al campo 75 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías de la beneficencia),15 continuaron jugando hasta hoy un importante papel como lugar de sociabilidad para los emigrantes de primera generación.16 Las asociaciones gallegas en Avellaneda Aunque en una escala menor a la de su gigantesca vecina porteña, el Partido (municipio) de Avellaneda conoció tanto el universo asociativo panhispánico, como el propiamente galaico de carácter regional y microterritorial. Situado inmediatamente al sur de la ciudad de Buenos Aires, de la que lo separa el curso de agua del Riachuelo, nació en 1852 con el nombre de Barracas al Sud, el mismo de su núcleo urbano y cabecera (declarado ciudad en 1895).17 En 1904 tanto el Partido como la ciudad homónima mudaron su denominación por la actual de Avellaneda. Hasta finales del tercer cuarto del siglo XIX fue un área de características predominantemente rurales y muy poco poblada (excepto su zona urbana, donde existió una importante industria de salazón de carne), pero experimentó una gran transformación socioeconómica a partir de las últimas dos décadas del siglo XIX. Como consecuencia de la misma, se convirtió en una de las concentraciones urbanas, industriales, portuarias y comerciales más importantes del país, embrión del “cinturón industrial” de Buenos Aires y asiento de un numerosísimo proletariado fabril.18 Al igual que en el resto de la Argentina, a pesar del paulatino aumento del número de inmigrantes gallegos en el municipio durante la segunda mitad del siglo XIX,19 las instituciones de matriz “regionalista” quedaron inicialmente relegadas, y quienes se integraban al movimiento asociativo hispano lo hicieron en entidades de ayuda mutua que se definían como “nacionales” (españolas).20 En ellas, como hemos demostrado en otros trabajos,21 el elemento galaico se volvió mayoritario entre la masa de sus asociados a partir de la última década del siglo, pudiendo ser su preeminente presencia entre la dirigencia aún más antigua. Por otra parte, sólo los nativos de Galicia parecen haber desarrollado ámbitos de sociabilidad étnicoregionales en el territorio de los actuales partidos de Avellaneda y Lanús. En lo que hace a las sociedades macroterritoriales, desde 1899 existe el Centro Gallego de Avellaneda (la institución galaica con continuidad más antigua de la Argentina), de cuyas características más salientes entre 1899 y 1918 nos hemos ocupado ya,22 y al que en 1925 se sumó el Centro Gallego de Mutualidad y Cultura de Valentín Alsina (hoy anexo del Centro Gallego de Buenos Aires). En cuanto a las microterritoriales, por lo que hasta ahora sabemos, entre 1908/9 y 1913 nacieron una delegación de la sociedad Hijos del Partido de Lalín, de Buenos Aires, la Unión de los Hijos del Grove (hoy Hijos de El Grove en Buenos Aires) e Hijos del 76 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías Partido de Puentedeume.23 Algunos años después surgieron la Sociedad Recreativa Juventud Unida del Ayuntamiento del Puerto del Son (1918) y la Sociedad Artística y Recreativa Orfeón Fonsagrada (1925). También de mediados de la década de 1920 son la Asociación del Ayuntamiento de Antas de Ulla. Mutua, Instructiva y Recreativa, y la Asociación Finisterre en América (1926).24 Por último, en 1936 nacería Residentes de El Grove (que en 1940 pasó a llamarse Centro del Ayuntamiento del Grove).25 La relativa exigüidad y/o fragmentación de la documentación generada por estas instituciones que ha llegado hasta nosotros, supone una importante limitación para abordar com la amplitud y profundidad debida sus diferentes dinámicas.26 Con todo, es posible explorar algunos ítems mediante la combinación de La documentación societaria, la prensa étnica, y otras fuentes generadas por el Estado receptor y la sociedad civil local. Así, por ejemplo, al igual que en el caso porteño la fundación de aquellas parece alcanzar su pico entre la primera y la tercera década del siglo pasado. Segundo, una simple mirada a los puntos de la geografia gallega en los que estas instituciones se referencian, muestra una certa correspondência entre éstas y la composición provincial de las migraciones galaicas em el Partido.27 De las ocho sociedades mencionadas, tres corresponden a ayuntamientos coruñeses (Pontedeume, Porto do Son y Fisterra), otras tantas a Pontevedra (Lalín y las dos de O Grove), y dos a Lugo (A Fonsagrada y Antas de Ulla). Del mismo modo, si bien son varias las que nacieron y tuvieron siempre (o casi) sus sedes en el Cuartel 1º,28 es decir en la planta urbana del municipio y su zona más céntrica (entendida en un sentido más socioeconómico que geográfico), otras –como el Orfeón Fonsagrada o Residentes del Grove- aparecieron en la localidad de Piñeiro (Cuartel 3º), lo que también constituye un reflejo de la distribución espacial de la comunidad galaica en el Partido en la primera mitad del siglo pasado.29 Tercero, como señala Núñez Seixas (2000: 359-60, 367-8), resulta poco operativo establecer correlaciones automáticas basadas únicamente en la evaluación del número de inmigrantes residentes en un determinado punto de destino para presuponer el nacimiento de este tipo de formas asociativas, ya que también era imprescindible la presencia de uno o varios catalizadores, individuos de cierta posición económica, dotados de tiempo libre, prestigio y respetabilidad, capaces de asumir el liderazgo de aquellas.30 No obstante (y al igual que para el autor antedicho), es evidente que la presencia de una “masa crítica” de personas originarias de una misma comarca, ayuntamiento o parroquia resulta un factor importante para El surgimiento de una sociedad microterritorial, como demuestra el hecho de que en nuestro caso lasprimeras y/o más duraderas (Fisterra, A Fonsagrada, Lalín o Porto do Son) 77 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías corresponden, precisamente, a aquellos lugares de Galicia donde se originaron algunas de las más fuertes y prolongadas corrientes migratórias hacia Avellaneda. Aunque la colonia gallega en el Partido resulto numéricamente más modesta que la asentada em la vecina capital, existieron varios casos de importantes cantidades de individuos de un mismo ayuntamiento o comarca. Además, solían hallarse relativamente concentrados en el territorio, lo que sin duda facilitó su interacción, y con ello también la reproducción o recreación de los esquemas, vínculos identitarios y espacio social de origen, lo que a su vez hizo posible la génesis y continuidad de una estructura societaria. Con todo, cabe preguntarse por qué otros municípios con una importante presencia numérica em la zona, como es el caso de Vigo o Vilagarcía de Arousa, no parecen Haber desarrollado allí ningún ámbito de sociabilidad municipal o parroquial. Al respecto, conviene recordar que en América el surgimiento de un tejido asociativo local de âmbito gallego habría estado condicionado por tres conjuntos de factores interactuantes, a saber: consideración de la emigración como una estrategia temporal; interrelación entre la movilización política y social a nivel local em Galicia, y su traslación a los emigrados; surgimiento dentro de la colectividad de una elite interesada en la promoción y mantenimiento de esas formas asociativas como parte de su capital simbólico dentro de la comunidad gallega y española emigrada.31¿En qué medida puede Haber influido este último factor en los casos que nos ocupan? A fin de responder a este interrogante y de aproximarnos a algunas de las características básicas del microasociacionismo gallego en Avellaneda, vamos a analizar los casos de las sociedades creadas por los nativos de Lalín, Porto do Son y A Fonsagrada. Detrás de la creación, entre 1908 y 1909, de una delegación en el Partido de lasociedad Hijos del Partido de Lalín, se halla el proyecto de dotar con un hospital a aquella vila pontevedresa. El origen de la institución (hoy Centro Lalín, Agolada e Silleda de Buenos Aires) se remonta a la constitución, en 1904, de un comité de lalinenses emigrados a la Argentina, cuyo objetivo era la construcción de un hospital en la cabecera del municipio. La iniciativa gestada en Buenos Aires, que cristalizaría cuatro años después en una estructura formal,32 repercutió en la orilla sur del Riachuelo. En octubre de 1904 el semanario galaicoporteño Nova Galicia anunciaba la asamblea que celebrarían los laninenses para tratar la construcción de un cementerio (¿?), y dejaba constancia de que “en representación de los hermanos residentes en Barracas al Sur concurrió Don José Lalín y Don Emilio Otero”.33 Asimismo, en septiembre de 1908 y con la sociedad ya constituida, el mismo órgano de prensa anunciaba que “En el día de hoy salen comisiones de esta agrupación para nombrar delegados en Barracas al Sud, Barracas al Norte, Flores y 78 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías Belgrano”.34 A parecer fue la de Avellaneda la única que efectivamente llegó a constituirse,35 y los fines que la motorizaron habrían perdurado allí durante varios años, según se desprende del siguiente párrafo, extraído del periódico local La Libertad: Una reunión que hará época en los anales de la localidad, es la velada artístico danzante que la meritoria sociedad ‘Hijos del Partido de Lalín’, Avellaneda, efectuará el día 8 del próximo Diciembre, en los espaciosos y elegantes salones del “Centro Gallego” [de Avellaneda]. Conocidos los fines que persigue esta humanitaria sociedad, el producto íntegro de la precitada fiesta, será a beneficio total de las obras que sostiene en Lalín, o sea un hospital, asilo, escuela; levantados con la contribución de los asociados y donados al patrio suelo como prueba de reconocimiento, como altruista emblema de la unión hecha carne en la colectividad, y como corolario del cariño acendrado hacia el trozo de tierra que nos vio nacer… 36 El caso de la microsociedad de los nativos de Porto do Son La instalación de los naturales del municipio de Porto do Son en Avellaneda fue significativa desde, cuando menos, los primeros años del siglo pasado. De hecho, tan notable resultaba su presencia que la misma fue destacada por algunos testigos de la época, como lo muestra el impactante (aunque también algo exagerado) párrafo del informe elaborado en 1908 por el Concejo Deliberante del municipio, en relación al proyecto de renombrar como “Avenida Galicia” a una calle del Cuartel 3º: “el pueblo del Son, pintoresco puerto gallego, se ha despoblado completamente y hoy, los que fueron sus habitantes, ayudan activamente en Avellaneda a formar la patria común”.37 Diez años después, en abril de 1918, se fundaba en la calle Pinto al 300 (perteneciente al Cuartel 1º, y hoy llamada 12 de Octubre) la Sociedad Recreativa Juventud Unida del Ayuntamiento del Puerto del Son, que más tarde cambiaría su nombre por el de Hijos del Ayuntamiento del Puerto del Son, llevando actualmente el de Hijos del Ayuntamiento de Porto do Son [HAPS].38 Aunque muchas veces se las ha tenido por fuentes parcas, las Actas de Asamblea de este tipo de sociedades permiten interesantes prospecciones de algunas de sus más salientes características. En el caso de HAPS se han conservado las elaboradas entre 1918 y 1944. Lo primero que destaca al observar los firmantes del acta de la primera asamblea, es la posible presencia de lazos de parentesco entre aquellos, dada la reiteración de ciertos apellidos (Santos, Alvite, Pozos, Chouza).39 De allí que pueda presuponerse que, como en otras ocasiones, su creación fue obra del accionar de una o varias redes relacionales. Del mismo modo, es posible individualizar en esa primera reunión a quienes luego veremos repetirse en las 79 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías sucesivas comisiones directivas. Limitándonos a los cuatro cargos más importantes (Presidente, Vicepresidente, Secretario y Tesorero) de las 19 comisiones del período 1918-1944 cuya composición conocemos, observamos, por ejemplo, que Rafael Enríquez aparece en siete oportunidades y Ramón Santos en seis; como también que otras personas que no figuran entre los socios fundadores, tuvieron igualmente un importante número de presencias en los máximos cargos directivos. Se trataba, en sus primeros tiempos, de una asociación exclusivamente masculina. Cuando en noviembre de 1918 un socio propuso que se admitiesen mujeres, argumentando que “además de la ayuda moral y material que aportarían a la sociedad sería más fácil formar comisiones de fiestas y otras necesarias para el desenvolvimiento de la sociedad”, se le respondió que los estatutos no contemplaban la presencia femenina.40 Y aunque en enero de 1920 las puertas de la institución sí se abrieron al ingreso de socios del otro sexo, ello fue tan sólo a cambio de otorgarles el mismo lugar secundario y subordinado que se estilaba en el resto de las instituciones gallegas (y españolas) de la época,41 abonando la mitad del valor de la cuota masculina (lo que las asimilaba a los menores de edad) y sin derecho a integrar la Comisión Directiva.42 Por otra parte, si inicialmente también se barajó la idea de no permitir que formasen parte del gobierno de la institución quienes no hubieran nacido en el ayuntamiento sonense (y aún que ingresasen a ella), ya en la segunda asamblea se decidió que “los que Residan en el Ayuntamiento del Puerto del Son Sin Ser Nativos /…/ que /…/ puedan Ser Socios y tendrán el mismo derecho que los hijos del Ayuntamiento del Puerto del Son a formar parte de la Comisión [Directiva]”. Y, del mismo modo, que “los que se casen con hijas del Ayuntamiento del Puerto del Son que tendrán derecho a Entrar como Avonados y También tendrán los mismos derechos que los hijos del Ayuntamiento del Puerto del Son”.43 Por lo demás, aunque no contamos con evidencia de impedimentos al ingreso de otros gallegos, españoles, argentinos, etc., parece evidente la existencia de una mayoría de socios originarios de aquel municipio y/o de la comarca del Barbanza, a juzgar por la amplia presencia de apellidos tales como Maneiro, Mariño, Calo, Chouza, etc. Respecto de sus fines, una crónica elaborada por la misma institución sostiene que su creación obedeció al hecho de que sus fundadores “sintieron la necesidad de tener un lugar en común con un fin social y afectivo, donde poder mantener sus vínculos”.44 Aparece así con toda claridad la típica intención de mantener los lazos de paisanaje y reconstruir el espacio social original. Por otra parte, sabemos que en ocasiones HAPS auxilió a algún socio que atravesaba apuros económicos, ya sea recurriendo a los fondos de la caja social, levantando suscripciones o mediante 80 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías algún “empréstito”.45 No obstante, no parece que los estatutos sociales prescribiesen subsidio alguno para los enfermos o necesitados, sino que sería más bien la Comisión Directiva la que tendría la potestad –discrecional- de “socorrer en lo que pueda según la necesidad del enfermo”.46 En un contexto caracterizado por el parco gasto social del Estado argentino antes de 1930 y la falta de hospitales públicos en el primer cordón al sur del Riachuelo, la ausencia del mutualismo entre los objetivos principales de la institución podría resultar llamativa. Sin embargo, debe considerarse la proximidad geográfica de la sede de la Asociación Española de Socorros Mutuos de Avellaneda (en cuyos registros de socios hemos detectado varios miembros de la directiva de HAPS entre 1918 y 1944), del Hospital Fiorito (el primero del Partido, inaugurado en 1913) o, ya cruzando el Riachuelo, de la Asociación Española de Socorros Mutuos de Barracas y Buenos Aires. E incluso la posible influencia del nuevo Centro Gallego de Buenos Aires y de la antigua Asociación Española de Socorros Mutuos de Buenos Aires, relativamente cada vez más cercanos, conforme mejoraba el transporte público entre Avellaneda y la capital. Otro tipo de ayuda ocasional fue la que, por ejemplo, recibió un socio cuando -por causa desconocida para nosotros- quedó imposibilitado para el trabajo: la sociedad intercedió ante el Cónsul español en Buenos Aires, quien se comprometió a pagar el 50 % de su pasaje de regreso a la Península, en tanto que HAPS iniciaba una suscripción para completar el resto del dinero.47 En relación con esto último, conviene señalar que ya tempranamente la sociedad conoció un debate acerca de si se debía o no pagar la repatriación de los socios que padecieran enfermedades crónicas, habiendo quienes opinaban negativamente, aunque si aceptaban que se facilitara algo de dinero a su familia en caso de fallecimiento.48 De hecho, el pago de una cantidad en tal circunstancia (seguramente destinada a sufragar o ayudar con los gastos del entierro), y la presencia de una comisión en representación de la sociedad, no parecen haber sido una práctica ocasional sino una obligación institucional.49 Al igual que en otras entidades gallegas o españolas, las preocupaciones de HAPS abarcaban el otro mundo. En enero de 1920 se acordó comprar un terreno en el Cementerio municipal de Avellaneda para levantar en él un panteón social, pero lo escueto de la caja social habría impedido que la idea prosperase.50 No obstante, los emigrantes sonenses hallaron otra forma de ocuparse de la última morada de sus paisanos (y, dada la ya mencionada elevada tasa de retorno, quizás también de la propia). Según la Historia de Porto do Son y su distrito, Aunque la iglesia parroquial de San Vicente de Noal-Porto do Son tenía un atrio bastante espacioso, acabó por ser insuficiente ya que las epidemias de cólera de 1883-1884 y la gripe de 1916-1918 ocasionaron tantos 81 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías enterramientos que casi se ocupó toda su área. Sin embargo parece que ni el Ayuntamiento ni a la Iglesia les preocupase lo más mínimo aquel problema /…/. El pueblo tampoco se preocupaba, y así se acabó por carecer del espacio necesario para dar sepultura a los muertos de la parroquia. Sin embargo los hijos del Son y lugares de la feligresía residentes en Buenos Aires, comprendieron la necesidad mejor que los presentes de la parroquia, y allá trataron de ayudar a solucionarla formándose una comisión al efecto, y reuniendo por suscripción una buena cantidad de pesos. 51 Aunque la segunda etapa de la empresa (la edificación del panteón) se inició en 1928, la obra nunca llegó a concluirse.52 Aparentemente habría sido la falta de apoyo de los mismos residentes en aquel municipio coruñés, lo que llevó primero a la parálisis de las obras y más tarde a su absoluto abandono.53 Sin embargo, puede que ello también tuviese que ver con cierta disparidad de intereses en el seno de la institución bonarense. En agosto de aquel año, un socio había interpelado al Presidente para saber si la sociedad no contribuyó en nada monetariamente para dicha obra /…/. El señor Alvariza, opina que la Sociedad no debe aportar con nada, que la misión de ella es ocuparse de los de este mundo.54 En cualquier caso, si asuntos tales como la mutualidad y la repatriación (tan comunes a otras sociedades similares) parecen haber sido objeto de un interés apenas circunstancial, no hay dudas de la gran atención que se dedicó al aspecto lúdico, organizando periódicamente bailes y pic-nics (fiestas campestres).55 Y aunque ocasionalmente se saldaban con pérdidas para la caja social, según uno de los directivos “la C.D. no había organizado estas fiestas con fines de lucro sino el único y exclusivo fin de proporcionar a los asociados un día de sana y económica expansión”.56 Además, es en función de estas actividades que debe entenderse la existencia, al menos desde 1930, de una comisión de mujeres.57 Respecto de la orientación política de la institución apenas podemos dar cuenta de dos datos aislados. En julio de 1933 uno de los asociados pidió que se retirase del salón social un cuadro obsequiado por el Ayuntamiento del Son, por entender que el mismo representaba a la Monarquía; sin embargo, su solicitud fue rechazada tras la intervención de otro socio, para quien “ese cuadro no representa a ninguna facción política sino que es un recuerdo de la España pasada y que por ser un obsequio del Pueblo del Son debe permanecer en el lugar que ocupa”.58 Algunos años después, durante la guerra civil de 1936, un ex-presidente preguntó a la Asamblea “por qué en `biblioteca´ aparecen sólo nombres de autores de carácter izquierdista y ningún español [a lo que] el secretario explica ser ésta una cosas 82 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías inboluntaria y sin importancia”.59 Por lo demás, nuestras pesquisas sobre si la sociedad apoyó de alguna manera a uno u otro de los bandos en pugna no han dado hasta ahora ningún resultado. Las Actas sólo mencionan el conflicto en una ocasión, cuando la presidencia pidió un voto de pésame “para los socios fallecidos durante el año aciéndolo extensivo a todos los que fallecen en nuestra patria”.60 Tal actitud no debe sorprender: cierto puntilloso neutralismo era una condición necesaria para captar la mayor cantidad posible de socios, y quizás también una postura acomodaticia respecto de los poderes locales en la sociedad de partida. Poco es también lo que sabemos del número de socios que la entidad llegó a reunir. La única vez que las Actas nos dan alguna información es en ocasión de una asamblea de agosto de 1919, donde el Tesorero informó que la sociedad contaba con 130 miembros (incluyendo tres decenas que no tenían sus cuotas al día).61 A mediados de década de 1930 parece existir cierta preocupación por el volumen de la masa social,62 lo que explica que en la asamblea celebrada en junio de 1938 “pide la palabra del señor A[.] Lourido Santos y dice que se debe desarrollar una amplia campaña para atraer al ceno de la Sociedad a un buen número de nuevos socios”.63 Sin embargo, la verdad es que la masa societaria de HAPS no sale mal parada en una comparación con el promedio de las microsociedades gallegas del período: en 1919 contaba casi con el mismo número de miembros (141) que el promedio de las 37 sociedades que en 1929 formaban la Federación de Sociedades Gallegas,64 lo que la convierte en una asociación de dimensiones medias. Se trata, además, de una institución de indudable impronta obrera. Conviene remarcar este hecho porque la composición social de las entidades microterritoriales gallegas en la Argentina solía ser bastante distinta: una mayoría de empleados y dependientes de comercio, seguidos por comerciantes y obreros manuales -calificados y no calificados.65 Prueba de ello es que en julio de 1933, como respuesta a alguna crítica en relación con la marcha de la vida económica de HAPS, el Secretario manifestó que “no puede tacharse de mala la administración hecha por hombres que debiendo dedicar la mayor parte del tiempo a procurar con su labor el sustento propio y de la familia, pues todos son obreros, trabajadores”.66 No obstante, resulta más es clarecedor el hecho de que de los seis socios fundadores cuya ocupación conocemos, cinco fuesen jornaleros (término polisémico, pero que alude a una extensa población de trabajadores no calificados, de gran movilidad espacial y ocupacional) y el restante carpintero. Contamos, asimismo, condatos de la ocupación de cuatro de las 11 personas que -como mínimo-presidieron la institución entre 1918 y 1944: entres casos (entre los que se incluye el de Rafael Enríquez, siete veces miembro de la directiva y tres veces 83 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías Presidente) se trataba de jornaleros, siendo el restante un ebanista.67 Vale decir que no sólo se delinea en su masa social un perfil tendencialmente proletario, sino que el mismo también puede ser atribuido a su dirigencia, al parecer menos elitista que la de otras sociedades galaicas o españolas en el país. Por otra parte, aunque la fuente no permite certificar la existencia de un notable que hiciera las veces de catalizador en la creación de la sociedad, sí deja entrever que ésta intentó gozar del mecenazgo algún emigrante de éxito. En enero de 1920 se planteó el nombramiento de una “Comisión Directiva Honoraria”, proponiéndose para el cargo de Presidente de la misma a Eugenio Ben.68 Sabemos que el antedicho había nacido en la provincia de A Coruña, y que desde 1890 se hallaba establecido en el pueblo de Barracas al Sud, donde se desempeñaba como abastecedor de ganado. Para 1926 su empresa daba trabajo a 60 personas entre empleados y obreros, y en 1928 integraba como Vocal el Directorio del Banco Comercial e Industrial de Avellaneda.69 La razón por la que se lo postuló para el cargo fue que era conveniente darle el título como Presidente honorario al señor Ben por cuanto que la sociedad precisa personas como el señor Ben para que influyan dentro de nuestra sociedad. /…/ darle el título de honorario a los señores nombrados con el fin de que esos señores con su influencia nos ayuden a llevarla al progreso.70 La preocupación por colocar a la institución bajo la protección de un benefactor era ciertamente pragmática, y se fundamentaba en la modestia de su economía. A pesar de que en enero de 1920 el valor de la cuota era de apenas $ 1,71 en agosto de 1919 un 23 % de los asociados no se hallaban al día con el pago de la misma,72 lo que motivó la queja de la presidencia, para quien “esta /…/ siendo ya de práctica por algunos socios que antomado la sociedad por estrumento de conveniencia que heran socios cuando a ellos le beniavien”.73 La sociedad se gobernaba a través de una Comisión Directiva cuya composición se renovaba año a año. Al parecer el sufragio se hacía mediante papeletas en las que se completaban a mano los nombres de las personas por las que cada socio votaba, pero en ocasiones el método variaba. Así, en el marco de una asamblea que debió sesionar en tercera convocatoria, el Presidente se refirió al “fracaso que han tenido las elecciones, por falta de concurrentes” y pidió una fórmula distinta para dejar constituida la nueva comisión, adoptándose entonces el criterio de hacerlo verbalmente y no por listas.74 En febrero de 1923 -por razones que desconocemosse alegó que el sistema para elegir a los dirigentes de la sociedad no daba buenos 84 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías resultados, proponiéndose que se facultara a la directiva para elaborar una “lista oficial /…/ dejando en blanco tantos renglones como tantos candidatos a elegir para así el socio que no le agrade tal candidato que forme la lista lo remplace polo que el socio lo crea conveniente”.75 Sin embargo, la propuesta no prosperó. Por su parte, en mayo 1935 quien entonces ocupaba el máximo cargo societario expuso que, dada la ausencia de listas opositoras, la elección no debía realizarse. Ante ello, otro socio objetó que era obligatorio sujetarse a los estatutos y que el hecho de que no hubiese una lista opositora no era óbice para que no se realizara la elección, por lo que finalmente se siguió un camino intermedio: se votó como una “lista” a la totalidad de la Comisión Directiva cuyo mandato ya caducaba.76 Por otra parte, con el tiempo las asambleas experimentaron cierto decaimiento en el número de concurrentes, lo que a menudo ocasionaba que debiesen sesionar en segunda o tercera convocatoria, y la imposibilidad de tratar asuntos de relevancia (como sucedió en septiembre de 1920 con el tratamiento de la reforma de los estatutos sociales).77 Con todo, la única vez que la fuente nos proporciona tanto la cantidad de socios como el número de aquellos que concurren a la asamblea (agosto de 1919), el porcentaje de asistencia no resulta nada desdoroso. De los 130 miembros teóricos se hallaban presente 35, lo que representaba un 26,9 % (o el 35 %, de considerar sólo a los que estaban al día con el pago de las cuotas).78 Se trata de índices considerablemente más altos que los que podían ostentar la generalidad de las instituciones mutualistas gallegas de alcance regional (o de las panhispánicas), y también muy superior a los de otras instituciones de ámbito microterritorial, situado en torno al 15 %.79 Si atendemos a la cantidad de presentes en las reuniones que se celebraron entre julio de 1918 y mayo de 1931 (las únicas que brindan el dato de la cantidad de asistentes), nos queda un promedio de 31 personas por reunión. No obstante, a mediados de la década de 1930 esa asistencia era demasiado baja desde la óptica de la institución, y causa de grandes dificultades a la hora de constituir las comisiones directivas con personas distintas de las habituales, dada la también escasa voluntad de los asociados a integrarlas, lo que generaba la habitual reiteración de nombres entre los directivos, tan común a las sociedades de este tipo. Además, la situación parece haber persistido al menos hasta mediados del siguiente decenio.80 Respecto a la sede social, si hasta 1930 HAPS deambuló por varios locales, a partir de ese año ocupa en propiedad un local ubicado en la calle Mariano Acosta 240 (Cuartel 1º), a escasas dos cuadras de la Av. General Mitre, la principal del municipio. En agosto de 1921 se autorizó a la Comisión Directiva para trabajar en la adquisición de un inmueble.81 Dos años después se compró por valor de $ 85 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías 7.588,80 un local en el cruce de Belgrano y Alsina,82 saldándose el importe con fondos líquidos de la sociedad ($ 3.800, depositados en la sucursal Avellaneda del Banco de Galicia y Buenos Aires), más una emisión de bonos destinada a cubrir el empréstito de $ 4.000 que José Chouza debió solicitar -con su garantía personal- en la misma entidad bancaria.83 Para mayo de 1923, sin embargo, la secretaría no se encontraba allí sino en Ameghino 390, mientras que la propiedad adquirida por la sociedad era alquilada a terceros a cambio de $ 50 mensuales.84 Para octubre de 1926 el local social se hallaba en O`Gorman 507 (hoy 25 de Mayo), en el límite entre la actual Ciudad de Avellaneda y la localidad del Dock-Sud (Cuartel 7º).85 Finalmente, en septiembre de 1928 se tomó la determinación de vender aquella propiedad y comprar un lote más grande, asunto que acabó con la que a la postre sería la última mudanza a la sede a la calle Mariano Acosta.86 Todas estas direcciones se hallan dentro de los límites del Cuartel 1º, lo que creemos está en relación con el patrón de asentamiento de los naturales del ayuntamiento sonense, que -al menos entre 1890 y 1930- privilegió su instalación en aquel (54,5 % del total). En lo que hace a su intervención socioeconómica en Galicia, existe –como vimosalguna evidencia de que la sociedad colaboraba ocasionalmente con el municipio de Porto do Son. Empero, tal como nos muestra lo ocurrido en relación a una carta enviada por el Alcalde de dicho municipio en 1934, solicitando la colaboración de HAPS para ciertas obras que se estaban desarrollando en aquel, la ayuda no era automática, ni las respuestas siempre positivas.87 El Orfeón Fonsagrada Puede que hacia 1927Hijos del Puerto del Son, Hijos de Lalín y el Orfeón Fonsagrada fuesen las más activas y/o importantes microsociedades gallegas del Partido. Al menos es una de las interpretaciones posibles al hecho de que fuesen precisamente sus presidentes, los convocados por el Centro Gallego de Avellaneda a su festival del 11 de octubre de ese año.88 Por entonces, la tercera de aquellas instituciones contaba con apenas un par de años de vida. Ya a mediados de la década de 1910 existió algún intento de constituir una sociedad de fonsagradinos en el área de Buenos Aires, como prueba la carta que dos naturales de aquel ayuntamiento lucense enviaron a Fortunato Cruces (director del diario La Colonia Gallega, de Buenos Aires) en agosto de 1914, en la que manifiestan la intención de fundar una sociedad mutualista para beneficio de sus paisanos en la Argentina, pero que mirase también por el progreso del solar natal.89 Se ha afirmado incluso que en aquel decenio “a los españoles los reunía una Sociedad Arte y Cultura Orfeón 86 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías Fonsagrada en Charlone al 800 y luego en Fraga 239”.90 Sin embargo, la documentación de la institución que se ha conservado (tan sólo las Actas de Comisión Directiva labradas entre mayo de 1925 y marzo de 1926)91 no registran su creación sino hasta mayo de 1925, fecha en la que nació la Sociedad Artística y Recreativa Orfeón Fonsagrada [OF].92 La elección del nombre se hizo tras barajar otros como “Orfeón Buronés”, “Orfeón Celta” u “Orfeón Lucense”, adoptándose finalmente aquel “por ser la mayoría de sus iniciadores hijos de los distritos del Partido Judicial del Pueblo de Fonsagrada”.93 El OF nació en la localidad de Piñeiro, lo que seguramente se relaciona con el patrón de asentamiento lugués en el Partido y, en particular, con el de los nativos de A Fonsagrada, como muestra el hecho de que un 52,5 % de los fonsagradinos hallados en las Actas de Matrimonio de los registros civiles del Partido entre 1890 y 1930 morasen en el Cuartel 3º. Del mismo modo que en el caso de la sociedad de Porto do Son, se observa entre sus fundadores la habitual reiteración de apellidos (López, Queipo) que permite suponer la existencia de lazos de parentesco entre aquellos. En cualquier caso, se trataba de una institución abierta a todos los españoles residentes en la República. Su carácter recreativo y cultural aparece expuesto en su misma denominación. Aún cuando no contamos con datos que certifiquen su funcionamiento real durante el primer año de vida de la sociedad, ya en la tercera asamblea de la misma (23 de mayo de 1925) se decidió poner en funcionamiento la primera sección cultural (el Orfeón), y un mes más tarde se mencionaba la necesidad de hacer lo propio con la Escuela de Canto y Declamación.94 Además, en su local se celebraban también los acostumbrados “bailes familiares” a los que sólo podían acceder los socios,95 aunque también podía suceder que se admitiesen invitados (que, a diferencia de los socios, debían abonar su entrada). Al igual que en el caso de HAPS,96 estas reuniones podían coincidir con fechas señaladas como la del 12 de octubre, declarado “Día de la Raza” por el gobierno nacional argentino en 1916.97 Y desde su primer año de vida el OF se sumó a la moda de realizar los cada vez más populares pic-nics veraniegos en las -por entonces- apetecibles playas del municipio de Quilmes, ubicado inmediatamente al sur del de Avellaneda.98 Más atrás hemos postulado la posibilidad de que, dada la cercanía tanto de la Asociación Española de Socorros Mutuos de Avellaneda como del Hospital Fiorito, HAPS no tuviese demasiado interés por desarrollar funciones mutuales. Pensamos la misma hipótesis puede aplicarse al caso del Orfeón, cuya documentación no permite suponer la existencia en él finalidad mutualista alguna. En realidad, el argumento 87 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías parece aún más lógico que en el caso anterior, pues la institución vio la luz cuando ya existían también en el contiguo Cuartel 5º del Partido la Sociedad Española de Socorros Mutuos de Valentín Alsina y el centro gallego de la misma localidad, cuya creación data de 1919 y 1925, respectivamente.99 En lo que hace al patrón residencial de los miembros del Orfeón, nuestra idea del mismo resulta bastante conjetural, debido a la inexistencia de registros de socios con las direcciones de los mismos. Creemos que una mayoría de ellos residía en el municipio avellanense, y dentro de él en la localidad de Piñeiro. Al menos es lo que podría colegirse del hecho (ya comentado) de que algo más de la mitad de los naturales de A Fonsagrada que contrajeron matrimonio en el Partido vivían allí. En el mismo sentido parece apuntar el dato de que, en marzo de 1926, se presentó una moción para que los socios que habitasen fuera de dicha localidad enviasen por giro postal el importe de su cuota social, pues al cobrador no le compensaba ir a cobrarles a sus casas. Por entonces también se determinó que no se mandarían avisos impresos a quienes habitaran en los barrios porteños de La Boca y Barracas, o en la zona céntrica de Buenos Aires, lo que -de paso- da una idea de dónde moraban quienes se encontraban fuera del Partido.100 La misma ausencia de documentación idónea nos impide caracterizar con exactitud el perfil socioeconómico de la masa social del Orfeón. Señalemos, a modo de aproximación indirecta, que cuando la sociedad tuvo que dotarse de sus primeros muebles un socio llamado Pedro Conde se ofreció a comprar la madera necesaria, “y al mismo tiempo los señores [miembros de la Comisión Directiva] Pichel y Méndez ofreciéronse a construir desinteresadamente los efectos mencionados.”101 De allí, y del hecho de que más tarde el mismo Pichel ofertara los servicios de su esposa para la limpieza del local social,102 puede colegirse el perfil socioeconómicamente bajo de sus dirigentes (los dos últimos debían ser carpinteros o, como mucho, ebanistas) y, por ende, de la mayoría de los miembros del OF. Pero no de todos. Hemos mencionado recién a uno de apellido Conde. Sin duda se trata de Pedro Conde Freire que, aunque no figura entre los fundadores de la institución, revista entre quienes se incorporaron a ella en sus más tempranos días. Gracias a la prensa étnica gallega sabemos que nació en la provincia de Lugo, y que a finales de la primera década del siglo XX ya era un conocido industrial, dueño de una fábrica de licores ubicada también en Piñeiro, y hasta 1916 (cuando se lo dio de baja) socio del más elitista Centro Gallego de Avellaneda.103 Su caso parece ilustrar el peso de los emigrados de éxito en la directiva de este tipo de sociedades, y puede que también el de quienes no podían acceder a corto o mediano plazo a las directivas de las grandes instituciones macroterritoriales. Una vez constituida la 88 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías asociación de Fonsagrada, fue elegido como su primer Presidente.104 Y, como acabamos de ver, cuando fue necesario adquirir la madera para fabricar los primeros muebles para la sede social, se hizo cargo de la tarea “por cuanto que, en virtud de sus relaciones, esperaba obtenerla a un precio muy ventajoso para la sociedad”,105 lo que juzgamos una muestra de cierto mecenazgo informal, o al menos del tipo de ayuda al progreso social que HAPS esperaba obtener de Eugenio Ben. ¿Es demasiado arriesgado afirmar que el OF fue una sociedad de ámbito distrital (y no municipal) debido a su presencia (y a su preferencia, intereses u objetivos) o a la presencia de otros como él? No resulta sencillo responder a este interrogante. En todo caso, a diferencia del caso de Porto do Son, entre los nueve socios iniciales del OF también figuran Pedro López y José Ferreiro, probablemente otros “notables”, en cuyo comercio se fundó la sociedad y donde funcionó su primera sede.106 No obstante la presencia de un hombre de recursos como Pedro Conde, la institución parece haber gozado (al menos en esta etapa temprana de su vida) aún menos recursos que la de Porto do Son. De hecho, para que pudiera funcionar fue necesario que en junio de 1925 un grupo de socios adelantase el importe de las cuotas correspondientes a seis meses.107 Y cuando en septiembre se pensó en adquirir un simple armario, debió recurrir nuevamente al préstamo de algunos de sus miembros, pues no contaba con fondos suficientes.108 Con todo, vale la pena recordar que no fueron muchas las sociedades de este tipo que poseyeron en propiedad un local, ni tan siquiera el dinero suficiente para alquilarlo, y que un gran número de ellas apenas fueron realmente dueñas de poco más que cuadernos, sellos y algún mueble.109 De la lectura de la escasa documentación existente no se desprende ninguna acción en beneficio de la comarca de Fonsagrada. Sí, apenas, una colaboración, en febrero de 1926 (y a solicitud de la Asociación Española de Socorros Mutuos de Avellaneda), de $ 25 para un homenaje a los tripulantes del hidroavión Plus Ultra, que había arribado a Buenos Aires el 10 de ese mes al comando del gallego Ramón Franco.110 Como era usual, la vida del OF se regulaba mediante unos Estatutos y un Reglamento Interno, pero los mismos no han llegado hasta nosotros. Apenas sabemos que los 14 miembros de la Comisión Directiva eran elegidos por el voto de los socios reunidos en asamblea, y que luego los que resultaban seleccionados votaban nuevamente para repartirse los cargos. Asimismo, que en octubre de 1925 se propuso una reforma de los estatutos para introducir una cláusula por la cual, para ser miembro de la CD (y no sólo Presidente o Vice) sería obligatorio que el 89 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías elegido fuese español,111 y que en noviembre del mismo año se creó una Comisión de Fiestas.112 En abril de 1936 el OF se fusionó con la sociedad Residentes del Partido de Fonsagrada, de Buenos Aires, adoptando entonces la denominación Unidos de Fonsagrada y sus Distritos, y trasladando su secretaría en la Capital Federal.113 A su vez, en los primeros meses de 1938 esta nueva sociedad intentó unirse con las entidades de naturales de Baleira y Castroverde (otros dos municipios lucenses, uno perteneciente a la comarca fonsagradina y el otro contiguo a ella), pero la asamblea planificada para el 20 de marzo fracasó debido a la intervención de la policía (¿?). Así, Unidos de Fonsagrada y sus Distritos continuó existiendo como entidad independiente hasta diciembre de 1939, cuando finalmente pudo celebrarse la asamblea extraordinaria que aprobó su unión con la sociedad de Baleira y la creación de una nueva entidad, a la que denominaron Unidos de Fonsagrada y Baleira.114 Años después, se fundiría en el nuevo Centro Lucense.115 A manera de cierre: recapitulación y nueva hipótesis Como hemos podido observar en las páginas anteriores, el Partido de Avellaneda conoció diferentes tipos de microsociedades gallegas. Aquí nos hemos acercado de forma somera a tres casos concretos: una de tipo distrital y -hasta dónde sabemoscarácter básicamente lúdico (Fonsagrada); otra de ámbito municipal, en la que el esparcimiento sólo esporádicamente se combinaba con algunos rasgos mutualistas (Porto do Son); y una tercera (Lalín), que era más bien una delegación de la matriz porteña, y cuya finalidad – al menos inicialmente- fue prestar su auxilio para cubrir algunos de los déficit de infraestructura del municipio de origen. Las tres compartieron -hasta donde hemos podido observar- una serie de rasgos comunes: nacieron tiempo después de la aparición en la zona de las mutuales panhispánicas y el asociacionismo gallego macroterritorial, dentro del período álgido del amanecer del microasociacionismo galaico en el país; su ámbito de referencia fue generalmente el mismo de las más importantes corrientes migratorias de Galicia al Partido de Avellaneda, lo que parece subrayar la importancia del stock para su surgimiento; fueron fundadas y tuvieron sus sedes dentro de las mismas áreas del Partido donde se verificó la mayor instalación espacial de su grupo provincial y/o municipal; consecuentemente con la realidad socioeconómica en la que se insertaron, parece haber primado entre su miembros el elemento obrero; sobrevivieron hasta nuestros días, ya sea en forma aislada o integrándose sucesivamente en instituciones referenciadas en ámbitos espaciales 90 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías cada vez más abarcativos; su ubicación geográfica y la cronología de su aparición podrían tener una relación directa con su falta de fines mutualistas. Por el contrario, el perfil socioprofesional de sus dirigentes parece presentar ciertos matices distintivos. No es el mismo en la sociedad de Porto do Son que en el Orfeón Fonsagrada, entre cuyos directivos sí habría existido gente de éxito económico que, a su vez, ejerció algún tipo de mecenazgo en su vida institucional. Por último, conviene retomar un interrogante formulado más arriba: ¿por qué nunca existió en el municipio avellanense una sociedad propia de los nativos de Vigo o de Vilagarcía de Arousa, ni otra de lalinenses independiente de su matriz porteña? En nuestra opinión, ello obedecería al hecho de que los hombres de éxito originarios de esos municipios, que potencialmente podrían haber motorizado el surgimiento de sociedades con esos marcos espaciales de referencia, simplemente encontraron otros canales a través de los cuales vehiculizar su liderazgo étnico. Tal como hemos explicado en otra parte,116 el grupo dirigente del Centro Gallego de Avellaneda siempre contó con una amplia presencia de nativos de la provincia pontevedresa y, cuando menos entre 1899 y 1918, fueron precisamente personas oriundas de Vigo, Vilagarcía y Lalín quienes más se repitieron en sus máximos cargos directivos. De modo que si bien existían líderes en potencia y un número suficiente de paisanos, lo que suponía razonables probabilidades de que se fundasen sociedades de ámbito territorial viguesas, vilagarcianas o lalinenses, esto no llegó a ocurrir porque sus eventuales promotores optaron por asumir su rol de dirigentes en una asociación de mayor ámbito territorial. Algo que, desde luego, no excluía su participación en la entidad microterritorial de sus paisanos y/o en otra panhispánica (por ejemplo, la AESMdeA), como de hecho prueba algún caso concreto que hemos podido glosar.117 Casualidad o no, Pedro Conde Freire ocupó un lugar destacado entre la dirigencia del Orfeón Fonsagrada años después de haber sido expulsado del más elitista Centro Gallego de Avellaneda. Notas e referências Fernando DEVOTO. Historia de la inmigración en la Argentina. Buenos Aires: Sudamericana, 2003, p. 240. 2 DEVOTO; Alejandro FERNÁNDEZ. “Mutualismo étnico, liderazgo y participación política. Algunas hipótesis de trabajo”. In: Mundo urbano y cultura popular. Estudios de Historia Social Argentina. Buenos Aires: Sudamericana, 1990, p. 136; José C. MOYA. Primos y extranjeros. La inmigración española en Buenos Aires, 1850-1930. Buenos Aires: Emecé, 2004, pp. 290-306. 1 91 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías Sobre la participación gallega en el mutualismo panhispánico de Buenos Aires hasta 1930, vid. Alejandro E. FERNÁNDEZ. “Los inmigrantes gallegos y el asociacionismo español de Buenos Aires”. In: Buenos Aires Gallega. Inmigración, pasado y presente. Buenos Aires: Comisión para la Preservación del Patrimonio Histórico Cultural de la Ciudad de Buenos Aires, pp. 121-34. 4 Para un análisis de las razones que explican la aparición y el desarrollo de un asociacionismo puramente galaico en la Argentina, vd. Xosé Manoel NÚÑEZ SEIXAS. “A parroquia de alén mar: Algunhas notas sobre o asociacionismo local galego en Bos Aires (1904-1936)”. Semata. Ciencias Sociais e Humanidades, Santiago de Compostela, Universidade de Santiago de Compostela, vol. 11, 2000, pp. 345-79. 5 Pilar CAGIAO VILA. “A vida cotiá dos emigrantes galegos en América”, en id. (comp.), Galegos en América e americanos en Galicia, Santiago de Compostela, Xunta de Galicia, 11535, 1999, p. 128. 6 En 1879 nació también su homólogo de Corrientes, y más tarde lo harían los de Córdoba (1889), Rosario (1892), Barracas al Norte (1895) y Barracas al Sud (1899), todos de breve vida excepto el último. 7 Fueron 400 en 1910, 16.076 en 1917, 39.118 en 1932, 57.000 en 1938, alcanzando en 1961-1962 a su máximo histórico: 104.855. CAGIAO VILA; Vicente PEÑA SAAVEDRA (Comisariado). Nós mesmos. Asociacionismo galego na emigración – Asociacionismo gallego en la emigración. [Santiago de Compostela]: Consello da Cultura Galega, 2008, p. 28. 8 NÚÑEZ SEIXAS. “Asociacionismo local y movilización sociopolítica: notas sobre los gallegos en Buenos Aires: 1890-1930”. In: La inmigración española en la Argentina. Buenos Aires: Biblos, 1999, pp. 201-3. Sobre las primeras tres décadas del Centro Gallego de Buenos Aires, vd. RODRÍGUEZ DÍAZ, 2000. 9 Vicente PEÑA SAAVEDRA. Éxodo, organización comunitaria e intervención escolar. La impronta socio-educativa de la emigración transoceánica en Galicia. Santiago de Compostela: Xunta de Galicia, 1991, I, pp. 355-88. 10 Una explicación pormenorizada de los objetivos de estas sociedades, en NÚÑEZ SEIXAS. Emigrantes, caciques e indianos. O influxo sociopolítico da emigración transoceánica en Galicia (1900-1930). Vigo: Xerais, 1998, pp. 109-159. 11 NÚÑEZ SEIXAS, 2000, pp. 349-56, 375-9. Se ha calculado en 326 el total de escuelas construidas, dotadas y/o mantenidas gracias a la financiación de las sociedades de instrucción de América. Tan sólo a las de Argentina se debe la creación de 65, de las que 29 corresponden a entidades pontevedreses y 25 a las coruñesas. PEÑA SAAVEDRA, 1991 II, pp. 23-56. 12 Marcelino X. FERNÁNDEZ SANTIAGO. “Asociacionismo gallego en Buenos Aires (1936-1960). In: La Galicia austral. La inmigración gallega en la Argentina. Buenos Aires: Biblos, 2001, p. 186. 3 92 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías NÚÑEZ SEIXAS, 1999, pp. 207-9, 232; CAGIAO VILA, PEÑA SAAVEDRA, 2008, p. 23. Sobre la Federación, DÍAZ. Historia de la Federación de Sociedades Gallegas. Identidades políticas y prácticas militantes. Buenos Aires: Fundación Sotelo Blanco/Biblos, 2007. 14 En 1941 se crea el Centro Orensano (1941), al que luego siguen el Centro Pontevedrés (1942), el Centro Lucense (1942) y el Centro Coruñés (1950). Todos ellos reúnen a muchas de las antiguas pequeñas instituciones. 15 Ese fue, por ejemplo, el caso de Pro-Escuelas de Ferreira (San Sadurniño, A Coruña), cuyos afiliados continuaron contribuyendo al sostenimiento del edificio escolar hasta entrada la década de 1960. Vd. NÚÑEZ SEIXAS; Raúl SOUTELO VÁZQUEZ. As cartas do destino. Unha familia galega entre dous mundos, 1919-1971. Vigo: Galaxia, 2005 (particularmente, pp. 135-56). 16 X. FERNÁNDEZ SANTIAGO, 1999, pp. 183-4, 193-6; NÚÑEZ SEIXAS, 1999, pp. 232. 17 La terminación “al Sud” diferenciaba al pueblo del barrio porteño de Barracas al Norte, hoy simplemente Barracas. 18 Una síntesis de la Historia de esta zona del Conurbano bonaerense, en Ruy Gonzalo FARÍAS IGLESIAS. La inmigración gallega en el sur del Gran Buenos Aires, 1869-1960. Santiago de Compostela: Universidade de Santiago de Compostela, 2010, pp. 89-135. 19 Para un análisis en profundidad de la inmigración gallega en esta zona entre 1860 y 1960, v. FARÍAS IGLESIAS, 2010. 20 La más antigua de ellas es la Sociedad Española de Socorros Mutuos de Barracas (hoy Asociación Española de Socorros Mutuos de Barracas y Buenos Aires), fundada en 1862 y decana del mutualismo español en la Argentina desde la desaparición de la AESMdeBA. Trás Ella surgieron, en 1891, La Asociación Española de Socorros Mutuos de Barracas al Sud (luego de Avellaneda, aún en funcionamiento), la Asociación Española de Socorros Mutuos para Mujeres (1901), la Sociedad de Socorros Mutuos Española, (de 1913, con sede en Wilde), y la Sociedad Española de Socorros Mutuos de Valentín Alsina (de 1919, también activa). 21 Ruy FARÍAS. “La participación gallega en los inicios del asociacionismo mutualista español en Barracas al Sud (1862-1891)”. Ponencia presentada al Congreso Internacional El asociacionismo de la emigración española en el exterior: significación y vinculaciones, Zamora, 2012, 2013. 22 Ruy FARÍAS. “Unha sociedade galaica cun ámbito de referencia crioulo: O Centro Gallego de Barracas ao Sud / Avellaneda”. Estudos Migratorios: Revista Galega de Análise das Migracións (Nova Xeira). Santiago de Compostela, Consello da Cultura Galega, vol. II, nº 2, segundo semestre 2009 [2010], pp. 109-32. 23 V. Nova Galicia [NG], XIII: 424, 24.9.1913, p. 2; NG, XIII: 427, 5.11.1913, p. 3; NG, XIV: 431, 6.1.1914; NG, XIV: 433, 3.2.1914, p. 1; NG, XIV: 435, 4.3.1914, p. 3; NG, XV: 455, 5.2.1915, p. 1; “Grove – Provincia de Pontevedra”, Boletín Oficial del Centro Gallego de Avellaneda [BOCGA], XI: 116, 15.4.1913, pp. 17-8. 24 V. Federación de Sociedades Españolas dela República Argentina, 2006, p. 118. 13 93 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías La fecha de fundación y su primera denominación nos fueron proporcionados por el personal del Arquivo da Emigración Galega (a quién deseamos expresar nuestro agradecimiento), mientras que el dato de su cambio de nombre fue obtenido de: Argentina. Archivo Federación de Asociaciones Gallegas de la República Argentina – Museo de la Emigración Gallega en la Argentina, Correspondencia recibida, 16-VII-1940. En la década de 1940 se asiste a la aparición de otras entidades de distinto alcance territorial, que pretenden agrupar a los naturales de toda una provincia, o aspiran a reunir a todos los gallegos residentes en un mismo punto del antiguo territorio barraqueño. Así, en 1944 surgen la Agrupación Cultural y Recreativa Residentes de Galicia en Lanús, la Sociedad Cultural y Recreativa Residentes de Galícia em Valentín Alsina, y la Unión Provincial Orensana. Los datos referidos de éstas últimas y de Antas de Ulla nos fueron facilitados también por El personal del Arquivo. 26 La pérdida y/o destrucción de la documentación de este tipo de institución es algo bastante común. No obstante, existen importantes iniciativas destinadas a contener y revertir esta tendencia. En Galicia, el Arquivo da Emigración Galega lleva adelante desde hace años una enorme tarea de recuperación documental entre las sociedades gallegas en América. Aunque a otra escala, en el caso del país al que refiere este trabajo es de destacar la labor del Museo de la Emigración Gallega en la Argentina, sobre cuyos fondos documentales (y sus posibilidades para el estudio de la integración de los migrantes gallegos en el país) nos hemos referidos en otra parte. Vid. Uy FARÍAS. “El asociacionismo gallego en Buenos Aires y las posibilidades que ofrece para el estudio de la integración de los migrantes: un análisis a partir del archivo de la FAGA-MEGA”. Antíteses. Londrina, vol. 4, nº 7, junio 2011, pp. 151-71. http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/antiteses) 27 FARÍAS IGLESIAS, 2010, pp. 169-92. 28 Entre 1908 y 1944 el Partido se dividió en ocho cuarteles que, a grandes trazos, se corresponden con una serie de ciudades y localidades actuales:1º (Barracas al Sur / Avellaneda Centro), 2º (Crucesita y Sarandí), 3º (Piñeiro y Gerli), 4º (Lanús Este, Remedios de Escalada y Monte Chingolo), 5º (Valentín Alsina y Lanús Oeste), 6º (Villa Domínico y Wilde), 7º (Dock Sud) y 8º (Lanús Oeste y Remedios de Escalada). En el último de aquellos años, sin embargo, su territorio fue cercenado para crear el actual Partido de Lanús. 29 FARÍAS IGLESIAS, 2010, pp. 243-59. 30 Sobre el concepto de liderazgo y sus diferentes modelos entre las comunidades hispanas en América (con particular referencia al caso argentino), vd. NÚÑEZ SEIXAS. “Modelos de liderazgo en comunidades emigradas. Algunas reflexiones a partir de los españoles en América (1870-1940)”. In: De Europa a las Américas. Dirigentes y liderazgos (1880-1960). Buenos Aires: Biblos, 2006, pp. 17-41. 31 NÚÑEZ SEIXAS, 2000, pp. 346-7. 32 NÚÑEZ SEIXAS. “Lalinenses emigrados na Arxentinapola República: Notas a un discurso de 1931”. Descubrindo. Anuario de Estudios e Investigación de Deza, nº 3, 2001, p. 113. 25 94 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías Sobre el asociacionismo del municipio de Lalín y de la comarca del Deza en Buenos Aires, véase también Gustava HERVELLA GARCÍA; María SEIJAS MONTERO. LalínBos Aires, unha historia compartida. Lalín: Patronato Cultural de Lalín – Seminario de Estudios de Deza, 2001. 33 ARGENTINA. “Hijos de Lalín en Buenos Aires”, NG, III: 51, 30-X-1904, pp. 2-3. 34 ARGENTINA. “Sociedades”, NG: 252, 13-IX-1908, pp. 3-4. 35 Vd. NÚÑEZ SEIXAS, 2001, p. 113-6; NG: 275, 21.2.1909, p. 2. 36 ARGENTINA. “Sociedades. Hijos del Partido Lalín”, La Libertad, 1-XII-1917. 37 ARGENTINA. “Amor a Galicia”, en Boletín Oficial del Centro Gallego de Avellaneda, IV: 63, 31.10.1908, p. 15. 38 ARGENTINA. Archivo Hijos del Ayuntamiento de Porto do Son [HAPS], Actas de Asamblea [AA]: 6-IV-1918. 39 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 6-IV-1918. 40 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 24-XI-1918. 41 CAGIAO VILA. Muller e emigración. Santiago de Compostela: Xunta de Galicia, 1997, pp. 115-7. 42 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 25-I-1920. 43 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 18-IV-1918). En estas citas y en las que le siguen se ha respetado la ortografía original del documento. 44 FEDERACIÓN DE SOCIEDADES ESPAÑOLAS. Las Instituciones formadas por españoles en la Argentina. Buenos Aires: Federación de Sociedades Españolas de la República Argentina, 2006, p. 294. 45 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 24-XI-1918, 19-IX-1920, 29-V-1921. 46 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 23-V-1920. 47 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 31-VIII-1919. 48 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 7-VII-1918. 49 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 5-VI-1927. 50 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 25-I-1920, 23-V-1920. 51 José BARREIRO BARRAL Historia de Porto do Son y su distrito. A Coruña: Diputación Provincial de La Coruña, 1989, p. 155. Véase también Archivo HAPS, AA: 2-VIII-1925. 52 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 19-VIII-1928. 53 BARREIRO BARRAL, cit., p. 156. 54 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 19-VIII-1928. 55 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 29-IX-1918. 56 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 1-V-1932. 57 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 13-IV-1930. 58 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 15-VII-1933. 59 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 6-V-1938. 60 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 18-IX-1937. 61 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 19-VIII-1919. 95 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 26-V-1935. ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 26-VI-1938. 64 NÚÑEZ SEIXAS, 2000, p. 371n. 65 NÚÑEZ SEIXAS, 2000, pp. 365-7. 66 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 15-VII-1933. 67 Los datos de la ocupación de estas personas fueron obtenidos de: Argentina. Archivo Asociación Española de Socorros Mutuos de Avellaneda, Registro de Socios nº 4 (entidad a la que también pertenecían los nombrados). 68 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 25-I-1920. 69 V. Luis Fernán CISNEROSy otros, Historia de la Ciudad de Avellaneda. La evolución de su progreso edilicio, político y social. Buenos Aires: Ediciones Argentinas, 1926, p. 306; Centro Comercial e Industrial de Avellaneda. 4 de Octubre 1928. Número extraordinario XXV aniversario. S/l: Centro Comercial e Industrial de Avellaneda, 1928, p. 80. 70ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 25-I-1920. Sin bien la propuesta fue aprobada, Ben rechazó el nombramiento amparándose en sus muchas ocupaciones, no obstante lo cual se manifestó “dispuesto a contribuir con su obra en bien de sus paisanos”. Archivo HAPS, AA: 23-V-1920. 71 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 25-I-1920. 72 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 31-VIII-1919. 73 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 31-VIII-1919. 74 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 23-V-1920. 75 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 4-II-1923. 76 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 26-V-1935. 77 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 19-IX-1920. 78 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 31-VIII-1919. 79 NÚÑEZ SEIXAS, 2000, p. 373. 80 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 26-V-1935, 31-V-1936, 7-V-1944. De allí que no resulte extraño encontrar reiteradamente en los máximos puestos directivos a Rafael Enríquez, José Chouzas (seis veces, tres como Presidente), Ramón Santos (seis y dos), José Servia (cinco y una), Modesto Casal (cuatro y una), Agustín Sieira (cuatro y dos) o José Pillado (cuatro). 81 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 13-VIII-1921. 82 Puede servir como indicador de la pequeña escala de la economía de la sociedad, el dato de que para levantar entre 1905 y 1916 su sede social (un edificio ubicado sobre la Avenida Mitre, frente a la plaza principal del municipio), el Centro Gallego de Avellaneda debió desembolsar más de $ 24.000 por el lote de terreno, y otros $ 100.000 por la obra. Ruy FARÍAS IGLESIAS, 2010. 83 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 4-II-1923. 84 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 20-V-1923. 85 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 3-X-1926. 62 63 96 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: ¿?-IX-1928, 13-IV-1930. ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 5-VI-1934. 88 V. ARGENTINA. Archivo Centro Gallego de Avellaneda [CGA], Actas de Comisión Directiva [ACD]: 28-IX-1927. 89 ARGENTINA. “Nuestras Sociedades Gallegas”, La Colonia Gallega, I: 94, 24-VIII-1914, p. 3 90 Rudi VARELA. “Piñeiro”. In: Reseñas históricas de las localidades del Partido de Avellaneda. Avellaneda: Municipalidad de Avellaneda (mimeo), 1994, p. 65. 91 Esa documentación ha sido digitalizada y por la Secretaría Xeral de Emigración de la Xunta de Galicia (España), estando disponible hasta hace un tiempo en su página web (www.galiciaaberta.com). En ella también hemos consultado las ACD de la sociedad Residentes del Partido de Fonsagrada entre 1925 y 1936, las AA de la misma institución entre 1930 y 1939, y las ACD de Unidos de Fonsagrada y su Distrito de 1936 a 1939. 92 ESPAÑA. Archivo Secretaría Xeral de Emigración [SXE], Fondo OrfeónFonsagrada [OF], ACD: 19-V-1925, 22-VI-1925. Es interesante señalar que casi por los mismos días se fundaba también, pero en la Capital Federal, Residentes del Partido de Fonsagrada en Buenos Aires. Vid. Residentes del Partido de Fonsagrada, ACD: ¿?-V-1925. 93 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 19-V-1925. El Partido Judicial de A Fonsagrada incluye al municipio homónimo y a los de Baleira, Navia de Suarna, Negueira de Muñiz y Ribeira de Piquín. 94 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 21-V-1925, 20-VI-1925, 3-VIII-1925. 95 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 16-VII-1925, 9-IX-1925. 96 ARGENTINA. Archivo HAPS, AA: 29-IX-1918. 97 ESPAÑA. Archivo SXE,OF, ACD: 8-X-1925, 15-X-1925. 98 ESPAÑA. Archivo SXE,OF, ACD: 16-XI-1925, 17-XII-1925, 30-XII-1925. 99 Ruy FARÍAS IGLESIAS, 2010, p. 373n, 412. 100 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 10-III-1926. 101 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 27-VI-1925. 102 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 3-VIII-1925. 103 NG, IV: 115, 28.1.1906; NG, VII: 283, 18.4.1909; NG, XIII: 402, 20.10.1912, p. 3; ARGENTINA. Registro Provincial de las Personas, Sección Piñeiro, Actas de Matrimonio, AMRCP, 1920: 36; CGA, ACD: 14-XI-1916. Véase también NG: 303, 5.9.1909. 104 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 15-V-1925. 105 ESPAÑA. Archivo Secretaría Xeral de Emigración, Fondo Orfeón Fonsagrada, Actas de Comisión Directiva: 27-VI-1925. 106 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 19-V-1925. 107 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 20-VI-1925. 108 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 24-IX-1925. 109 NÚÑEZ SEIXAS, 2000, p. 371-2. 86 87 97 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê El microasociacionismo gallego en la Argentina en la primera mitad del siglo XX: una mirada al caso del Partido de Avellaneda Ruy Farías ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 6-II-1926. ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 22-X-1925. 112 ESPAÑA. Archivo SXE, OF, ACD: 5-XI-1925. 113 ESPAÑA. Archivo SXE, Residentes del Partido de Fonsagrada, AA: 19-IV-1936; Archivo SXE, Unidos de Fonsagrada y su Distrito [UFD], ACD: 19-IV-1936. 114 ESPAÑA. Archivo SXE, UFD, ACD: 15-I-1938, 30-IV-1938; “Sociedades Unificadas Baleira, Castroverde y Fonsagrada”, Ga, 562, 20-III-1938; “Unidos de Fonsagrada y sus Distritos”, Galicia [Ga] 568, 1-V-1938, p. 2; “U. de Fonsagrada y sus Distritos”, Ga, 601: 18-XI-1938, p. 2; España. Archivo SXE, UFD, ACD: 25-XI-1939; España. UFD, AA, 3XII-1939. 115 V. Una historia que no cesa: de los centros provinciales al Centro Galicia de Buenos Aires. S/l: Xunta de Galicia, 2004, p. 26. 116 Ruy FARÍAS, 2009. 117 ARGENTINA. Archivo AESMdeA, Registro de Socios nº 4; Asociación Española de Socorros Mutuos de Avellaneda (1941). 110 111 98 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê: E-imigração espanhola e espanhóis na diáspora O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido* Xosé M. Núñez Seixas Ludwig-Maximilians Universität München (Universidade de Munique) Resumo: O exilio galego de 1936-39 na Europa, em comparação com outros territórios da República espanhola, foi relativamente reduzido em termos quantitativos. Mais de mil refugiados galegos republicanos passaram pelos campos de internação do Sul de França em 1939, dos quais somente uma minoria - algumas centenas - puderam empreender o caminho para a América. Europa e, nomeadamente França, também foram um destino, passageiro muitas vezes, mas também definitivo em outras, de dezenas de guerrilheiros refugiados desde 1945. Muitos antifranquistas cuja emigração “legal” escondia seu mal estar com o regime encontraram fortuna como trabalhadores na França, Suiça, Alemanha ou outros países. Frente à maior atenção historiográfica que recebeu o exílio galego na América, os exilados na Europa passaram quase inadvertidamente na memória histórica da Galiza contemporánea. Mas a incidência dos exilados galegos na Europa na evolução do antifranquismo galego foi digna de menção. PALABRAS CHAVE: Migração – Exílio galego Guerra Civil Espanhola. Resumen: El exilio gallego de 1936-39 en Europa fue, em comparación con otros territorios de la República española, relativamente reducido em términos cuantitativos. Más de un millar de refugiados gallegos republicanos pasaron por los campos de internamiento del Sur de Francia en 1939, de los que solamente una minoría - algunos centenares – pudieron emprender el camino para América. Europa y, en particular, Francia también fue un destino, pasajero unas veces, definitivo otras, de decenas de guerrilleros refugiados desde 1945. Más tarde, muchos antifranquistas cuya emigración “legal” escondía su malestar con el régimen hallaro fortuna como trabajadores en Francia, Suiza, Alemania y otros países. Frente a la mayor atención historiográfica que ha recibido el exílio gallego en América, los exiliaddos en Europa pasaron casi desapercibidos en la memoria histórica de la Galicia contemporánea. Pero la incidencia de los exiliados en Europa sobre la evolución del antifranquismo gallego fue notable. PALABRAS CLAVE: Migración –Exilio gallego Guerra Civil Española Abstract: Exiles from Galicia after the Spanish Civil War (1936-39) in Europe were less abundant than those from other territories of the Spanish Republic. Yet more than one thousand Galician refugees came through Frehcn internment camps in 1939. Just some of them had the chance to continue their trip to America. Moreover, Europe and particularly France were a destination chosen by dozens of guerilla fighters who fled from Galicia after 1945. Later in the 1950s, many Antifrancoists migrated as “legal” workers to France, Switzerland, Germany and other countries. They wee also politically motivated. In spite of the fact that Galician exiles in Europe have been less treated by historiography, and remained ignored for the historical memory of contemporary Galicia, their incidence on the evolution of Galician antifrancoism was noteworthy. KEYWORDS: Migration – Galician exile Spanish Civil War. Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 99-121 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas O exilio galego de 1936-39 na Europa, em comparação com outros territórios da República espanhola, foi relativamente reduzido em termos quantitativos. Mais de mil refugiados galegos republicanos passaram pelos campos de internação do Sul de França em 1939, dos quais somente uma minoria - algumas centenas - puderam empreender o caminho para a América em alguns dos barcos fretados com esse fim. Europa e, nomeadamente França, também foi um destino, passageiro muitas vezes, mas também definitivo em outras, de dezenas de guerrilheiros refugiados desde 1945. Mais tarde, desde finais dos anos cinquenta, muitos antifranquistas cuja emigração “legal” escondia seu mal estar com o regime encontraram fortuna como trabalhadores na França, Suiça, Alemanha ou outros países, de acordo com os acordos de imigração subscritos entre Espanha e vários Estados europeus. Frente à maior atenção historiográfica que recebeu o exílio galego na América, os exilados na Europa passaram quase inadvertidamente em boa parte da memória histórica da Galiza autônoma desde 1980. Mas houve importantes núcleos de exilados galegos que atuaram na Europa, e sobretudo na França, desde 1939-40 e 1944 até 19751 e sua incidência na evolução do antifranquismo galego durante os anos finais da ditadura franquista foi igualmente digna de menção. Buenos Aires estava mais perto Os galegos eran poucos dentre os exilados espanhóis da Guerra Civil de 1936-39. Aínda que seja problemático fixar o seu número, até agora pode ser identificado um mínimo de 2.141 con nomes e sobrenomes. Sua quantidade total provavelmente não ultrapassa 3.000 pessoas. Cumpre levar em consideração, ademais, que os cômputos totais de republicanos espanhóis fixados nos campos franceses são muito díspares e, ao longo de 1939, seu total diminuiu como consequência do retorno de muitos refugiados à procura de trabalho fora do campo ou graças à reemigração. Entre junho de 1939 e abril de 1940 o seu número desceria de 173.000 a 30.000.2 Os galegos, mesmo supondo que seu número esteja infracontabilizado, não representavam mais de 6-7 por cento do conjunto de refugiados republicanos em finais de 1939. Até agora sabemos con segurança que uns 1.320 galegos, no mínimo, passaram pelos campos franceses.3 Segundo algumas fontes, em fevereiro de 1945 haveria na França ao redor de 1.800 exilados políticos galegos, além de cerca de 350 imigrantes “econômicos”.4 Essa desproporção traduzia, em princípio, uma questão aleatória. Dos territorios que cairam em mãos dos insurgentes no verão de 1936, puderam sair muito menos partidários da República, e Galiza era uma autêntica ratoeira, rodeada por mar, território rebelde vizinho e, ao Sul, o Portugal salazarista. Sair do país converteu-se em uma odisseia para dezenas de galegos, razão pela qual seu exílio tambén teve 100 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas alguns traços distintos no conjunto do exílio republicano espanhol.5 Quais foram estes? A) Foi um exílio que começou diretamente em julho de 1936, ao cair o território galego em finais do mês em mãos rebeldes. Nem sempre partilhou a experiência miliciana e o combate na guerra. Tratou-se também de um exílio que procurou a via direta Portugal-América, ou mesmo Galiza-América. E a passagem pela França nem sempre foi obrigatória. A emigração fronteiriça tinha lugar através de Portugal, ou do mar.6 B) Em parte por isso, os exilados galegos demonstraram menor tendência a permanecer na Europa do que os espanhóis. Uma amostra de perto de mil refugiados espanhóis residentes nos departamentos franceses de Aveyron, Hérault e Gard desde 1944 é bem significativa: os galegos estavam praticamente ausentes dela, como tambén o estavam em outros departamentos.7 Por outro lado, os exilados galaicos mostraram uma significativa predisposição de radicar-se na América, pois, se França era um país de acolhida natural dos exilados políticos espanhóis por razões de proximidade geográfica, para os galegos isso não tinha porque ser assim, nomeadamente por dois motivos. B. 1) Primeiro, por razões históricas que “redimensionavam” as distâncias. A França ficava mais longe para um lavrador ou marinheiro galego que Buenos Aires, Havana ou Montevidéu, destinos para os quais as correntes migratórias se dirigiram preferencialmente antes de 1936. As redes microssociais preexistentes possibilitaram que muitos exilados dispusessem de conhecidos e familiares em diversos pontos da América. B.2) Un segundo fator foi a excepcional importância que no caso galego adquiriram as coletividades organizadas e conscientizadas de emigrantes na América, como fornecedores de recursos, canalizadores de informações e como polos de atração. O exílio galego teve também por isso um centro de atração e gravitação fundamental, ainda que não exclusivo, no Rio da Prata e principalmente em Buenos Aires, cidade definida pelo político galeguista e escritor exilado e morto na Argentina Alfonso R. Castelao (1886-1950), como a “Galiza ideal”. Certo é que nem todos puderam recorrer a esses contatos, fosse por falta de oportunidades, tempo ou azar. Os exilados galegos que enfrentaram a guerra na zona leal, que atravessaram os Pireneus e ingressaram nos campos de refugiados do Sul da França (além dos da Tunísia e Algeria), que entraram na Legião Estrangeira francesa, ou que foram obrigados a serem trabalhadores forçados na Alemanha, a sobreviver na França de Vichy ou que participaram da Resistência francesa, tenderam a permanecer na Europa. Muitos casaram na França, o que não era de estranhar: os exilados galegos apresentavam uma alta taxa de masculinidade, já que 101 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas desde a Galiza poucas famílias inteiras puderam fugir.8 Os menos afortunados fizeram parte dos 10.000 republicanos espanhóis deportados para os campos de concentração nazistas, como o de Mauthausen, onde morreram uns 110 refugiados galegos - uns 2,2% do total de Rotspanier ali falecidos.9 Depois da libertação da França, uma boa parte desses exilados reemigraram para a Latinoamérica. Alguns, sem podermos estabelecer percentagens confiáveis, reintegraram-se nas atividades guerrilheiras no interior da Espanha e da Galiza. Outros mais permaneceram em diversos pontos da França. Os menos envolvidos em atividades políticas regressara à Galiza ao longo da segunda metade dos quarenta e nos cinquenta, con desigual fortuna. Uma pequena percentagem, sobretudo militantes do PCE, teve como destino final a União Soviética. Pode-se afirmar algo semelhante com relação a muitos dos exilados na década de 1940 pertencentes ao PCE, à CNT ou à guerrilha antifranquista, que acharam refúgio nas organizações existentes em solo francês. Nesse caso, contudo, também houve abundantes exemplos de reemigração para a América Latina, nomeadamente para Cuba. As organizações unitárias do exílio galego na Europa O exilio galego teve uma visibilidade relativamente escassa fora do Rio da Prata e, em menor medida, no México e na Venezuela. Em parte, porque só na Argentina e Uruguai o nacionalismo galego foi capaz de criar uma esfera pública autônoma ao redor de instituições e periódicos representativos. Essa relativa invisibilidade era consequência da maior escassez, frente aos exilados bascos e catalãs, da atuação coletiva diferencial de muitos imigrantes galegos, expressa na fundação de associações próprias, instituições específicas e representativas, escritos da imprensa ou círculos de sociabilidade formais em que se apresenta um espaço público próprio. A fronteira, por isso, entre o “exílio galego” e o que poderíamos definir como “participação galega no exílio republicano espanhol” nem sempre foi nítida. Para alguns tratava-se de espaços arredados, e acreditavam comumente que deviam se manter afastados, ainda que fosse apenas para evitar que as entidades de emigrantes se contaminasem “não só pelo espanholismo unitarista, senão pelo divisionismo partidário”.10 Para outros, um estava integrado de jeito orgânico no outro, ainda que mantivesse algumas especificidades organizativas. Para outros mais - talvez a maioria - não havia diferença nenhuma: o elo principal era a identidade de classe ou a identidade republicana espanhola. Boa parte dos exilados galaicos - e este foi o caso, nomeadamente, da França – não se integraram em círculos de sociabilidade formal, em organizações ou em agrupamentos de âmbito territorial especificamente galego, e não acataram outra autoridade suprema que a de suas organizações políticas. Só uma relativa minoria 102 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas apresentou uma conduta diferente. Dentre eles contaram-se sobretudo os exilados galeguistas, que fundaram instituições e organizações própias, e tentaram construir um âmbito institucional equiparável ao Goberno Basco ou à Generalitat da Catalunha, dando-lhe continuidade até 1975. Foi o caso do Conselho da Galiza, constituído en novembro de 1944 em Buenos Aires, que contou com delegações en vários países da América. Houve igualmente grupos especificamente galegos de exilados socialistas, cuja base de atuação localizaou-se no México. Por sua parte, os anarquistas refundaram, no exílio, o Grupo de Galegos Libertários, primeiro, e mais tarde a Confederação Regional Galaica, que manteve-se operativa na França ao redor de vários líderes refugiados nesse país, como Miguel Vázquez Valiño (1910-?) e Xosé Sánchez Triñanes. Estes estabeleceram relação com anarquistas galegos que mantinham atividade na Galiza e agiram como aglutinadores do exílio anarquista durante anos, editando en Toulouse un órgão próprio (Solidaridad) entre julho de 1948 e fevereiro de 1950. A marcha de Vázquez Valiño e outros anarcosindicalistas como emigrantes para o Brasil acabou, porém, com a presença organizativa dos cenetistas galegos na França.11 Os impulsores principais da constituição de organizações políticas do exílio galego na França foram sem dúvida os comunistas. Estes últimos integraram-se em vários países em estruturas que reproduziam a escala galega ou o esquema da política de “União Nacional” promovida polo PCE no nível espanhol. Em solo francês, um pequeno grupo de galeguistas, con apoio comunista, promoveram inicialmente a fundação da Frente Liberador Gallego (FLG), que surdiu em Toulouse em outubro de 1944 e editou nessa cidade um órgão própio: Galicia, desde julho de 1945. Segundo os seus próprios dados, provavelmente inflados, chegou a contar com 884 membros - uma maioria deles constituída por 633 guerrilleiros - em fevereiro daquele ano, dentre os quais 530 pertenciam ao PCE, 67 à anarcosindicalista CNT e 42 ao sindicato socialista UGT, ademais de 39 galeguistas.12 O seu objetivo confesso era a constituição de um organismo representativo de todos os partidos republicanos galegos com o fim de apoiar a luta guerrilheira e os núcleos clandestinos que atuavam no interior, que adotou o nome de Consello Insurreccional Galego, assim como representar a vontade autonomista do país, invocando o precedente de legitimidade do Estatuto de Autonomía prebiscitado em 28 de junho de 1936. Esse organismo havia atuado, por sua vez, como gérmem de um futuro Governo autônomo provisório quando se reinstaurasse a República na Espanha. Com esse fim, o FLG convidava o restante dos entes representativos do republicanismo galego, tanto partidos como alianças e comissões da América e Europa, a unir-se a ele. No verão de 1945 contava com a participação ou adesão de várias personalidades do exílio galego vinculadas ao PCE, a Izquierda Republicana e outros partidos, além de estabelecer conversas com representantes da União Republicana. Colheu as adesões de alguns exilados mais ou menos proeminentes como Manuel Portela Valladares 103 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas (1869-1952), político centrista radicado na localidade de Bandol; de Manuel Martínez-Risco (1888-1954), dirigente da Izquierda Republicana que, desde 1939, havia se refugiado em Paris, onde desenvolveu um importante trabalho profissional como cientista; e de César Alvajar Diéguez (1892-1965), governador civil da província de Soria em julho de 1936 e pertencente à Unión Republicana, tema a que se voltará mais adiante. Somaram-se também ao FLG outros representantes da UGT e do PSOE. Os autênticos promotores da organização eram, por isso, vários líderes e militantes comunistas que participaran de jeito muito ativo da Resistência francesa durante os anos da ocupação nazista, como o coronel corunhês e antigo oficial de Estado Maior da Marinha republicana José A. Paz Martínez, ou ainda o coronel García Acevedo ou Antonio Núñez, do partido Izquierda Republicana. A eles uniu-se o galeguista Xoán Xosé Pla (1906-?). Mas o autêntico e quase carismático líder da FLG era o antigo comandante do Quinto Regimento Jesús Liste Forján Enrique Líster (1907-1994).13 Como refundação do projeto original da FLG, que pretendia definir posições comuns dos republicanos galegos sob a tutela e orientação comunista no novo panorama de esperança da restauração republicana que surdiu após a constitução do Governo de concentração republicana presidido por José Giral no último terço de 1945, nasceu, em Toulouse, o Bloque Repubricán Nazonal Galego (BRNG), depois Conferencia de Unidad Gallega, fundada naquela cidade nos dias 21 e 22 de dezembro de 1945. O seu manifesto fundacional insistia na necessidade da formação de um Consello Xeral de Galiza na França no qual estivessem representados todos os partidos antifranquistas galegos, e nos que se fundissem em uma espécie de “grande movimento mundial dos republicanos galegos”, tanto a Alianza Nazonal Galega (procomunista) do México e do Uruguai como o Consello de Galiza promovido pelos deputados nacionalistas galegos a partir de Buenos Aires. Através dele seria coordenada a luta contra o franquismo através de um organismo supostamente constituído no interior da Galiza, um Consejo Nacional Gallego de la Resistencia, tradução do Consejo Nacional de la Resistencia proposto pelo PCE para toda a Espanha. Os objetivos do BRNG consistiam na reinstauração da República, posta em vigor na Galiza do Estatuto de Autonomia Regional, prebiscitado em junho de 1936, e na possibilidade futura de constituir uma Federación de Pueblos Hispanos, operando como um Goberno Autônomo provisório na Galiza quando se restabelecesse a República.14 O BRNG manteve certa atividade na esfera pública do exílio republicano na França entre começos de 1946 e os primeiros meses de 1948. Realizou de forma esporádica algumas conferencias e reuniões, transladando sua sede para Paris; e apresentou-se perante as organizações republicanas espanholas como o único e verdadeiro representante da causa autonomista e republicana galega, entrando en concorrência 104 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas aberta com o Consello de Galiza. Editou ademais um órgão bilingüe, Galiza, pelo menos até fevereiro de 1948. Em agosto de 1947, o BRNG organizou en Paris un ato de “afirmação republicana e galleguista” com adesão de várias entidades galegas da América e do Norte de África, com o objetivo de continuar a pressionar o Governo da República no exílio para que incluísse um ministro representante da Galiza. César Alvajar escreveu a história do movimento “autonomista” galego, e pronunciou-se pela união livre dos povos da Espanha, mediante uma “integração sem absorção”.15 Aínda que a sua atividade diminuísse desde essa data, o BRNG continuou existindo depois do desaparecimento da esperança de uma intervenção dos Aliados para derrubar Franco. Em começos de 1948 constituiu filiais entre os refugiados galegos radicados em Casablanca e na Inglaterra, e reuniu até 55 doadores nas suas subscrições, apesar de vários deles não serem galegos. Havia, em todo caso, contribuintes para a organização e para o periódico Galiza que residiam en diversas zonas da França: Paris, Marsella, Perpignan, o Jura, Albi, Isère, Le Havre, Nîmes, Vaucluses e Ussel.16 Um informe do Consulado Geral da Espanha em Paris, datado de 1948, estimava em 300 os membros ativos do BRNG que moravam na França. Em meados de 1948, porém, a organização desapareceu.17 Havia, enfim, outros exilados galegos na França e nos mais diversos pontos da Europa, mas que não estavam integrados em organizações de âmbito galaico, ou simplesmente achavam-se relativamente isolados em seus contextos geográficos. Era o caso, por exemplo, de Xosé Calviño Ozores, militante do PSOE e albacea do líder do socialismo espanhol Francisco Largo Caballero que, na década de 1960, servia de ligação com a Internacional Socialista e com o PSOE no exílio dos dirigentes do Partido Socialista Galego, com os quais colaborou estreitamente. Era o caso, também, do militante comunista Veremundo González Alejandro del Valle (19101986), que publicou em Paris vários livros em francês, galego e espanhol - como Poética Galicia (1973) e Cité de la nuit (1970) -, além de trabalhar para a emblemática Editorial Ebro.18 Fora da França residiam assim mesmo personagens isolados que protagonizavam atuações individuais em prol do galeguismo. Eis o exemplo de Alexandre M. Raimúndez (¿-1968), que, em começos dos anos trinta, estudante em Madrid, estivera vinculado ao semanario fascista La Conquista del Estado, logo aproximando-se do Partido Radical e se convertendo em profesor da Escola de Comercio de Barcelona, de onde fugiu para Londres, cidade na que se estabeleceu em plena guerra civil, temendo que sua fase fascista lhe custasse a vida. Nos anos quarenta, Raimúndez filiou-se ao galeguismo e promoveu os programas em galego que foram emitidos pela BBC entre 1947 e 1956, além de ser membro correspondente da Real Academia Galega.19 Nesse programa também colaborou o galeguista Plácido R. Castro (1902-1967), que se radicara na capital britânica entre 1949 e 1956 e trabalhou como locutor e crítico na BBC. Na Suíça chegaram alguns exilados galegos mais ou menos soberbos, caso do escritor e deputado republicano 105 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas em 1931 Ramón Mª Tenreiro, que ali faleceu em 1939, do diplomata Salvador de Madariaga ou, durante algum tempo, de uma das filhas de César Alvajar, Amparo Alvajar. Galegos podíam se encontar, de fato, nos destinos mais variados. Desde a Itália caso do advogado e jornalista Xosé María Domínguez García, de tendência socialista, que se radicou em Roma como funcionário da FAO - à Bélgica, destino final dos cenetistas José Conde ou Luis Chamorro. Várias dezenas de militantes do PCE, incluindo alguns marinheiros e “crianças da guerra” de origem galega, acabaram fixandos-e na União Soviética. Mais exóticos foram os casos do comunista corunhês Enrique Veira Catrufo, que, depois de cumprir condenação num cárcere franquista, acabou exilando-se, via París, em Budapeste; ou do também comunista Gumersindo Montero, que, depois de sobreviver escondido durante vinte anos em Meirás, saiu da Espanha e acabou por residir em Sofía.20 Nenhum deles, porém, nucleou atividades coletivas de âmbito galego nesses lugares. Poucos e divididos: O galeguismo exilado en Europa Na Europa, sobretudo na França, refugiaram-se e permaneceram até a morte destacados líderes políticos galegos que foram presidentes de Governo durante a II República e que, durante a década de 1930, jogaram de maneira mais ou menos oportunista com o galeguismo. Eram os casos do já mencionado republicano centrista Manuel Portela Valladares e do republicano corunhês Santiago Casares Quiroga (1884-1950), que se manteve afastado das brigas políticas do exílio republicano, apesar de manter certa solidariedade com o derradeiro presidente da República em guerra Juan Negrín e partilhar de sua posição até 1945. 21 Era equiparável ao caso de Salvador Etcheverría Brañas (1894-1957), republicano igualmente corunhês que, em 1955, se deslocou para a França a partir do México, para ocupar lugar no Goberno republicano no exílio.22 Alguns deles jogaram um papel pouco influente como representantes mais ou menos informais da causa galeguista em momentos pontuais, como Portela Valladares. O galeguismo organizado, porém, sempre teve na França uma presença política muito débil. Assim foi desde que, em agosto de 1939, os responsáveis do que restou da organização do Partido Galeguista (PG), perante a dispersão dos seus militantes nos campos de internação do Sul da Francia e as dificuldades para manter vínculos estáveis naqueles tempos de debandada - quando vários tentavam embarcar para a América -, delegaram ao Grupo Galeguista (filial do PG) de Buenos Aires a representação e direção do aparelho partidário do nacionalismo.23 Sintomático dessa debilidade foi sem dúvida a solidão que experimentou Castelao quando, nomeado ministro do Governo presidido por José Giral, se deslocou de Buenos Aires para a França e permaneceu um ano em Paris, entre julho de 1946 e agosto de 1947. O 106 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas Governo Giral, porém, não durou além de janeiro de 1947, incapaz de frear as tentativas dos socialistas liderados por Indalecio Prieto e parte da CNT de pactuar com os monarquistas. Tanto no novo gabinete presidido por Rodolfo Llopis como no posterior, sob a batuta de Álvaro de Albornoz, não houve nem representação galega nem muito menos galeguista. A presença de um ministro galego no Governo Giral fora uma reivindicação do BRNG, partilhada tanto polos galeguistas exilados como pelos atuantes no interior, assim como pelas demais forças republicanas galegas. Ainda que o candidato de Líster e do BRNG fosse Portela Valladares, as gestões de um enviado do galeguismo do interior e comissionado pela Xunta Galega de Alianza Democrática, Ramón Piñeiro (1915-1990), que viajou a Paris en fevereiro de 1946 e entrevistou-se, dentre outros, com Líster e com o presidente do Governo basco José Antonio Aguirre, conseguiram finalmente que, como ministro para representar a Galiza, fosse designado o deputado galeguista Alfonso R. Castelao. Castelao chegou a Buenos Aires da Francia com grandes esperanças. Mas as suas relações com os meios do exílio republicano galego naquele país foram acidentadas. Além de sua falta de influência política no seio do Governo Giral, Castelao sentiu-se menos isolado no plano pessoal do que no político na França, faltando-lhe o apoio organizativo dos seus correligionários e carente do colo acolhedor de uma coletividade significativa e organizada de emigrantes “econômicos” galegos mais ou menos influída pelo galeguismo, como era o caso na Argentina. Pelo contrário, os não muitos “galegos da França”, segundo escrevia em abril de 1947, eram, em sua grande maioría, exilados, fiéis à disciplina dos partidos republicanos e de esquerda que o ignoravam, “fazendo-se de surdo-mudos e e desejando me ver caído para apedrejar-me”. A indiferença dos galegos da França com relação à causa nacionalista convenceu-o mais do que nunca de que aquele país não podia ser “o centro de direção política do galeguismo /.../ a voz autêntica do exílio somente estava na América”.24 A política do exílio republicano espanhol na Europa seria uma metástase do cancro do “Madrid mexicano”, as intrigas políticas dos principais grupos exilados.25 As relações de Castelao com o único representante autorizado do PG residente na França caracterizaram-se ademais pelas contínuas desavenças políticas e pessoais. Quem teoricamente colocara-se a seu servizo operava, em verdade, por sua própria conta. Tratava-se de um personagem peculiar. Xoán Xosé Pla, farmacêutico natural de Viveiro, fora, em agosto de 1936, um dos organizadores das Milicias Gallegas en Madrid, cidade na qual fora surprenddido pela sublevação militar, que depois viria a ocupar o posto de secretário da Xunta Executiva do PG en Barcelona, entre meados de 1937 e início de 1939. Depois da guerra, Pla estabeleceu-se na localidade de 107 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas Montauban, onde sobreviveu como pôde durante os anos seguintes, tendo, talvez, participado em atividades de apoio ao maquis.26 Graças a isso, estabeleceu vínculos com vários grupos. Mantinha contatos estreitos com o PCE, porém também tinha boas relações com os serviços de informação do Partido Nacionalista Basco (PNV) na França. No plano político-estratégico Pla optava pelo PCE e pela política de “Aliança Nacional” promovida por aquele partido no âmbito galego, figurando entre os promotores do FLG e do BRNG. Nos seus escritos, pouco originais do ponto de vista teórico e redigidos sempre desde um prisma historicista, Pla defendia plenamente a reinstauração do Estatuto de Autonomía de 1936, no contexto da volta da República à Espanha, apesar de invocar a possibilidade da Espanha se converter em uma República federal, situada longe do (con)federalismo ibérico que era defendido polo nacionalismo galego no exílio.27 Apesar de manter sua militância no PG, Pla criticava a Castelao e ao “soidisant Consejo de Galicia”, considerando que aquele estava obrigado a se somar às iniciativas unitárias promovidas pelos comunistas, que reconheceriam o direito de autodeterminação das nacionalidades e mesmo da federação ibérica, para o qual o Pla também afirmava ter contatos com os exilados antisalazaristas residentes na França.28 Dois anos depois expunha que, dada a debilidade do galeguismo organizado na Francia, a estratégia mais inteligente havia ser “galeguizar” outras forças políticas, mediante a participação dos nacionalistas em organismos pluripartidários que reconhecessem os direitos nacionais da Galiza. Em meados de 1947, Pla seguia projetando a constituição de um novo organismo unitário que englobasse todas as forças republicanas galegas que estivessem contra uma negociação com os monarquistas - o que excluía parte da CNT e os socialistas da facção de Indalecio Prieto -, assim como movimentos apartidários e a representação dos emigrantes galegos que tivesse como norte os seguintes princípios: reinstauração da República, Autonomia e uma inconcreta aceitação do “feito diferencial” galaico. Projeto que mantinha em fevereiro de 1948.29 Tudo isso somava-se às desavenças estratégicas do próprio Castelao com os galeguistas do interior, que mantinham, por sua vez, uma relação epistolar paralela com o Pla. Essas divergências, que tinhm muito a ver com a desconformidade daquelas da atuação de Castelao como ministro, centradas na preponderância do dilema República/Monarquia, fundamental para boa parte dos exilados, frente ao de democracia/ditadura. Este último era o eixo privilegiado pelos galeguistas do interior, que participavam tanto da alianza GALEUZCA como, de modo lateral, da Alianza Nacional de Fuerzas Democráticas, não desaprovando uma solução transacional pactuada com os monarquistas, na qual a forma de governo da Espanha se decidisse em um referéndum, e na qual fosse garantida, igualmente, um espaço para o reconhecimento do autogoberno das “nacionalidades”.30 108 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas Castelao passou o tempo en Paris perambulando entre a Biblioteca Nacional, o Museu do Louvre e a sede dos nacionalistas bascos, situada no número 11 da Avenue Marceau. Significativo foi, certamente, que o líder mais carismático do nacionalismo galego não fosse capaz de criar, sequer, um único núcleo galeguista en Paris, como ocorrera durante sua estadía em Nova York, em 1939-40. Xoán Xosé Pla, pelo contrário, seguia mergulhado no seu próprio jogo. Afirmava, em janeiro de 1947 não representar o PG na França, assegurando que não existia organização nesse país para além de alguns simpatizantes e filiados dispersos.31 Mas, ao mesmo tempo e perante seus interlocutores no PCE, não só apresentava a si mesmo como delegado do PG na França, mas também como representante da ortodoxia e disciplina do partido frente às declarações “incontroladas” de que ainda era seu líder.32 Pla criara, em janeiro de 1945, o seu próprio grupo galeguista, a Irmandade Nazonalista Republicá Galega na Franza, da que sabemos que contava com “trisquel diretor” do que ele era o dirigente máximo, além de um parente (X. Antón Pla Fernández, talvez um irmão) como conselheiro e J. Fra Domínguez, residente em Metz, como secretário político, contando com a adesão de alguns outros galeguistas como Isolina Rocha ou García Trota. A sua sede deslocava-se entre Montauban e Toulouse, celebrando reuniões como grupo autônomo a partir, pelo menos, de 1946.33 Na década de 1950, já dissolvido o BRNG e estando cada vez mais afastado da órbita do PCE, Pla tambén criou outras organizações, como a Acción Republicana Nacionalista Galega, fundada por ele mesmo e alguns acólitos e familiares em 1956. Presidiu, igualmente, o Movimiento Republicano Antifascista de Liberación Hispana, constituído en 1954, no qual figuravam republicanos de várias tendências. Depois da atuação de Castelao na França, em agosto de 1947, e do seu estabelecimento definitivo en Buenos Aires até sua morte, em janeiro de 1950, o nacionalismo galego na França, sem o independente Pla, ficou desamparado e sem capacidade de interlocução direta - e de altura política - perante as instituções do Governo da República desterradas e presentes em Paris. Durante vários anos ninguém representou oficialmente o galeguismo no exílio europeu, até que a delegação de além mar do Conselho da Galiza passou a ser assumida, desde finais de 1957, pelo republicano liberal corunhês César Alvajar Diéguez. Durante a guerra, Alvajar fora por um tempo subsecretário de Propaganda do Ministério de Estado do Governo Negrín. Exilou-se com parte de sua família na Normandía e, em 1946-47, dirigiu em Paris o periódico La Nouvelle Espagne, voz oficiosa do Governo da República no exílio. Mais tarde editou também o periódico República, órgão da Ação Republicana Democrática Espanhola. A decisão parecia, porém, no mínimo peculiar, pois a trajetória galeguista de Alvajar até aquela fora discutível. Em 1931-32 ele se destacara por sua oposição ao autogoverno, por considerar que o país era demasiado atrasado, presa de redes 109 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas caciquistas e imaturo para aspirar à autonomia, se bem que, em 1936, tenha participado da campanha pro-Estatuto, graças, talvez, ao influxo íntimo de sua esposa, a militante galeguista Rita Amparo López-Jean (1885-1942). Durante a estadia de Castelao em Paris e apesar de sua adesão nominal ao BRNG, César Alvajar convertera-se em um dos seus principais apoios, concedendo-lhe até mesmo um modesto espaço nas páginas de La Nouvelle Espagne. Igualmente passou a adotar posturas essencialmente autonomistas e defensoras da aplicação do Estatuto de Autonomia de 1936, ainda que guardasse distância objetiva de qualquer veleidade etnonacionalista.34 Em agosto de 1947, Alvajar recebeu de Castelao a tarefa de representar a Galiza nos congressos e jornadas de caráter federalista e europeísta que se celebrariam, nos quais eram especialmente dinâmicos os nacionalistas bascos. Estes últimos não haviam contado com a participação de Castelao em algumas dessas reuniões, o que contrariara profundamente ao político galego, que considerava que a tradição federalista dos galeguistas era muito mais sincera que, nesse sentido, o oportunismo estratégico dos bascos.35 Alvajar, contudo, participou em alguns atos europeístas celebrados en Paris, junto com os nacionalistas bascos e catalães. Foi o caso da palestra sobre Rexionalismo político e cultural en España, que teve lugar no Anfiteatro Edgar Quinet da Universidade de Sorbonne, em junho de 1948.36 Não parece, entretanto, que o seu envolvimento nas atividades europeias tenha sido muito mais ativa. A partir de dezembro de 1957, depois que, a partir de Buenos Aires insistissem para que ele aceitasse a tarefa, César Alvajar manteve uma representação oficial do Conselho da Galiza na Europa. Os galeguistas portenhos tinham formas de custear economicamente a presença de um enviado próprio em Paris, também não se fiavam nas posições mantidas, no plano político, pelos galeguistas do interior, naquele momento, concentrados nas atividades culturais, pois, “no que se refere à política estão um pouco na lua”. Na qualidade de representante do Consello de Galiza, Alvajar assistiu a diversas reuniões com personalidades do esmorecente exílio republicano, tendo, sobretudo, participado das reuniões realizadas em Bruxelas pelo Conselho Espanhol do Movimento Europeu. Tanto ele, como, desde 1965, seu filho também exilado depois de 1945, Javier Alvajar (1920-1996),37 cansaram de insistir, perante os já velhos exilados em Buenos Aires, sobre a importância que representaria a participação no movimento federalista europeu para a manutenção das aspirações futuras da Galiza no autogoverno. A relação com Buenos Aires não era, en todo caso, singela. Aos inconvenientes gerados pela distância, acrescentava-se o fato dos portenhos pagarem mal e com atraso os gastos de representação e deslocamento de Alvajar; e aqueles nem sempre mostravam comprensão com as sutilezas da política europeia de posguerra. Ademais, as disputas entre os galeguistas do exílio e o núcleo principal do 110 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas nacionalismo galego, de praxe culturalista, do interior, deslocaram-se, de forma indireta, para París, pois as relações do delegado do Conselho da Galiza com os nacionalistas atuantes na própria Galiza era inexistente. Em finais da década de 1960, por exemplo, tanto Salvador de Madariaga coma o nacionalista basco Manuel Irujo e o catalanista Josep Mª Batista i Roca ofereceram dois postos para a Galiza, sendo um correspondente ao exílio e outro ao interior, no Consejo Federal Español do Movimento Europeu. O posto correspondente do “interior”, porém, jamais foi ocupado, em boa parte pela desconfiança que a partir de Buenos Aires gerava a figura de Ramón Piñeiro, que era porém do agrado do próprio Alvajar.38 O resultado foi a crecente falta de operacionalidade prática da delegação europeia do Conselho da Galiza, que só tinha existência no papel e graças ao hiperativismo de Alvajar. A delegação da Irmandade Galega constituída em Paris em 1963, presidida por César Alvajar e integrada por vários exilados, teve apenas um ano de vida.39 Fosse por desinterese ou desconhecimento, o certo é que os delegados do Conselho da Galiza mantiveram uma escassa relação com os jovens galeguistas da geração de posguerra que, nos anos sessenta estudavam em Paris, e que não entravam em contato com o movimento europeu. Ademais, o panorama político do galeguismo do interior começou a mudar rapidamente entre 1963 e 1964, quando surgiram dois novos partidos nacionalistas de orientação marxista, um de tendência socialista: o Partido Socialista Galego (PSG) e outro marxista-leninista: a União do Povo Galego (UPG). O novo protagonismo dos comunistas galegos O PCE como organização despendeu algumas energias para preservar uma esfera pública autônoma para o exílio galego na Europa, sobretudo na França. Neste último país, residiram líderes galaicos notáveis, como o valdeorrês Santiago Álvarez Gómez (1913-2002), Enrique Líster e muitos outros. Alguns desses exilados, como Manuel Bravo Silvares Mariño (1909-2001), tiveram uma destacada participação na Resistência francesa, e seguiram desempenhando diversas tarefas na agitação antifranquista a partir da Francia.40 Estabeleceram-se também na França numerosos expatriados que cruzaram a fronteira ao longo das décadas de 1940 e 1950; vários deles antigos membros da guerrilha. Muitos fixaram-se en Paris e em sua periferia, e ganharam certa relevância na direção do PCE a partir da entrada de Santiago Álvarez no Comité Central do mesmo, no VI Congresso de dezembro de 1959. Nele, Alvarez defendera, mais uma vez, o direito de autodeterminação da Galiza, Euscadi e Catalunha e mais a aproximação dentro da Galiza com os nacionalistas, já que considerava que os cenetistas e os socialistas se “diluíram” política e organizativamente, tanto no exílio como no interior. Anos despois, em fins de 1966, Álvarez promoveu entre os correligionários a revista doutrinal bilingüe Nova Galicia. 111 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas Os comunistas, ademais, mantiveram-se em contato permanente com a “Galiza real”, tanto a do interior como a encarnada pela nova emigração econômica. Primeiro, porque vários deles foram enviados à Galiza entre 1945 e 1965 para dirigir a luta guerrilheira e, anos depois, abandonada a opção armada, para reorganizarem o PCE e entrarem em contacto com os núcleos das Comissões Operárias (CC.OO.) emergentes nos novos núcleos industriais nas cidades de Ferrol e Vigo. Foi o caso de Santiago Álvarez, enviado à Espanha em finais de 1944 e encarcerado por algum tempo, até o seu indulto em 1954, depois que se estabeleceu na França; mas, também, posteriormente, de Amador Martínez Fernández Ramón (1914-2007), antigo combatente do maquis francês e empregado na Editorial Ebro de París, que residiu na Galiza por orientação do PCE, entre 1960 e 1965. Ramón contribuiu, em muito, para conseguir novos adeptos para o partido, além de organizar núcleos sindicalistas nos estaleiros Bazán de Ferrol.41 Dessas idas e vindas também se foi derivando un “pingar”, modesto porém constante, de visitas de estudantes galegos comprometidos com o PCE em Paris na década de 1960, asim como de viagens e retornos de ativistas e exilados. A capital francesa converteu-se, assim, em unha meca dos “novos exilados” políticos desde fins da década de 1960. Ativistas estudantis ou operários que, quando tinham problemas com a polícia franquista, fugiam para a capital francesa, onde existia uma estrutura partidária que os acolhia, da qual participavam, também, emigrantes e estudantes mais ou menos boêmios. Varios dirigentes comunistas galegos realizaram estadias de semanas ou meses na Francia durante a década de 1960, com a desculpa de exercer algum trabalho ou visitar parentes imigrados no país.42 Além dos Pireneos, esses militantes combinavam o ativismo político com o cultural, asim como o contato com a emigración “econômica” e com o exílio político. Da comunicação entre os exilados e os atuantes no interior, assim como das conversas de Santiago Álvarez com os exilados galeguistas na América Latina nasceu, também, o projeto de fundar um PC da Galiza, imitação do PSUC da Catalunha ou do PC de Euscadi. Era uma ideia que já desabroxara, em anos anteriores, no Mexico, e que fora exposta por Santiago Álvarez no VII Congresso do PCE (agosto de 1965), com o apoio de Enrique Líster. Finalmente, a reunião fundacional do PCG teve lugar em Paris em dezembro de 1968, com a presença de delegados da Galiza e do exílio. No seu primeiro Comité Central figuraram o próprio Líster, Álvarez, Amador Martínez e outros exilados.43 Os comunistas envolveram-se, de jeito consciente, na tarefa de ganha adeptos entre as centenas de imigrantes galegos que foram chegando à França, Suíça e outros países na década de 1960, em sua maioria trabalhadores da indústria e da construção. Muitos deles socializaram-se nas organizações sindicais autótonas e, ao voltarem à Galiza na década de 1970, converteram-se em ativistas ou quadros sindicais de 112 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas grande valor. São casos dificilmente quantificáveis e, certamente, só poucos alcançaram postos dirigentes de relevância dentro das organizações políticas e sindicais operárias da Galiza desde meados da década de 1960. Tudo indica, porém, que os comunistas colheram, nesse ponto, um notável êxito, assim como, frente ao que acontecia na América, tanto na França como na Suíça existiu uma estreita imbricação entre exilio político antifranquista e emigración “econômica”. Alguns emigrantes “econômicos”, como Santos Costa Barroso, foram captados na França pelo PCE, que o reenviou como liberado à Galiza, onde ele exerceu un papel catalizador decisivo nas organizações das Comisións Campesiñas nas províncias de Lugo e Ourense.44 Foi tambén o caso de Fernando Miramontes, um dos primeiros dirigentes do PCE em Ferrol. Ele fora imigrante em Grenoble, onde se “impregnou da cultura da esquerda” e, no seu retorno, fundou uma pequena empresa familiar de trabalhos de gesso. Apesar de ser um dos poucos líderes comunistas da região que não trabalhava como operário nos estaleiros, sua socialização política na emigração o “ganhara” para a causa comunista.45 Os militantes comunistas tiveram uma presença e influência destacadas no mundo associativo dos imigrantes galegos, sobretudo na França e na Suíça. Em boa parte, agiram nesse âmbito como aríetes de conscientização social e cultural. No caso francês, onde a coletividade galega imigrada antes de 1936 era muito escassa, os expatriados de 1936-39 tenderam a integrar-se nos círculos de sociabilidade e instituições próprias dos republicanos espanhóis, ou nas instituições espanholas em geral. Nas primeiras associações galegas que nasceram em Paris em finais dos anos cinquenta, como a Casa de Galicia, fundada em 1958, os exilados republicanos e os comunistas jogaram um papel protagonista: o seu primeiro secretário foi Javier Alvajar e, dentre seus fundadores, contou-se, também, Salvador Etcheverría. Nos seus estatutos, a associação fazia o discurso do apoliticismo e do neutralismo em matéria ideológica e religiosa, proclamando como objetivos um renovado interesse pela cultura galega: “reunir a todos os galegos e amantes da Galiza residentes na França, com o fim de exaltar os valores galegos, realizar estudos econômicos e linguísticos, fomentar e difundir a cultura e outras manifestações artísticas oo de qualquer índole que se produzam ou se hajam produzido na Galiza”. A assembléia de sócios, porém, aprovou pouco tempo depois um regulamento de regime interior, em cujo artigo primeiro se especificava que a Casa da Galícia “orientará suas atividades no sentido de enaltecer as liberdades regionais, artísticas e literárias da Galiza”, o que tornava explícita uma certa vontade reivindicativa.46 Esta também ficava patente nas suas primeiras revistas - como Ecos dos Celtas e Galicia en Francia -, que faziam o papel de um galeguismo cultural temperado, se bem tenha tendido a esmorecer na década dos sessenta. As características da inserção sociotrabalhista dos emigrantes galegos nas sociedades de acolhida europeias durante a década de 1960 113 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas explicam igualmente porque uma parte considerável dos novos emigrantes ‘econômicos’ se sintonizassem com as posições dos exilados que militavam nessas instituições. Como ocorrera na América, porém, para muitos dos a elas filiados os serviços recreativos e a oferta de lazer e sociabilidade era mais importante do que as atividades políticas e culturais. Um caso paradigmático da incidência dos novos exilados na reordenação do panorama associativo dos imigrantes galegos foi aquele protagonizado por vários comunistas em 1973. A raiz da repressão da greve de Ferrol de março de 1972, cinco ativistas do PCE (Francisco Fernández Filgueiras, J. J. Miraz, J. Mª Cabado, José Caneiro e Ramiro Romero) acabaram por refugiar-se na França, depois de seguir diversos caminhos, até mesmo através da URSS. Ali, a organização do PCE procurou-lhes trabalho. Ao comprovarem que o Centro Galego de Paris, nova institução criada em 1970, girava na órbita de Enrique Líster - expulso do partido -, decidiram fundar, em 1973, um novo centro, com o nome de Asociación Cultural O Toxo. Em seu seio, as angueiras culturais, recreativas e mutualistas combinaram-se com apoio dos exilados e mais as ações de protesto contra a ditadura franquista. Dessa instituição aproximou-se, também, o grupo de nacionalistas de esquerda já operante em Paris. O grupo editou alguns folhetos, como o curioso opúsculo Galicia un pobo unha nación (1975), primeira parte que chegava até a Idade Media de uma coleção de divulgação da Historia da Galiza, com o fim de “por em destaque o subdesenvolvimento da consciência histórica da Galiza”. O grupo também publicou um boletim integramente escrito em língua galega, intitulado Sempre.47 Nesses e em outros centros da coletividade imigrante na Francia desenvolveu-se uma cultura política específica, que combinava o culto à memória da II República espanhola (celebrando o 14 de abril), com o movimento operário e mais as próprias efemérides do nacionalismo galego, agora incorporadas ao seu próprio calendário comemorativo. Não ficou à margem dessa influência o fato das associações galegas na Francia, como em outros países de Europa, manterem, nas décadas que se seguiram, um certo galeguismo cultural, ainda que, em sua maioria, no passassem do bilinguismo galego-castelhano, usual na cultura política dos comunistas galegos nesse momento, ou do trilinguismo galego-castelhano-francês.48 Para essa pujança cultural também contribuiu a influência de algumas personalidades galegas de certa relevância intelectual, profissional ou intelectual, que desenvolviam seu trabalho em diversos aspectos. Era o caso do locutor de radio e escritor Ramón Chao (1935), muito próximo do PCG nos anos finais do franquismo que, entre 1959 e 1968, teve sob sua responsabilidade um espaço mensal em galego na Radio France. Ou do poeta José Ángel Valente (1929-2000) que, durante os anos sessenta e setenta, trabalhou como tradutor da ONU em Genebra. 114 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas Os sobreviventes dos partidos operários de forte enraizamento antes da Guerra Civil, mas cuja organização fora desmantelada pela repressión e não conseguiram desenvolver uma nova estrutura no posguerra, também encontraram uma fonte de esperança e de formação política no exílio europeu. Foi o caso de Ramiro Pose Díaz, operário ferrolã que, em junho de 1968, visitou parentes exilados que moravam em Roissy (Francia). A vivência do maio parisiense de 68 levou-o a se afiliar ao PSOE na França, convertendo-se, assim, no único militante que o partido tinha em Ferrol. Durante os anos seguintes, o único contato que Ramiro Pose teve com o PSOE foram os cursos de verão da organização no Sul da França.49 O passo do novo nacionalismo galego por Europa O novo nacionalismo galego de esquerda, que nasceu nos anos sessenta também teve alguma presença na Europa. Na Francia, o seu impacto foi inferior ao dos comunistas. A atuação dos nacionalistas galegos, porém, foi muito mais relevante e, sobretudo, conseguiram mais apoios em outros países de imigração galega recente. Foi o caso da Suiça, principalmente de Genebra. Nessa cidade, na que moravam uns oito mil galegos no início dos setenta, o novo nacionalismo de esquerda teve presença organizada desde 1972 ao redor de imigrantes “econômicos” e de alguns estudantes, tendo conseguido penetrar e influir em algumas das entidades mais importantes fundadas pelos imigrantes. Nomeadamente, a sociedade A Nosa Galiza de Genebra, constituída en 1967 sob um forte influxo do PCE. A UPG conseguiu recrutar, desde início dos anos setenta, vários militantes na Suíça, assim como ali implantar, durante algum tempo, o boletín clandestino do partido: Terra e Tempo. Em Genebra também se reuniu, pela primeira vez, um congresso de delegados da UPG na emigração (janeiro de 1973) e foi editado um porta-voz para a diáspora: Galiza emigrante, em março de 1974.50 O relativo êxito da UPG na Suiça não é imputável a exilados, mas, sobretudo, à presença de alguns quadros nacionalistas de grande dinamismo, como Carlos Díaz Martínez (1951-2007), que chegara a Genebra, com seus pais, com a idade de onze anos e, mais tarde, licenciou-se em Sociologia. Díaz não só impulsou as atividades políticas da UPG, como também um editorial em galego a partir de 1973: Roi Xordo. O ímpeto nacionalista, entretanto, tinha igualmente relação com o fato de que enquanto na Francia o PCE já ocupara de forma predominante o terreno das associações galegas, graças à presença dos que se exilaram antes da onda massiva de imigração galega nos anos sessenta, na Suiça aqueles não existiam, razão pela qual se abriam mais possibilidades de atuação para os novos nacionalistas. Estes, de fato, chegaram ao poder em A Nosa Galiza no ano de 1973 e, diante da oposição do PCG, acabaram por promover uma divisão - a Irmandade Galega na Suíça -, asim como uma federação de sociedades galegas do país, situada na órbita do nacionalismo.51 115 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas Na França, pelo contrário, os nacionalistas tiveram um menor espaço de influência na coletividade imigrante. Tenderam, assim, mais a chercher les bretons, levados, em parte, por uma antiga querência celta. Uma mostra sintomática foi que, quando um novo Xosé Manoel Beiras (1936) se deslocou, pela primeira vez, para Paris para realizar estudos, em 1957, ali contactou apenas exilados galegos, além de alguns pintores galegos como Virxilio Fernández Cañedo (1925-2011) e Manuel Colmeiro (1901-1999), estabelecidos na capital francesa. Em contrapartida, Beiras viajou à Bretanha, para conhecer, em primeira mão, os círculos nacionalistas bretões da Universidade de Rennes. Encontrou os nacionalistas bretões, segundo recordou anos depois, em um estado ideologicamente pouco desenvolvido. O contato com eles e com alguns occitanos, porém, serviu-lhe como “contastação de que existiam realidades nacionais sem Estado e pessoas, coletivos de cidadãos dessas nações sem Estado, concretamente na Bretanha, onde tinham plena consciência do fato.”52 Alguns anos mais tarde chegaram a Paris outros jovens nacionalistas galegos vinculados à UPG, fosse como emigrantes econômicos ou como refugiados políticos. O âmbito prioritário das relações políticas eram os ativos, apesar de minoritários, círculos de nacionalistas bretões e occitanos, de uma parte; e o contato com a organização da UPG en Genebra, por outra, assim como a constituição e extensão de núcleos vinculados à UPG. Os seus integrantes foram recrutados, sobretudo, entre emigrantes, estudantes e profissionais galegos radicados na Suiça, Alemanha, Países Baixos e Reino Unido. Neste último caso influindo no Grupo de Traballo Galego de Londres, constituído em 1970, do qual faziam parte jornalistas e profissionais residentes naquela cidade, como Fernando Pérez-Barreiro (1931-2010), Carlos Durán, o galaico-argentino Ricardo Palmás (1940-1996), Xavier Toubes ou o pintor Manuel Fernández-Gasalla.53 A concorrência mais pesada foi establecida com o PCE/PCG que, como vimos, estabelecera bases cruciais entre as sociedades de imigrantes, com as quais os novos nacionalistas rivalizavam no sentido de captar simpatias, a pesar de, às vezes, também colaborarem em questões comuns. Um bom exemplo foi a caminhada na França de um dos fundadores da UPG, Luís González Blasco Foz (1941), a partir de 1968, ano em que se viu forçado a cruzar a fronteira devido à perseguição sofrida por suas atividades políticas clandestinas na Galiza, até 1975. Pela capital francesa, também, circulava Henrique Harguindey Banet (1946), na época leitor de espanhol em Compiègne e depois em Brest, e algum estudante a mais que tivesse algum vínculo com a UPG na Galiza. Na capital francesa, Foz estudou na Universidade de París VIII e, junto com outros imigrantes galegos comprometidos e mais alguns jovens que completavam sua formação em Paris, como o estudante de Sociologia e Música e futuro cantor Amancio Prada (1949), jogou um papel destacado na constituição de março de 1970 da Seção de Atividades Culturais da Casa da Galiza, que se caracterizaria por seu carácter comprometido 116 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas com a língua e a cultura galegas. A comissão, porém, esmoreceu em pouco tempo, em parte pela constante rivalidade entre a UPG e o PCG, que tentava manter o seu campo de influência nas associações de imigrantes.54 Por sua parte, o estudante de doutoramento e posterior professor de Ciência Política Xosé Vilas Nogueira (19362010), vinculado à UPG, também exerceu o papel de ligação da organización em Paris durante seu período de estudos nessa cidade, entre outubro de 1974 e maio de 1975, dedicado-se, junto com Foz, a fomentar os contatos com outras organizações nacionalistas da esquerda radical, notadamente a basca ETA e os catalãs do PSAN. Um pequeno núcleo de filiados e simpatizantes da UPG, tanto militantes expatriados como estudantes na cidade, também desenvolveu atividades em Toulouse a partir de 1971.55 Os ativistas da UPG tiveram apenas algum contato com Javier Alvajar, mas o delegado do Conselho da Galiza não gostaba muito deles por serem comunistas. Mais relevantes foram as seus negócios no terreno das relações com partidos semelhantes de outras nações sem estado europeias. Os vínculos estabelecidos na capital francesa com membros de partidos nacionalistas de esquerda da Bretanha e da Occitania, como a Union Démocratique Bretonne, Lutte Occitane e outros grupos – surdidos, em sua maioria, da ‘onda’ anticolonial e da nova esquerda que se seguiu à revolução de maio de 1968 e à expansão das teorias do occitano Robert Lafont -, asim como a receção do modelo político e organizativo dos movimentos de libertação nacional do Terceiro Mundo, começando pelo exemplo argelino, facilitaram a importante participação da UPG na redação e asinatura da Carta de Brest (1974). Esse documento programático resumia os postulados do colonialismo interior e da conjunção entre nacionalismo subestatal e a nova esquerda, que foi muito característica de vários partidos nacionalistas subestatais da Europa Occidental entre 1965 e 1975. A importância da França e da Suiça como lugar de exílio dos novos nacionalistas viu-se subitamente eclipsada pela ascensão de Portugal, que tornou-se un ótimo lugar de refúgio dos ativistas da UPG depois da revolução “dos cravos” de abril de 1974. No norte de Portugal o partido estabeleceu vários militantes - como a jornalista Margarita Ledo Andión (1951) ou o próprio Foz - desde o outono daquele ano, imprimiu folhetos e propaganda, participou de alguns atos políticos durante o tumultuado periodo do “Processo revolucionário em curso” que se seguiu à queda do regime salazarista, e com o apoio de organizações da esquerda armada lusa tentou colocar em marcha, com poucos resultados, um comando de ação direta, além de promover un programa de radio em galego a partir do Porto.56 Alí foi, também, onde, em abril de 1975, foi apresentada em público a Asemblea PopularNacional Galega (AN-PG), organização política de ‘masa’ da UPG, que depois seguiria outros caminhos. 117 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas A Europa, portanto, também teve certa importância para o novo nacionalismo galego, como centro cultural e como lugar donde se via o mundo exterior e onde tanto Beiras como os ativistas da UPG contactaram outros nacionalistas subestatais. Foi alí onde os teóricos e os que forjaram o nacionalismo galego de esquerda conheceram, em profundidade, o exemplo argelino e outros nacionalismos anticoloniais, modelo influente na adoção da estratégia de “frente” interclasista e “patriótica”; onde esses ativistas familiarizaram-se com as teorias do colonialismo interior, lendo autores como Robert Lafont, Frantz Fanon ou Albert Memni. Mais do que tudo, isto aconteceu, en boa medida, malgré o exilio de 1936, e non grazas a ele. Notas e referências Tradução livre da editora. Cf. Xosé M. NÚÑEZ SEIXAS. “¿La otra Galicia ideal? Sobre el exilio gallego en Francia (19391975)”, in Mª LLOMBART HUESCA (ed.). Identidades de España en Francia. Un siglo de exilios y migraciones (1880-2000). Granada: Comares, 2012, pp. 179-204. 2 G. DREYFUS-ARMAND. El exilio de los republicanos españoles en Francia. De la Guerra Civil a la muerte de Franco, Barcelona: Crítica, 2000, p. 72. 3 Repertorio biobibliográfico do exilio galego. Unha primeira achega. Santiago de Compostela: Consello da Cultura Galega, 2006. 4 Informe A colonia galega na Franza, s. d. (ca. febreiro/marzo de 1945), en Fundación Penzol-Fundo Fernández del Riego, Vigo (FP-FFR). 5 NÚÑEZ SEIXAS. “Itinerarios do desterro: Sobre a especificidade do exilio galego de 1936”, in X. M. NÚÑEZ SEIXAS e P. CAGIAO VILA (eds.). O exilio galego de 1936: Política, sociedade, itinerarios. Sada-A Coruña: Eds. do Castro / Consello da Cultura Galega, 2006, pp. 11-51. 6 J. RUBIO. La emigración de la Guerra Civil de 1936-1939: Historia del éxodo que se produce con el fin de la II República Española. Madrid: Ed. San Martín, 1977, 2 vols, v. I, p. 268; G. DREYFUS-ARMAND, 2000, pp. 186-91. 7 Como bem escrevia César Alvajar em 1958, “a geografía de nossa guerra determinou uma mínima emigração galega na França, frente a uma muito numerosa basca e outra catalã”. Carta a Ramón Suárez Picallo, 13 de abril de 1958, citada em A. ERIAS MARTÍNEZ. “Lembranza de Javier Alvajar e unha viaxe pola correspondencia del e de seu pai con Ramón Suárez Picallo”, Anuario Brigantino, 31, 2008, pp. 153-90. 8 O exilado galeguista e depois comunista Ramón de Valenzuela (Era tempo de apandar. Vigo: A Nosa Terra, 1977, pp. 97-114) narrou como vários dos seus companheiros galegos de exílio se estabeleceram, por diversas vias, na França. Um namorou uma negociante de sedas e, posteriormente, viajou a Nova York em primeira classe; outro empregou-se com jardineiro; um terceiro tornou-se camponês em uma granja; outro mais pôs-se a trabalhar com um afiador ourensã, conterrâneo seu e casado desde muito tempo com uma francesa. 9 L. VÁZQUEZ FERNÁNDEZ. “Máis de 100 galegos foron morrer a Mauthausen (Austria)”. Grial, 75, 1982, pp. 107-14. 10 Carta de Castelao aos galeguistas do interior, 31 de março de 1946. A. R. CASTELAO. Obras. Vol. 6. Epistolario, Vigo: Galaxia, 2000, pp. 593-614. * 1 118 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas D. PEREIRA GONZÁLEZ; E. FERNÁNDEZ FERNÁNDEZ. “Os libertarios galegos e o seu exilio”, in NÚÑEZ SEIXAS; CAGIAO VILA. (eds.). O exilio galego, 2006, pp. 243-70. 12 Vid. informes de Xoán Xosé Pla ao Consello Directivo do Partido Galeguista, Montauban, 20.3.1945, e A colonia galega na Franza, s. d. (fevereiro/março 1945), FP-FFR. 13 “Editorial” e “Manifiesto del ‘Frente Libertador Gallego’”, Galicia. Órgano del “Frente Liberador Gallego”, 1:1, 25 de julho de 1945, pp. 1-2 e 4-5. Igualmente, carta de Xoán Xosé Pla ao Comité Executivo do Partido Galeguista, Montauban, 1 de agosto de 1945. Archivo del Nacionalismo (AN), Bilbao, EBB-210-4. 14 Carta de José A. Paz a Alfonso R. Castelao, Toulouse, 30 de janeiro de 1946, acompanhando o manifesto fundacional do BRNG (¡Gallegos!¡Compatriotas todos!), in Fundación Penzol (Vigo) – Fundo Castelao (FP-FC); conclusións da Conferencia de Unidad Gallega, in Fundación 10 de Marzo (Santiago de Compostela), Fundo Amador Martínez (F10M-FAM), Caixa 114; A. Núñez, “Hacia la unidad gallega republicana”, Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 5 (maio de 1947), p. 1; E. Líster, “Para qué necesitamos un Consejo General de Galicia”, Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 6 (junho 1947), pp. 1 e 3; J. A. Paz, “¡Galegos! ¡Ergueitos pra Sega!”, Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 8 (fevereiro de 1948), p. 3. 15 Carta do BRNG (cópia) ao PNV, París, 12 de agosto de 1945, in AN, EBB-208-4; um resumo da palestra de Alvajar está reproduzido em ERIAS MARTINEZ, 2008, pp. 334-35. 16 Cf. Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 8 (fevereiro de 1948), p. 2. 17 V. SANTIDRIÁN-ARIAS. “Política do exilio”, in X. M. NÚÑEZ SEIXAS; P. CAGIAO VILA (eds.). O exilio galego, 2006, pp. 217-42. 18 X. VARELA SIEIRO. “As manifestacións culturais galegas en París na segunda metade do século XX”, in D. Kremer (ed.). Actas do VI Congreso Internacional de Estudios Galegos: Un século de estudios galegos, Galicia fóra de Galicia. Sada / Tréveris: Eds. do Castro / Universität Trier, 2010, v. 2, pp. 1007-16. 19 A. R. DE TORO SANTOS. “Introdución”, in id. (ed.), Galicia desde Londres. Galicia, Gran Bretaña e Irlanda nos programas galegos da BBC 1947-1956. Oleiros: Tambre, 1994, pp. 31-46. 20 Dados retirados do Repertório, cit. 21 Mª I. GÓMEZ-RIVAS. “El exiliado de la calle Vaugirard”, in E. GRANDÍO SEOANE e J. RODERO (eds.), Santiago Casares Quiroga, la forja de un líder. Madrid: Eneida, 2011, pp. 197-225. 22 E. GRANDÍO SEOANE. “Entre a ilusión e a desesperanza: Salvador Etcheverría Brañas (19371957)”, in NÚÑEZ SEIXAS e CAGIAO VILA, P. (eds.). O exilio galego, 2006, pp. 413-28. 23 Cartas de Xoán Xosé Pla ao Grupo Galeguista de Buenos Aires, Melun, 2 de agosto de 1939 e 5 de agosto de 1939 (FP-FC). 24 Carta de Castelao a Xoán Xosé Pla, París, 16 de abril de 1947. A. R. CASTELAO. Cit., pp. 638-40. 25 Carta de Castelao a Alfredo Somoza, Buenos Aires, 29 de dezembro de 1947. Ibid., pp. 684-89. 26 Vid. alguns exemplos de octavillhas em galego, com objetivo de alentar os refugiados galaicos a participar en atividades de resistência contra os “boches” durante a ocupação da França, en Copia de duas octavillas que foron distribuidas perante [sic] o periodo de clandestinidade, FP-FFR. 27 X. X. Pla, “En torno ao Estatuto”. Galicia. Órgano del “Frente Libertador Gallego”, 1, 25 de julho de 1945, pp. 7-8; id., “Presenza e loita da nazón galega”. Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 6 (junho de 1947), p. 3. 28 Carta de Xoán X. Pla a Eliodoro de la Torre, Montauban, 12 de fevereiro de 1945, in Arquivo Tarradellas (Mosteiro de Poblet, Tarragona), maço 301. 11 119 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas Cartas de Xoán X. Pla a Castelao, Montauban, 11 de abril de 1947 e 7 de maio de 1947 (FP-FC); X. X. Pla, “Ollando o porvir”. Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 8 (fevereiro de 1948), pp. 1-3. 30 X. CASTRO. Castelao e os galeguistas do interior: Cartas e documentos, 1943-1954. Vigo: Galaxia, 2000. 31 Carta de Xoán X. Pla a Castelao, Montauban, 8 de janeiro de 1947 (FP-FC). 32 Cf. o informe interno do PCE Información de asuntos gallegos recibida por conducto de Pla, s. f. (ca. principios de 1947), F10M-FAM. 33 Cf. cópia dos acordos adotados pelo Trisquel Diretor da Irmandade Nazonalista Republicá Galega na Franza, Toulouse, 9.10.2.1946, in AN, GE-752-C5. Igualmente, informe da mesma organização, assinado por J. Fra Domínguez, ao Consello Diretor do PG, s. d. (meados de 1946), FP-FFR. 34 Cf. por exemplo os seus artigos “A cada día su afán. ¡Maldito gallego!”. La Nouvelle Espagne, n. 37, 17.10.1946, p. 4, e “Añejez y solera del movimiento autonomista gallego”. Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 6 (junho de 1947), p. 3. Un emotivo perfil biográfico da acidentada andança da familia Alvajar durante os anos de exílio na entrevista a Teresa Alvajar en Terra e Tempo, 147-48 (2008), pp. 6-16. 35 Carta de Castelao a Manuel de Irujo, Buenos Aires, 15 de abril de 1948. CASTELAO, cit., pp. 699708. 36 “Galiza na Sorbona de París”. A Nosa Terra, 462, junho de 1948, p. 2. 37 Javier Alvajar passou ao exército republicano, mas em 1939 fora feito prisioneiro pelos franquistas. Após várias experiências, porém, conseguiu chegar à França depois de 1945. Ocupou vários cargos no Governo da República no exílio e, ao voltar à Galícia ainda foi alcaide do município de Cambre pelo PSOE entre 1983 e 1986. Cf. ERIAS MARTÍNEZ, 2008. 38 Maria I. GÓMEZ RIVAS. “O exilio galego en Europa: A Delegación do Consello de Galiza en París”, en NÚÑEZ SEIXAS e CAGIAO VILA, P. (eds.). O exilio galego, 2006, pp. 289-321; J. ALVAJAR LÓPEZ. “Apuntes sobre la Delegación del Consejo de Galicia en Europa (I)”, Anuario Brigantino, 11, 1998, pp. 125-36; id. “Apuntes sobre la Delegación del Consejo de Galicia en Europa (II)”, Anuario Brigantino, 12, 1989, pp. 175-208; id. “Apuntes sobre la Delegación del Consejo de Galicia en Europa (III)”, Anuario Brigantino, 13, 1990, pp. 141-202; ERIAS MARTINEZ, 2008. 39 Cf. J. M. IGLESIAS MARTÍNEZ; V. M. SANTIDRIÁN ARIAS. A autoridade na palabra. Biografía do comunista Paco Filgueiras (1920-1976). Santiago de Compostela: Fundación 10 de Marzo/Xunta de Galicia, 2006, p. 379. Da sua direção faziam parte, além de César e Javier Alvajar, antigos refugiados republicanos de 1939, como José Viéitez Iglesias ou Daniel Álvarez Quintás, junto a outros nomes cuja filiação não pudemos identificar. 40 Cf. J. A. PAZ. “Los gallegos en la liberación de Francia”. Galiza. Órgano do Bloque Repubricán Nazonal Galego, 5 (maio de 1947), p. 2; V. SANTIDRÁN ARIAS. Manuel Bravo Silvares “Mariño”. Sada-A Coruña: Ediciós do Castro, 2005. 41 V. M. SANTIDRÁN ARIAS, 2006. 42 J. M. IGLESIAS MARTÍNEZ; V. M. SANTIDRIÁN ARIAS, 2006, pp. 105-06. 43 V. M. SANTIDRIÁN ARIAS. Historia do PCE en Galicia (1920-1968). Sada-A Coruña: Ediciós do Castro, 2002, pp. 585-605. 44 V. M. SANTRIDRIÁN ARIAS, 2006, p. 238. 45 E. BARRERA BEITIA. La Transición en Ferrol. Ferrol: Ed. Embora, 2001, pp. 170-71. 46 Estatutos de la Casa de Galicia, 27.1.1959 (copia), e Casa de Galicia. Reglamento de régimen interior, s. f. (ca. 1959), in Arquivo da Emigración Galega – Consello da Cultura Galega, Santiago de Compostela (AEG). 29 120 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Dossiê O exílio galego na Europa (1939-1975): Um êxodo esquecido Xosé Manuel Núñez-Seixas BARRERA BEITIA, cit., pp. 176-77; J. M. IGLESIAS MARTÍNEZ e V. M. SANTIDRIÁN ARIAS. “Amador Martínez e a xeración comunista da República”, in Congreso da memoria (2º. 2005. Culleredo). A II República e a Guerra Civil: actas dos traballos presentados ao II Congreso da Memoria, Culleredo, 1 a 3 de decembro de 2005, s. l. :Asociación Cultural Memoria Histórica Democrática, 2006, pp. 15861; VARELA SIEIRO, 2010; L. GONÇALES BLASCO. A política e a organizaçom exterior da UPG (1964-1986). Santiago de Compostela: Laiovento, 2012, pp. 224-25. 48 VARELA SIEIRO, cit; SANTIDRIÁN ARIAS 2008. 49 BARRERA BEITIA, 2001, pp. 182-83. 50 Uma extensa - e muito caótica - recompilação documental sobre as atividades da UPG na Europa in GONÇALES BLASCO, 2002, pp. 214-400. 51 L. M. CALVO SALGADO; E. GRAF; M. HELFER HERRERA; X. MARTÍNEZ CRESPO. Galiza en Suíza: aspectos dunha emigración - Galicien und die Schweiz: Aspekte einer Auswanderung - La Galice en Suisse: Aspects d'une émigration, s. l.: Confederación Intersindical Galega, 2010; GONÇALES BLASCO, 2002, pp. 263-83. 52 M. A. FERNÁN VELLO; R. PILLADO MAYOR. A nación incesante. Conversas con Xosé Manuel Beiras. Santiago de Compostela: Sotelo Blanco, 1989, p. 57. 53 F. PÉREZ-BARREIRO NOLLA. Amada liberdade. Memorias. Vigo: Xerais, 2013, pp. 137-39. 54 Ata de constituição da Seção de Atividades Culturais da Casa da Galiza, París, 6 de março de 1970 (cópia en AEG). Cf. também GONÇALES BLASCO, cit., pp. 218-22. 55 GONÇALES BLASCO, 2002, pp. 232-34, 242-48. 56 Vid. o testemunho de M. Ledo Andión, “As quintas feiras, no norte día a día…”, in Atas do Congreso Internacional “O exilio galego” (do 24 ao 29 de setembro de 2001), pp. 1137-43 (disponível em http://consellodacultura.org/mediateca/extras/congreso_internacional _exilio.pdf). 47 121 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal - finais do século XIX e inícios do XX Fernanda Paula Sousa Maia Isilda Braga da Costa Monteiro CEPESE (Porto, PT) Resumo: Dos cerca de um milhão e trezentos mil portugueses que emigraram, no período que decorreu entre meados do século XIX e o início da I Guerra Mundial, cerca de 90% escolheu o Brasil como país de destino. No entanto, sabe-se hoje, que destes que cruzaram o mar, em média entre 30 a 50% acabaram por regressar a Portugal. Este artigo pretende destacar o papel que estes emigrantes de retorno (os “brasileiros”) tiveram na sociedade portuguesa, analisando alguns dos setores que eles souberam mobilizar e desenvolver, evidenciando a sua importância na dinamização de um pequeno país europeu, entre finais do século XIX e a primeira metade do XX. PALAVRAS-CHAVE: Emigração “Brasileiros” – Empreendedorismo. Abstract: Of the approximately one million and three hundred thousand Portuguese who emigrated from the mid-nineteenth century and the beginning of World War I, about 90% chose Brazil as the country of destination. However, it is known that these who crossed the sea on average between 30-50 % eventually return to Portugal. This article aims to highlight the role that these returning emigrants (“brazilian”) had in Portuguese society, analyzing some of the sectors they knew mobilize and develop, highlighting its importance in fostering a small European country, between the late nineteenth century and the first half of the twentieth. KEYWORDS: Emigration "Brazilian" - Entrepreneurship . Introdução Estima-se hoje que apenas no período que decorreu entre meados do século XIX e o início da I Guerra Mundial, cerca de um milhão e trezentos mil portugueses tenha emigrado para o continente americano, quase exclusivamente com destino ao território brasileiro.1 Esse fenômeno, cada vez mais, tem sido estudado dos dois lados do Atlântico. Eulália Lahmeyer Lobo assina um dos estudos mais paradigmáticos sobre essa questão que, apesar de publicado em 1994,2 continua a ser uma referência incontornável na investigação desta problemática, a par da obra Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 122-149 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro de Jorge Alves que, desde o início da década de 1990, vem publicando trabalhos fundamentais, não apenas para o tema da emigração para o Brasil, mas, sobretudo, na análise do fenômeno do retorno.3 A saída de emigrantes portugueses para o Brasil, embora deva ser inserida num ciclo de migração de massas que afetou toda a Europa, não deixou de assumir em Portugal uma expressão significativa, especialmente se a considerarmos em relação aos valores globais da população do país nesta época – cerca de 5 milhões de habitantes em finais do século XIX.4 O Brasil foi, neste contexto, o destino preferencial da emigração portuguesa, prolongando uma corrente com fortes raízes, especialmente na região Norte de Portugal que, desde pelo menos o século XVII, viu muita da sua população cruzar o Atlântico. Após a independência do Brasil, assumindo agora a dimensão de uma efetiva emigração, as saídas para este território registaram volumes quantitativos cada vez mais expressivos, ajudando a engrossar as estatísticas oficiais do Estado português e tornando-se um dos fatores responsáveis e determinantes para o debate que a partir de então suscitou. Na verdade, a emigração portuguesa para o Brasil foi vista na época, especialmente pelo Estado e pelas elites culturais portuguesas, como um fenômeno isolado, expressão sintomática de uma vivência patológica da sociedade portuguesa, a que o sentimento de decadência nacional, prevalecente nos finais da centúria, viria a emprestar ainda maior consistência. Percebe-se, assim, pelo menos até à década de 1940, a tendência do discurso oficial português acentuar a noção de decadência na análise deste fenômeno, à medida que, como bem sublinhou Eduardo Lourenço, a emigração na sua complexidade põe em causa, sobretudo, a imagem de nós mesmos enquanto país e povo.5 Essa visão oficial, relativamente ao período em estudo, acabaria por marcar também a imagem dos emigrantes que partiram para o Brasil, ou “brasileiros” como em Portugal ficaram mais conhecidos. Na verdade, especialmente na literatura portuguesa dos finais do século XIX, deles nos ficou a imagem do homem pobre, rústico e analfabeto que, na sua ignorância, se tornou presa fácil e desprevenida nas mãos de engajadores sem escrúpulos, mas que, depois de fazer fortuna além-mar, retorna à terra de origem exibindo o seu sucesso. Ora, entre finais do século XIX e os inícios do XX, o estereótipo do “brasileiro” foi-se instalando em Portugal, especialmente no Norte deste país, região de onde partia o maior fluxo de emigrantes para o Brasil. Não se sabe muito bem quando, em Portugal, começou a circular esse epíteto. Sabe-se, no entanto, que, como referiu Maria Beatriz Rocha-Trindade, uma das primeiras análises críticas deve-se a Alexandre Herculano, na década de 1870. Numa observação perspicaz da 123 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro sociedade em que se inseria, este intelectual mostrou perceber bem os diferentes cambiantes que caracterizavam a emigração portuguesa da sua época, salientando já então que o vocábulo “brasileiro” se aplicava àquele que não tendo nascido no Brasil, tinha saído “de Portugal na puerícia ou na mocidade mais ou menos pobre e que, anos depois, voltou mais ou menos rico.”6 Por parte de intelectuais nascidos no Brasil também é possível encontrar interessantes reflexões sobre este tópico. Não nos referimos apenas à reconhecida obra de Guilhermino César, publicada em 1969, intitulada O “Brasileiro” na ficção portuguesa, na qual aquele autor desenvolveu, com argúcia e sagacidade, uma análise interpretativa em torno do que designou, em complemento de título, como O direito e o avesso de uma personagem tipo.7 Lembramos, também, outro pequeno artigo, publicado originalmente na revista Brotéria, em 1938, por Afrânio Peixoto, no qual este autor elaborou uma argumentação em torno do equívoco e, sobretudo, da injustiça que encerrava a utilização deste vocábulo.8 O “brasileiro” seria, então, a designação do emigrante que, tendo partido para o Brasil, assumia o seu retorno de sucesso, exibindo atitudes, comportamentos e hábitos que, sendo diferentes dos residentes, sublinhavam a sua condição. A literatura portuguesa de finais de Oitocentos reproduziu este lugar-comum e acentuou os seus matizes, ajudando a fixar a figura do “brasileiro” de torna-viagem com traços estereotipados que acentuavam o exotismo da linguagem e do vestuário, a ostentação dos adereços e dos sinais exteriores de riqueza, associados, geralmente, a um perfil psicológico pouco abonatório, em que a imodéstia, a falta de cultura e de educação, decorrentes de um arrivismo endinheirado, eram a tónica. A esse propósito, o “brasileiro” de Camilo Castelo Branco permanece, ainda hoje, como o tipo mais acabado de uma figura em que o ridículo e a imbecilidade de modos e de atitudes são uma constante. Sabe-se, hoje, que motivações de índole pessoal devem ter estado por trás desta ideia, uma vez que o seu implacável rival na conturbada paixão que nutriu por Ana Plácido, Manuel Pinheiro Alves, havia sido ele também um “brasileiro”. Nem mesmo Eça de Queirós, no início da sua carreira literária, foi capaz de fugir a este personagem estereotipado. No ano de 1872, n’As Farpas, Eça apresentava-nos uma imagem de um “brasileiro” reles e grosseiro, em “tons de chocolate”, que haveria de ser muito mal recebida no Brasil, nomeadamente pela comunidade portuguesa aí residente. Não deixa de ser interessante verificar, no entanto, que, alguns anos depois, em 1886, quando Eça redigiu o prefácio para o romance de Luís de Magalhães, intitulado O Brasileiro Soares, não tenha perdido a oportunidade para rever a sua posição anterior. Aproveitando para criticar a visão romântica que 124 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro apresentava o “brasileiro” regressado rico, como imbecil, por contraponto ao emigrante que regressava pobre e que, por isso, suscitava compaixão por parte desses intelectuais, Eça louvava a via adotada por Luís de Magalhães nessa obra, à medida que, em sua opinião, este se aproximava de uma descrição mais realista do emigrante português regressado do Brasil. Foram poucos, no entanto, os que conseguiram “ver” para além da matriz discursiva predominante, assumindo um discurso contra-corrente em defesa das virtualidades da emigração e do “brasileiro”. Dentre estes, no entanto, há que destacar os nomes de Oliveira Martins e o mesmo Eça de Queirós de quem falamos há pouco, agora, porém, já não como literato, mas no desempenho da sua função diplomática. Em 1887, por exemplo, perante uma Câmara de Deputados predominantemente crítica da emigração portuguesa, o intelectual J. P. de Oliveira Martins, na qualidade de deputado pelo círculo do Porto, com a legitimidade que o seu prestígio intelectual lhe emprestava, calculava sem hesitações, “em 10.000:000$000 réis os capitaes que todos os annos o Brazil manda para Portugal”,9 uma verba que, em termos macro-econômicos, se afigurava fundamental para ajudar a saldar o déficit nacional. Por seu turno, Eça de Queirós enquanto diplomata assumiria também, sem rodeios, uma defesa clara da emigração num relatório oficial datado de Novembro de 1874. Nesse texto, depois de fazer o seu historial, perspectivando-a em contexto europeu, observando as suas causas, refletindo sobre qual deveria ser o papel do Estado, termina com uma análise sobre “as vantagens geraes que a emigração /…/ tem dado à civilisação”, considerando-a textualmente “como força civilisadora”.10 Estas posições não conseguiram, porém, destruir a visão “oficial” sobre a emigração portuguesa prevalecente neste período, fornecida essencialmente pelo discurso crítico veiculado pela percepção das elites. Detentoras privilegiadas e legitimadas da palavra, nas suas práticas discursivas não foram, no entanto, nem imparciais nem inócuas. Importa, por isso, através das técnicas de análise de conteúdo e de crítica textual disponíveis, tentar “desnaturalizar” essas práticas discursivas e esses textos e representações produzidos sobre a emigração e, sobretudo, sobre o emigrante. Por trás de muitas destas visões críticas, aparentemente inocentes, podemos sentir o medo das classes dominantes portuguesas, que temiam ver perturbados os seus interesses, sustentados em modos tradicionais de organização social e econômica. A eventual falta de braços nos campos, e mesmo nas cidades, podia, por exemplo, fazer disparar os salários perturbando uma economia, já de si frágil e pobre, ao mesmo tempo que, por outro lado, a emigração punha, também, a nu muita da fraqueza nacional que, assim, se via inexoravelmente exposta ao exterior, dando a conhecer a miséria, o 125 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro crescimento lento e a falta de expectativas de uma franja importante e anônima da população11. A realidade, contudo, era bem mais diversificada do que aquela que o estereótipo sugeria. Em Portugal, a par de muitos que partiram pobres e que nunca chegaram a enriquecer, houve também outros que, embora provenientes de famílias social e economicamente bem sucedidas, fizeram da emigração a sua opção de vida, mesmo que temporária. Se para uns o Brasil foi um destino sem retorno, outros houve que cruzaram várias vezes o Atlântico, cuidando dos seus interesses nos dois lados do Oceano. Destes, se uns, no regresso às terras que os viram nascer, optaram por evidenciar o seu sucesso em iniciativas de pura ostentação, outros fizeram-no através de produtivos investimentos que muito contribuíram para o desenvolvimento de Portugal. Na verdade, quando o pesquisador parte para a leitura dos jornais publicados neste período por todo o Norte de Portugal, apercebe-se que, para além desta visão negativa da emigração que acabamos de enunciar, existem outras leituras mais benignas e virtuosas desta realidade emigratória. São inúmeros os exemplos que poderíamos aqui deixar a partir da leitura de muitos artigos escritos na época e publicados em diferentes jornais locais e regionais. A par do discurso “oficial” emerge um outro, mais próximo da vivência do emigrante e do quotidiano das localidades nortenhas, no qual se percebe um claro distanciamento do tópico negativo do discurso formal sobre a emigração que enfatizava o despovoamento, a deslocalização de riqueza e de mão-de-obra, a miséria e a fragilidade nacional de um país que deixava partir os seus filhos, para se aproximar muito mais daquilo que hoje chamamos de “país real” e, sobretudo, fazendo-se eco dos anseios e expectativas sentidos pela população no seu dia-a-dia. Veja-se, a este propósito, um periódico publicado em Lamego, cidade do interior Norte de Portugal, na margem sul do rio Douro. Em 1910, sublinhando que “há longos annos Lamego tem encontrado na emigração os seus melhores alentos de vida”, o jornal O Progresso congratulava-se pelo fato de se encontrar aberta uma subscrição permanente em Manaus, por iniciativa de um conterrâneo lá residente, para apoiar financeiramente lamecenses menos afortunados que, como ele, pretendessem emigrar para esse destino.12 Alguns anos mais tarde, em 1922, na mesma cidade, o jornal republicano A Fraternidade, dava voz a um dos seus colaboradores, J. Seves d’Oliveira, para criticar os que estavam contra a emigração, salientando que ...há muita gente que crê sinceramente que a emigração é um grave mal para os povos que são forçados a effectival-a. Apreciam n’uma 126 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro quantia convencional cada homem que se vae, e estimam, ao fazerem a conta annual dos que emigraram, que o producto total que estes dão, é exactamente a somma que se subtrahiu á economia nacional”. Ora, quem assim pensava até parecia ter razão; no entanto, uma análise mais aprofundada da questão permitia concluir em sentido contrário, como justificava este colaborador: Primeiro, porque um homem que se auzenta deixa de ser um consumidor no logar que habitava, e isto constitue um alivio, enquanto a subsistências, na communidade. Segundo, porque nivela o trabalho para os estacionários, visto que a parte que aquelle executava e que era insufficiente ao seu sustentáculo, beneficia claramente estes. E terceiro, porque todo o que encontra difficuldades para o desenvolvimento das suas forças e energias no seu meio natalício, se não o abandona, ou perecerá n’elle ou, quando menos, será uma sombra para o bem-estar dos seus connaturaes ou familiares”. Peremptório, o articulista não hesita em sublinhar que A emigração é, pois, uma porta que o porvir abre á esperança, a qual é inútil que pretendam fechar leis ocas que emanam d’um estado impotente para crear trabalho no seu território sufficiente e entreter e recompensar todos os braços que se cançam de folgar.13 Por seu lado, na margem norte do rio Douro, o Vilarealense, jornal publicado em Vila Real, evidencia a perspectiva virtuosa do fenômeno migratório. Num artigo publicado em 1913, o articulista refere que, em Portugal, se reclama contra a emigração pedindo medidas repressivas porque as terras ficam sem braços. Na argumentação que desenvolve, concorda até que “Pode ser que tal succeda”, no entanto, registra que ... desde largos annos, que esse êxodo tem augmentado e a fome, por falta de cultura, não tem invadido esta região, e bem pelo contrario, a cultura tem-se desenvolvido e progredido, graças aos novos e remuneradores processos, que economisam um grande número de braços. Reforçando esta ideia, chama a atenção para a beleza “cada vez mais ridente das aldeias”, onde no lugar dos casebres se construíram “asseadas moradas”, para o luxo que então se verificava no trajar, não hesita em sublinhar 127 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro ... que se deve tudo isto, /…/ a esses arrojados emigrantes, que não achando no torrão onde nasceram em que empregar a sua actividade, demandaram paizes florescentes, onde, pelo seu incessante labor, adquiriram meios de regressarem à pátria, para fruírem descanço e commodidades merecidas. Apontando como exemplo outras regiões do país, pergunta: Quem fez do Minho, esse, de sua natureza, jardim do nosso Portugal, a mais florescente província que seduz pelos seus palácios e quintas modelos, que se succedem quasi ininterruptamente? D’onde esses grandes capitaes legados aos differentes estabelecimentos pios e com que se erguem templos ao ensino, em tantas povoações, onde, até há pouco, dominava o estrangulador analphabetismo? Finalmente, relativamente a Vila Real salienta, mais uma vez, a prosperidade vivenciada, escrevendo: Erguem-se magníficos prédios públicos e particulares, adereçados de custosos mobiliários. Succedem-se uns aos outros os bem abastecidos estabelecimentos de modas, de cafés e de géneros alimentícios de primeira ordem. O bom gosto e elegância no vestir de todas as classes não differe dos grandes centros de Portugal”. Termina, então, com uma pergunta “E tudo isto será indicio de pobresa? Onde é que a não há?”.14 A leitura da imprensa de Ovar, uma localidade de pequena dimensão, situada no litoral Norte do país, no distrito de Aveiro, permite-nos encontrar idêntica sensibilidade face à candente questão da emigração para o Brasil, na primeira metade do século XX. No ano de 1912, no semanário A Discussão,15 perante o visível enriquecimento de alguns “brasileiros” de retorno, multiplicam-se os testemunhos inequívocos do sucesso e das virtualidades da emigração para o Brasil. Tomando consciência e chamando a atenção para as vantagens que, entretanto Portugal tinha beneficiado com os capitais destes “brasileiros”, o autor escrevia, de uma forma peremptória: ... á emigração para o Brazil deve Portugal esse novo aspecto que tomaram as cidades, as villas e as aldeias; quem conheceu o nosso paiz de há trinta para quarenta annos e o compara com o seu estado actual, maravilha-se. É uma transformação completa – e quem o transformou? O ouro do Brazil. 128 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Que melhor exemplo se podia invocar para contrariar o discurso oficial traumático predominante, sobre a emigração para o Brasil, que inundava os escritos de intelectuais e políticos desta época? Talvez por isso, o autor deste artigo desabafe com os seus leitores, de uma forma desabrida “são já rançosos os lamentos sobre a falta de braços para as operações agrícolas, e accusa-se a emigração desta falta …”, para continuar, constatando os benefícios da emigração, que ... o que sustenta o nosso paiz é ainda em grande parte, o que recebe dos seus emigrantes na América, são as fortunas, que traz cada vapor que chega do Brazil, são os soccorros, que de lá recebem as suas famílias”. Prosseguindo este raciocínio, que claramente descola do registo discursivo oficial e dominante, o articulista de Ovar pergunta retoricamente “Que seria de Portugal, se não fosse o ouro do Brazil?”. Por isso, não lhe custa concluir, contra a corrente, que “vale hoje para nós o Brazil muito mais sem comparação do que valia, quando pertencia a Portugal”. 1.O retorno do Brasil e o investimento no desenvolvimento local A constatação da existência de uma corrente de opinião claramente oposta à que então se tinha, oficialmente, sobre a emigração a partir de Lisboa, enquanto centro do poder político, tem para nós um significado especial. Na verdade, quanto mais nos debruçamos sobre estes temas, maior nos parece ser a convicção de que, entre finais do século XIX e os inícios do século XX, o dinheiro remetido pelos emigrantes portugueses no Brasil assumiu um papel fundamental para o desenvolvimento local e regional de Portugal, especialmente das regiões mobilizadoras do fluxo migratório, entre as quais se destaca o Norte do país. Como demonstrou Maria Ioannis B. Baganha num artigo publicado em 1994, “é inegável o enorme impacto da emigração na demografia e na economia nacionais”, baseando-se, em grande parte, nos estudos de Eugénia Mata sobre a análise da repercussão do volume das remessas vindas do Brasil nas exportações e no PIB português.16 Por seu turno, os estudos de J. Alves ajudam-nos a sedimentar esta hipótese, mostrando o papel crucial destes emigrantes de retorno na dinamização da sociedade portuguesa dos últimos dois séculos17. Com efeito, o impacto benigno da emigração para o Brasil na economia portuguesa vai muito para além do volume das remessas, por si só fundamentais para o Estado monárquico e republicano. Como bem percebeu, em 1862, o redator do jornal Économiste, num fundamentado estudo sobre a emigração no século XIX, publicado sob a tutela da Academia Francesa, os emigrantes portugueses no Brasil 129 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Devenus riches /…/ rentrent volontiers en Portugal avec leurs capitaux, achetent les belles maisons, les belles terres, se placent à la tête des grandes affaires, et font ainsi concourir leur expérience et leur fortune au progrès de leurs pays. Les Brasileiros conservent le type, aujourd’hui inconnu en France, des oncles millionaires des colonies: utiles aiguillon de l’esprit d’entreprise”18 [sublinhado nosso]. Talvez por ser um estrangeiro, Duval viu o que era, ainda, imperceptível para a maioria dos portugueses, ou seja, que não apenas a riqueza, mas também a experiência adquirida no Brasil por estes homens, foram instrumentos fundamentais no incentivo e estímulo do espírito empreendedor. E essa era uma mais-valia a favor de Portugal que não poderá nunca deixar de ser contabilizada no balanço da emigração para o Brasil. Hoje sabemos que muitos destes homens que partiram para o Brasil não o fizeram definitivamente. O retorno puro e simples ou, ainda, a reemigração, ou seja, o retorno temporário, gerando um movimento pendular de emigrantes, cadenciado pelo ritmo dos negócios, dos afazeres, das festividades locais ou para tratar de questões particulares, como, por exemplo, cuidar da sua própria saúde, acompanhar a doença dos familiares mais próximos, descansar, marcar presença em casamentos, batizados e solenidades públicas ou privadas e viajar pelo país ou para o estrangeiro, assumiram uma inegável importância. Como provou Jorge Fernandes Alves para a região do Porto, este retorno da emigração para o Brasil teve, na segunda metade de Oitocentos, um claro significado estatístico, estimando-o entre 30 a 50% dos que partiram.19 Nesse sentido, poder-se-á hoje dizer que desses a maioria partia anonimamente e anonimamente regressava – sem fortuna acumulada, frequentemente fragilizados pela doença e pelo ruir das expectativas que os tinham levado a cruzar o Oceano. Confinados aos espaços das aldeias que os viram nascer, deles não reza a história. O mesmo não acontece com alguns outros, uma minoria a quem o berço mais afortunado ou o destino e a sorte, permitiram o enriquecimento que em Portugal não teriam, certamente, alcançado. Na verdade, qualquer leitura, mesmo desatenta, da imprensa periódica portuguesa de finais de Oitocentos e de toda a primeira metade do século XX, ajuda-nos a confirmar este fenômeno ritmado de partidas e chegadas dos emigrantes de sucesso às suas terras de origem, registradas em pequenas notícias nas quais o(s) redator(es) saudava(m) a chegada e dava(m) as boas vindas, fazia(m) votos de boa viagem de regresso ou, simplesmente, desejava(m) melhoras de saúde. Eles eram, localmente, os exemplos mais acabados de sucesso de alguns homens que por si próprios, ou com o suporte da retaguarda familiar, tinham conseguido vencer e, 130 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro por isso, despertavam em seu torno o interesse público, e até a inveja, que a imprensa escrita local, consoante os interesses em presença, aproveitava para mediatizar. Apesar de mal entendido pela generalidade dos intelectuais oitocentistas, o emigrante português no Brasil, uma vez regressado com capacidade financeira e espírito empreendedor, mesmo encarnando o estereótipo do “brasileiro”, acabaria por ser, no entanto, uma das figuras mais importantes para a dinamização econômica, social, educativa, cultural e até política, das suas terras de origem, em Portugal. Como não deixou de ser publicamente reconhecido pelos seus contemporâneos, estes emigrantes enriquecidos que retornavam definitivamente às suas terras ou que a elas regressavam periodicamente foram, na transição do século XIX para o XX, verdadeiros agentes de investimento e de desenvolvimento de muitas localidades portuguesas, especialmente aquelas que geraram os maiores fluxos de partida, como é o caso de todo o Norte de Portugal. Enriquecidos com o dinheiro obtido em cidades como o Rio de Janeiro, Santos, São Paulo ou Recife onde muitos destes emigrantes estavam ligados às tradicionais atividades comerciais, ou abonados com os lucros conseguidos nas, ainda hoje, longínquas cidades de Manaus e Belém, próximas da fonte da borracha natural amazônica - que, neste início do século XX, fez do Brasil um dos principais produtores e exportadores a nível mundial -, uma vez regressados à sua terra natal estes homens souberam aplicar uma parte dos seus vultosos lucros em setores inovadores, até aí fora dos objetivos dos poderes públicos. Um pouco por todo o país, mas especialmente no Norte, estes emigrantes de sucesso regressados, temporária ou definitivamente, do Brasil – os “brasileiros” – faziam donativos de diversa natureza e com variados fins. Para além de recuperarem a casa que os vira nascer ou edificar uma moradia imponente, compatível com o seu novo estatuto, estes “brasileiros” enriquecidos, voluntariamente ou a pedido, contribuíram também para o restauro de igrejas ou de capelas da sua devoção, para realizar melhoramentos urbanísticos, adquirindo terrenos para levantar praças, cemitérios, jardins, ou outros espaços públicos, para o financiamento das festas das suas terras e confrarias, construindo asilos ou outras instituições de caridade, ajudando a custear as obras de hospitais ou de sedes de bombeiros ou construindo escolas. Sublinhe-se que, antes de mais, esta vertente filantrópica, devidamente publicitada nos jornais regionais, ajudava a consolidar o retorno destes “brasileiros”, emprestando-lhes um lugar na sociedade local e garantindo-lhes o reconhecimento da sua importância junto dos seus conterrâneos. 131 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Abertas estas “portas”, num segundo momento, alguns destes “brasileiros” canalizaram os seus capitais para outro tipo de investimentos produtivos, no comércio ou na indústria locais, dando continuidade ao seu espírito empreendedor e à experiência adquirida. Num país de fracos recursos e débil fomento industrial, como era Portugal entre finais do século XIX e inícios do XX, as iniciativas empresariais destes homens tornaram-se, assim, significativas e até incontornáveis. Na verdade, alguns destes empreendimentos, gerando lucros rápidos e vultosos, acabaram também por proporcionar ainda outros ganhos ao “brasileiro” que regressava ao seu país. Assegurando-lhe um crescente protagonismo no plano social, que passava pelo reconhecimento público do seu prestígio, tantas vezes premiado com a nobilitação, ou através da sua participação activa na vida política local ou nacional, participando nomeadamente em subscrições com conotação política (por exemplo, destinadas à construção de monumentos), ou fazendo empréstimos ou doações ao poder político instituído. Pelo importante papel que estes “brasileiros” desempenharam a nível local, a eles se ficou também a dever muita da intervenção urbana nas localidades do Norte de Portugal, no período que decorre entre finais do século XIX e os inícios do XX. Como é hoje reconhecível, por exemplo, deveu-se a um “brasileiro”, o Conde de Ferreira, a construção daquele que pode ser considerado o primeiro parque escolar português.20 Na verdade, foi a partir do seu legado, datado de 1866, numa altura em que os edifícios escolares eram ainda muito raros e deficientes, e em que a iniciativa estatal era manifestamente insuficiente face às necessidades reais do país, que este “brasileiro” de retorno definitivo a Portugal deixou em testamento dinheiro para, segundo ele, construir e mobilar cento e vinte “casas para escolas primarias para ambos os sexos nas terras que forem cabeças de concelho, sendo todas por uma mesma planta e com acomodação para vivenda do professor”.21 Com o dinheiro remanescente foi ainda construído o Hospital de Alienados na cidade do Porto, ao tempo, verdadeiro modelo na especialidade.22 Depois dele, muitos outros emigrantes beneméritos se interessaram pela instrução pública, custeando a construção de edifícios ou o pagamento de salários e de material didáctico. A opção pelo ensino não era aleatória. Todos eles acreditavam na importância da preparação e instrução dos jovens para o progresso futuro do país e para o seu próprio sucesso enquanto cidadãos. Ou seja, todos eles estavam convictos, como muitos outros, da função regeneradora da escola e das suas virtualidades sociais.23 Talvez por isso, a República Portuguesa, implantada em 1910, tenha conotado tanto o seu discurso com a necessidade de incrementar a instrução e a alfabetização. 132 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Na viragem de Oitocentos para Novecentos, numa época em que Portugal atravessava grandes dificuldades financeiras, apresentando gravosos déficits estatais, exacerbados pela participação portuguesa na Grande Guerra, os investimentos destes emigrantes e ex-emigrantes portugueses no Brasil, foram essenciais para o desenvolvimento urbanístico, econômico, cultural e social de Portugal. Se as atitudes de benemerência e filantropia tiveram um forte impacto a nível social, os investimentos na área econômica revelaram-se essenciais para o desenvolvimento de Portugal, sobretudo no Norte do país. Os exemplos que aqui trazemos, dos muitos que poderiam aqui ser evocados, servem para demonstrar o que acabamos de afirmar. 1.1. Investimentos rurais O retorno à terra natal trouxe de volta à atividade agrícola muitos dos emigrantes que não conseguiram cumprir o sonho de enriquecimento que os levara ao Brasil. Sem alternativa, estes homens retomaram mais ou menos no mesmo ponto, a vida a que tinham tentado sem sucesso dar a volta. Um insucesso a que o amanho das terras, suas ou, na pior das hipóteses, de outros, colocava dramaticamente em evidência. No entanto, para alguns, o exercício da atividade agrícola dominante no Norte de Portugal, foi naturalmente (re)apreendido como um modo de vida a que algum dinheiro amealhado do outro lado do Oceano veio possibilitar inovação e alguma capacidade de investimento. Sem grandes ostentações, mas com a segurança de quem conhecia bem a região e as vicissitudes do trabalho agrícola, estes emigrantes vão ser os responsáveis, na medida das suas possibilidades técnicas e financeiras, pela dinamização da agricultura, justificando as palavras entusiasmadas do articulista do jornal de Vila Real que tivemos já oportunidade de reproduzir acerca dos campos do Minho e do Douro. Estando ainda por ser feito um estudo mais aprofundado que nos permita ter uma dimensão mais concreta desta realidade, é um fato que os “brasileiros” de retorno não deixaram fora do seu campo de ação o interesse pela terra e pela agricultura.24 Independentemente de aí fixarem residência e/ou se dedicarem a outras atividades econômicas, a aquisição de terras e quintas na aldeia natal ou na sua proximidade, surge como uma boa possibilidade de investimento mesmo que sem expectativas de um lucro imediato para além do usufruto do descanso e da alegria do encontro com a família que, esse espaço, lhes poderia possibilitar nos meses de Verão. Manuel Luís de Sena, natural do centro da cidade de Lamego, emigrara muito jovem para Manaus, na segunda metade do século XIX, deixando para trás a profissão de latoeiro.25 Em 1899, com pouco mais de 30 anos, já está de novo em Lamego, onde pela sua atividade filantrópica em prol das principais casas de 133 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro caridade da cidade vai ganhando, ao nível local, uma grande notoriedade. Detentor de uma personalidade forte, Manuel Luís de Sena vai ser um dos “brasileiros” de retorno de maior destaque na sociedade lamecense da primeira metade do século XX. Embora se tenha dedicado a outras atividades, a terra foi uma das suas primeiras opções de investimento, tendo comprado em final de 1906 uma grande quinta nos arredores da cidade26 que ficará conhecida pela designação de Quinta Sena. Com um espírito empreendedor e inovador, Manuel Luís de Sena vai procurar rentabilizar em novos moldes a sua vasta propriedade, recorrendo a mecanismos e soluções pouco habituais na região. Entre eles, destacamos a contratação de um “agricultor diplomado” para lhe fazer a planta da propriedade, que posteriormente colocou em exposição num estabelecimento comercial da cidade e que definiria certamente as áreas de cultivo para cada um dos produtos.27 Especialmente vocacionada para a produção de vinho, como acontece por toda a região do Douro, Sena não descurou a parte comercial que lhe permitiria o escoamento desse produto e o retorno do investimento feito, abrindo em Maio de 1908, uma Adega Económica28 publicitada na imprensa local.29 Além disso, envolvido com as questões agrícolas, Sena torna-se, em Agosto desse mesmo ano, representante da firma de adubos Herold & Cª, na cidade de Lamego.30 Embora o acompanhamento do seu percurso de vida quase centenário (morrerá em 1962, com 97 anos31), nos permita colocar a hipótese de que o entusiasmo inicial em torno deste investimento na terra e na agricultura, se deparou com alguns percalços que acabaram por o arrefecer, levando-o mesmo a afastar-se e a vir terminar os seus dias na cidade de Lisboa, a Quinta Sena era, pela dinâmica e organização, apesar de tudo, considerada na década de trinta, pela imprensa da época, como “um modelo, um encanto, uma propriedade que honra Lamego e a sua região”.32 Este é um dos muitos exemplos que aqui poderíamos evocar a propósito do desenvolvimento agrícola promovido pelos emigrantes de retorno no Norte de Portugal. Se o vinho foi uma opção para grande parte deles, outros houve que enveredaram por diferentes gêneros que sempre souberam capitalizar. O que é inegável é que, como demonstrou J. Alves, a progressiva monetarização da economia promovida por estes homens acabaria por se tornar especilamente decisiva neste microcosmos rural.33 1.2. Atividade comercial e de transportes A partir da leitura dos periódicos da época, é-nos possível concluir que a atividade comercial foi um dos ramos em que se verificou o maior volume de investimento por parte dos emigrantes vindos do Brasil. Os estudos de Jorge Alves, um dos maiores especialistas deste tema, têm evidenciado isso mesmo, especialmente para 134 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro a cidade do Porto. Neste contexto, a abertura do café A Brasileira, em 1903, parecenos ser um exemplo eloquente de uma iniciativa de um brasileiro de retorno. Adriano Teles, regressado de Minas Gerais e conhecedor do modus faciendi do cultivo e produção do café, resolveu trazer para o Porto algum desse saber, abrindo não apenas o espaço comercial, mas controlando o próprio processo de torrefação dos grãos de café, consciente de que, assim, obteria uma melhor qualidade no produto final.34 Assumindo-se como uma importante imagem de marca, o café de A Brasileira impôs-se rapidamente no mercado português, em especial do Norte do país, graças ao recurso a agentes comerciais e a uma eficiente política de marketing.35 Com efeito, muitos dos emigrantes que partiram para o Brasil tinham feito o seu percurso no setor comercial sendo, por isso, um dos que melhor o conheciam, tendo muitos deles começado o seu percurso como caixeiros.36 Outros, porém, houve que não escolheram esta via para singrar no Brasil. É o caso de Abílio de Magalhães. Proveniente de uma pequena localidade do interior Norte de Portugal, a cerca de quarenta quilômetros da cidade do Porto – Aparecida (concelho de Lousada) – este “brasileiro” desenvolveu, neste ramo, um interessante percurso que já tivemos oportunidade de analisar num anterior trabalho.37 Nascido no seio de uma família de comerciantes, foi continuador do estabelecimento do pai, fundado em 1845, que irá, ainda antes da sua partida para o Brasil, expandir abrindo novas lojas e diversificando o tipo de produtos aí vendidos. Constitui a firma Magalhães, Vieira & Cª com outros dois sócios e, paralelamente em 1903, deu origem a uma outra sociedade – Abílio de Magalhães & Cª – proprietária da Casa de Ferragens e drogaria da Aparecida.38 Em 1911, Abílio de Magalhães, então com 40 anos, opta por partir com toda a família para Pernambuco onde fixará residência durante alguns anos. Alegará, então, ter de tratar da administração das importantes propriedades que aí possuía e, sobretudo, colocar os filhos num colégio religioso, em virtude do recente encerramento de muitas escolas católicas pela Primeira República portuguesa, o que nos parece revelar que, nesta opção pela partida, terão estado eventualmente algumas razões políticas.39 A estadia no Brasil permitiu-lhe alargar perspectivas, estabelecer lucrativos negócios e multiplicar a sua fortuna individual. Terá sido toda esta vivência pessoal, associada ao desejo, normal, de ostentar o sucesso na sua terra natal que esteve na base do protagonismo que, a partir do seu regresso definitivo, ocorrido na década de 1920, viria a assumir. Como todos os emigrantes de retorno bem sucedidos, Abílio de Magalhães fez também questão de ser um dos maiores financiadores da festa local, fazendo questão de o dar publicamente a conhecer.40 Não era apenas o simples espírito de solidariedade e benemerência que estava em 135 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro causa. Abílio de Magalhães era um negociante, proprietário de duas grandes casas comerciais, e, atrair à sua terra, a Aparecida, um número inusitado de potenciais consumidores era, sem dúvida, uma excelente oportunidade para aumentar os seus lucros e promover o desenvolvimento daquela pequena localidade. Através dos seus contactos e do jornal que possuía – intitulado Vida Nova –, Abílio de Magalhães foi capaz de catalisar os comerciantes locais num objetivo comum – o desenvolvimento econômico da terra. Soube mostrar-lhes como unidos, recorrendo àquilo que eram os valores e patrimônio locais, nos quais se inclui a romaria, podiam representar uma força aglutinadora e reivindicativa, capaz de gerar uma mais-valia significativa. Não admira, por isso, que, a partir de 1926, num primeiro momento instigados por Abílio de Magalhães, os comerciantes aparecidenses tenham assumido a organização das festas de Agosto. Começando por apelar aos seus amigos mais diretos e familiares, como aconteceu no ano de 1927, “para effectuar com brilho a romaria”, percebe-se existir um acordo tácito entre os comerciantes locais para organizarem rotativamente a festa.41 Ou seja, como acabamos de observar, as grandes dificuldades econômicas e financeiras que, nesta época, se faziam sentir, sobretudo no interior pobre do país, obrigaram à adoção de estratégias locais para o seu atenuamento, que passavam, nomeadamente, por um forte investimento nas festas e romarias que, sobretudo, na época estival, coloriam o Norte de Portugal. Graças a Abílio de Magalhães, a localidade da Aparecida muito cedo ganhou disso consciência, colocando à frente da comissão de festas aqueles que, devido ao seu interesse pessoal e à capacidade para avançarem com o capital necessário, estariam mais preparados para o fazer com sucesso – os comerciantes. Simultaneamente, desenvolveu estratégias para atrair o interesse e o dinheiro dos aparecidenses que, tal como ele, tinham sido ou eram emigrantes no Brasil. Como demonstrou Eulália Lobo para o Brasil, nas primeiras décadas do século XX, o setor dos transportes foi um dos que mereceu atenção e investimentos por parte dos portugueses aí estabelecidos.42 Não admira, por isso, que este tenha sido também um dos setores procurados no regresso. É o caso de José Ribeiro Conceição, natural de Lamego, que, muito novo, emigrou para Santos. Sobre o que foi a sua vida em terras brasileiras pouco se sabe a não ser o que a imprensa de Lamego escreveu anos mais tarde. Informações suficientemente vagas que, sem grandes comprometimentos, procuram justificar perante a sociedade a fortuna arrecadada, atribuindo-a a um trabalho árduo, sério e honrado. José Ribeiro Conceição, dizia-se então, terá enveredado pela atividade comercial tornando-se num dos maiores importadores de Santos, do estado de S. Paulo, entrando, mais 136 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro tarde, no setor dos transportes como armador e proprietário do vapor de longo curso Pavana, que fazia a ligação entre Buenos Aires e o Norte do Brasil.43 Assim terá feito a fortuna que lhe permitiu alterar radicalmente a sua vida a partir de 1905, passando desde então a viver dividido entre dois continentes e duas cidades – Lamego, no interior duriense, e Santos, no litoral brasileiro –, num vaivém contínuo, ao ritmo dos compromissos familiares e profissionais. Apesar da discrição que o caracteriza, Ribeiro Conceição não escapou aos holofotes da imprensa local que logo se apercebeu da sua capacidade financeira e empreendedora. Atento às potencialidades da cidade e da região, Ribeiro Conceição aposta no final da segunda década de Novecentos no setor dos transportes, mantendo em circulação uma frota de carros de aluguel que veio a vender em Fevereiro de 1924 à empresa Aragão e Cª L.ª,44 após alguns conflitos com homens de Lamego estabelecidos nesse ramo de negócio. Como veremos mais à frente, por essa altura, Ribeiro Conceição está prestes a encetar uma nova fase na sua vida empresarial, ao construir e dirigir um teatro com potencialidades e dimensão nunca imaginadas numa cidade do interior do país como Lamego. 1.3. Atividade Industrial Ao nível dos investimentos industriais, os “brasileiros” também deixaram em Portugal inúmeros sinais deste tipo de empreendimentos, espalhados um pouco por todo o Norte do país. Jorge Alves mostrou já alguns exemplos desta iniciativa, como é o caso da Chapelaria a Vapor Costa Braga & Filhos, uma fábrica de chapéus que tinha anexa uma loja comercial, situada numa rua central do Porto, fundada em 1866 por um emigrante português que tinha estado 24 anos no Rio de Janeiro.45 Ou, ainda na mesma cidade, a bem conhecida Fábrica Confiança, fundada por António da Silva Cunha, um emigrante na Baía. Em finais de Oitocentos empregava cerca de mil mulheres o que deve ter inspirado Aurélio Paz dos Reis a imortalizar a sua saída numa película animada. Fora do Porto, muitos outros exemplos de investimentos industriais semelhantes podem, ainda hoje, ser referenciados, como é o caso da Fábrica de Fiação e Tecidos de Santo Tirso, da iniciativa do conhecido conde de São Bento, e que representa um esforço de dinamização da actividade têxtil na região Norte.46 Do mesmo modo, em Fafe, Miguel Monteiro identificou a Fábrica Têxtil do Bugio, que começou a laborar em 1879, fundada por José Florêncio Soares, e a Companhia de Fiação de Tecidos de Fafe, criada em meados da década de 1880, por José Ribeiro Vieira de Castro, à frente de um conjunto de acionistas. No início do século XX, esta última disporia já então de inovações assinaláveis como um bairro operário, 137 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro cantina, creche, lactário e escolas inspiradas no modelo de industrialização inglês e utilizadas como instrumento social de controle dos seus mais de mil operários.47 A propósito dos investimentos no setor agrícola protagonizados pelos “brasileiros” de retorno, referimos já neste artigo Manuel Luís de Sena, relativamente à cidade de Lamego. Com um forte espírito empreendedor, no retorno do Brasil, este homem alargou os seus interesses às mais diversas áreas incluindo a industrial. Em 1925, consciente das potencialidades industriais da recém-instalada energia eléctrica na cidade, e da oportunidade de negócio que isso podia significar, Sena vai fundar em sociedade com alguns lamecenses a Panificação Mecânica Lda. Com instalações fabris sediadas na quinta de que era proprietário e com dois depósitos de venda, estrategicamente colocados no centro da cidade de Lamego, aí se produziam, “pondo de parte velhos processos rotineiros hoje condenados”,48 além do pão, “tosta doce, azêda, biscoito para chá, pastéis, massa para pão sandwich e de regueifa de Valongo”, as afamadas bolas de Lamego, “fornecendo-se a massa em pasta a qualquer hora do dia ou noite”.49 As polêmicas surgidas nos anos seguintes entre Sena e os restantes sócios e que foram trazidas pelos próprios para a praça pública, através das páginas dos periódicos locais, mostram que o negócio não terá corrido tão bem quanto certamente todos desejariam. Por entre contundentes ataques pessoais e troca mútua de acusações, a sociedade desfez-se e a panificadora acabou por mudar de mãos. Sem grandes repercussões na vida de Manuel Luís de Sena, que já então se fazia mais em Lisboa do que em Lamego, este episódio terá acentuado certamente o seu desencanto com a terra natal. 1.4. Bancos e Seguros Os bancos constituíram outra esfera de ação econômica participada pelos “brasileiros”, especialmente a nível urbano e com particular destaque para a cidade do Porto. Como mostrou Jorge Alves, nesta cidade, a sua presença fez-se sentir desde os primórdios do setor, sendo vários os subscritores “brasileiros” na primeira instituição do gênero fundada na cidade – o Banco Comercial do Porto (1835). De igual modo, no banco Mercantil Portuense, fundado em 1855, podemos encontrar nomes de “brasileiros” como José Joaquim Leite Guimarães, mais tarde Barão de Nova Sintra, António de Sousa Barbosa e Francisco Pinto de Miranda como destacados elementos dos corpos sociais.50 Em 1914, sediado em Lisboa, surge, com o patrocínio de um brasileiro nortenho – Cândido Sotto Mayor – a Casa Bancária Pinto & Sotto Mayor (sociedade constituída pelo filho com o mesmo nome, então com 24 anos, e António Vieira Pinto que, apesar dos 26 anos, tinha já experiência no setor bancário e um apurado sentido do negócio51). Em 1925, adotando a nova designação de Banco Pinto & Sotto Mayor,52 138 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro há um alargamento da sociedade e um reforço do capital. Embora reconhecido por todos como o grande mentor e patrocinador do Banco, Cândido Sotto Mayor, só então deixa os bastidores aos quais se tinha remetido, e entra como sócio, reforçando a sua posição e a do filho – com um total de 15 600 contos investidos, estes homens passam a deter mais de metade do capital do Banco.53 Afirmando-se no setor bancário, Cândido Sotto Mayor funda ou compra outras casas bancárias, entre as quais o Banco Colonial Português, o Banco de Chaves e o Banco Mercantil de Viana. No entanto, dando início ao primeiro grupo econômico em Portugal,54 Sotto Mayor diversifica as suas áreas de investimento. Em 1917 funda, em Lisboa, a Companhia de Seguros Luso-Brasileira Sagres e, no Porto, a União Eléctrica Portuguesa,55 a que se seguiram muitas outras empresas primordiais para o desenvolvimento de Portugal nessa época, e que iam desde a gestão de bens imobiliários à comercialização de carne. Cândido Sotto Mayor, nascido em Lebução, concelho de Valpaços, distrito de Vila Real, a 26 de Outubro de 1852, emigrou com dezenove anos para o Brasil em 1873,56 onde se juntou aos tios – Lino e Joaquim da Cunha Sotto Mayor – com casa comercial de fazendas aberta no Rio de Janeiro – a Casa Sotto-Mayor.57 Esse terá sido o ponto de partida para a aquisição de uma grande fortuna que permitiu a Cândido Sotto Mayor, o investimento na indústria têxtil carioca, através da Fábrica do Corcovado da Companhia de Fiação e Tecidos Corcovado, com centenas de operários, de que foi fundador e um dos principais impulsionadores.58 Retornando a Portugal nos últimos anos do século XX (em 1897 é detentor do alvará de exploração das águas termais Campilho59 e, em 1900, é já uma figura de grande prestígio e influência em Chaves60), Sotto Mayor destaca-se pelo espírito empreendedor que o tornou uma referência no mundo dos negócios portugueses e brasileiros. Como pudemos assim verificar, também nos seguros é possível encontrarmos a participação destes “brasileiros” de retorno. Mais uma vez, Jorge Alves, nos trabalhos que sobre estes temas tem desenvolvido, mostrou que, especialmente a partir da segunda metade de Oitocentos e com particular destaque para a cidade do Porto, é possível depararmos com alguns nomes de ex-emigrantes no Brasil, e de outros que ainda aí se encontravam, fazendo parte da administração de companhias seguradoras, já com relativa importância, como é o caso, para além da Companhia de Seguros Luso-Brasileira Sagres, já referida, da Garantia.61 1.5. A participação política e o desenvolvimento local Pelas suas características pessoais e pela notoriedade que alcançavam a nível local, é fácil entender que muitos dos “brasileiros” de retorno se tenham sentido atraídos, ou tenham sido pressionados, para participarem, formal ou informalmente, na vida 139 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro política local, sobretudo no conturbado período que marca o final da monarquia e a implantação da Primeira República em Portugal. Os exemplos não faltam por todo o Norte do país, cobrindo todo o espectro político de então. Em Lamego, Manuel Luís de Sena, a quem já nos referimos, foi, por exemplo, vereador camarário durante os últimos anos da monarquia,62 tendo, em 1913, manifestado o seu apoio ao Partido Republicano local. Mais tarde, a acreditar nas notícias veiculadas no único jornal que se continuou a publicar durante a vigência da Monarquia do Norte, a que Lamego aderiu, ter-se-á colocado ao lado deste movimento, vindo inclusivamente a aceitar integrar a recém-criada comissão administrativa. Detentor de uma forte personalidade e de um grande pragmatismo, pouco compatível com fidelidades partidárias, Sena parece-nos ter, sobretudo, utilizado a política para defender o que ele considerava serem os interesses da sua cidade e para cuja defesa ele mostrou várias vezes estar disponível. Fizera-o em 1913, integrando a comissão principal do movimento que junto do poder político central procurou fazer de Lamego sede de distrito, procurando subtraí-la definitivamente à dependência da então distante cidade de Viseu.63 Voltará a fazê-lo em 1917, quando se colocou ao lado da Câmara Municipal de Lamego, disponibilizando meios financeiros para assegurar a construção da linha de caminho-de-ferro e levar o comboio até à cidade.64 As oscilações partidárias que evidencia, não resultaram certamente de uma inconsistência ideológica, mas de um ajustamento oportunista às fidelidades locais a figuras de políticos em que ele depositava confiança, acreditando que seriam as pessoas certas para protagonizar o progresso da sua cidade. Simultaneamente, a política local carecia de personalidades com as suas características – dinheiro e influência. Como um jornal republicano local, em 1913, salientava, a importância do apoio público manifestado por Sena ao partido republicano local, “n’um meio como o nosso e mesmo fóra d’aqui”, não “é difficil a um abastado proprietario e grande capitalista disposto a prestar serviços, a ser util”, sublinhando que sendo ele “defensor do engrandecimento local” que é o que mais o impulsiona e estimula, de nada precisa, “só tendo que dar”.65 O protagonismo político destes “brasileiros” no nível do poder central, acaba por não ser tão referenciado e identificado com o seu percurso de vida, enquanto emigrante. Se a imprensa local se preocupa em associar as duas variáveis – político e emigrante –, em Lisboa, nos corredores do poder, essa circunstância passa mais despercebida ou nunca é referenciada, intencionalmente ou não. Por isso, são escassas as referências que dispomos, especialmente se obtidas na imprensa 140 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro periódica. Só quando se fazem estudos prosopográficos dos atores políticos desta época é que é possível surpreender algum deputado ou ministro que tenha nascido ou vivido no Brasil. Dos estudos que, nos últimos anos, vimos fazendo na área da política parlamentar, é-nos possível adiantar, por agora, alguns nomes cujo percurso, algum dia no passado, encontrou o Brasil. É o caso de Tomás António de Oliveira Lobo, testamenteiro do nosso já conhecido Conde de Ferreira, nascido no Rio de Janeiro, na primeira metade do século XIX. Para além de ter sido vereador da Câmara Municipal do Porto, em 1864 e 1865, foi ainda eleito deputado em 1868 e 1869, tendo sido, também, entre 1879 e 1881, Governador Civil do Distrito do Porto.66 Do mesmo modo, também João Crisóstomo Melício, nascido no Rio de Janeiro, no ano de 1836, filho de um médico português, emigrante nessa cidade, se revelou na tribuna parlamentar. Como muitos outros filhos de emigrantes portugueses no Brasil, partiu para Portugal, em 1850, para estudar Direito, na Universidade de Coimbra. Acabados os estudos, ficou por Portugal ocupando lugares de destaque na Companhia dos Tabacos e na Associação Industrial de Lisboa. Mas seria como deputado, filiado no Partido Histórico, eleito em 1869, 1870, 1871, 1878, 1879, 1884 e 1897, que teria um percurso mais longo. De sublinhar que, o fato de ter nascido no Brasil, lhe trouxe alguns dissabores quando da sua primeira eleição como deputado. Na verdade, foi então obrigado a defender a sua nacionalidade portuguesa, na medida em que alguns fizeram veicular notícias, segundo as quais ele seria estrangeiro.67 Com um percurso marcante também a nível local, José Guilherme Pacheco, filho de um emigrante no Brasil, nascido no Rio de Janeiro, em 1823, depois de ter estado em Portugal até aos 12 anos, para aí regressa, tendo trabalhado na casa comercial de um seu tio. Regressado a Portugal, em 1845, quando então tinha 22 anos, vai para a Universidade de Coimbra, tendo-se licenciado em Direito. Depois de ter sido Presidente da Câmara Municipal de Paredes, em 1858, foi eleito pela primeira vez como deputado em 1860. Permanecerá como parlamentar nas legislaturas de 1871-1874, 1875-1878, 1879, 1880-1881 e 1882-1884, tendo evidenciado uma postura interventiva ativa, que lhe permitiu destacar-se.68 Evidenciando um percurso típico do emigrante nortenho, na segunda metade do século XIX, José João Martins de Pinho saiu aos 14 anos de Matosinhos, para ser empregado de escritório, depois de ter recebido uma cuidada preparação a nível comercial. No Brasil destacou-se como banqueiro, tendo dirigido o Banco do Crédito Real da Companhia Pastoril, e juntamente com Mota Machado e Mayrink, fundou o Banco Construtor. No Brasil ainda, foi grande benemérito, nomeadamente do Liceu 141 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Literário do Rio de Janeiro, tendo chegado a ser seu presidente. Será no regresso a Portugal, que é eleito deputado, em 1892-1894 e 1897, chegando a Par do Reino, em 1898. O seu perfil de benemerente granjear-lhe-á prestígio no Brasil e em Portugal. D. Pedro II, imperador do Brasil, confere-lhe o título de Barão, em 1880, tendo recebido o título de Conde de Alto Mearim, por duas vidas, das mãos de D. Carlos, em 1891.69 Seu filho, Álvaro Roque de Pinho, nascido já no Rio de Janeiro, em 1880, seguir-lhe-á as pisadas tribunícias e financeiras, tendo sido eleito como deputado, em 1905.70 De projeção nacional inequívoca e desempenhando um papel de destaque naquela que foi a primeira experiência republicana em Portugal, impõe-se referir o nome de Bernardino Machado que, primeiro entre 1915 e 1917 e, mais tarde, no ano de 1925, chegou a exercer o mais alto cargo da Nação, como Presidente da Republica portuguesa.71 O seu pai tinha sido ele também um ex-emigrante no Brasil. Nascido em Joane (concelho de Famalicão), partira em 1840, aos vinte anos, para o Rio de Janeiro, depois de ter feito um tirocínio profissional de três anos como caixeiro em casa de mercadores, nas cidades de Guimarães e do Porto. Já no Rio de Janeiro estabelece-se como comerciante, tendo regressado a Portugal em 1860, onde envolve-se na política local, desenvolvendo uma importante ação cívica e benemerente em Famalicão, acabando por ser nobilitado, ostentando o título de 1º barão de Joane.72 O seu filho, Bernardino Machado, nascera no Brasil, no ano de 1851, tendo regressado a Portugal ainda criança. Como estudante universitário, opta pela nacionalidade portuguesa. No entanto, essa opção não significou rutura. Antes pelo contrário. Como se pode constatar pela política que desenvolveu em torno das relações Portugal-Brasil, não apenas enquanto Presidente da República, mas também na qualidade de Ministro e Embaixador de Portugal no Rio de Janeiro, a ele se ficou a dever a elevação das legações do Rio de Janeiro e de Lisboa à categoria de embaixadas.73 1.6. Cultura e Turismo Foi também na área da cultura que muitos destes “brasileiros” de retorno mais se distinguiram. Tratando-se de uma área que, ainda hoje, é sacrificada pelos governos em termos de investimentos públicos, particularmente em épocas de crise, no período compreendido entre finais do século XIX e inícios do XX, viveu muito dos investimentos particulares de beneméritos da cultura, como aconteceu com os “brasileiros” de retorno. Na verdade, o investimento neste setor traduz uma postura pouco convencional, e até mesmo vanguardista, relativamente à sociedade portuguesa do seu tempo, acabando por evidenciar a sua marca particular. 142 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Desde cedo, e um pouco por todo o Norte do país, é possível encontrar “brasileiros” de retorno a investirem em salas de espetáculo, manifestando evidentes preocupações culturais aliadas à intenção de promoção geral das suas comunidades, uma vez que na época se consideravam os teatros como marcas distintivas de civilização. São, por isso, variadíssimos os exemplos que poderíamos aqui trazer evocando localidades de todo o Norte de Portugal. Em 1912, por exemplo, na cidade do Porto, numa das suas ruas centrais, foi inaugurado o Olympia Kinema-Teatro, por ação do “brasileiro” Henrique Alegria. Uma vez que esta cidade albergava já então outras salas destinadas à representação, esta casa distinguiu-se pela diferença. Na verdade, ela foi pioneira do animatógrafo, tendo sido palco das célebres projeções “electro-animadas-extra-luminosas”, além de exibir “magníficas sessões” de variedades em que predominava a música e a dança, protagonizadas por reputados artistas portugueses e internacionais.74 Por sua vez, em Matosinhos, um outro ex-emigrante no Brasil, Emídio José Ló Ferreira, mais tarde Visconde de Trevões75, empregou o seu entusiasmo e auxílio financeiro na construção do Teatro Constantino Nery76, inaugurado em 1906. Na época da sua abertura, este teatro recebeu nomes prestigiados da representação e possuía uma capacidade de lotação superior a meio milhar, sendo constituído por plateias superior e geral, galeria, balcão, camarotes e um amplo salão. Tendo entrado em decadência nos anos de 1980, foi recentemente recuperado pela Câmara Municipal, tendo reaberto ao público em 2008. Um pouco mais para o interior, em Fafe, José Summavielle Soares um neto de um dos mais destacados “brasileiros” do concelho, de seu nome José Florêncio Soares, numa iniciativa de caráter particular mandou construir, em 1923, na sua terra um belíssimo edifício destinado a funcionar como Teatro-Cinema. Trata-se de uma das últimas obras patrocinadas por “brasileiros” construídas em Fafe, dispondo de uma lotação de cerca de 400 lugares, possuindo um palco de grandes dimensões e estando apetrechado com um fosso para a orquestra.77 Numa outra cidade do Norte de Portugal (Lamego), um outro “brasileiro”, de seu nome José Ribeiro Conceição, a quem atrás já nos referimos, aqui investiu o seu dinheiro, aplicando-o em várias iniciativas, entre as quais queremos agora destacar a área cultural78. Num dos seus retornos periódicos, depois de arrematar em hasta pública em 1924, por dez mil e um escudos, o espaço em ruínas do antigo hospital, deu início à construção daquele que, em Portugal, seria, certamente o negócio da sua vida – o Teatro-Circo Ribeiro Conceição. Dessa forma, este emigrante português em Santos envolver-se-ia num projeto que lhe trouxe muita projeção social, mas também inúmeros problemas, não apenas inerentes ao processo de reconstrução 143 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro do próprio edifício como, sobretudo, aqueles decorrentes do fato de ele ter perturbado os interesses econômicos estabelecidos desde há muito numa pacata cidade do interior. Isso ganhava uma dimensão mais acentuada num momento em que Lamego dispunha já de duas casas de espetáculo – o Teatro Lamecense79 e o Salão-Teatro80 – e parecia definitivamente colocada no caminho do desenvolvimento que os da terra não queriam partilhar com estranhos. Apostado em dotar Lamego de um equipamento cultural único e que oferecesse uma dignidade suplementar relativamente aos espaços já existentes, Ribeiro Conceição não poupou esforços para construir a jóia que seria simultaneamente o seu ninho de investimento que ele augurava auspicioso. Assim, como podemos ler na imprensa local, contrata um engenheiro do Porto, e manda vir de Braga um dos mais conceituados arquitetos do país o que demonstrava bem “o empenho e o prazer que tem que esta obra se realise, e que emfim Lamego passe a ter um grande teatro, à altura duma cidade moderna”81. Inaugurado em 1929, a grandeza do projeto era de fato esmagadora tendo em conta a dimensão da cidade e a mediania a que esta estava habituada. O jornal A Justiça de Lamego, em 1927, perdia-se em elogios quando descrevia as potencialidades do Teatro então em construção: O palco é gigantesco, onde pode trabalhar á vontade uma companhia de revista ou de opereta. Tem dependências para tudo! Salão de recepções, salas de bilhares, restaurant, café, bufet, incluindo quatro espaçosas dependencias, para comercio, onde se podem montar 4 estabelecimentos82. Era uma coisa que, efetivamente, Lamego nunca vira. Após vicissitudes várias, o Teatro fecharia as suas portas em finais da década de 1980, e assim ficaria até que, depois de adquirido pela Câmara Municipal, foi de novo inaugurado em 2008, oitenta anos depois da sua primeira abertura ao público. Setor importante para o desenvolvimento local, o turismo atraiu, também, o interesse dos emigrantes portugueses retornados do Brasil. Nascido numa região rica em fontes de águas com reconhecidas qualidades terapêuticas – entre as quais se destacam Vidago e Pedras Salgadas –, Cândido Sotto Mayor a quem já nos referimos, após o seu retorno a Portugal, cedo se apercebeu das potencialidades turísticas do termalismo. Em 1897, compra a quinta do Revolar, na aldeia de Vidago, freguesia de Arcossó, concelho de Chaves, passando a explorar as águas da nascente denominada Campilho descoberta alguns anos antes,83 dotando-a de um luxuoso edifício e um frondoso parque que permitia não só a sua utilização por quem aí dela quisesse usufruir, como o seu engarrafamento através de um 144 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro moderno e mecanizado processo que possibilitava a sua distribuição por outras zonas do país.84 Em 1914, candidata-se à exploração das termas de Chaves, posta a concurso pela Câmara Municipal.85 Conhecidas desde os romanos, estas termas estavam, desde há algum tempo, votadas a um quase abandono e sem um balneário capaz. Movendose facilmente na sociedade flaviense, onde construíra uma grande casa e doara à cidade um jardim que veio a ter o seu nome, Sotto Mayor apresenta-se, nesta mesma altura, como candidato pelo influente partido republicano às eleições para a Câmara Municipal. Sem grandes surpresas, ganha o concurso.86 A sua promessa de investimento na recuperação do espaço termal que Chaves ambicionava a bem do progresso da cidade, contudo, não se vem a concretizar.87 Uma situação desconfortável para os que o apoiavam e que foi aproveitada pelos que se lhe opunham para lhe dirigir duras críticas. Dentre eles, a Folha de Chaves que, repetindo o argumento frequentemente utilizado em outras localidades e com outras “brasileiros” de retorno, o acusa de se preocupar mais com os negócios e menos com a benemerência. Apesar de ser “vinte vezes milionário”,88 escreve esse semanário em 1916, Sotto Mayor não se incluía entre os “brasileiros” da região que, embora com menos fortuna, entregavam as suas dádivas à Santa Casa da Misericórdia de Chaves ou ao Asilo da Infância Desvalida. Conclusão Apesar do painel apresentado, estamos conscientes de que este trabalho é apenas mais uma das muitas sínteses que ainda estão por fazer, no que respeita ao papel desempenhado por estes emigrantes portugueses no Brasil, uma vez retornados às suas terras de origem, entre finais de Oitocentos e inícios do século XX. Como se pode perceber, o impacto dos seus investimentos, em dinheiro, conhecimentos e experiência adquirida, que se traduzem em outras tantas visões do mundo, foram fundamentais para o desenvolvimento de Portugal num período em que, financeiramente, se viveram tantas dificuldades a nível interno. A importância das remessas dos emigrantes no Brasil e o impacto deste capital nas finanças públicas portuguesas já nos tinha sido dada a conhecer. Para além das remessas, contudo, existe todo um universo por conhecer e dimensionar que envolve o empreendedorismo destes homens e que, como quisemos demonstrar, foi um pilar essencial no desenvolvimento econômico, social e cultural de Portugal. Impõe-se, por isso, trabalhar cada vez mais no terreno, empreendendo um levantamento de informação que nos permita cadastrar estas obras e os seus protagonistas, através da multiplicação de estudos de micro-análise, como o que acabamos de fazer. Como mostrou já J. Alves, estes estudos não se apresentam 145 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro fáceis de concretizar. Na realidade, para efeitos da burocracia a condição de emigrante ou de ex-emigrante, na maior parte dos casos não resulta relevante.89 Daí a importância de se cruzarem vários tipos de fontes documentais, nomeadamente os relatos provenientes da imprensa escrita. Só assim será possível compreendê-los melhor, reconhecer os locais de emigração no Brasil e identificar os setores de atividade onde fizeram fortuna, evidenciando aquele que foi, sem dúvida, um dos mais importantes instrumentos do desenvolvimento das relações Portugal-Brasil – a emigração. Notas e referências *O artigo foi adaptado para o português do Brasil, segundo as novas regras ortográficas, mas a estrutura do texto foi mantida. 1 Joaquim da Costa LEITE. Portugal and emigration, 1855-1914. Columbia University, p. 1-3. Costa Leite estima que cerca de 90% dos emigrantes se dirigiam para o Brasil (cf. Joaquim da Costa LEITE, 1999. O Brasil e a Emigração Portuguesa (1855-1914). In Fazer a América: a Imigração em Massa para a América Latina. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1994, p. 177. 2 Eulália Maria Lahmeyer LOBO. Portugueses en Brasil en el siglo XX. Madrid: Editorial Mapfre, 1994. 3 Destacamos, especialmente, a sua tese de doutoramento: Jorge Fernandes ALVES. Os Brasileiros: Emigração e Retorno no Porto Oitocentista. [S.n.]: Ed. de Autor, 1994. 44 Rui RAMOS. A Segunda Fundação (1890-1926). In José MATTOSO (dir.). História de Portugal. [S.l.]: Círculo de Leitores, 1994, p.31. 5 Eduardo LOURENÇO. A emigração como mito e os mitos da emigração. In O Labirinto da Saudade: Psicanálise Mítica do Destino Português. 2ª ed. Lisboa: Gradiva, 2001, p. 125. 6 Maria Beatriz ROCHA-TRINDADE. Refluxos culturais da emigração portuguesa para o Brasil. Análise Social. Lisboa. vol XXII (90), 1986, p. 145. 7 Lisboa: Parceria A. M. Pereira. 8 O “Brasileiro” ou o Equívoco Português. Lisboa: [s.n.]. (Separata do vol. XXVI, fasc. I, da revista Brotéria). 9 PORTUGAL. Diario da Camara dos Deputados… Sessão de 10 de Junho de 1887, p. 1168. 10 Eça de QUEIROZ. A Emigração como força civilizadora. Lisboa: Perspectivas e Realidades, 1979, p. 150. Trata-se de um relatório que Eça escreveu enquanto cônsul, datado de Novembro de 1874, tendo-o entregue a Andrade Corvo, Ministro dos Negócios Estrangeiros, antes de partir para o seu posto em Newcastle. A análise sobre as vantagens da emigração centra-se no capítulo IV desta obra (pp. 83-95). 11 Joaquim da Costa LEITE, 1999, p. 63. 12 “Em favor de Lamego”. O Progresso, Lamego (PT), 14 de Maio de 1910, p. 1. 13 J. Seves d’OLIVEIRA. Portugal e a Emigração. A Fraternidade, Lamego, 22 de Abril de 1922, p. 1. 14 “A emigração para o Brazil. Por Villa Real”. O Vilarealense, Vila Real (PT), 6 de Março de 1913, p. 1. 15 Almeida MEDEIROS. “A Emigração”. A Discussão, Ovar (PT), 12 de Outubro de 1912, p.1. 16 Maria Ioannis B. BAGANHA. As correntes emigratórias portuguesas no século XX e o seu impacto na economia nacional. Análise Social. Lisboa. Vol. XXIX (128) (4º), 1994, p. 963 17 Jorge F. ALVES. Terra de Esperanças – O Brasil na emigração portuguesa. Portugal e Brasil – Encontros, desencontros, reencontros. Cascais: Câmara Municipal, VII Cursos Internacionais, 2001, p. 127. 146 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro M. Jules DUVAL. Histoire de l’Émigration Européenne, Asiatique et Africaine au XIXe siècle. Ses causes, ses caractères, ses effets. Paris : Librairie de Guillaumin et Cie, 1862, p. 168. 19 ALVES, 2001, p. 353. 20 Wenceslau Gonçalves NETO; Justino MAGALHÃES. Estado e Particulares na Escolarização de Portugal na segunda metade do século XIX: a Escola Conde de Ferreira em Mafra. História & Perspectivas. Uberlândia. (38) 163-189, Jan-Jun 2008. 21 António da COSTA. Historia da instrucção popular em Portugal: desde a fundação da monarchia até aos nossos dias. Porto: Editor Antonio Figueirinhas, 1900, pp. 197-198. 22 Sobre a biografia do Conde de Ferreira ver Jorge F. ALVES. Percursos de um Brasileiro do Porto: o Conde de Ferreira. Revista da Faculdade de Letras – História. Porto: Universidade do Porto. II Série, nº IX, 1992, pp. 202-204. 23 Ver também o nosso trabalho Fernanda Paula Souza MAIA. A Acção dos ‘Brasileiros’ de TornaViagem em Ovar: a Obra dos Irmãos Oliveira Lopes (Válega). Dunas: Temas & Perspectivas. Revista anual sobre cultura e património da região de Ovar. Ovar. Ano 5, nº 5 (Nov.), 2005, pp. 3-14. 24 ALVES, 2001, p. 287-288. Veja-se, também, sobre esta problemática Miguel MONTEIRO. Migrantes, Emigrantes e «Brasileiros» de Fafe (1834-1926): Territórios, itinerários e trajectórias. Fafe: Ed. Autor, 2000, pp. 258-259. 25 A Fraternidade, Lamego, 5 de Março de 1927, p. 2. Latoeiro é o artesão que produz e repara objectos de latão. 26 O Progresso, Lamego, 20 de Abril de 1907, p. 2. 27 No estabelecimento de José Meneses, na Praça do Comércio. PT/ Lamego, 25 de Janeiro de 1908, p. 1. 28 O Progresso, Lamego, 27 de Maio de 1908, p. 2. 29 O Progresso, Lamego, 27 de Junho de 1908, p. 3. 30 O Progresso, Lamego, 8 de Agosto de 1908, p. 1. 31 Voz de Lamego, Lamego, 29 de Novembro de 1962, p. 3. 32 Voz de Lamego, Lamego, 22 de Setembro de 1934, p. 3. 33 ALVES, 2001, p. 117. 34 ALVES, 2001, p. 309; MAIA, Fernanda Paula Sousa MAIA; Maria da Conceição Meireles PEREIRA. Os Brasileiros Empresários e Investidores. Os Brasileiros de Torna-Viagem. Lisboa: CNCDP, 2000, p. 312. 35 Em Novembro de 1904, o representante de A Brasileira, convidou a sociedade lamecense para tomar café no Hotel Central. O evento contou com a presença da imprensa local, garantindo, de imediato, a publicitação do produto que desta forma se pretendia promover. PT/ Lamego. O Progresso, 19 de Novembro de 1904, p. 1. 36 José Manuel PEREIRA. O Caixeiro e a Instrução Comercial no Porto Oitocentista: percursos, práticas e contextos profissionais. Porto: Ed. Autor , 2001 (Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, orientada por Jorge Fernandes Alves). 37 Isilda Braga da Costa MONTEIRO; Fernanda Paula Sousa MAIA. Em defesa dos interesses da Senhora Aparecida – os “brasileiros” e o desenvolvimento local. Oppidum. Ano 4, nº 3, 2008/2009, pp. 195-207. 38 Vida Nova, Lousada (PT), 6 de Novembro de 1910, p. 2. 39 Cf. Vida Nova, Lousada, 11 de Maio de 1911, p. 2. Em várias ocasiões, regressou e tornou a partir, havendo um registo de passaporte datado de 10 de Março de 1921 com destino a Pernambuco (PT. Arquivo Distrital do Porto, Livro de registo de passaportes nº 3430, registo nº 159). 40 Vida Nova, Lousada, 16 de Junho de 1928, pp. 1-2. 18 147 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Vida Nova, Lousada, 16 de Junho de 1928, pp. 1-2 LOBO, 1994, p. 54. 43 A Nossa Terra, Lamego, 9 de Fevereiro de 1929, p. 1. 44 A Fraternidade, Lamego, 12 de Abril de 1924, p. 2. 45 ALVES, 2001, p. 307. 46 MAIA; PEREIRA, 2000, p. 313. 47 MONTEIRO, 2000, pp. 282-283. 48 A Fraternidade, Lamego, 26 de Set. de 1925, p. 1. 49 A Fraternidade, Lamego, 22 de Ago. de 1925, p. 2. 50 ALVES, 2001, pp. 300-305. 51 João de Sousa da CÂMARA. História do Banco Pinto e Sotto Mayor. 1914-1989. [S.l.]: Banco Pinto e Sotto Mayor, 1989, pp. 13-14. 52 Os bancos podiam efectuar recepção de depósitos, colocação de obrigações alleias e contratos de empréstimo sobre penhores, enquanto as casas bancárias apenas estavam autorizadas a fazer algumas destas funções (J. Amado MENDES. E empresa bancária em Portugal no século XX: evoluções e estratégias, Gestão e Desenvolvimento. Viseus, 2002, 11, 39-56, p. 43) 53 CÂMARA, 1989, p. 23. 54 CÂMARA, 1989, p. 13. 55 CÂMARA, 1989, pp. 27-29. 56 PORTUGAL. Arquivo Municipal de Vila Real, Governo Civil de Vila Real, Livros de Passaportes 010/1615/328, p. 85. 57 Barroso da FONTE - coord. Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses. Guimarães: Editora Cidade Berço. 1988, vol. I, p. 587. 58 Sérgio de Oliveira BIRCHAL. O empresário brasileiro: um estudo comparativo. Revista de Economia Política. São Paulo. vol. 18 , nº 3 (71), Jul-Set. 1998, p. 33; PT/ chaves. O Intransigente, 18 de Agosto de 1902, p. 2; 24 de Agosto de 1902, p. 3. 59 Adalberto TEIXEIRA. Água minero-medicinal de Vidago: Fonte Campilho. Porto: Typographia do Porto Medico, 1908. (Dissertação apresentada à Escola Médico-Cirurgica do Porto), p. 35. 60 O Intransigente, Chaves, 7 de Janeiro de 1900, p. 1. 61 Jorge Fernandes ALVES. A Difusão da Técnica Actuarial e as Primeiras Companhias de Seguros no Porto (século XIX). Revista da Faculdade de Letras: História. Porto, 2005, III série, vol. 6, pp. 200 e 203. 62 PORTUGAL. Arquivo Municipal de Lamego. Actas de Vereação, Lº 22, fl. 7v. 63 A Fraternidade, Lamego, 11 de Fevereiro de 1913, p. 1; O Progresso, 15 de Março de 1913, p. 1. 64 O Progresso, Lamego, 5 de Maio de 1917, p. 1. 65 O Progresso, Lamego, 18 de Julho de 1913, p. 1. 66 Fernando MOREIRA. Tomás António de Oliveira Lobo. In Maria Filomena MÓNICA - coord.. Dicionário Biográfico Parlamentar: 1834-1910. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais; Assembleia da República, 2005, vol. 2, pp. 615-616. 67 Fernando MOREIRA. João Crisóstomo Melício. In: Maria Filomena MÓNICA, (coord.). Dicionário Biográfico Parlamentar ..., 2005, vol. 2, pp. 816-817. 68 Maria Isabel SOARES. José Guilherme Pacheco. In Maria Filomena MÓNICA (coord.). Dicionário Biográfico Parlamentar ..., 2005, vol. 3, pp. 145-147. 69 Maria da Conceição Meireles PEREIRA. Os Brasileiros Notáveis e… os Outros. In Os Brasileiros de Torna-Viagem no Noroeste de Portugal. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2000, p. 367. 41 42 148 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Impactos da emigração portuguesa para o Brasil no norte de Portugal – Finais do séc. XIX e inícios do XX Fernanda Paula S.Maia/Isilda Braga da C. Monteiro Fernando MOREIRA. Álvaro Roque de Pinho. In MÓNICA, Maria Filomena (coord.). Dicionário Biográfico Parlamentar ..., 2005, vol. 3, p. 306. 71 Fernando Farelo LOPES. Bernardino Luís Machado Guimarães e António Barreto. Maria Filomena MÓNICA - coord. Dicionário de História de Portugal. Porto; Lisboa: Liv. Figueirinhas, 1999, vol. 8, p. 164. 72 Elzira Machado ROSA. Bernardino Machado: cientista, pedagogo e político: raízes minhotas e brasileiras. In Os “Brasileiros” da Emigração. Seminário no Museu Bernardino Machado. Famalicão: Câmara Municipal, 1999, pp. 22-27. 73 ROSA, 1999, p. 26. 74 MAIA; PEREIRA, 2000, p. 317. 75 Natural de Trevões (S. João da Pesqueira), emigrou para o Brasil, onde em Manaus colaborou com o governador António Constantino Nery, atribuindo-se-lhe o projecto da Casa de Detenção de Manaus (cf. Carlos Lélio Lauria FERREIRA; Luís Carlos VALOIS. Sistema Penitenciário do Amazonas: História; Evolução; Contexto Atual. Curitiba: Juruá Editora, 2006, p. 85). O título de Visconde de Trevões foi-lhe concedido por D. Manuel II, por decreto datado de 29 de Abril de 1909 (cf., Afonso Eduardo Martins ZÛQUETE - dir., coord e compil. Nobreza de Portugal. Lisboa: Editorial Enciclopédia, Lda, 1961, vol. III, p. 453). 76 Sublinhe-se que a designação dada ao Teatro – Constantino Nery – evoca o nome do então governador do Amazonas, coronel Antônio Constantino Néry (entre 23 de Julho de 1904 e 23 de Julho de 1908). 77 Miguel MONTEIRO. Fafe dos “Brasileiros”(1860-1930): Perspectiva histórica e Patrimonial. Fafe: Ed. A., 1991, pp. 112-116. 78 Fernanda P. S. MAIA; Isilda B. da C.a MONTEIRO. Os “Brasileiros” de torna-viagem como agentes culturais. O caso de Lamego na primeira metade do século XX. In Actas do Seminário Internacional Memórias e Migrações: Museus, História, Educação, Diversidades e Direitos Humanos. Museu dos Emigrantes, 2007. Disponível em http://www.museuemigrantes. org/seminario-comunicacao-fmaia.htm. 79 Começou a ser construído em 1839 e foi inaugurado em 1841. Cf. Sousa BASTOS. Dicionário de Teatro Português. Edição fac-similada. Coimbra: Minerva, 1994, p. 347. 80 O seu projeto teve início em 1901. Cf. Fernando CABRAL. Cinema em Lamego: do mudo aos nossos tempos. [S.l.]: Tip. Voz de Lamego, 1996, p. 59. 81 A Fraternidade, Lamego, 21 de Junho de 1924, p. 2. 82 A Justiça de Lamego, Lamego, 15 de Janeiro de 1927, p. 1. 83 A. TEIXEIRA, 1908, p. 35. 84 A. TEIXEIRA, 1908, pp. 31-33. 85 Folha de Chaves, Chaves, 24 de Abril de 1914, p. 2. 86 O Flaviense, Chaves, 27 de Junho de 1915, p. 1. 87 Após o falecimento do pai, em 1935, Cândido Sotto Mayor Júnior adquire em 1848 os direitos de exploração das termas de Chaves (João de ALENCAR. As Caldas de Chaves serão o fulcro da cidade nova. (Sep. do Semanário Ecos de Chaves, 1948). 88 Folha de Chaves, Chaves, 29 de Outubro de 1916, p. 1. 89 ALVES, 2001, pp. 126-127. 70 149 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Universidade Federal de Mato Grosso Resumo: O questionamento se houve ou Abstract: The question whether or not the não franceses em São Paulo é sempre dirigido àqueles que estudam a temática. Não constituindo os contingentes majoritários deslocados para a cidade, os franceses sempre foram silenciados no contexto dos estudos migratórios. Esse artigo busca, justamente, demonstrar que tanto houve a presença de imigrantes franceses em São Paulo, como a imigração francesa, para além de viajantes, escritores, pintores ou engenheiros, facetas mais conhecidas, também foi composta por pessoas comuns de parco ou nenhum recurso. Dentre as fontes utilizadas estão incluídos processos de casamentos e notícias de jornais, em uma metodologia que contempla a prosopografia e histórias de vida. Palavras-chave: Imigração francesa – São Paulo – cidade - histórias de vida. French in São Paulo is always directed to those who study the subject. Do not constitute the majority contingent moved to the city, the French have always been silenced in the context of migration studies. This article seeks precisely to show that there was so much the presence of French immigrants in São Paulo, as the French immigration, as well as travelers, writers, painters or engineers, better known facets, was also made up of ordinary people of meager or no resources. Among the sources used are included processes of weddings and newspapers in a methodology that includes the prosopography and life stories. Keywords: French immigration - São Paulo – Cities - life stories. “Realmente houve imigração francesa para São Paulo?” Eis aí um questionamento relativamente comum quando se envereda por essa rota de pesquisa. Em geral, quando se pensa em imigração para a São Paulo oitocentista, advêm as imagens de italianos, alemães e japoneses. Ou seja, aquelas nacionalidades cujo número de integrantes salta aos olhos, inclusive por meio da historiografia, com grande quantidade de produções acadêmicas. O caso francês é um pouco diferenciado. Em sua maior parte, não se trataram de saídas em massa, arregimentadas pelo Estado ou por fazendeiros, mas individuais e espontâneas. Nesse sentido, mesmo em um momento no qual era premente a demanda de mão-de-obra para a lavoura cafeeira, os franceses não se verteram para o âmbito rural, mas, sobretudo, para a urbes, onde desempenharam diferentes ofícios e um emaranhado de vivências que revelam seu cotidiano. Não obstante, nas análises que enfocam a cidade de São Paulo, as menções aos franceses serem pulverizadas e esporádicas, a própria historiografia produzida na França, durante muito tempo, relegou a emigração a tema marginal e secundário. Tal se deve a alguns fatores, dentre os quais o de que os estudos franceses estiveram, em geral, associados ao republicanismo, em que era acentuado um Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015, pp. 150-176 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar discurso de afirmação nacional, de construção identitária. Logo, no contexto desta “História Nacional”, não havia espaço para aqueles que, ao emigrarem, rompiam o contrato social implícito que os ligava à nação. A historiografia republicana, inclusive, sustentava que o ideário de nação já estava solidificado antes do momento em que ocorreram as emigrações em massa na Europa. Assim, o destino desses emigrantes foi por vezes apagado. Colaboraram nesses aspectos, também, dois outros pontos. O primeiro refere-se à falta de interlocução entre os historiadores franceses e os especialistas dos países de acolhida; o segundo a forte distinção que se fazia entre a História da França e a História de outras localidades, as chamadas de “estrangeiras”.1 De qualquer forma, a imigração francesa foi patente ao longo do XIX e não composta somente por viajantes, escritores, pintores ou engenheiros, facetas mais conhecidas e que induzem ao pensamento de que esta emigração era especializada e tinha traços de elite. O grosso da população que partiu da França e, em particular, fez da São Paulo oitocentista parte da sua caminhada, pelo contrário, eram pessoas comuns de parcos ou nenhum recurso. Tratavam-se de indivíduos que não chamavam a atenção por seu quantitativo, mas por seus aspectos qualitativos - padeiros, modistas, cozinheiros, cabeleireiros, ourives, alfaiates, costureiros, empreendedores dos ramos de hotéis e restaurantes, engenheiros, além de outros que se encontravam longe do glamour tradicionalmente imputado aos franceses. Assim estavam os porqueiros, que vendiam carne pelas ruas; pintores; pedreiros; ferreiros; mecânicos e aqueles que vagavam pelas moradas de outrem pedindo trabalho. Enfim, não “grandes personagens” acompanhados de “grandes feitos”, mas, assim como os demais fluxos de imigrantes, indivíduos esperançosos que buscavam algum tipo de ascensão econômica, possibilidades mais prósperas e dignas de sobrevivência. A emigração francesa, dessa forma, não deve ser considerada uma “aberração” ou um capítulo à parte na história, mas um componente nem mais nem menos excepcional que os demais, no quadro das movimentações intercontinentais que o século XIX abarcou. Na realidade, a presença e influência francesas no Brasil, mesmo que esparsa e indireta, já se consubstanciava desde a colonização,2 por intermédio de Portugal ou diretamente a partir do próprio território francês, com incursões de cientistas, viajantes, contrabandistas e missionários que deixaram, dentre as marcas iniciais, obras com impressões acerca do Brasil. Essas marcas, no pensar de Gilberto 151 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Freyre, indicam “que a presença, em nosso país, de seus autores correspondeu a uma ação de influência de ideias, estilos e maneiras francesas trazidas por eles”.3 Logo, no campo das ideias, a penetração cultural foi patente e perdurou ao longo dos séculos, através de livros e membros da elite que optavam por estudar na França. A penetração que se fazia sentir nos contornos da literatura, a partir do século XIX, no entanto, passou a delinear-se de maneira paulatina na vida cotidiana, com a crescente presença de franceses que cruzavam o Atlântico para se estabelecerem no Brasil. Inaugurado o século XIX, o panorama europeu enovelava-se à França sob os auspícios de Napoleão. Em 1808, com a abertura dos portos na Colônia - fator que tornou mais constante a presença de estrangeiros - oficialmente vetava a entrada de franceses. Em 1814, porém, findas as guerras napoleônicas e com as relações sendo retomadas entre Brasil e França, uma série de personagens - incógnitos ou não - passou a afluir ao Brasil, principalmente para as zonas que apresentavam maiores possibilidades de sobrevivência e ascensão econômica. Nesse sentido, durante a primeira metade do século, as cidades eleitas foram Rio de Janeiro,4 Salvador e Recife, que acabaram por receber engenheiros, artesãos, artistas e comerciantes, franceses atraídos pela opulência e pelo leque de inserções que essas localidades exalavam. Pela mesma época, por outro lado, a despeito de estar longe de ser a soturna e pacata cidade5 apregoada nas descrições de alguns viajantes e memorialistas, São Paulo guardava ainda lugar de modesto destaque nos quadros da economia, incitando, desta forma, esparsos e miúdos contingentes imigratórios. Esta tela, entretanto, não excluía a lenta penetração de hábitos europeus nas famílias aristocráticas, que se utilizavam, especialmente, do já assentado comércio de luxos e miudezas, ao gosto francês, na Corte. De qualquer maneira, a partir da década de 50 do Oitocentos, São Paulo verteu-se em palco de transição – onde o velho interagia com a inserção do novo – e de transformações de naturezas diversas, que mudaram seu cenário, ao trazer diferentes cores econômicas, urbanas e sociais. Foi, assim, que se tornou atrativa aos franceses que, então, eram identificados com as “luzes”. Nos almanaques e jornais da cidade pululavam nomes de franceses e, em suas ruas principais, alocavam-se quantidades consubstanciais de casas comerciais, cujos negociantes eram personagens que introduziam novos gostos; elementos importantes em meio ao manancial que imprimia ares peculiares de dinamismo à capital. 152 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar A riqueza advinda com o café fomentou uma série de transformações,6 instituindose definitivamente, a partir de 1850, como o primeiro artigo de exportação da Província, de modo a consagrá-la ao topo da economia imperial. O desenvolvimento do comércio cafeeiro teve como resultado o enriquecimento das elites locais e um processo endógeno de aproveitamento dos lucros.7 Nessa esteira, a capital do estado passou a centralizar todo esse complexo, dado que a burguesia do café ali estabeleceu residência, mediante as facilidades de comunicação propiciadas pelas ferrovias que – construídas em ritmo acelerado - serviam ao escoamento de produtos e pessoas. À medida que os fazendeiros se mudavam, crescia a tendência em promover melhoramentos urbanos. A cidade, desta forma, transformava-se e por isso demandava novas necessidades. Ao “aburguesamento” dos gostos e do modo de vida também estava imbricado o desenvolvimento do comércio, dos serviços e depois das incipientes indústrias. Nessas novas oportunidades detiveram-se os imigrantes, inclusive os franceses, tanto aqueles primeiros, que já vieram instalar-se em meados do século, ou antes, quanto aqueles vindos nas últimas décadas. A França, por sua vez, figurava entre as potências da época, com crescente industrialização – sem esquecer, no entanto, que o setor primário ainda detinha importante peso na economia - e com a burguesia definindo seus contornos, firmando-se cada vez mais no poder e demandando mudanças no panorama francês. A construção de ferrovias, o desenvolvimento de bancos, a facilitação do crédito e da formação de sociedades anônimas, ademais a remodelação urbana efetuada por Haussmann em Paris, foram exemplos dessa ingerência. A burguesia exalava comportamentos, formas de vestir, comer e, sem dúvida, de consumir. Paris estava sendo concebida para ser modelo, vitrine mundial, enfim, a “Meca da Moda”. A influência cultural se espraiava, inclusive através da exportação dos chamados “artigos de Paris”, como tecidos, objetos de armarinho, perfumaria, móveis e peças de decoração. A despeito desse contexto de “exaltação” havia, sem dúvida, outro conjunto que permeava a vivência do indivíduo em si. A decisão de emigrar, em qualquer época, não é incólume, mas desvenda um complexo de situações socioeconômicas pertencentes ao cotidiano, ligadas, por exemplo, à agricultura, às atividades urbanoindustriais, ao crescimento populacional e a mudanças na sociedade como um todo.8 O desejo de ascensão econômica, o de melhorar de vida através de outras oportunidades e, mesmo, o de fugir à miséria faziam parte do universo do emigrante, do qual o francês não estava excluído. 153 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar A França, desse modo, era o lugar dos extremos sociais. Ao lado dos privilegiados pela “festa imperial”, o mundo do dinheiro e os espetáculos da Bolsa, descritos por Zola (1960) e Dumas [1956], estavam as vítimas da miséria, excluídas deste universo abastado, representadas em Les Misérables de Victor Hugo. Os números consubstanciais de saída não devem ser desprezados,9 ao passo que um estudo quantitativo da imigração francesa torna-se praticamente inviável pela própria deficiência das fontes estatísticas e pelo fato dos franceses não migrarem em massa. Tal emigração não comporta ser vista, assim, em um aspecto macronacional, mas sim como a somatória de fluxos regionais diversos. Cada departamento e mesmo cada arrondissement tinha lógicas próprias. A emigração massiva não se deu na França por alguns fatores, dentre os quais não estavam incluídas as possibilidades de que sua população não passasse por dificuldades e de que não houvesse lacunas sociais. A principal causa disso não ter ocorrido explicava-se pelo fato de que não houve um “boom” populacional. A França contava com baixas taxas de natalidade e isso fazia com que o governo adotasse medidas restritivas à emigração de seus nacionais. Circulares alertavam para os perigos de dar ouvidos aos agentes recrutadores e às próprias cartas de amigos ou parentes que serviam de chamariz.10 Em realidade, as agências de emigração brasileiras, por exemplo, estavam proibidas de atuar na França, pelo menos até fins do XIX. O aliciamento de trabalhadores franceses para a lavoura cafeeira foi mínimo e, mesmo assim, muitos se evadiram para as cidades, onde encontravam maiores chances de ascensão econômica. O controle sobre as agências de emigração dificultava as saídas em massa, mas não as espontâneas, individuais. Sopesava sob esse aspecto a mecanização, tanto da agricultura, como da indústria, que tendia a eliminar a necessidade de mão-de-obra e fazia com que, aos poucos, um dos arrimos econômicos de boa parcela da população citadina se esvanecesse: o artesanato domiciliar. O perfil do emigrante francês não fugia, assim, ao estereótipo do emigrante europeu do século XIX. A maior parcela constituía-se de homens, jovens, adultos, solteiros e com idade que variava entre 15 e 40 anos.11 O que não significa que, em todos os casos, a decisão de partir fosse uma opção puramente individual, pois, por vezes, tendeu a se integrar em estratégias mais globais de amplitude familiar.12 Mesmo sendo a emigração em família minoritária e o partir só mais comum, percebe-se que, nesse primeiro meio, o tipo mais recorrente era o de irmãos. Para a travessia para o outro lado do Atlântico, irmão atraía irmão. Celestino e Camilo Bourroul, constituíram família e se estabeleceram em São Paulo, o primeiro com 154 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar lojas de fazendas e o segundo com botica.13 Trajetórias semelhantes tiveram os irmãos Luis, Marcelino e Thereza Gerard, negociantes plenos de interações com pessoas diversas naquela cidade oitocentista.14 Isso sem deixar de mencionar o engenheiro civil Euzebio Stevaux, responsável por várias obras e que, inclusive, dá nome a uma rua hoje existente em São Paulo, no bairro de Santo Amaro. Morador de São Roque, em 1876 deu todo o apoio ao casamento do irmão Artur Henrique, que então administrava a sua fazenda.15 As histórias são múltiplas e esse ano de 1876 ainda assinalou a saga de Maria Sauretene. Viúva e já com seus 50 anos logrou casar a filha, também francesa, com um patrício que igualmente morava na freguesia da Sé.16 Ou Isabel Frank, filha de pai incógnito, que saiu da França ao lado de sua mãe aos dois anos de idade para outros rumos que não aquele de seu local de nascimento. Aos 17 anos, já relatava ser órfã e se casou com o campineiro José Jacintho.17 Por fim, outro ângulo dessa mesma configuração era o de conhecidos na França serem atraídos por franceses residentes no Brasil. Processos-crime, de casamento e de divórcio estão repletos de exemplos. Aqui será citado somente um caso, pois outras histórias de vida ainda serão percorridas. Cozinheiro de um hotel, Desiré Leonard casou-se em 1878 com a alemã protestante Augusta Schmidt. Dentre as testemunhas necessárias ao processo estava Augusto Dubreg, que vivia em São Paulo como cabeleireiro e atestava conhecer o justificante desde o lugar de sua naturalidade e bem assim a família do mesmo, visto ser natural do mesmo lugar que ele testemunha e por isso sabe que ele é o próprio em sua identidade, solteiro, livre e desimpedido, assim tido e havido, e isto sabe por conhecê-lo desde ele mocinho e pelas relações que com ele tem desde o lugar de seu nascimento.18 A convivência na França e o mesmo destino, o Brasil, se cruzavam. Redes de informações e apoio estavam envolvidas na decisão de emigrar. Pedro Bougarde, dono de lojas de fazendas, foi uma das testemunhas do casamento de Pedro Chiquet - estabelecido como ourives – com uma brasileira, natural do Brás, Amélia Cândida de Oliveira. Veja-se o relatado por Bougarde: Pedro Bougarde, natural da França e, residente n’esta Capital onde vive de seu negócio, casado, 38 anos /.../ conhece os justificantes e sabe que são os mesmos em suas identidades, solteiros, livres e desimpedidos, o justificante sabe por ter vindo com o mesmo de sua terra, e também sempre por estarem juntos nesta cidade.19 155 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Do que se apreende, Bougarde e Chiquet vieram na mesma embarcação da França para o Brasil, onde optaram por dirigir-se a São Paulo para construir um novo enredo para suas vidas; percursos que contaram com a participação, para além deles próprios - por “estarem sempre juntos” - de Garraux, importante livreiro, que os conhecia desde Paris20 e de outros franceses, alemães, portugueses, brasileiros, africanos..., que compunham a miscelânea dos andares da cidade. O labutar da “Paulicéia” oitocentista Na São Paulo oitocentista, a influência cultural francesa era patente. Não só no que concerne ao âmbito das letras, mas na maneira de vestir, comportar-se, pentear-se, falar, divertir-se e até mesmo de comer. No paulatino cosmopolitismo em que a cidade se inseria, as lojas estavam repletas de produtos importados da França. Vestidos, roupas feitas, calçados, bibelôs, perfumarias, tranças para cabelos, tecidos, dentre outros componentes que acabavam por adquirir uma aura de luxo e requinte, verdadeiros diferenciadores de status social porque vindos da França. Foi nessa esteira que esses imigrantes se assentaram. Aproveitando-se da influência cultural, alguns com o savoir-faire e muitos outros dele desprovido, improvisavam seus papéis, tornando-se modistas, alfaiates, ourives, empreendedores dos ramos de hotéis e restaurantes, cabeleireiros, donos de lojas de armarinhos e de fazendas, enfim, ofícios vinculados à imagem cultural que a França difundia pelos continentes. Serralheiros ou marceneiros na França, em São Paulo lidavam com tecidos. Estratégias de sobrevivência! Mesmo pequenos artesãos no país de origem, com técnicas ultrapassadas do ponto de vista europeu, eram aqui considerados como eficientes detentores de habilidades, que os faziam sobressair nos entremeios do comércio. Anúncios de jornal alardeavam artigos e pessoas vindas de Paris como sinônimo de qualidade. Por isso o pequeno índice de naturalizações. Ser francês era importante para a própria subsistência! Sem dúvida, não se pode deixar de mencionar a presença de médicos; de engenheiros; do livreiro Garraux; do litógrafo, pintor e desenhista Jules Martin, conceptor do Viaduto do Chá; personalidades que, com seu ofício e conhecimento, marcaram a São Paulo de outrora. A maior parte dos imigrantes franceses que rumavam para essa cidade, entretanto, eram pessoas simples, não grandes especialistas ou detentores do afamado savoir-faire. Tratava-se de imigrantes comuns, com seus sonhos e esperanças. Os anúncios eram forma de propagar o negócio e arrematar mais clientes. No Correio Paulistano,21 primeiro jornal diário da Província, cuja estabilidade e 156 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar regularidade lograram mais de um século de circulação (1854-1963), esmiuçou-se as atuações desses franceses ao longo da segunda metade do XIX,22 assim como nos Almanaques e Indicadores publicados nesse período.23 O Almanaque Administrativo, Mercantil e Industrial da Província de São Paulo para o ano de 1857 já mostrava uma série de franceses no comércio citadino. Divididos por ofício, seguido do nome e do endereço em que podiam ser encontrados, lá estavam médicos, dentistas, donos de lojas de fazenda, alfaiates, barbeiros, sangradores e cabeleireiros, donos de hotéis e pequenas fábricas, além de ourives e padeiros. É pelos franceses tintureiros, porém, que se dará o passo inicial. Acompanhando os almanaques e os anúncios, logo se percebe uma faceta muito comum dentre os imigrantes que tinham negócio na cidade de São Paulo: a fluidez com que mudavam o endereço de sua casa de comércio. Veja-se o exemplo do tintureiro Ferard: em 1855 estava à rua Nova de São José; em 1857, à rua do Acú; e em 1866, à rua Alegre. Sexta-feira, 19 de janeiro de 1855, o primeiro chamadao do anúncio deixa margem a dúvidas, por somente conter a seguinte frase: “Casa pintada de muitas cores”, aparentemente lembrando tratar-se de um pintor. Nota-se, contudo, que Ferard já era conhecido pela sociedade local, dado que posteriormente anunciou: “tintureiro francês continua a tingir como de costume, com todas as cores. Acha-se sempre pronto e apronta os objetos com a maior brevidade”.24 Em 1862, em anúncio cuja ilustração clamava ao “Grande Santo Mauricio, padroeiro dos tintureiros”, e alocado à rua Alegre, nº 34, evidenciou de maneira mais detalhada que continua a tingir e lavar como de costume todas as qualidades de lã, seda, algodão, linho e as fazendas mescladas de seda e algodão, chales, vestidos, casacas, sobrecasacas, calças, coletes, mantilhas, capas, batinas, véus, ornatos de igrejas, cochonilhos, etc., as meias de seda e os chapéus de palha do Chile; tinge chapéus de pelo preto e de palha de cor de café; tira mofo das fazendas de lã e seda; lava luvas de pelica, camurça e outras, tudo por preços razoáveis.25 157 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Fonte: APESP. Correio Paulistano. Anúncio de 05 de fevereiro de 1862. A influência europeia se espraiava e um de seus traços principais, levando em consideração a França como modelo, era o da moda. Tecidos, chapéus, luvas, casacos, vestidos, enfim, a indumentária de homens e mulheres era verdadeiro diferenciador de status social e aspiração de muitos. Dessa forma, cuidar desses aparatos tornava-se imperante. Limpar, talvez nem tanto por asseio, mas para manter o aspecto de novo e tingir para diferenciar ou reformar peças já desgastadas, foi o veio de inserção que esses tintureiros franceses encontraram em São Paulo. Por outro lado, parece que nem tudo funcionava bem nesse tipo de negócio. Mercadorias eram ali deixadas por anos a fio, sem que seus respectivos donos resolvessem aparecer e efetuar o pagamento das encomendas. Desde 1855, passando por 1862, 1865, até 1870, os alertas de Ferard continuavam: ... participa as pessoas que tiverem obras em sua casa desde 1 a 2 anos, tenham a bondade de procurarem nestes 2 meses, a contar d’ esta data, pelo contrario serão vendidas para cobrar-se do seu trabalho.26 Trata-se de estratégia colocada a público através do jornal para que, a despeito da concessão de crédito ser uns dos facilitadores da economia da época, a sustentabilidade do negócio pudesse prosseguir. 158 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar À medida que o tempo passava e as oportunidades de serviços e de comércio se acentuavam na cidade - de modo especial a partir da década de 70 - outros imigrantes aventuraram em se estabelecer. Foi o caso de Villary que, em 1875, anunciava ser tintureiro francês e “encarregar-se de todo e qualquer trabalho que diz respeito a sua profissão, e garantindo perfeição por preços módicos”.27 Essa questão dos “preços módicos” pode ser encarada sob duas vertentes que, na realidade, se correlacionam: um atrativo ao freguês e, com a complexificação do comércio e dada à concorrência, o quesito comparativo de preços. Em 1880, aparecia Emilio Saignes, que deu o nome de Tinturaria Parisiense a sua casa comercial. As referências a Paris ou alusões à França no comércio eram correntes, pois denotavam algo que, no imaginário, estava muito em voga: a ligação de serviços ou artigos parisienses às ideias de qualidade e de requinte, aspectos diferenciais que conferiam tônus de padrões europeus a serem copiados, ou melhor, adaptados à mescla dos costumes locais. Saignes, instalado à rua 25 de Março – os limites do centro da cidade iam se expandindo -, dizia utilizar-se de uma “química moderna” que não queimava ou estragava a roupa ou fazenda (tecido). Ainda mais porque, fazendo “todo o possível para agradar seus fregueses”, trabalhava com amostras antes de proceder ao tingimento completo. Ademais, garantia seus serviços em qualquer ponto da Província, com pedidos e entregas nas diferentes regiões. Aliás, essa era uma das preocupações dos negociantes: expandir o comércio para além dos contornos da capital, atendendo a outros cantões da Província e quiçá fora dela. Através de seu anúncio, o ofício de tintureiro ficou mais delineado. Para as mulheres que frequentavam as procissões, as missas dominicais ou os novos modos de sociabilidade que o ocaso do Oitocentismo impetrava, havia uma opção de menor custo, que era a de utilizar o mesmo traje, mas com cores diversas, pois Saignes “tingia roupas /.../ de diferentes cores como rosa grená [bordô], cor de laranja, havana, roxo, azul, amarelo souferino ou de canário”.28 Por se tratar de um anúncio, seu conteúdo e expressões tinham por finalidade valorizar o trabalho e atrair fregueses, daí o esmiuçamento das cores. Já Charles Pierre Etchecoin - que também trouxe o irmão, Joaquim Luiz (que gerenciava o Hotel das 4 Nações) para São Paulo - vivia do produto da venda de seu elixir odontológico, que “fazia desaparecer a dor em menos de 15 minutos”29 e da chamada Pílula Paulistana, que servia para o “alívio das mais diversas moléstias”. Seu método de venda? Através da consignação. “São franqueadas em depósito para os negociantes e fazendeiros”, que deveriam receber 23% de comissão e prestar conta a cada seis meses, embora isso nem sempre acontecesse. 159 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Tanto é verdade que, em anúncio por ele publicado, apesar de salientar que “todos os depositários são muito honrados”, pedia que lhe mandassem o produto da venda, pois “ainda não recebi um real deste ano, tenho grandes despesas e devo, quero pagar”. Por outro lado, com certo tom de esbravejamento, perguntava: “vosmecês julgam que sou muito rico, e por ter esta ideia falsa devem não me mandar qualquer quantia por ser pouca?.30 Soa curioso, no mesmo exemplar de jornal, aparecer uma elegia, feita a suas pílulas pelos presos da Capital. Pode-se aventar o porquê disso. Um agradecimento, encomendado ou real, posto ali no mesmo quadro de anúncios servia como estratégia para chamar mais a atenção do público para o produto e para a falta de pagamento do que lhe deviam. Em meio a essas ideias, pode aflorar um questionamento sobre a neutralidade ou não, bem como sobre os possíveis vínculos de amizade entre os anunciantes e os editores do jornal. Veja-se o dito anúncio que, na realidade, foi escrito em 6 de maio de 1861 e publicado somente oito meses depois, no dia em que também saiu demanda de Etchecoin: Ilmo. Sr. Dr. Carlos Pedro Tendo Deus com o seu Divino Poder permitido que vossa senhoria more nesta cidade, para com sua mão caridosa dar alívio aos desgraçados /.../. Tendo eu lido no “Correio Paulistano” os grandes milagres que tem feito a pílula de sua invenção, e como eu sofro uma úlcera /.../ e reumatismo, mandei pedir a vossa senhoria por esmola o que prontamente me mandou uma porção de pílulas /.../ logo desapareceu dos todos os mais incômodos/.../. Com essas melhoras minhas, peguei a contar aos meus companheiros os quais recorreram a mesma caridade /.../ Entre todos Benedicto Ribeiro homem de 70 anos assaltou-lhe uma pontada no umbigo e já estava a exalar a alma quando me lembrei das pílulas /.../ e assim foi curado /.../ Todos nós /.../ desejando-lhe muitas prosperidades /.../ Os presos da cadeia da Capital.31 Em relação a esses remédios milagrosos, até mesmo o conhecido francês arquiteto, pintor, desenhista e litógrafo, Jules Martin, os vendia. Em junho de 1880 dispunha, em seu estabelecimento à rua São Bento, 37, da “Caroba e Sucupera”, aprovada pela Junta de Higiene, que curava “radicalmente todas as moléstias provenientes de impurezas no sangue e de erupções na pele, é o maior depurativo do sangue.”32 Sem esquecer que quatro meses depois anunciava um remédio para gonorréia.33 Não só em sua loja, mas também em várias outras, mesmo nos idos de 1880, não havia especialização do estabelecimento. Vendia-se de tudo um pouco, à medida 160 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar que a capacidade de consumo local ainda era relativamente pequena e, portanto, a diversificação de sortimentos era necessária para atrair mais clientela. Marmotant, por exemplo, vendia aqueles “remédios milagrosos” como elixir odontálgico e extrato vegetal para cabelos cujas propriedades eram várias. Existente tanto em pomada como em líquido, este último servia para dar “lustro bonito e agradável”, prevenir sua queda, com o adendo de fazer com que fios nascessem de novo, extrair caspas e para complementar, tingir os cabelos de loiro, castanho ou negro.34 Além disso, o francês fabricava e consertava guarda-chuvas de seda, tinha papel de várias cores, luvas e meias. As tintas de escrever eram vendidas em garrafas, as de primeira qualidade por 1#000 e as de segunda por 600 réis. Esses preços, porém, correspondiam somente ao líquido; as garrafas deveriam retornar.35 Como já era de se esperar, em 1862, Marmotant saiu da rua da Santa Teresa e já na do Rosário, depois denominada da Imperatriz - reduto dos franceses na capital (tal como alude o mapa a seguir) - comercializava bengalas, bijuterias, chocolates e charutos.36 Oferecia, também, seus préstimos como tintureiro e as habilidades de seu compatriota e genro Genin para a colocação de vidros em janelas e portas. Inicialmente, Marmotant tinha uma sócia: a viúva francesa Margarida Reinil, que, em agosto de 1860, vendeu a ele a parte que tinha no negócio. Genin, seu genro, que com ele morava e aparecia no Almanaque de 1857, no interregno desse ano até 1865 faleceu. A partir daí, sua filha Lucie ficou conhecida como viúva Genin. Em 1865, prevendo sua morte, Victor Marmotant redigiu de próprio punho o seu testamento em francês. Apesar de ter três filhas, deixou bem encaminhada a viúva Genin que, no mesmo ano, assumiu os negócios do pai. Marmotant que, provavelmente, já sentia as agruras de uma paralisia crônica, quis fazer essa transição. Três anos depois, em 1868, viúvo desde que chegou a São Paulo, faleceu aos 68 anos e foi sepultado no Cemitério Público.37 Dando continuidade ao trabalho familiar, típico do universo europeu, Lucie anunciava, então, que a antiga casa Marmotant passava a se chamar Viúva Genin e Companhia (das duas outras irmãs), mas era ela quem encabeçava o negócio e avisava ao público, em junho de 1865, que sob essa forma ficavam os ativos e passivos da casa anterior.38 Por algum tempo, ao publicar seu sortimento, como miçangas, tesouras, agulhas – logo objetos que remetiam ao bordado, - além de ceroulas, camisas, meias e toucas para batizados, não deixava de colocar ao lado do endereço – à rua da Imperatriz, n°. 12 – “antiga Casa Marmotant”,39 não só em alusão ao pai, mas também como referência para os fregueses. 161 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Os imigrantes franceses delinearam uma vida em São Paulo; vida essa que compreendia a inserção em ofícios, mas também interações com as pessoas que estavam em seu entorno e não somente no que tangia aos negócios. Relações de amizade, compadrio e vizinhança são alguns dos fios que desvendam as sociabilidades. Do mesmo modo, ter uma família, já emigrar com ela constituída, formá-la através do casamento ou dissolvê-la pelo divórcio eram elementos do cotidiano, momentos marcantes nas suas trajetórias, que, por vezes, eram igualmente permeadas por dissensões e conflitos que abrangiam desde compatriotas, alemães e italianos, a portugueses, brasileiros, africanos, escravos ou não, em uma verdadeira miscelânea de caminhos e vivências. Interações do cotidiano – Sociabilidades envoltas em conflito Por certo nem todas as relações eram amistosas e a vida glamourosa. Percalços cotidianos estavam presentes. Dissensões e conflitos com a sociedade local ocorriam, não dirimindo patrícios e o próprio seio familiar. Os processos de divórcio, por exemplo, trazem elementos reveladores de que, no interior das moradas e nos momentos de lazer, podia não reinar a paz, culminando também em uma fronteira limítrofe: a separação. A documentação contraria, dessa forma, a noção genérica de que ... historicamente a família, no Brasil, sempre constituiu, ao menos na aparência, um grupo permanente e estável, funcionando como uma entidade organizada e incumbida de um certo número de funções sociais.40 Os franceses não fugiram dessa vivência, incutida em São Paulo desde os tempos coloniais. O processo de divórcio mais antigo de que se tem notícia ... data de 1700 e faz parte do acervo do Arquivo da Cúria Metropolitana, dado que o julgamento desses casos, antes da proclamação da República, era da competência do Tribunal Eclesiástico”.41 Não só a Igreja, contudo, estava envolvida. A vida doméstica coincidia (ou quase) com a vida coletiva. Co-residentes, parentes e vizinhos comungam do quadro de sociabilidade. Todos pareciam se conhecer. A condição de parente ou vizinho confere foro de credibilidade aos testemunhos sobre a vida dos casais, tão íntimos fossem os aspectos ventilados.42 Desse modo, aparecem como testemunhas nos processos e mesmo delatores das problemáticas por que passavam os cônjuges. As mais diversas questões ultrapassavam o universo do privado, entrando no âmbito da coletividade. Do “ouvir dizer” ou do “presenciar”, por ser parente, 162 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar vizinho ou amigo – componentes da teia social. Logo, é plausível que muitos rompimentos conjugais escapassem “de qualquer controle geral, passando a ser uma prática julgada pela moral da comunidade”,43 até mesmo porque o “grupo familiar, assim como a rede de solidariedade da vizinhança, constituíam-se inúmeras vezes de um apoio importante, sobretudo quando havia violência envolvida”44 Apenas em 1890, esses processos passaram a ser encaminhados ao Tribunal de Justiça Civil, em virtude da ideia de que o casamento era um laço indissolúvel perante Deus e ... seria /.../ anacrônico supor que o divórcio significasse /.../ algo mais do que separação, uma vez que a possibilidade dos casados contraírem novas núpcias depois de se separarem só existia [em uma época em que o Estado ainda não chamava a si a cerimônia do casamento] quando fosse dada a sentença de anulação de matrimônio, o que ocorria apenas em situações bem específicas da legislação canônica”[Um exemplo era a não consumação do ato sexual por doença contagiosa].45 Segundo Alzira Campos: O estudo dos processos revela que a Igreja era mais cautelosa na concessão das nulidades. Daí, provavelmente, a transformação de numerosos pedidos de anulação em divórcios. A começar pela palavra divórcio que, na acepção do direito canônico, significava tanto a dissolução do vínculo, como a separação do leito e habitação. No entanto, impuseram-se distinções: como o matrimônio fosse indissolúvel, só a sua nulidade poderia dissolver o liame, ficando o termo divórcio restringido à separação quoad thorum et habitationem, também chamada de desquite. O divórcio poderia ser por tempo determinado, sem determinação de prazo e perpétuo, segundo as causas fossem de natureza transitória ou não.46 Os motivos da separação, grosso modo, se relacionavam ao adultério, já que “se opunha às noções de fidelidade, de coabitação e de ajuda mútua, princípios reguladores do casamento e do ambiente familiar interno”.47 Este ainda podia ser associado a outras causas, como o abandono do lar; doenças contagiosas ou incuráveis, que impedissem a união carnal e, finalmente, as sevícias consubstanciadas em maus-tratos físicos e/ou morais. Após 35 anos de casamento, em 1870, a paulista Emilia Cândida de Oliveira requereu o divórcio do ourives francês Casemiro Mouth. Ao longo desses anos de convivência – havia se casado na Sé na noite de 11 de maio de 183548 - teve com ele vários filhos e dizia 163 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar ... sempre ter vivido honestamente, como é publico e notório, guardando ao dito seu marido fidelidade conjugal, segundo as leis da Igreja e bons costumes, e cumprindo escrupulosamente todos os demais inerentes ao seu estado de mulher casada. Emilia queria divorciar-se quod torum et coahabitorem “a vista da causa ou razão canônica alegada” de que o suplicado de tempo a esta parte tem faltado para com esta todas as obrigações de esposo, ao ponto de ter praticado nela sevícias por diversas vezes, espancando-a desumanamente, além de pô-la constantemente para fora de casa com ameaças e palavras injuriosas. 49 Seis testemunhas foram ouvidas, dentre as quais quatro mulheres. A suíça Josephina Lorett, casada, sabia dos acontecimentos por ouvir a justificante, pessoas da família, “bem como por ter ouvido falar em geral”. Não obstante, ela e sua irmã, cerca de 2 ou 3 anos antes do depoimento, estiveram na casa de Emília e presenciaram rusgas entre o casal. Clemencia Chassot, suíça, e irmã da acima mencionada, igualmente, declarava ... que é exato que o justificado maltrata sua mulher e tem dado n´ela pancadas, segundo é sabido e ela testemunha tem ouvido dizer, tendo mesmo presenciado a uma ocasião há 2 para 3 anos pouco mais ou menos, uma dúvida que teve o justificado com a justificante, dúvida esta na qual quis o mesmo justificado dar na justificante com uma cadeira, com o que a uma criança que achava-se presente e pôs-se a chorar, achando-se nesta ocasião ela testemunha com sua irmã Josephina em casa da justificante. Nestes casos não só o “ouvir falar” era atestado, mas a convivência cotidiana permitia o confronto com as mais diversas situações. João Floriano de Monte Carmello, natural de São Paulo e vizinho dos cônjuges, por volta de 1868, percebeu “grandes vozerias e gritos na casa da suplente”. Logo após, narra ele, apareceu o Delegado e seu escrivão, além de um médico na morada vizinha, onde estiveram, tendo isso dado lugar ao que o suplicado fosse a casa d´ele testemunha a perguntar-lhe se tinha sido o denunciante do ocorrido em sua casa, não lhe tendo dito porem o que n´ela se dera. Os vizinhos espreitavam os acontecimentos, ao mesmo tempo em que criavam uma corrente de falatórios, propiciando o “ouvir dizer”, de modo a tecer uma rede de solidariedade. Floriano nada afirmou sobre ter alertado o delegado. Se não foi ele, algum passante ou vizinho deve tê-lo feito. 164 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Rita Maria de Jesus, também natural de São Paulo, solteira e que vivia de seu trabalho, assim como José Mariano da Cunha, empregado público, casado, natural de São Paulo afirmaram somente “ouvir dizer”. Já Joaquina Moraes, por volta de 50 anos, viúva, e que vivia de seu trabalho, só viu algumas vezes o justificado disputar e resignar com a justificante, nunca vendo porém o mesmo espancá-la /.../ sabendo por ouvir dizer que o justificado correra ultimamente com a justificante para fora. Durante o processo era comum a mulher ser depositada, ou seja, mudar de morada, levando consigo roupas e até escravos para servi-la, em “casa idônea”, justamente para evitar conflitos maiores entre o casal. “Convém acentuar que, uma vez depositada, a mulher não podia abandonar sem autorização a sua nova morada”.50 Amélia foi depositada na casa do genro, o ourives francês Pedro Chiquet “com sua cama, jóias e roupas de seu uso /.../ e para seu serviço” uma das escravas do casal, dando-se preferência a preta Benedita com a qual já estava acostumada.51 No processo existente na Cúria Metropolitana de São Paulo, não aparece a sentença final ou a revelia do cônjuge francês, o que torna difícil elencar qual ou quais “verdades” estavam por trás da convivência desse casal. O tecer da sociabilidade no “Auxílio mútuo” A Société Française 14 Juillet,52 fundada em 14 de julho de 1881, assentou um tom de coesão e certo amparo nos momentos de desvelo dos franceses para consigo mesmos e para com os pares de mesma nacionalidade. A preocupação em tornar essa “ajuda mútua” institucionalizada por meio de uma Sociedade é reveladora no sentido de demonstrar a sedimentação dos imigrantes franceses na São Paulo que caminhava para o ocaso do século XIX, denotando que, em meio a uma cidade tão plural de caras e modos, dada à imigração massiva, que aqueles que provinham da França também faziam parte da composição populacional e tinham o seu espaço. Seu próprio título evidencia uma data ideologicamente agregatória e que até hoje é feriado nacional na França. Houve, neste caso, uma tentativa de formação de identidade que criasse laços, vínculos associativos entre os “compatriotas” – como se auto-designavam - não mais baseados somente nas relações interpessoais, mas estruturados sob os auspícios de uma instituição. Nos Estatutos e Regulamentos da Sociedade – cujo conteúdo direcionava à estrutura e ao modo ideal de funcionamento - o propósito-mor, em 1881, foi descrito como o de auxiliar, por todos os meios em seu poder, a todos os franceses necessitados domiciliados em São Paulo.53 Em alguns casos, entretanto, e depois 165 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar de colhidas as informações, os socorros poderiam se estender aos franceses de passagem. Para se tornar sócio era necessário pagar doze mil réis de inscrição e mensalidades de mil réis (antecipadamente a cada três meses), o que constituía o capital da Sociedade, agregado a possíveis doações. Os membros eram divididos em ativos e honorários. Os primeiros estavam constituídos por franceses que habitavam São Paulo. Já os segundos, por mulheres francesas, franceses que não moravam em São Paulo, franceses naturalizados e estrangeiros que pudessem ter contribuído de alguma maneira com a Instituição. Não obstante, todos estavam sujeitos à exclusão se detectados casos de “má conduta” ou “imoralidade”. Em termos hierárquicos, a Sociedade era composta pelo Presidente, Secretário, Tesoureiro e Comitê Administrativo, que eram nomeados através de eleições realizadas durante a Assembleia Geral, feita uma vez por ano. Além dessa Assembleia, havia também reuniões mensais e possíveis convocações extraordinárias. Inicialmente, a pré-determinação quanto à duração da “14 de Julho” foi de 39 anos, com a possibilidade de prorrogação, desde que fosse submetida à aprovação do Governo Imperial. Aliás, existia um adendo que deixava claro o fato de que o Estatuto havia sido aprovado pelo próprio D. Pedro II em 1881. Por seu turno, o Regulamento só foi adotado cerca de seis anos depois, admitido em Assembleia Geral realizada em outubro de 1887. Dele fazia parte um quadro pormenorizado, dividido em dez capítulos, das regras que norteavam a Sociedade: composição, admissão, administração, atribuições, incompatibilidades, representação, reuniões e assembleias, eleições, socorros e óbitos. Notam-se aí algumas mudanças se for comparado ao que foi postulado no Estatuto de 1881. A começar pela inclusão, entre os membros ativos, dos filhos de franceses e do valor atribuído aos novos sócios a título de entrada: se antes era de doze mil réis, passara a ser de seis mil réis. Todo pedido para compor a Sociedade deveria ser feito com o apoio escrito de dois sócios ao presidente, para, em seguida, atravessar um processo de exame até a admissão ou não. Essa admissão concretizava-se, também, através do crivo dos olhares da comunidade, do “ouvir dizer”, dos comportamentos, da moralidade. Assim, todos os requerimentos eram comunicados ao chamado Comissário de Serviço, figura cujo papel era vital para a Instituição e que funcionava, além de outras atribuições, como uma espécie de elo entre os franceses, sócios ou não, e a Sociedade. O Comissário mantinha as demandas à disposição dos sócios que 166 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar quisessem tomar conhecimento e, da mesma forma, recebia as suas observações sobre o comportamento e a “dignidade” do postulante. Logo que passava essa etapa, os pedidos e as informações colhidas eram submetidos ao julgamento do Comitê que, finalmente, decidia. O novo sócio era avisado pelo Secretário e efetuava o pagamento inicial ao Tesoureiro. A ajuda era fornecida aos franceses sócios e não sócios, porém com algumas diferenças. Os franceses não sócios que residissem em São Paulo ou estivessem de passagem podiam ser atendidos, mas o auxílio pecuniário ultrapassaria a quantia de dez mil réis somente em caso de extrema necessidade e depois de submetido ao Comitê. Igualmente em situações de doença, o Comissário de Serviço se dirigia ao local onde o necessitado estivesse e providenciava os socorros de urgência. Aos sócios todos esses auxílios eram menos restritivos e considerados direitos. O óbito era tido como momento de auxílio e de acompanhamento. Se a Sociedade fosse avisada do falecimento de um francês de passagem, o Comissário de Serviço cuidava do que fosse necessário para o enterro “de um compatriota morto no estrangeiro”.54 Para aqueles franceses necessitados residentes em São Paulo, que não deixavam recursos, o mesmo Comissário providenciava um enterro modesto, classificado como de 3ª classe e que não ultrapassasse o valor de vinte mil réis. Por seu turno, o primeiro ponto a ser executado após a morte de um sócio era verificar junto à família se aceitariam que a Sociedade se encarregasse do enterro. Todo sócio tinha direito a um enterro “decente”, denominado de 2ª classe. Ao mesmo tempo, era previsto que a maior parte dos membros do Comitê, assim como dois sócios, “conduzissem seu compatriota e o acompanhassem a sua última morada”.55 Aos filhos dos franceses sócios também era prevista certa proteção. Cuidava-se da educação dos órfãos. De acordo com sua idade, eram colocados em uma instituição laica ou direcionados a uma pessoa de escolha do Comitê e que, em qualquer caso, estivessem inseridos no valor máximo estipulado. Tratava-se, então, de um agrupamento institucionalizado de franceses para auxílio mútuo, que procurava manter algumas características identitárias de coesão, tomando por base a nacionalidade e o fato dos indivíduos estarem fora da terra de nascimento (no “estrangeiro”). Uma ideia mais prática acerca de seu funcionamento no interregno do período de seis anos transcorridos entre a fundação (1881) e o estabelecimento do regulamento (1887) é fornecida pelos anúncios do Correio Paulistano em 1885. Tal como engendrava o regulamento, o Secretário, à época o francês Eyherabide, comunicava através de jornal as datas, os horários e os locais onde se dariam as 167 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar reuniões da “14 Juillet”. Aí se percebe que ainda não havia um local definido ou próprio da Sociedade. As reuniões se davam nos estabelecimentos comerciais ou na casa de franceses, em geral bem conhecidos, que habitavam na cidade. Outro ponto denotado é que esses encontros aconteciam à noite, por volta das 9 horas. Assim, os sócios foram convocados para, no dia 10 de janeiro de 1885, comparecerem às 9h da noite na casa de Mme. Rogé (Restaurant Française) à Rua do Comércio. Como não houve número suficiente de participantes, nova reunião foi marcada, igualmente às 9h da noite, na casa do litógrafo Jules Martin, à rua São Bento, nº 37. Com qualquer número de participantes comunicava-se que o assunto seria deliberado. Até mesmo a Assembleia Geral se realizava dessa maneira, na casa de compatriotas. Momentos de sociabilidade também eram referidos, como a ocasião em que o novo presidente da Sociedade assumia o cargo. Em uma data festiva, 14 de julho de 1885, todos os membros eram convidados a uma recepção no Clube de Ginástica Português às 6h da noite, justamente para acolher o novo “estandarte”.56 As viagens à Europa, que faziam parte dos meandros de cotidiano dos franceses em São Paulo, da mesma forma aparecem na documentação. O então Tesoureiro, nomeado em 1884,57 em fevereiro de 1885 partiu para a Europa e em reunião foi decidido que o negociante Jules Bloch, proprietário do Au Bon Diable – casa que vendia roupas feitas para homens e meninos, além de outros objetos, à rua Direita – assumiria interinamente a função até o retorno de Felix Bloch de sua viagem (o que se deu nove meses depois, em novembro do mesmo ano). Outra estratégia relacionada a essas relações era o aviso mensal, publicado também em jornal, dando a conhecer quem era o Comissário de Serviço. Vê-se, assim, a importância estratégica que esse cargo agregava. Não só era dado conhecimento de quem era o Comissário do mês quanto seu endereço, para que, em caso de necessidade, ele pudesse ser procurado. Em março de 1885, por exemplo, o encarregado foi Isidore Aron, da Maison Grumbach situada à rua da Imperatriz, 4. Aos poucos a Société Française 14 Juillet foi crescendo e se tornando mais complexa, de modo a ampliar seu quadro de sócios e de serviços. Quinze anos depois de sua fundação, ou seja, em 1896, em Assembleia Geral, o estatuto foi reformado, assim como o título foi alterado. Ao nome Société Française 14 Juillet foi agregado de Bienfaisance et Secours Mutuels,58 que enaltecia os propósitos da Instituição. O número de franceses aumentava na cidade e suas condições econômicas variavam sensivelmente. Além do auxílio funerário, para doenças e indenizações pecuniárias, 168 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar a Sociedade passou a ter médicos e farmácias associadas, que forneciam amparo no tratamento e nos medicamentos. Ainda no século XX, a Instituição manteve várias atividades e se firmou no seio da colônia francesa. Em 1937, por exemplo, aludia-se à construção de um abrigo para idosos, que em 1968 já estava concretizado com o nome de Residência Mère Hilbert. Ao longo de sua existência, a Sociedade teve pontos de encontro flutuantes, inclusive, o já aludido, inicialmente na casa dos próprios membros da instituição. Durante o século XX já existia lugar próprio, porém as mudanças de endereço foram constantes: rua da Boa Vista, rua Vieira de Carvalho, rua Quintino Bocaiúva até chegar à rua dos Cafezais, onde se localiza hoje – justamente sediada na casa Mère Hilbert, o dito abrigo para idosos. Sem dúvida, atualmente, em relação ao total, há uma quantidade proeminente de senhores e senhoras de origem francesa que ali habitam. Os serviços são pagos e a linha de auxílio mútuo encontra-se em um convênio firmado com o Consulado da França em São Paulo. Caso haja cidadãos franceses idosos sem condições financeiras para arcar com as despesas, há dois ou três quartos vagos à disposição. Percebe-se que as reuniões sociais, os encontros, a agregação de pares de mesma nacionalidade – esse caráter mais próximo que delineava os primeiros anos – foram dissolvidos. Mesmo sob essa égide, porém, a influência francesa está presente, sendo o francês adotado como idioma entremeado ao português. Foram várias as histórias de vida silenciadas ao longo do tempo, mas que deixaram marcas indeléveis das trajetórias que foram cumpridas, como no fundo de uma pasta empoeirada intitulada “documentos antigos”, com a qual esta pesquisadora se deparou, onde foram encontrados os Estatutos e Regulamentos dos tempos da fundação da Société Française 14 Juillet na São Paulo do século XIX. Notas e referências François WEIL. “French migration to the Americas in the 19th and 20th centuries as a historical problem”. Studi Emigrazione. Roma, XXXIII, n. 123, p. 6, 1996. 2 Há um leque de trabalhos que, remetendo ao período colonial, cuida dessa questão, que não deixa, também, de ser lembrada em análises cujo fulcro é o século XIX. Nesse sentido ver, dentre outros: Gilberto FREYRE. Um engenheiro francês no Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1940; Emília da Costa VIOTTI. Alguns aspectos da influência francesa em São Paulo na segunda metade do século XIX. Revista de História, 2000, pp. 142-3. 3 A grafia foi atualizada nas citações. Gilberto Freyre, 1940, p. 33; 1 169 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar V. Maria Beatriz Nizza da SILVA. Fazer a América: franceses no Brasil (1815-1822). Separata da Revista de Ciências Históricas, nº X. Universidade Portucalense, 1995. 5 Acerca dessa “quebra de visão” da São Paulo colonial e dos primeiros anos do Império como monótona e reclusa ver Ilana BLAJ Trama das tensões: o processo de mercantilização da São Paulo colonial, 1681-1721. São Paulo. Tese da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1995; Denise Aparecida Soares de MOURA. Economia, cultura e sociedade em São Paulo (1808-1850). São Paulo. Tese da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1997. 6 O lucro cafeeiro como um dos agentes fomentadores de transformação da Província de São Paulo parece ser senso comum entre trabalhos de natureza acadêmica e memorialistas. Dentre estes v. Ernani Silva BRUNO. História e tradições da cidade de São Paulo. vol. II. Rio de Janeiro: José Olympio, 1954; Urquisa Maria BORGES. Negociantes na cidade de São Paulo (1875-1880). São Paulo. Dissertação da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1979; Maria Luiza MARCÍLIO. A cidade de São Paulo – povoamento e população (1750-1850). São Paulo, 1973: Pioneira; Laima MESGRAVIS. A Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (1599-1884). São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1976; Thomas DAVATZ. Memórias de um colono no Brasil (1850). São Paulo: EDUSP, 1980; Paulo César Garcez MARANS. Habitação e vizinhança: limites da privacidade no surgimento das metrópoles brasileiras. In: Nicolau SEVCENKO (org.). História da vida privada no Brasil. v. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998; Eni de Mesquita SAMARA. Família e vida doméstica no Brasil: do engenho aos cafezais. Estudos do CEDHAL nº 10. São Paulo: CEDHAL/Humanitas/FFLCH, 1999; Emilia da Costa VIOTTI, 2000; Heloisa Maria Silveira BARBUY. A cidade-exposição : comércio e cosmopolitsmo em São Paulo, 1860-1914 (estudo de história urbana e cultura material). São Paulo. Tese da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2001; Silvia Cristina Lambert SIRIANI. Uma São Paulo alemã: vida cotidiana dos imigrantes germânicos na região da capital (1827-1889). São Paulo: Arquivo do Estado/Imprensa Oficial do Estado, 2003; Marisa Midori DEAECTO. Comércio e vida urbana na cidade de São Paulo (1889-1930). São Paulo: SENAC, 2002; Maria Luiza Ferreira de OLIVEIRA. Relações sociais e experiências da urbanização – São Paulo, 1870-1900. São Paulo. Tese da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2003. 7 DEAECTO, 2002, p. 95. 8 WEIL, 1996. 9 A emigração de mais de um milhão de franceses para a América, no curso dos anos entre os anos de 1820 e 1920, oferece ao historiador ampla matéria de reflexão. Cf. WEIL. Les migrantes français aux Amériques (XIXe – XXe siècles), nouvel objet d’ histoire. Annales de Démographie Historique. Paris: Belin, n. 1, 2000, p. 5. 10 WEIL, 2000, p. 450. 11 Cf. Annie SABAROTS. L´emigration des basques du nord en Argentine In: BRUNETON, Ariane (dir.). Histoire et mémoire de l´émigration française vers les Ameriques : initiatives et expériences institutionelles et associatives. Migrance, n. 26, 2005; 4 170 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Rolande, BONNAIN. Migrations et inscription urbaine des Pyrénéens en Amerique du Sud au XIXe. siècle : Montevideo et Caracas. Annales de Démographie Historique. Paris : Belin, 2000, n. 1, pp. 61-76. 12 Hernán OTERO. A imigração francesa na Argentina: uma história aberta In: Boris FAUSTO. Fazer a América. São Paulo: EDUSP, 1999, p. 131. 13 BRASIL/SP. Arquivo do Tribunal de Justiça de São Paulo. (doravante ATJSP). Inventário de Celestino Bourroul. Processo 365. 3º Ofício da Família, 1874. 14 BRASIL/SP. ATJSP. Inventário de Luis Supplicy, 1975. 1º Ofício da Família, 1865. 15 BRASIL/SP. Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo (doravante ACMSP). Processo de casamento. Notação 70.12.8358,1876. 16 BRASIL/SP. ACMSP. Processo de casamento. Notação 72.12.8376,1876. 17 BRASIL/SP. ACMSP. Processo de casamento. Notação 36.12.7933,1870. 18 BRASIL/SP. ACMSP. Processo de casamento. Notação 79.12.8474,1878. 19 BRASIL/SP. ACMSP. Processo de casamento. Notação 06.12.7539,1861. 20 BRASIL/SP. ACMSP. Processo de casamento. Notação 06.12.7539,1861. 21 Houve toda uma gestação ao longo do XIX para que, no fim desse século, os jornais se transformassem em estruturas comerciais capitalistas. A começar pelo Correio Paulistano, que separou propriedade de edição: “Separando propriedade de direção da redação, que na sua primeira fase seria capitaneada por Pedro Taques, composto inicialmente em quatro páginas a três colunas, mesmo que num prelo de pau, o Correio Paulistano, desde a sua primeira edição [em 1854], apresentaria características que informariam a nova concepção de jornal então nascente na Província”. CRUZ apud Paula PORTA, org. História da cidade de São Paulo. Vol. 2: a cidade no Império. São Paulo: Paz e Terra, 2004, p. 358. Entre os anos de 1855 e 1858, por enfrentar alguns problemas, foi bissemanário e diário quando das seções da Assembléia Provincial. Produzido e vendido na Typographia Imparcial de Azevedo Marques, na rua do Ouvidor, nº 46, local onde também foi feito o primeiro Almanaque da Província, o Almanaque Administrativo, Mercantil e Industrial da Província de São Paulo para o anno de 1857, este último continha o preço da assinatura do jornal: “ para a Capital, por anno 8 rs, por semestre 4 rs, para o Interior, por anno 10 rs, por seis mezes, 5 rs”. E, para tornar o jornal mais concorrido no seu exemplar inicial, afirmava-se que os assinantes teriam os anúncios inseridos gratuitamente desde que não fossem ultrapassadas dez linhas. O que, com a paulatina solidificação e ascensão, além de sua própria capitalização, não deve ter mais ocorrido. BR/SP. Arquivo Público do Estado de São Paulo (doravante APESP). Correio Paulistano, nº 01, 26 de junho de 1854. 22 Foi coletado um arsenal de 647 anúncios remontantes aos anos de 1855, 1862, 1865, 1870, 1875, 1880 e 1885, encontrados no APESP. A opção por pesquisar os exemplares de cinco em cinco anos deu-se devido ao fator de que não haveria tempo suficiente, dada também a variedade de fontes desta pesquisa para o resgate de 39 anos (1850-1889) de jornal com tiragem diária. O ano de 1862 figura na lista porque, no arquivo, não existem os exemplares dos anos de 1860 e 1861. 171 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar Universidade de São Paulo. Instituto de Estudos Brasileiros (doravante IEB). Almanach administrativo, mercantil e industrial da Provincia de São Paulo para o anno de 1857. São Paulo: Typographia Imparcial de J. R. de Azevedo Marques, 1856; Idem para 1858.; Memorial Paulistano para o anno de 1866. São Paulo: Typographia Imparcial de J. R. de Azevedo Marques, 1866; Almanak da Provincia de São Paulo para 1873.; Almanach Literario Paulista para 1876. São Paulo: Typographia da Provincia de São Paulo, 1875; Indicador de São Paulo administrativo, judicial, industrial, profissional e commercial. São Paulo: Typographia Jorge Seckler, 1878; ALMANAK administrativo, mercantil e industrial da Provincia de São Paulo para o anno bissexto de 1884. São Paulo: Editores Proprietários Jorge Seckler , 1883. 24 BRASIL/SP. APESP. Correio Paulistano, Anúncio de 19 de janeiro de 1855. Grifo nosso. 25 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 05 de fevereiro de 1862. 26 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 10 de dezembro de 1855. 27 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 08 de outubro de 1875. 28 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 07 de julho de 1880. 29 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 09 de maio de 1855. 30 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 21 de janeiro de 1862. 31 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 21 de janeiro de 1862. 32 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 24 de junho de 1880. 33 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 01 de outubro de 1880. 34 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 05 de janeiro de 1855. 35 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 10 de setembro de 1855. 36 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 23 de junho de 1862. 37 BRASIL/SP. ACMSP. Parochia da Sé. Óbitos de livres. 1864-1871. Notação 3.1.39, fl.112. 38 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 17 de junho de 1865. 39 BRASIL/SP. Correio Paulistano, Anúncio de 23 de março de 1870. 40 Eni de Mesquita SAMARA. Família e vida doméstica no Brasil: do engenho aos cafezais. Estudos do CEDHAL nº 10. São Paulo: CEDHAL/Humanitas/FFLCH, 1999, p. 113. 41 SAMARA. As mulheres, o poder e a família – São Paulo, século XIX. São Paulo: Marco Zero/Secretaria do Estado da Cultura, 1989, p. 79. 42 Alzira Lobo de A. CAMPOS. Casamento e família em São Paulo colonial. São Paulo: Paz e Terra, 2003, p. 340. 43 Luciano Raposo de A. FIGUEIREDO. Barrocas famílias – vida familiar em Minas Gerais no século XVIII. São Paulo: Hucitec, 1997, p. 92. 44 FIGUEIREDO, 1997. 45 Maria Beatriz N. da SILVA. Sistema de casamento no Brasil colonial. São Paulo. T.A. Queiroz/EDUSP, 1984, p. 211. 46 CAMPOS, 2003, p. 540. 47 Eni de Mesquita SAMARA; Madalena Marques DIAS; Vanessa dos Santos Bodstein BIVAR. Paleografia e Fontes do Período Colonial Brasileiro. Estudos do CEDHAL, Nova Série, n° 11, FFLCH/USP, Humanitas, São Paulo, 2005, p. 82. 23 172 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Nas fronteiras da imigração: Os franceses e suas vivências em São Paulo Vanessa dos Santos Bodstein Bivar BRASIL/ SP. ACMSP. Registro de casamento. Parochia da Sé. Casamentos de brancos e libertos (1833-1862). Livro nº 5. Notação 1.2.13, fl. 11v. 49 BRASIL/ SP. ACMSP. Processo de divórcio. Notação 43. 15.558. 50 SILVA, 1984, p. 214. 51 BRASIL/SP. ACMSP. Processo de divórcio. Notação 43. 15. 558. 52 Para análise, os materiais informativos e documentais amealhados são os existentes no Alamanhach Administrativo, Commercial e Industrial da Provincia de São Paulo para o anno bissexto de 1884, nos anúncios do jornal Correio Paulistano de 1885 e, finalmente, nos Estatutos e Regulamentos da Sociedade. 53 BRASIL/SP. Status de la Société Française 14 juillet, ST. Paul (Brésil). Typ. e Lithog. Compagnie Industrielle, 1887, p. 1. 54 Status de la Société Française 14 juillet, ST. Paul (Brésil). Typ. e Lithog. Compagnie Industrielle, 1887, pp. 14-15. 55 Status de la Société Française 14 juillet, ST. Paul (Brésil). Typ. e Lithog. Compagnie Industrielle, 1887, pp. 14-15. 56 BRASIL/SP. APESP. Correio Paulistano, Anúncio de 14 de julho de 1885. 57 BRASIL/SP. Almanak administrativo, mercantil e industrial da Provincia de São Paulo para o anno bissexto de 1884. São Paulo: Editores Proprietários Jorge Seckler , 1883. 58 Société Française 14 Juillet de Bienfaisance et Secours Mutuels. Status et Règlements. São Paulo : Typ. Garraux, 1909. 48 173 Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Alfredo Moreno Leitão Maria Izilda Santos de Matos Pontificia Universidade Católica de São Paulo Resumo: A investigação pretende uma contribuição para o estudo das experiências e ações políticas dos imigrantes portugueses em São Paulo, no período entre 1920 a 1940. A análise procurará recuperar as relações cotidianas, as experiências no mundo do trabalho, formas de resistência e luta política dos lusos. Privilegiando, entre outros documentos, os do DEOPS (Departamento Estadual de Ordem Política e Social), particularmente os prontuários. PALAVRAS CHAVES: Imigrantes portugueses, expulsão, trabalho, resistência, DEOPS Abstract: The research proposes to contribute to the study of experiences and political actions of Portuguese immigrants in Sao Paulo, between 1920-1940. The analysis recovers everyday experiences in the world of work, forms of resistance and struggle lusos policy. Used, among other documents, the DEOPS (State Department of Political and Social Order), particularly records. KEYWORDS: Portugueses immigrants, deportation, labor, resistance, DEOPS Não se habita impunemente em outro país, não se vive no seio de uma outra sociedade, de uma outra economia em um outro mundo, em suma, sem que algo permaneça desta presença, sem que se sofra mais ou menos intensa e profundamente, conforme as modalidades de contato, os domínios, as experiências e as sensibilidades individuais, por vezes, mesmo não se dando conta delas e, outras vezes, estando plenamente consciente dos efeitos. Imigração portuguesa: cotidiano e trabalho Nos finais do século XIX, a expansão urbana de São Paulo encontrou-se vinculada à expansão do complexo cafeeiro. No começo do século XX, a cidade assumiu seu destino de metrópole, sob o influxo do crescimento industrial, comercial e financeiro. Em 1934, totalizavam 287.690 estrangeiros morando na cidade,1 dentre eles 79.465 portugueses,2 contribuindo para compor um mosaico diversificado de grupos étnicos e seus descendentes, que juntamente com os migrantes do interior do estado e de outras regiões do país, conviviam numa multiplicidade de culturas e tradições. Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 174-195 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos Apesar da origem rural da maioria dos portugueses que emigraram, eles procuraram evitar o trabalho no campo e tenderam a se concentrar nas cidades, sendo São Paulo um dos principais polos de atração. Alguns vieram diretamente para a urbe, talvez previamente informados sobre as condições de trabalho na zona rural, outros, após uma rápida passagem pela lavoura, migravam à procura de melhores perspectivas de ganho, oportunidades abertas pelo intenso florescimento da Capital. A emigração portuguesa foi, a princípio, prioritariamente masculina, mas o contingente feminino cresceu gradativamente, podendo-se verificar um aumento na entrada de mulheres casadas, ampliando o deslocamento familiar de acordo com a política de atração do Brasil. Assim, a imigração lusa, caracterizada até então como individual, masculina e temporária, tornou-se tendencialmente familiar e permanente. Os portugueses procuraram possibilidades de colocação nas atividades fabris, no setor de serviços, abastecimento e obras, também em ocupações informais. Enfrentando a concorrência, já que a concentração de mão de obra excedia as necessidades do mercado de trabalho e aviltava os salários, os trabalhadores eram levados a buscar atividades temporárias e domiciliares, subemprego e emprego flutuante, ampliando os que garantiam a sobrevivência na base das ocupações casuais, expedientes eventuais, incertos e improvisados.3 A indústria paulista nasceu à sombra dos cafezais, implantou-se na cidade, cresceu e diversificou-se. Os operários de origem estrangeira compuseram, expressivamente, a mão-de-obra fabril (80,4%), que se utilizou intensivamente do trabalho de mulheres e menores. Nos inícios do século XX, os portugueses representavam 15,5% dos trabalhadores estrangeiros empregados na indústria. Essa participação aumenta em uma observação por setores: nas fábricas de juta, eram aproximadamente 22% do total, em algumas dessas fábricas, como a Santa Chantal (1912), representavam 38% do operariado.4 Os portugueses marcaram presença nos setores de fiação, tecelagem e malharia; na industrialização de cigarros, charutos e fumos; na confecção de roupas, roupas brancas e redes; na produção fabril de fitas, fósforos, velas, sabão, chapéus, calçados e tamancos, destacando-se, também, no setor de alimentos, panificação, chocolate e bebidas, ocorrendo a participação mais baixa na metalurgia, cerâmica e vidro.5 A indústria utilizava intensivamente o trabalho de mulheres e menores, que enfrentavam jornadas extensas e exaustivas, serviços noturnos, ambiente insalubre, ritmo intenso de produção, disciplina rigorosa, somados aos salários baixos, multas e acidentes frequentes. 175 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos Mesmo nos períodos de plena expansão industrial, a intensificação dos fluxos migratórios manteve os níveis salariais baixos, gerando insegurança na conservação do emprego, devido à reorganização dos processos produtivos, às novas levas de recém-chegados, além das crises periódicas que atingiam as indústrias que geravam desemprego e pauperismo. A estas condições no mercado de trabalho somavam-se as múltiplas dificuldades do cotidiano: carência de moradia, alto custo da alimentação, carestia, insalubridade (ausência de água e esgoto), problemas de transporte, entre várias outras questões, acirrando tensões, descontentamento, enfrentamentos e conflitos. Trabalho: resistência e luta Homens e mulheres, jovens e velhos, nacionais e estrangeiros, camponeses e trabalhadores urbanos procuravam novas oportunidades em São Paulo. A cidade, por suas características, catalisou a proliferação de culturas e ideais trazidos pelos diversos grupos. Nos bairros pobres, com seus cortiços e vilas operárias, os trabalhadores do comércio e ambulantes, operários e empregados domésticos questionavam as dificuldades vigentes, o cotidiano árduo de trabalho, as exclusões e injustiças, gerando um terreno profícuo para a difusão de novas ideias e a infiltração de propagadores destes preceitos. De certa forma, a Primeira Grande Guerra (1914-18) bloqueou o fluxo migratório, diminuindo a oferta da mão-de-obra e a alta rotatividade dos operários, o que favoreceu a organização dos movimentos de trabalhadores, com forte atuação do movimento anarquista. Premidos pelas vicissitudes do cotidiano, frente às condições de trabalho e salários, ampliaram as ações, com um quadro de greves, repressões, demissões e enfrentamentos com patrões e autoridades. A imprensa e o movimento operário foram os principais fomentadores das contestações em defesa dos direitos dos trabalhadores; encabeçaram a organização das lutas e resistências contra o patronato e os poderes estabelecidos.6 Os estrangeiros e seus descendentes foram os principais agentes e integrantes destes movimentos.7 Vistos, a princípio, como elementos fundamentais para o progresso do país, os imigrantes, a partir desse momento, passaram a ser encarados com desconfiança pelo patronato, elite política e poderes estabelecidos, temerários da força que as ações operárias adquiriam num processo de resistência constante. O movimento de anarquistas e, posteriormente, as articulações dos comunistas difundiram suas propostas pela imprensa, organizaram sindicatos e ações de luta, sendo considerados causadores da instabilidade social e sublevadores da ordem vigente. Baseado nisto, foi legitimada a necessidade de criação de mecanismos que 176 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos controlassem o avanço destas práticas e ideais, que pudessem deter as ações e seus líderes, sustando a onda de greves e manifestações. Desde 1907, que o Estado brasileiro com a criação de primeira lei de expulsão,8 a Lei Adolfo Gordo,9 visou controlar a atuação de estrangeiros considerados subversivos. Mesmo com a elaboração dessa legislação, porém, criaram-se brechas para burlar as medidas legais e escapar das punições. Seguiram-se outras ações que procuraram fechar as possibilidades, mas que não conseguiram atingir plenamente seus objetivos.10 Intensificou-se a polêmica entre o poder Executivo e o Judiciário,11 sobre a quem caberia determinar o destino desses estrangeiros. A legislação foi considerada ineficiente e o Estado assumiu a dianteira, organizando e aperfeiçoando o corpo policial, que, desde o princípio do século XX foi aprimorado, visando atender às novas necessidades: uma polícia militarizada, mais hierarquizada, combativa e agressiva. Para tanto, em dezembro de 1924, foi criada a Delegacia de Ordem Política e Social, voltada especificamente para reprimir e controlar as manifestações.12 A Delegacia surgiu acanhada, mas gradativamente ganhou importância, centrando seu foco de ação contra os opositores do regime, dentre eles, os estrangeiros identificados como “indesejáveis” e propagadores de “ideias exóticas”.13 Na década de 1920, o comunismo expandiu sua órbita de ação e ampliou o número de adeptos, influenciando as organizações sindicais e manifestações populares. A partir dos anos de 1930, particularmente com a implantação do Estado Novo, elegeu-se o comunismo como “inimigo da nação”, mote para a massiva campanha anticomunista que legitimou o enrijecimento e a centralização do poder. Essas medidas articulavam-se à política nacionalista que visava defender a nação contra uma “pregação que buscava desvirtuar os nacionais” (principalmente o trabalhador nacional - identificado como indivíduo ordeiro e cordato). Dessa forma, validava-se o combate ao “perigo estrangeiro”.14 Ainda dentro dessas medidas nacionalistas foram estabelecidas leis que limitavam a entrada de estrangeiros – a Lei de Cotas15 – além das que visavam manter um controle sobre os imigrantes, como a obrigatoriedade da carteira de identidade para estrangeiros (modelo 19), exigida para obtenção do registro profissional. O Governo Federal impôs essas medidas a todos os estrangeiros residentes no país, excetuando os menores de 18 anos e os maiores de 60 anos. Através dos acordos estabelecidos entre os governos de Vargas e Salazar, porém, os portugueses acabaram por ser liberados da Lei de Cotas e passaram a gozar de algumas benesses,16 como a facilidade na obtenção de lotes de terras nos núcleos coloniais.17 177 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos O imigrante português foi muitas vezes exaltado como exemplo de indivíduo laborioso, tenaz, ordeiro; modelo a ser seguido pelo trabalhador nacional. O grupo, contudo, não pode ser considerado homogêneo: houve lusos que, rompendo com o ideal propalado, militaram politicamente dentro dos partidos e grupos de oposição; posicionaram-se contrários a ordem vigente e foram tratados como criminosos políticos, elementos perigosos e “indesejáveis”. Da mesma forma, outros na mesma situação (nacionais ou estrangeiros) passaram por investigações e prisões, sofreram torturas e, algumas vezes, como última medida, foram expulsos do país. Historiografia: questões e possibilidades A produção acadêmica sobre a imigração é ampla, diversificada e vem sendo enriquecida por abordagens que analisam aspectos diferenciados da questão, assim, a temática pode ser considerada como privilegiada pela produção historiográfica. A imigração ibérica só mais recentemente tem instigado os pesquisadores,18 contudo, a maior parte dos trabalhos se volta para o Rio de Janeiro, aonde a presença portuguesa foi significativa e marcante.19 A produção historiográfica sobre imigração em São Paulo privilegiou certos grupos, em particular os italianos e japoneses. Só mais recentemente é que apareceram análises que investigam os ibéricos e em particular os portugueses.20 Por outro lado, a historiografia sobre as lutas operárias e organizações políticas em São Paulo, ainda que observe aspectos da imigração, pouco focalizou os portugueses como agentes políticos e atuantes no movimento operário, priorizando outros grupos, particularmente italianos e espanhóis. Em algumas análises, quando citados, os portugueses são identificados como alienados, pelegos, “mansos”, elementos pouco engajados na luta política, principalmente na cidade de São Paulo.21 Já em Santos os estudos são em parte diferentes, visto o português estar contemplado nas lutas sociais e políticas.22 Cabe destacar certa incongruência no cruzamento destas análises, já que a trajetória e o perfil do imigrante luso para estas duas cidades foram muito semelhantes. A maior parte dos estudos historiográficos sobre a imigração classifica, ainda, os imigrantes portugueses dentro de certo perfil: imigração jovem, masculina, individual e temporária, que visava à formação de um pecúlio para amealhar o dinheiro e, sem desviar-se em outras questões, retornar à terra natal.23 Essa visão contribuiu para a ideia do distanciamento do português em relação às lutas operárias. 178 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos Cabe destacar que não houve um único padrão de deslocamento.24 Muitos imigrantes eram chefes de família, vieram bem antes de seus familiares, que ficaram aguardando outra possibilidade; outros chegaram ainda crianças ou jovens, sem a família. Em diferentes casos, a família veio junto, mas alguns deles não permaneceram unidos no novo contexto ou nunca se encontraram e/ou não voltaram a se reunir, gerando toda uma complexidade de situações vivenciadas. Acrescente-se que nem todos tinham as mesmas perspectivas ou, melhor, nem todos conseguiam atingi-las. Nos casos da permanência definitiva, com a formação ou transferência da família para o Brasil, impôs-se a necessidade de condições para instalação, trabalho digno com remuneração adequada, além de outras questões fundamentais ao bem-estar e fixação, como: educação, moradia, saúde, transporte etc.25 Para consegui-las, houve, muitas vezes, a necessidade de questionar e lutar por direitos, reivindicar melhorias e posicionar-se contra a ordem estabelecida.26 A análise das lutas operárias, particularmente em São Paulo, não pode ser desvinculada do trabalhador estrangeiro, sendo necessário articular os movimentos contestatórios que se organizaram nas fábricas ou sindicatos com as experiências de vida cortiços, pensões, vilas operárias e bairros populares, permitindo captar a circulação e interação de pessoas, que se amparavam em um processo que procurava amenizar as dificuldades do cotidiano, as carências de emprego, alto custo de vida, falta de saneamento básico, dentre outras dificuldades.27 Ressaltando este contexto, levar em consideração as aproximações do imigrante português aos parceiros de fábrica, aos vizinhos de cortiço e aos amigos de rua, observando-os como sujeitos históricos atuantes nas lutas e reivindicações. Muitos dos imigrantes portugueses trouxeram de Portugal experiências de trabalho e de luta política e sindical, transpondo para o novo contexto estas práticas; outros adquiriram estas experiências no país de acolhimento.28 No Brasil, associações dirigidas por portugueses patrocinaram cursos técnicos a jovens imigrantes, procurando qualificá-los para o mercado de trabalho.29 Com isso, não se pode afirmar que o padrão do imigrante luso era de indivíduos de baixa ou nenhuma qualificação, predominantemente analfabetos e sem experiência política. Experiências de Lutas e resistências Os confrontos étnicos foram considerados uma das principais limitações do movimento operário em São Paulo. Alegava-se que as hostilidades entre vários grupos criavam barreiras para a coesão e organização da classe, abortando muitas greves e tentativas de organização.30 Citava-se a ocorrência de tensões entre grupos estrangeiros, particularmente entre italianos e portugueses, que eram considerados por aqueles furadores de greve e desprovidos de consciência social. Essa visão foi criada particularmente pela imprensa operária de militantes italianos, cujas 179 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos generalizações historiográficas necessitam ser ponderadas,31 destacando-se que a origem étnica influenciou tanto para isolar como aglutinar; ora dificultou a coesão, ora foi motor de solidariedade e ações políticas.32 Buscando questionar estas abordagens, este trabalho busca verificar práticas, costumes, lutas, acomodações e solidariedades presentes no cotidiano de homens e mulheres emigrados de Portugal, sendo possível localizar agentes em movimento, dispondo de suas vidas e de seus métodos de ação, formas de organização e táticas de resistência, frutos de um processo cotidiano de experiência. Questionando o silêncio aludido, podem ser visualizadas lutas que emergem múltiplas e diferenciadas, reivindicadas por diferentes canais de expressão, produtos de racionalidades e dinâmicas diversas. Assim, as ideias de que homens e mulheres portugueses eram avessos à participação nos movimentos operários pode ser contestada percorrendo a documentação do Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (DEOPS/SP), e, também, notícias nos jornais diários e operários, além das “listas negras” elaboradas pelo patronato. A análise das solicitações de assistência jurídico-econômica e reclamações consulares de lusos também sinalizam sobre as dificuldades enfrentadas por esses imigrantes: os atrasos de pagamento, retenção pessoal, erros de contas, multas, exigências de contrato coercitivas, moléstias e acidentes de trabalho, rescisões de contratos. Apesar de encontrarem certos obstáculos, portugueses demonstraram força de resistência coletiva, reagindo contra as arbitrariedades.33 Desde o início do século XX, pode-se observar a presença portuguesa nas greves e manifestações populares através das notícias de jornal.34 As participações ocorreram por reivindicações várias: redução da jornada de trabalho para oito horas sem o rebaixamento do nível salarial, abolição das multas que reduziam o ganho e melhoria dos salários. As manifestações de resistência não se limitaram à ação em greves e participação em associações, nas “listas negras” elaboradas pelo patronato, nas quais se divulgavam os nomes dos operários “indesejáveis”,35 dentre os quais contavam-se vários portugueses. As demissões ocorriam também em função de sabotagens, boicotes, roubo, embora, principalmente, devido à ação no movimento obreiro. ... operário Indesejável: Abílio José de Souza, ajudante de máquina, português, de 26 anos de idade, solteiro, residente a rua Frei Gaspar número 155, despedido da Cia. Nacional de Tecidos de Juta, como agitador na Fábrica Santana.36 180 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos Já a análise do acervo do DEOPS/SP, principalmente os prontuários individuais produzidos até 1940, possibilita novas revelações. Nessa documentação foram localizados aproximadamente 6.000 portugueses com passagem pela polícia política e social. Apesar de ser um pequeno conjunto do total do acervo, a mostra é significativa quando analisada do ponto de vista qualitativo. Muitos portugueses foram classificados pelo órgão como “subversivos”, “comunistas”, “anarquistas”, “grevistas”, “agitadores”, “integralistas”, “partidários do Eixo”; além daqueles fichados por incorrerem em crimes contra a “economia popular”. Desse total, em cerca de 190 prontuários de portugueses consta a identificação “comunista”,37 sendo que 13 indivíduos, após serem presos, julgados e condenados, foram expulsos por decreto assinado pelo presidente da República.38 Dentre muitos processados por crimes de opinião ou delitos comuns, vários foram os indivíduos que reuniram as características comuns ao conjunto dos portugueses chegados no bojo da Grande Imigração, que comprovavam os vínculos existentes entre a pobreza, a imigração e a contestação sobre suas diferentes formas.39 Dentre os expulsos, alguns haviam chegado ao país ainda crianças e outros nos primeiros anos do século XX. Esses prontuariados indicavam profissão e emprego fixo, sendo três pintores, um comerciante, um oleiro, um agricultor, um ferroviário, um motorneiro, um motorista, um negociante, um gráfico, um operário e um estivador. Os que eram casados somavam seis, restando sete solteiros. Devese salientar que os ditos “solteiros” poderiam ter companheira e possuir filhos, somente não eram casados legalmente, enquadrando-se nesta categoria dois indivíduos: José da Silva Carvalho, que possuía companheira, e Antonio Joaquim Calhau, que, além da companheira, possuía quatro filhos. Dentre estes analisados, alguns se deslocaram muito jovens ou em tenra idade, como foi o caso dos irmãos Abílio e Francisco Neves,40 que, saindo de Carviçaes, Trás-os-Montes, emigraram para o Brasil com oito e três anos de idade respectivamente, acompanhados dos pais e irmãos, agricultores analfabetos e que, segundo consta, não tinham experiência e nem mesmo conhecimento de ideias políticas e de práticas subversivas. Foi aqui que a experiência de vida e trabalho, a convivência com outros indivíduos (nacionais ou estrangeiros), possibilitou aos irmãos Neves a tomada de uma posição política, com o engajamento no movimento anarquista.41 Observe-se que estes e outros lusos mantinham relações bem articuladas com elementos de distintos grupos étnicos e que tinham a seu favor a facilidade de se misturarem entre os brasileiros. Dos portugueses investigados somente um se declarou “analfabeto”, donde se pode concluir que estes indivíduos tinham condição de acesso à literatura de 181 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos esquerda e informações trocadas entre os grupos que militavam, não só entre portugueses, mas com “camaradas” de outras nacionalidades, o que contradiz a ideia que a baixa participação dos portugueses nas ações e organizações de esquerda se devia ao alto índice de analfabetos. Por outro lado, essas informações permitem questionar se estes indivíduos podiam ser identificados como “elementos oportunistas”, que chegaram ao país com o intuito de propagar de ideias ditas subversivas. Segundo as informações organizadas pelos investigadores e outros funcionários do DEOPS, observa-se a existência de portugueses engajados em grupos ditos subversivos de importante atuação no país, como o Partido Comunista, sindicatos fortes como da Construção Civil, dos Ferroviários e dos padeiros.42 Os padeiros e os operários da construção civil foram responsáveis por diversas manifestações de luta e resistência entre patrões e empregados e de greves que reivindicavam melhorias salariais e de trabalho. Ambas as categorias lutavam contra as péssimas condições nos ambientes de trabalho: os padeiros trabalhavam várias horas por dia em turnos que varavam a noite, junto à alta temperatura dos fornos.43 Já os operários da construção civil reclamavam por maior segurança nas obras, pois o número de acidentes que incapacitavam ou mesmo que ocasionavam a morte, era muito grande. Alguns portugueses tiveram destaque dentro das ações políticas, assumindo muitas vezes, postos de liderança, como idealizadores e colaboradores dos jornais operários e anarquistas, como Neno Vasco44 e Adelino de Pinho,45 que defendiam, dentre outras ações, a simplificação da ortografia, aproximando as formas escritas das orais no desenvolvimento dos métodos de educação popular. Pinho, como professor autodidata, criou algumas “Escolas Libertárias”,46 com o objetivo de oferecer instrução aos filhos dos operários. Destacou-se, também, Antonio Candeias Duarte, natural de Coimbra, nascido em 1881, que chegou a São Paulo, com a família, em 1891. Ele foi ativista, pensador e líder da esquerda e, conforme documenta seu prontuário, esteve preso em várias ocasiões: 1917, 1931, 1935, quando da organização da Aliança Nacional Libertadora (ANL), e 1947, quando da cassação do PCB.47 Nas primeiras décadas do século XX, Candeias manteve forte militância anarquista e depois comunista, participando na produção e organização de livros e jornais de esquerda. Destacou-se como um dos principais líderes da greve de 1917,48 ocasião em que compôs o Comitê de Defesa Proletária, sendo, junto com Edgard Leuenroth, redator do jornal A Plebe que escorou o movimento. 182 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos Participou da fundação de um Partido Comunista de feição anarquista no Rio de Janeiro, em 1919, e no mesmo ano o organizou em São Paulo. Até 1919, Antônio Candeias Duarte foi partidário do anarquismo. Depois se converteu ao marxismo, aderindo francamente ao Partido Comunista, mantendo uma atividade, em parte de expectativa, depois, por ocasião do triunfo da Revolução de Outubro, concorrendo com dinheiro e literatura saída de sua pena para a vitória de sua causa.49 No campo da autoria e ações editoriais, Candeias escreveu, em parceria com o próprio Edgard Leuenroth, O que é o maximismo ou o bolchevismo, sob o pseudônimo Hélio Negro. Na década de 1920, apoiou o movimento comunista através das ações gráficas,50 e, nos anos 1930, em parceria com Oswald de Andrade e Pagú, editou O homem do povo. Outros não tiveram tanta projeção, mas nem por isso menos importância, como o motorista Aureliano Henriques,51 natural do pequeno lugarejo de Carregal, pertencente ao Distrito de Leiria, região de Estremadura, sudoeste de Portugal. Nascido em 1904, era filho de João Henriques e residente na cidade de São Paulo à Avenida Celso Garcia. Durante algum tempo foi dirigente do Sindicato dos Condutores de Veículos, órgão que recebia apoio da Frente Única Sindical, ligado à Confederação Sindical Unitária do Brasil (organização comunista) e colaborador da Aliança Nacional Libertadora (ANL). Aureliano Henriques, desde 1933, foi classificado pela polícia do DEOPS como “agitador comunista”, sendo preso em 28 de novembro de 1935 e recolhido ao presídio político. Ele gozava de grande prestígio na sua categoria, e, em 1935, foi incumbido pela Confederação de organizar um plano que desencadeasse a greve dos motoristas, como protesto contra o fechamento da ANL. Durante interrogatório, foi acusado de ser “um pernicioso líder que vem agitando a classe dos chauffeurs desta capital”, fato que não negou, pois “confessa que há cinco anos vem mantendo atividades como agitador de classe”. Visto como estrangeiro perigoso, pois, na análise da polícia, em nada se assemelhava à imagem do bom imigrante, teve como punição a expulsão do país, decretada em 6 de abril de 1936 e efetivada em 3 de junho do mesmo ano, quando, no porto de Santos, foi embarcado no vapor Eubeé com destino a Lisboa. Outros portugueses também foram expulsos e de seus destinos em Portugal pouco se sabe.52 Nos documentos do DEOPS não há indícios do que ocorreu com esses indivíduos quando desembarcaram em solo português. Com certeza, a recepção aos recém-chegados não foi nada acolhedora, já que lá, assim como no Brasil, vigorava um controle implacável sobre comunistas e anarquistas.53 Os hiatos nos dados documentais permitem sondar o percurso até a expulsão e só voltam ao 183 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos relato no retorno do envolvido, criando um vazio no interregno, com a necessidade de consultas os arquivos portugueses.54 O caso do pintor Abílio José das Neves55 é exemplar. Natural de Carviçais, Torre de Moncorvo Trás-os-Montes, onde nasceu em 30 de setembro de 1903, emigrou de Portugal, junto com a esposa e um filho, em 1926. Foi acusado, junto com seu irmão Francisco, de atividades anarquistas, tendo ambos sido presos e expulsos, embarcando com destino a Lisboa, em 8 de maio de 1936. Nesse ponto, as informações encerram-se, só recomeçando em 16 de fevereiro de 1953, quando Abílio e sua esposa retornaram ao Brasil, mesmo sem ter sido revogada a sua expulsão. Sua situação de ilegalidade foi descoberta em 1957, sendo aberta uma sindicância para apurar suas atividades. Feitos todos os trâmites necessários, constatou-se sua inocência, sendo sua expulsão revogada por decreto datado de 29 de março de 1961. No caso de Abílio das Neves, há uma particularidade: as falhas no seu processo de banimento, com evidências da fraqueza das provas que confirmassem sua militância anarquista (apesar de simpatizante e leitor de livros). Ao contrário, seu irmão, Francisco das Neves, confessou ser anarquista militante, com uma intensa atividade junto a organizações e jornais libertários. A Constituição de 1934,56 em vigor quando da expulsão de Abílio, garantia, em seu artigo 113, item 9, liberdade a nacionais e estrangeiros para manifestarem seus pensamentos, sem que, para isso, fosse necessária uma prévia censura. Somente seriam punidos aqueles que promovessem processos violentos contra a ordem política e social. Assim, apesar da liberdade de Abílio ser garantida pela Constituição, não foi respeitada pelo poder Executivo, que, agindo acima da lei, tomou para si o livre arbítrio em relação ao destino dos imigrantes “indesejáveis”. Os dramas destes imigrantes, suas emoções e incertezas, somavam-se ao inconformismo, consciência das dificuldades e injustiças, como também ao medo do desconhecido aqui e lá; tramas de sentimentos difíceis de recuperar. Os prontuários, nesse contexto, possibilitam algumas descobertas, aproximações destas “histórias de si”,57 como a correspondência preciosa “apreendida em poder de Cypriano da Cruz, quando pretendeu colocal-a no seio de uma Srª. que o visitou hoje” Querida Alice, como é do teu conhecimento foi assignada a minha expulsão. Nesta não quero fazer considerações sobre o que a polícia se apoiou para julgar-me um revolucionário terrível, pois tu bem sabes quem deu a ela as melhores informações, mas quero somente julgar-me um prisioneiro e como tal, qual o que mais me interessa se ser expulso ou ser julgado e ficar no Brasil. 184 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos Eu tenho de ficar como tantos outros que a meses suas expulsões foram assignadas e eles ainda aqui estão e ficaram enquanto quiseram. Consideremos: desde que eu fui prezo juntamente com os 10.000 ou 11.000 mil prisioneiros políticos que há no Brasil, já houve revolução no Japão, na Bolívia, no Paraguai, em Portugal etc. Em todos esses países os implicados já foram julgados e grande parte já está na rua, – como em Portugal onde grande parte foi condenada a 90 dias de prisão e os demais podem escolher se querem ficar em Portugal ou irem para fora do país ou para a África – E no Brasil só mentiras desse governo que está tão divorciado do povo que só pode governar de baixo do terror policial acompanhado de leis de arrocho e para manter-se lança mão de todos os meios, como seja prender deputados, senadores, juízes, prefeitos, capitães, altas patentes do Exército. Operários, médicos em fim pessoas de todas as classes sociais. Que representa isso? Que esse governo está governando interesses diferentes dos do povo, isto é, é um governo que luta contra o povo tendo a seu lado para apoiá-lo o ouro dos grandes magnatas da alta finança internacional, pois está provado que o que a nação brasileira tem de mais puro, de mais patriótico são os homens que neste momento estão nos cárceres. E isso está assim por muito tempo? Creio que não, - Mas quando terminará? – Também não sei, mas não demorará muito, pois o povo do Brasil já está cansado dos atuais homens que espezinham, massacram e sufocam com sangue os anseios de liberdade deste povo oprimido. No Brasil já antes desta ultima revolução foi criada a chamada “lei de segurança nacional” “lei monstro (?)” e havia os Juízes e os Tribunais para julgarem todos os chamados crimes políticos, mas qual o nosso crime? Só o de pensarmos de modo diferente do dos homens do governo, pois em São Paulo não houve um só tiro e como podem eles nos condenar responsabilizando-nos por uma revolução? Era preciso que os juízes se prestassem a isso, mas, estes não quiseram ser carrascos togados e contrariarem os potentados do poder, julgariam sim, e condenariam de acordo com as provas, e a onde há essas provas? Não existem. Então o governo não está contente com a ter prendido milhares de pessoas, o que ele quer é condenar seja lá como for haja ou não provas, mas os juízes não estão pra isso só condenam se houver provas em contrario põem na rua, mas isso não interessa ao governo ele está incompatibilizado com a nação e cada um destes homens e considerado por ele como capaz de chefiar uma revolução que o ponha abaixo. Eis aí por que não fomos ainda julgados. Enquanto isto, seja decretado o “estado de guerra” façam-se novas leis cria-se um tribunal da Sta. Inquisição e desse-lhe o nome de Tribunal Especial, nomeiam-se para esse tribunal, não juízes para julgarem mas somente juízes que condenem, pois se fora para sermos julgados não era preciso criar Tribunal Especial, já havia tribunais e juízes com essa atribuição, mas, onde 185 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos as provas do nosso crime? Não há prova, pois se nem um tiro foi dado em São Paulo, como podemos ser julgados por uma revolução? Mas o governo quer a nossa condenação e essa é a função do tribunal especial, e não basta a esse governo todas essas leis de arroxo, todas essas prisões ainda quando os prisioneiros reclamam o que de direito pertence a um prisioneiro, somos atacados a bala de metralhadora a gazes e tudo quanto a ideia criminosa dos homens perversos ansiou, e depois mandam anunciar nos jornais que nos “revoltamos” para fugir e por essa razão foram obrigados a atentar contra nós. Certo que no Brasil a muita gente que se move contra este estado de cousas e quando o povo oprimido do Brasil romper os grilhões que o prendem, ruirão por terra os castelos que o prendem, ruirão por terra os castelos de tirania, abrindo-se de par em par as portas das cadeias e as multidões agitam os seus estandartes entoam seus hinos na marcha vitoriosa para a conquista do pão da terra e da liberdade, nesse dia abrir-se-ão também as porteiras para os que foram deportados e ai voltarem de novo para junto daqueles que como eu tem posto a sua vida e o seu bem estar a serviço da causa dos oprimidos como soldados da primeira linha rebatendo os (ilegível) dos fariseus e afrontando com galhardia as suas lanças criminosas tantas vezes manchadas no sangue dos verdadeiros interpretes do Sentimento e das aspirações populares. S. Paulo, 25. 10.1936.58 Desde os primórdios do processo imigratório, os poderes estabelecidos, as elites e o patronato projetaram modelos de trabalhadores: indivíduos produtivos e laboriosos. Nesse sentido, constituíram os discursos e práticas imigrantistas, mas a defesa da imigração destacava a necessidade de “braços”, mas não de “cabeças”, agentes ou articuladores sociais. A partir do século XIX, os portugueses emigraram em grandes levas na procura de novas oportunidades e sonhos, alguns se deslocaram por conta própria, outros vieram subsidiados. Com perfis, origens e ideias diferenciados, enquanto uns buscaram enriquecer e retornar (“brasileiros de torna viagem”), outros não conseguiram ou perderam a esperança de voltar, alterando os planos iniciais. Se para alguns foi possível atribuir adjetivos como: “laboriosos”, “ordeiros”, “obstinados”; para outros seria melhor imputar e/ou acrescentar características como: “lutadores”, “contestadores”, “inconformados com as injustiças sociais”. Para estes a expulsão foi a ação impetrada pelo Estado autoritário, que se utilizando de métodos arbitrários, constituiu um conjunto de medidas para controlar e selecionar os imigrantes desejáveis e “com lei ou sem lei”,59 o governo perseguiu e expulsou os que eram considerados “indesejáveis”. Dessa forma, o processo de imigração portuguesa para São Paulo englobou várias experiências cotidianas, através das quais os lusos constituíram-se como sujeitos 186 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos históricos. Na sociedade de acolhimento essas vivências abarcaram expectativas e sonhos, desalentos e frustrações, trabalho e estratégias de sobrevivência, além de tensões, formas de resistências e luta. Como sujeitos históricos, os lusos não podem ser observados dentro de um único e restrito modelo, mas como agentes de experiências múltiplas. A ampliação dos corpos documentais, o exame exaustivo das fontes e a sua reinterpretação permitem que novas hipóteses e problemas sejam colocados, na expectativa de recobrar as tramas que delineiam as histórias destes deslocamentos. Notas e referências BRASIL/SP. Censo Estadual de 1934. Oscar Egídio ARAÚJO. Enquistamentos étnicos. Revista do Arquivo Municipal, v. LXV, mar. 1940. 3 Maria Izilda Santos de MATOS. Cotidiano e Cultura. São Paulo: EDUSC, 2002. 4 MATOS, 2002. 5 MATOS, 2002. 6 “Por Movimento operário entende-se o conjunto de fatos políticos e organizacionais relacionados com a vida política, ideológica e social da classe operária ou, mais em geral, do mundo do trabalho. Tem como primeira condição a subsistência de um proletariado industrial, isso é, “de um conjunto de homens que baseiam sua existência no trabalho assalariado, estado privados da posse dos meios de produção”. Vd. Norberto BOBBIO et al (orgs). Dicionário de política. 11ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília (UnB), 1998, p. 781. Grifo nosso. 7 Boris FAUSTO. Trabalho urbano e conflito social (1890-1920). São Paulo: Difusão Europeia do Livro (Difel), 1976, p. 32. 8 Após uma sequência de greves ocorridas em 1906, com a participação de grande número de estrangeiros, foi aprovado o decreto-lei nº 1.641, de 7 de janeiro de 1907 – Providência sobre expulsão de estrangeiros do território nacional, defendida pelo senador Adolfo Gordo. Vd. Alfredo Moreno LEITÃO. Nem todos eram mansos: o imigrante português nas lutas operárias em São Paulo (1930-1940). Dissertação de Mestrado em História Social. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), 2010, p. 116. 9 BRASIL. Collecção de Leis da República (doravante CLR). Decreto Legislativo nº 1.641, de 7 de Janeiro 1907. 10 BRASIL (CLR). Decreto nº 2.741 de 8 de janeiro de 1913; decretos nº 4.247 e 4.269 (repressão ao anarquismo), ambos de 1921, além da reforma constitucional de 1926 .Vd., dentre outros, LEITÃO, 2010, pp. 117, 120 e 121. 11 Nos primeiros anos do século XX, travou-se uma acirrada discussão entre os poderes Executivo e Judiciário. O primeiro defendia uma maior autonomia, usando como argumento a defesa da Segurança Nacional, para expulsar os estrangeiros indesejáveis; o segundo, por sua vez, defendia o respeito à legislação e a garantia dos direitos concedidos aos estrangeiros no Brasil. A expulsão só seria possível, segundo o judiciário, se houvesse 1 2 187 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos leis específicas sobre o assunto. Sobre esta questão. Vd. Rogério Luis G. BONFÁ. Com lei ou sem lei: as expulsões de estrangeiros e o conflito entre executivo e judiciário na Primeira República. Dissertação de Mestrado em História Social do Trabalho. São Paulo, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH-Unicamp), 2008. 12 A Lei nº 2.034, de 30 de dezembro de 1924, cria no interior do Gabinete de Investigações e Capturas de São Paulo, a Delegacia de Ordem Política e Social, com a finalidade de manter sob controle as ações dos cidadãos em geral. Alfredo Moreno LEITÃO e Débora Cristina Santos da SILVA. Um histórico do fundo DEOPS-SP. Quadrilátero. Revista do Arquivo Publico do Distrito Federal, Brasília, vº 1, nº 1, p 59-70, mar. – ago. 1998, p. 68. 13 Lená Medeiros de MENEZES. Os indesejáveis. Rio de Janeiro: Editora de Universidade do Rio de Janeiro (EdUERJ), 1996. 14 Paulo Sérgio PINHEIRO. Estratégias da Ilusão: a revolução mundial e o Brasil (1922-1935). São Paulo: Companhia das Letras, 1992, pp. 118 e 120. 15 O decreto nº 3.010, de 20 de agosto de 1938, em seus artigos 9, 10 e 11, tratava de organizar a ‘imigração por cotas’. Essas cotas seriam determinadas a partir do total de estrangeiros de uma determinada nacionalidade que entraram no país entre os anos de 1884-1933. Desse total, calculavam-se 2%, porcentagem que equivaleria à quantidade permitida de imigrantes que poderiam entrar no país anualmente. 16 Apesar das restrições na política imigratória a partir de 1930, presentes na Lei dos 2/3 (decreto 19.482 de 12 de dezembro de 1930) que garantia a cota de 2/3 de trabalhadores brasileiros natos em todas as categorias profissionais. Na mesma década a medida foi relativizada pela Resolução 34 do Conselho de Imigração e Colonização (22 de abril de 1939) que revogou qualquer restrição numérica as entradas de portugueses. 17 Carmen G. Burgert SCHIAVON. Estado Novo e relações luso-brasileiras (1937-1945). Tese de Doutorado em História. Rio Grande do Sul, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), 2007. A preferência dada os portugueses pode ser compreendida pelos interesses políticos convergentes entre Brasil e Portugal, os dois viviam governos semelhantes e buscavam apoio mútuo. Para o Brasil, os vínculos com os portugueses significavam uma porta de entrada na Europa e a possibilidade de fortalecer contatos com vários países, entre eles, Alemanha e Itália, que mantinham relações com Portugal. Por outro lado, oficialmente procuravam difundir e fortalecer os laços culturais, dentro do discurso que exaltar a origem comum de ambos. 18 Para a produção em Portugal destacaríamos o livro de Miriam Halpern PEREIRA (A política portuguesa de Emigração, 1850-1930. Bauru: EDUSC, 2002) e de Maria Antonieta CRUZ (Agruras dos emigrantes portugueses no Brasil. Porto, 1987). 19 Dentre esses trabalhos, destacamos: Gladys S. RIBEIRO. Mata Galegos. Os portugueses e os conflitos de trabalho na República Velha. São Paulo: Brasiliense, 1990 e "Cabras" e "Pés de chumbo": os rolos do tempo. O antilusitanismo na cidade do Rio de Janeiro, 1889-1930. Dissertação de Mestrado. Niterói, Universidade Federal Fluminense, 1987; M. Helena Beozzo LIMA. A missão herdada. Um estudo sobre a inserção de imigrante. Curitiba. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Paraná; Luis Filipe ALENCASTRO. "Proletários e 188 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos escravos - Imigrantes portugueses e cativos africanos no RJ (1850-1872)". Novos Estudos Cebrap, jul-1988, nº 21:30; M. Manuela R. S. SILVA. Ambição e horror à farda ou a Saga dos imigrantes portugueses no Brasil segundo a Gazeta Luzitana (1883-1889), doutorado, FFLCHUSP, 1991; June E. HAHNER. "Jacobinos versus Galegos. Urban Radicals Versus Portugueses Immigrants in RJ, in 1890s". Journal of Interamericam Studies and World Affairs, 18 (2), 1976;m Lená Medeiros de Menezes. Os Indesejáveis. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1996; Fernando de SOUSA, Ismênia Martins e M. Izilda S. de Matos. Nas Duas Margens: os portugueses no Brasil. Porto, CEPESE, 2009; Ismênia MARTINS e Fernando de SOUSA. Portugueses no Brasil: migrantes em dois atos. Rio de Janeiro: Muiraquitã/Porto: CEPESE, 2006; Ismênia MARTINS e Fernando de SOUSA. A emigração Portuguesa para o Brasil. Rio de Janeiro/Porto: CEPESE, 2007; M. Izilda S. de MATOS e Fernando de SOUSA. Deslocamentos & Histórias: os portugueses. Bauru: EDUSC/ /Porto:CEPESE, 2008; M. Helena Beozzo LIMA. A missão herdada. Um estudo sobre a inserção de imigrante. Curitiba. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Paraná. 20 Ver, dentre outros: M. Suzel G. FRUTUOSO. A Emigração Portuguesa e sua influência no Brasil: O Caso de Santos (1850-1950). Dissertação de Mestrado. São Paulo, Universidade de São Paulo, 1989; Sonia M. FREITAS. Presença Portuguesa em São Paulo. São Paulo: Imprensa Oficial, 2006; MARTINS e SOUSA, 2006; MARTINS e SOUSA, 2007; MATOS e SOUSA, 2008; Maria Aparecida PASCAL. Portugueses em São Paulo. São Paulo: Expressão e Arte, 2005; SOUSA, MARTINS E MATOS, 2009; MARTINS E SOUSA, 2006; LEITÃO, 2010. 21 FAUSTO, 1983; Sheldon Leslie MARAM. Anarquistas, Imigrantes e o Movimento Operário Brasileiro (1890-1920). Rio de Janeiro:Paz e Terra, 1979. 22 FRUTUOSO, 1989; Maria Lucia GITAHY. Os Ventos do Mar. SP. Ed. UNESP, 1992. 23 Herbert S. KLEIN. Migração internacional na história das Américas. In: FAUSTO, Boris (org.). Fazer a América. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo (Edusp), 2000, p. 24. 24 Paola CORTI. Storia delle migrazioni internazionali. Roma, Editori Laterza, 2007. Os deslocamentos aparecem como alternativas adotadas por uma gama abrangente de sujeitos históricos, alguns inseridos em fluxo de massa, grupos e familiares, outros em percursos individuais; envolvendo processos de migração engajada, mas também voluntária; abarcando diversos extratos sociais, levas e gerações; envolvendo agentes inspirados por estratégias e motivações diferenciadas, inclusive culturais e existenciais. Cabe destacar entre essas múltiplas motivações que levaram à migração a procura da realização de sonhos, da abertura de novas perspectivas, das fugas das pressões cotidianas, da busca do “fazer a América”, envolta em variadas representações construídas e vitalizadas neste universo. Cabe ressalvar vários mecanismos que viabilizaram este processo, como: a constituição de redes, que incluíam a difusão de informação, chamadas, acolhimento, estabelecimento de relações interpessoais, institucionais, agenciadores, aliciadores, sistema de propaganda, meios de comunicação e a organização do sistema de navegação comercial, que viabilizou o transporte transoceânico em massa. Estas e outras questões são observadas por recentes possibilidades abertas pela história cultural. 189 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos Zeila B. F. DEMARTINI. Imigração, Família e Educação. V Congresso Luso-brasileiro de História da Educação, Évora, 2003, p. 3 26 MENEZES, 1996, p. 111. 27 Paulo César G. MARINS. Habitações e vizinhança: limites da privacidade no surgimento das metrópoles brasileiras. In: Nicolau SEVCENKO (org.). História da vida privada no Brasil: República, da belle époque à era do rádio. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 132-3; Maria Célia PAOLI e Adriano DUARTE. São Paulo no plural: espaço público e redes de sociabilidade. In: PORTA, Paula (org.). História da cidade de São Paulo, vol. 3. A cidade na primeira metade do século XX, 1890-1954. São Paulo: Paz e Terra, 2004, p. 53. 28 Eulália Maria Lahmeyer LOBO. Imigração portuguesa no Brasil. São Paulo: Hucitec, 2001, pp. 50-51. 29 LOBO, 2001, p. 51. 30 FAUSTO, 1983; MARAM, 1979. 31 Muitas vezes, as dificuldades e fracassos nas ações dos movimentos operários, não se deviam apenas a repressão, os italianos dificilmente se desligam dos preconceitos em relações aos operários negros, mulatos, portugueses ou espanhóis, gerando enfrentamentos e conflitos. Mário CARELLI. Carcamanos e Comendadores: os italianos de São Paulo: da realidade à ficção (1919-1930). São Paulo: Ática, 1985, pp. 66-67. 32 Azis SIMÃO. Sindicato e Estado. São Paulo: Ática, 1981. 33 Maria Izilda Santos de MATOS. "Estratégias de sobrevivência: a imigração portuguesa e o mundo do trabalho". In: A Emigração-Imigração Portuguesa nos séculos XIX-XX. Lisboa: Fragmentos, 1993, pp. 218-237. 34 MATOS, 2003. 35 Uma vez denunciado, o trabalhador se via impossibilitado de arrumar outro emprego. 36 BRASIL/SP. CIFT. Circular nº 633, 28 de agosto de 1926. 37 As fichas do DEOPS, possuem no item “assunto” que de forma genérica que incluía sob a chancela comunistas, também, anarquistas, socialistas e outros grupos de esquerda Entre os portugueses prontuariados por “crime de opinião”, a grande maioria era comunista, só uma pequena parcela era composta por anarquistas, porém, foram classificados como “comunistas”. Isso se deve, provavelmente, por ser mais importante identificar os indivíduos que pudessem ser causadores de desordem, do que o tipo de ideologia que professavam. 38 Os 13 prontuários, que fazem parte do fundo DEOPS-SP que se encontra sobre a guarda do Arquivo Público do Estado de São Paulo (doravante APESP), são os seguintes: “Abílio José Neves” – pront. 02; “Antonio Araújo Luiz Ribeiro” – pront. 3.022; “Antonio Cláudio” – pront. 678; “Antonio da Costa” – pront. 4.036; “Antonio Duarte” – pront. 3.450; “Antonio Fernandes Martins” – pront. 3.118; “Antonio Joaquim Calhau” – pront. 2.829; “Aureliano Henriques” – pront. 477; “Cypriano da Cruz Affonso” – pront. 208; “Eduardo Basílio” – pront. 1.080; “Francisco Augusto Neves” – pront. 155; “José da Silva Carvalho” – pront. 2.201; “Theotonio Ribeiro” – pront. 2.970. Todos os portugueses expulsos eram residentes no estado de São Paulo, sendo seis na capital, 25 190 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos quatro em Santos, dois no interior (Araçatuba e Bauru) e um que viveu entre a capital e a cidade de Lins. LEITÃO, 2010. 39 MENEZES, 1996, p. 72. Este trabalho analisa os portugueses no Rio de Janeiro, mas as questões tratadas também ocorriam em São Paulo. 40 BRASIL/SP. Livro de Registro da Hospedaria de Imigrantes, Livro 7-A, página 146 – Memorial do Imigrante. 41 BRASIL/SP. APESP. Prontuários: “Abílio José Neves” – nº 02 e “Francisco Augusto Neves” – nº 155. 42 MATOS, 2009, p. 415-443. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/his/v28n1 /15.pdf. Acesso em 26 de janeiro de 2010. 43 MATOS, Maria Izilda Santos de. “Portugueses e experiências políticas: a luta e o pão”. São Paulo, 1870-1945. História, São Paulo, v. 28, n. 1, pp. 415-443, 2009. Disponível em www.scielo.br. Acessado em 26 de janeiro de 2010. 44 “Neno Vasco (1878-1920), pseudônimo de Gregório Nazianzeno Moreira de Queirós Vasconcelos, advogado, jornalista, dramaturgo e poeta que lutou pela simplificação da ortografia. Integrava o grupo de anarquistas italianos de São Paulo, mas sua formação era portuguesa, na Universidade de Coimbra. Escreveu artigos, poesias, peças, como A Plebe, fundou a revista Amora e dirigiu O Amigo do Povo. ... Em 1911, retornou a Portugal.” (Cf. LOBO, 2001, p. 86; Edgard CARONE. Movimento Operário no Brasil (1877-1944). São Paulo: Difel, 1984, pp. 474-477. 45 Adelino Tavares de Pinho, natural de Aveiro onde nasceu em 21/01/1885, ingressando no território nacional em 20/10/1906, por Belém do Pará. Atuou de 1917 a 1923 escrevendo no jornal “A Plebe”, onde foi responsável pelo jornal junto com Rodolpho Felippe. Retornou, definitivamente, a Portugal, em 27/03/1957. –APESP. DEOPS-SP, Pront. 04; BR/SP. Memorial do Imigrante. Registro de Estrangeiros – Delegacia Especializada de Estrangeiros. 46 “Escolas mistas, sem exames, sem promoções, sem castigos ostensivos, combinando um currículo convencional com a difusão dos princípios anarquistas refletida nas festas e comemorações ...”. Cf. FAUSTO, 1976, p. 82. 47 BRASIL/SP. APESP. DEOPS. Prontuário nº 61: Antonio Candeias Duarte. 48 Comitê era formado, entre outros por: Edgard Leuenroth, Teodoro Monicelli, Gigi Damiani, Francisco Cianci. Cf. Christina da Silva Roquette LOPREATO. O espírito da revolta: a greve geral anarquista de 1917. São Paulo: Annablume, 2000 e A semana trágica: a greve geral anarquista de 1917. São Paulo: Museu da Imigração, 1997. 49 BRASIL/SP. APESP. DEOPS. Prontuário nº 61: Antônio Candeias Duarte. 50 Candeias fundou o Editorial Marenglen (fusão das iniciais de Marx, Engels e Lênin) visando a publicação de manifestos, livros e periódicos do PCB. 51 BRASIL/SP. APESP. DEOPS. Prontuário nº 477: Aureliano Henriques. 52 Cabe constatar que a expulsão de militantes políticos portugueses, nesse período histórico, mas do que em outros anteriores, colocou esses imigrantes numa situação de dificuldades, renegados por ambos os governos, na medida em que eles não correspondiam ao modelo de imigrante idealizado no Brasil; também não eram o 191 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Artigos Portugueses com ideias e ações políticas: estrangeiros perigosos Allfredo Moreno Leitão/Maria Izilda S.de Matos retornado almejado pelo governo salazarista, um “brasileiro-de-torna-viagem”, um excluído no país de adoção e na terra natal. 53 Assim como no Brasil, em Portugal foi criada uma polícia especializada em vigiar e reprimir os opositores do Estado, a Polícia de Vigilância e de Defesa do Estado/ Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PVDE/PIDE), a polícia política, espinha dorsal do sistema. Cf. Fernando ROSAS. O Estado Novo (1926-1974). In: José MATTOSO (dir.). História de Portugal. Lisboa: Estampa, 1994. v. 7, p. 275. 54 O processo de expulsão era individual, só atingia ao condenado e não a sua família, com isso muitos expulsos eram separados de suas famílias, a reunião muitas vezes era dificultada por questões financeiras e por ressentimentos de ambos os lados. O desconhecimento do destino desses retornados portugueses possibilita um leque de alternativas que podem ser levantadas: prisão por um período indeterminado e posterior soltura com fixação do liberto em solo português ou em outro país que não o Brasil; prisão e tortura seguida de morte; retorno secreto ao Brasil etc. Há informações, na maioria das vezes vagas, sobre a volta clandestina de alguns expulsos. 55 BRASIL/SP. APESP. DEOPS. Prontuário nº 2: Abílio José das Neves; BR/Arquivo nacional (doravante AN). Fundo Ministério da Justiça e Negócios Interiores, Processo nº 26.653, ano de 1954. Caixa 5.271. 56 BRASIL. Constituição (1934). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, decretada e promulgada pela Assembleia Nacional Constituinte em 16 de julho de 1934. Portal da Câmara dos Deputados, Brasília, DF. Seção Legislação. Disponível em http://www2.camara.gov.br/legin/fed/consti/1930-1939/constituição-1934-16-julho1934-365196-publicacao-1-pl.html. Acesso em: 01 de agosto de 2010. 57 Os estudos das cartas e correspondências, a sua utilização como documentação para o historiador vem se desenvolvendo recentemente, possibilitando rastrear elementos da memória dos indivíduos e/ou do grupo. V. Angela de Castro GOMES. Escrita de si, escrita da história. Rio de Janeiro: FGV, 2004. 58 BRASIL/SP. APESP. DEOPS. Prontuário nº 208: Cypriano da Cruz Affonso. A grafia foi atualizada. 59 Rogério Luis G. BONFÁ, Com lei ou sem lei: as expulsões de estrangeiros e o conflito entre executivo e judiciário na Primeira República. Dissertação de Mestrado em História Social do Trabalho. São Paulo, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH-Unicamp), 2008; Expulsão e Residência: a luta pelo direito dos imigrantes na Primeira República. Texto integrante dos Anais do XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP. Universidade de São Paulo, 08 a 12 de setembro de 2008. Cd-Rom. 192 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Resenhas ARRUDA, J. Jobson de Andrade; FERLINI, Vera Lucia A. Ferlini; MATOS, Maria Izilda Santos de; SOUSA, Fernando de (org.). De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil. São Paulo, Alameda, 2013. De colonos a imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil é uma obra de referência para os estudiosos do fenômeno da imigração em nossas terras. Trata-se de um livro de 601 páginas que abarca trinta e nove capítulos escritos por 45 estudiosos do assunto, entre brasileiros e portugueses. São justamente brasileiros e portugueses que respondem pelo viço desse livro, proponente de unir duas pontas atlânticas: as terras lusitanas situadas na banda norte desse oceano, e o território brasílico, em sua latitude sul. Em comum, uma forte tradição de vínculos de diversas naturezas: políticos, econômicos, culturais e, muitas vezes, quando se trata de questões familiares, porque não dizer, emocionais. Seus elementos de unidade são sua história imbricada, primeiro pela colonização do país europeu, e depois pelas pontes construídas pelo estupendo afluxo de imigrantes portugueses que, desde a emancipação política do Brasil, estiveram sempre presentes em significativa quantidade e de forma praticamente ininterrupta, por quase um século e meio nas terras lusofalantes da América do Sul. Aliás, eis aí outro elemento fundamental de unidade, a língua. Cabe lembrar que, além de Portugal, o único país do Ocidente que tem o português como língua oficial é o Brasil. Muito embora haja quem diga em tom jocoso que Brasil e Portugal são “dois países separados pela mesma língua”, dada a variação de manejo do idioma materno de ambos os países, coisa que, na prática, nunca foi problema verificado na comunicação entre seus falantes europeus e sul americanos. O livro foi resultado é organizado por quatro professores, todos de extenso currículo na área de História, e com pesquisas vinculadas aos estudos sobre Portugal, portugueses e o tema dos imigrantes e da imigração. São eles, por ordem alfabética: o Professor Fernando Sousa, professor catedrático da Universidade do Porto e um dos maiores nomes do mundo intelectual luso-brasileiro na área de estudos da imigração; o Professor José Jobson Arruda, historiador da USP e do Instituto Camões, atualmente debruçado na formulação intelectual sobre as relações luso-brasileiras; a Professora Maria Izilda de Matos, Titular de História da PUC-São Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015, pp. 193-202 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo Paulo, com destacada produção sobre a presença dos imigrantes portugueses em São Paulo, e suas relações epistolares com a família na terra de origem, e a pesquisadora Vera Lucia Ferlini, Professora Titular em História Ibérica da USP, possuidora de uma trajetória intelectual vinculada aos estudos de Portugal, entre outros assuntos. A obra nasce como resultado do VII Seminário Internacional sobre imigração realizado através da PróReitoria de Cultura e Extensão Universitária da USP em novembro de 2012, com o apoio da Fapesp e do Cepese da Universidade do Porto. O evento deu ensejo à agregação das mais diversas produções individuais sobre o tema dos estudos da imigração, que é um campo de pesquisa que vem crescendo cada vez mais no Brasil, país no qual se destacam hoje três grandes polos de produção organizada de conhecimento sobre o assunto, a saber: Belém, Rio de Janeiro e São Paulo. Não por acaso Belém, Rio de Janeiro e São Paulo são justamente as três cidades brasileiras que mais receberam imigrantes europeus. Nessas cidades merecem destaque grupos de pesquisa de estudos da imigração atuantes na UFPA, UERJ, USP e PUC-SP. A esses núcleos de investigação vêm a se agregar pesquisadores de diversos estados brasileiros, de Norte a Sul, cada vez 194 mais interessados na constituição de redes de pesquisa sobre o tema. A área de estudos imigratórios vem, portanto, se organizando cada vez mais no Brasil, já podendo ser identificado um grupo significativo de especialistas que vêm se encontrando periodicamente em Congressos nacionais e internacionais para debater suas temáticas de investigação. Além dos pesquisadores nacionais, fazem parte deste trabalho um grupo significativo de historiadores portugueses, radicados principalmente no Cepese, órgão vinculado à Universidade do Porto, que é um dos mais importantes centros de pesquisa do mundo sobre o tema da imigração lusitana. Mas não só portugueses nortenhos aparecem com os seus trabalhos entre os estudiosos lusitanos, pois lisboetas e açorianos também marcam presença nessa coletânea. E para ninguém dizer que este é um “clube fechado” de investigadores luso-brasileiros, há também um capítulo escrito por um professor da Universidade de Barcelona, responsável por um dos quatro trabalhos de imigração espanhola presentes no livro. Entre as principais questões discutidas estão as políticas públicas de imigração; as aproximações e distanciamentos entre o português colono e o imigrante; a identidade do imigrante nas cidades brasileiras; Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo questões metodológicas acerca do trato das fontes; o associativismo; as redes de sociabilidade; os conflitos e as integrações do imigrante luso na zona urbana brasileira; imigração e imprensa e, por fim, as análises quantitativas sobre a imigração. Outras temáticas também se fazem presentes, como as correspondências epistolares, as benemerências portuguesas no Brasil, a produção de cultura do imigrante, estudos específicos sobre espanhóis e italianos, entre outros. Os organizadores optaram em estruturar o livro dividindo o conjunto de trabalhos que o compõem em seções. A coletânea é aberta com uma divisão denominada “questões conceituais”, composta de três trabalhos que propõem uma reflexão sobre as distinções entre imigrante e colono e, fundamentalmente, sobre o próprio conceito de imigrante. Inicia com um capítulo de José Jobson Arruda que pensa o fluxo imigratório português para o Brasil como um continuum, que vai desde o século XVI até meados do Século XX. Discute a opção lusitana pelo trabalho compulsório na América portuguesa como uma opção ao povoamento e lucratividade da empresa colonial, privatizando assim a defesa de suas possessões no continente americano. Através de sua construção argumentativa Arruda vai 195 caracterizando na transversalidade do seu texto uma relação de pertencimento mútuo que Portugal estabelece com o Brasil depois da emancipação política de 1822. Ressalta que, ao contrário do caminho escolhido pelos vizinhos da América espanhola, o Brasil não fundeou a sua identidade como país independente a partir da negação da antiga metrópole europeia mas, de forma distinta, aproveitou-se dos laços históricos estabelecidos com Portugal para fazer valer um processo civilizador nos trópicos que se iniciou pela manutenção da dinastia lusa dos Bragança em nossa terra, a única regida por uma Monarquia na América do Sul. Diferentemente da estigmatização do espanhol como inimigo a ser combatido para a afirmação da nação na América hispânica, o português aqui foi bem-vindo durante todo o Século XIX, e serviu como substituto da mão-de-obra escrava em um momento de crise do escravismo após a Lei Eusébio de Queirós, que proibiu o tráfico negreiro em 1850. Mostra o autor que, com o advento da República, em fins do Oitocentos, uma das primeiras providências do novo regime foi realizar uma grande naturalização de portugueses, o que, segundo entende, confirmava um sentido de vinculação de longa duração entre os dois povos que vinha se estendendo desde o verdor Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo dos tempos coloniais, e que ainda se manteria até década e meia após o fim da II Grande Guerra Mundial. Em seguida ao texto de Jobson Arruda vem o artigo do Professor Fernando de Sousa, catedrático da Universidade do Porto, e um dos maiores especialistas internacionais em imigração portuguesa. Mantendo a proposta de pensar a relação entre colono e imigrante, o estudioso português chama atenção para o fato curioso de que, com a emancipação política do Brasil, o elemento português radicado em nossas terras, logo, assim de roldão, torna-se brasileiro. Em contrapartida desse movimento, o lusitano que passa então a afluir ao Brasil – esse afluxo continua em grande monta mesmo após a independência – vai de colono a imigrante. A torrente imigratória continuou a mesma, não mudou a língua, nem o território, mas a condição jurídica do português desde então mudou, frisa o texto do Professor Sousa. Passada a análise do impacto da independência da antiga colônia americana, o catedrático português discute a postura do Estado lusitano quanto às precariedades e agruras de seus cidadãos, agora imigrantes em terras brasileiras. Evidencia o pouco caso das autoridades lusas quanto às condições de seus compatriotas no Brasil, em que tivesse pesado a época discursos de indignação da elite 196 política portuguesa, mas vindo sempre desconexos de iniciativas efetivas para resolver esse grave problema que impingiu sofrimentos e humilhações a milhares de portugueses em terras sul americanas. O professor Sousa aponta que a razão dessa inação do Estado português quanto a imigração massiva ao Brasil e as condições de seus cidadãos residia nos interesses de manter as remessas financeiras que os imigrantes cá fixados enviavam a sua terra natal, e da qual a economia lusitana de então muito dependia. Fernando Sousa aborda ainda as diferenças de perfil do imigrante português nortenho para aquele ilhéu, menos instruído e mais precário em sua condição, sobretudo o açoriano, que muitas vezes emigrou clandestinamente ao Brasil, e atuou no campo brasileiro em péssimas condições, não raro sendo tratado como escravo. Frisa que o lusitano setentrional demonstrou um pouco mais de instrução, além de vir muitas vezes formado em um ofício. Atuaram mais no comércio, em bem melhores condições, e com maior remuneração que os compatriotas insulares. Por fim, demarca que os portugueses imigrantes no Brasil do Século XIX vieram cá para substituir a mão de obra escrava, em crise depois de 1850, mas que, mesmo assim, em que tenham lhes Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo sobrepesado suas desventuras e agruras em terras brasílicas, as dificuldades encontradas no Brasil ainda teriam sido melhores do que a vida que lhes era reservada em Portugal. Em seguida ao capítulo de Fernando Sousa temos o artigo de Miriam Halpern Pereira, ex diretora do Arquivo Nacional da Torre do Tombo e professora de História Contemporânea de Vicennes, na França. O tema em foco é a discussão do conceito de imigrante e a política de imigração em Portugal. Para cumprir o seu intuito de análise começa discutindo a origem do conceito de emigrante. Inicia ressaltando que essa palavra surge nos lexicógrafos da língua portuguesa na primeira metade do Século XIX com um significado distinto do contemporâneo, conotando então aquela pessoa que teria sido compelida a abandonar o seu país, independentemente do motivo ou da condição social. O texto segue abordando o contexto do Brasil pós-emancipação política, com destaque para a discussão da lusofobia em nossas terras e para as facilidades de obtenção da nacionalidade brasileira pelo cidadão português após a constituição de 1824. Em seguida discute os diversos fatores que envolveram o fenômeno imigratório lusitano ao Brasil, como a lei de contratação de serviços de 197 colonos, de 1837, a lei de terras de 1850 e o impacto da lei Eusébio de Queirós, do mesmo ano. Seu texto avança chamando atenção para as preocupações do Estado português relativamente à imigração clandestina de açorianos e madeirenses ao Brasil na década de 1830, mas ressalta que as medidas mais enérgicas das autoridades lusitanas em face a esse problema só se apresentaram a partir de 1850, com o início da grande imigração. Pela metade do texto a autora retoma a discussão conceitual que relaciona o colono ao imigrante, chamando-nos a atenção para o fato de que até 1863 os dois termos eram usados pelas autoridades administrativas portuguesas, que os diferenciava pelo tipo de trabalho no destino, sendo o imigrante entendido como aquele que era possuidor de um contrato de trabalho, ou que pagava a sua própria passagem. Em direção ao final de seu capítulo discute as iniciativas do governo português para inibir a imigração familiar que se iniciava em fins do Século XIX, e que comprometia o fluxo de remessas de lusitanos à terra natal, importância que constituía um fator econômico decisivo para o equilíbrio das contas públicas portuguesas. Conclui seu texto discutindo as diferenças entre o imigrante e o viajante, o que mantém a coerência e riqueza argumentativa de sua proposta de problematizar o conceito de imigrante ao mesmo Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo tempo em que discute as políticas públicas lusitanas quanto à imigração. Abrindo a seção “Identidades” surge o texto de Maria Izilda de Matos, uma das maiores e mais destacadas lideranças nos estudos da imigração portuguesa no Brasil. Professora Titular da PUC de São Paulo, Maria Izilda especializou-se na rica pesquisa de cartas entre imigrantes portugueses e seus familiares na terra de origem, investigação que a levou a esquadrinhar tanto o acervo de epístolas depositadas em arquivos portugueses como nos brasileiros, com destaque para aqueles do Memorial do Imigrante, na antiga Hospedaria dos Imigrantes de São Paulo, e dos Arquivos Distritais do Porto e de Braga, em Portugal. Antes de desenvolver a análise das cartas entre portugueses, tanto os cá radicados quanto seus parentes na origem, Maria Izilda levanta um rico arco de questões acerca da imigração lusitana para São Paulo, operando desde uma caracterização dessa cidade que os recebia, sua evolução demográfica e social, até a tipificação desse imigrante, constituindo assim um movimento que vincula cidade e imigrante em uma mesma trama. Constituída a relação entre a urbe e o imigrante, a professora passa à análise das cartas de chamada, para posteriormente discutir aspectos metodológicos desse trabalho, a 198 problemática familiar do imigrante, e a discussão de gênero no interior de suas análises epistolares. Termina o seu texto ressaltando a importância do estudo das redes de imigração, e deixando ao leitor que deseja iniciarse na temática das cartas de imigrantes uma notável introdução ao assunto. A autora não deixa dúvida sobre a relevância desse tema no interior dos estudos imigratórios, de suas especificidades no que tange às questões que suscita, às possibilidades de abordagem, e também à metodologia que requer para o seu tratamento, dando nota da complexidade que envolve a temática, e do domínio da mesma pela autora. Ainda na seção “Identidades” merece destaque o estimulante texto de Érica Sarmiento. Professora dos programas de pós-graduação da UERJ, onde atualmente dirige o Labimi – Laboratório de Estudos da Imigração Estrangeira – e da Universo, a professora Érica pode ser considerada um dos talentos emergentes na cena da pesquisa brasileira sobre os estudos imigratórios. Com passagens como professora visitante pelas universidades de Santiago de Compostela na Espanha, e por Columbia University em Nova Iorque, além de sete anos de estudos e pesquisas de pós-graduação na Espanha, a professora fluminense Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo traz em sua trajetória um considerável cabedal de conhecimentos sobre o tema da imigração. O seu capítulo se destina a discutir a relação entre portugueses e galegos no Rio de Janeiro entre fins do Século XIX e inícios do Século XX. Para tanto Sarmiento inicia a sua análise apresentando o caráter imbricado das relações entre lusitanos e galegos na sua origem ibérica. Vai desenhando as relações de trabalho que incentivaram as populações galegas a imigrarem ao norte de Portugal, a fim de trabalhar com o fito de obter renda complementar. Na tessitura de seus argumentos, Sarmiento nos vai constituindo um quadro no qual as fronteiras políticas se esmaecem em face às similaridades culturais e as necessidades materiais que vinculam esses dois povos peninsulares. Deste modo, transporta o leitor a uma viagem à freguesia de São José, no atual bairro da Lapa, no Rio de Janeiro da virada do século, evidenciando conflitos e cumplicidades entre galegos e portugueses que ali circulavam. A autora mostra ainda como a relação entre esses dois tipos de ibéricos trouxe a terras cariocas um entrelaçamento que remetia ao convívio entre esses dois povos desde a sua intensa experiência de compartilhamento social no espaço 199 europeu de integração que era o Noroeste peninsular. Assim, Sarmiento elucida o leitor quanto à curiosa alcunha que os portugueses receberam em terras brasileiras; refiro-me a sua tradicional designação como “galegos”, que tem no texto da professora Érica uma chave de compreensão da historicidade do apelido, forjada em anos de experiência de vida comum nas zonas de fronteira ibérica permeadas por ambos os povos. Outra seção que merece destaque nesse livro sobre imigração portuguesa é a denominada “Fontes e Abordagens”. Nela, entre outros bons artigos, sobressai o trabalho da Sub-Reitora de graduação da UERJ, e Titular de História Contemporânea dessa mesma instituição, Lená Medeiros de Menezes. Uma das mais antigas e conceituadas pesquisadora de história da imigração do Brasil, a professora Lená traz ao leitor um arco de problemáticas e questões acerca do que denominou “zonas de sombra documentais”, indagações que derivam de sua longa experiência como pesquisadora do tema imigração. Inicia suas ponderações pondo em questão os limites da análise quantitativa acerca da imigração, lembrando que o trabalho do historiador é em muito dependente de decisões das autoridades de imigração tomadas no passado, dos Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo dados que foram coletados e daqueles que foram omitidos. A imigração clandestina também entra em sua pauta de indagações, pois lembra a professora do caráter quase imensurável que esse fenômeno constituiu, deixando um difícil desafio aos investigadores do presente. Ao longo da leitura do seu texto os problemas levantados no tratamento das fontes vão se avolumando, o que dá nota do caráter complexo dessa área do saber histórico, e das dificuldades encontradas pelo pesquisador no processo de produção de conhecimento sobre o assunto. A professora lembra das dificuldades relacionadas a utilização de vários nomes por um mesmo indivíduo; as complicações daqueles que ingressam mais de uma vez no mesmo porto; ou as dificuldades relacionadas aos passaportes coletivos, utilizados para o registro de entradas de famílias, o qual faz o historiador encontrar grandes dificuldades no registro de mulheres, para ficar num só exemplo, uma vez que o documento de entrada no país de destino indicava apenas o nome do chefe da família, a época um homem. Aponta também a falta de sintonia das autoridades das diversas localidades de um mesmo país para o registro adequado das entradas de imigrantes, sobretudo no período republicano brasileiro, no qual o 200 federalismo fazia parte da organização política do país. Termina o seu texto advertindo os pesquisadores de imigração que atuam na temática dos levantamentos quantitativos, convidando-os a uma reflexão sobre as dificuldades inerentes a atuação desses profissionais junto às “armadilhas” escondidas por trás de uma suposta objetividade das fontes disponíveis. Seu texto constitui um material rico em questões e indispensável à reflexão metodológica sobre o tratamento das fontes nessa área, além de importante base para aqueles que iniciam as suas atuações nesse campo dos estudos de imigração. Na parte do livro denominada “Grande imigração” destacamos o capítulo da Professora Ismênia Martins, uma das maiores e mais notáveis estudiosas dos estudos de imigração no Brasil. Professora do programa de pós-graduação da UFF, a Professora Ismênia coordena o projeto portugueses no Brasil, importante iniciativa de pesquisa que vincula universidades portuguesas e brasileiras no esforço de pesquisa sobre a imigração lusitana em nossas terras. O texto de Ismênia Martins trata de portugueses, espanhóis e italianos no período da grande imigração no Brasil. Trata-se de um breve resumo de um trabalho muito maior, de grande vulto, que essa pesquisadora Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo coordena, liderando uma equipe extensa de pesquisadores que realiza um portentoso levantamento de ingresso desses três povos europeus meridionais, que constituíram nossos principais vetores de imigração no período proposto. Ao longo do texto a historiadora vai apresentando uma série de gráficos que constituem a base na qual fundamenta as suas análises. Relações de navios com as nacionalidades cuidadosamente discriminadas também aparecem em abundância nesse artigo, dando nota ao leitor do caráter meticuloso de sua pesquisa documental. Variantes como religião, estado civil e alfabetização também são levadas em conta em suas apresentações estatísticas e análises que lhes correspondem e dão sentido. Seu texto constitui um importante material de estudo metodológico e exemplo de trabalho sobre imigração ancorado em levantamentos e análises estatísticas sobre o assunto. Outras seções registram importantes trabalhos nessa coletânea, como a denominada “Trajetórias”, na qual pesquisadores refletem sobre os diversos caminhos trilhados pelos imigrantes no Brasil; a “Aportes Culturais”, na qual manifestações culturais desenvolvidas por imigrantes aqui radicados recebem tratamento; a “Fluxos de Riqueza”, onde encontramos trabalhos que 201 discutem as contribuições materiais dos imigrantes em terras brasileiras e, por fim, uma seção intitulada “Contextos Regionais” na qual os estudos de diversos níveis de diálogos entre imigrantes e as suas localidades de fixação são analisados por um grupo de estudiosos do assunto. Seja pelos artigos dos mestres mais destacados e experientes – alguns injustamente não resenhados aqui por força de seleções que este formato nos impõe, seja pelos valiosos estudos de jovens pesquisadores sobre o tema, De colonos a imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil constitui importante material de referência para os estudiosos das mais diversas temáticas de imigração, pois o sentido dessa coletânea é justamente oferecer um painel de discussões sobre o assunto em pauta. Mas essa oferta generosa de temáticas constitui mais do que isso, pois é também um grande espelho dos assuntos pesquisados na área, tanto no Brasil quanto em Portugal, já que essa é uma obra que costura a distância entre dois lados de um mesmo oceano, como a imigração portuguesa ao Brasil costurou a separação entre Brasil e Portugal realizada em 1822, e não permitiu nunca que nós brasileiros viéssemos a esquecer uma face tão importante de nosso país. A julgar pelo Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas De Colonos a Imigrantes. I(E)migração portuguesa para o Brasil André Nunes Azevedo apresentado na obra, mesmo a imigração portuguesa cessando, haverá ainda um grupo significativo de historiadores trabalhando nos dois lados do Atlântico para nunca permitir que esqueçamos de nossos laços e, no caso do Brasil, de nossas 202 origens, pois são parte constituinte do que somos. André Nunes Azevedo Univ. do Estado do Rio de Janeiro Navegar, vol. 1, nº 1, Julho 2015 Resenhas MATOS, Maria Izilda Santos de. Portugueses: Deslocamentos, Experiências e Cotidiano - São Paulo nos séculos XIX e XX Bauru, SP: Edusc, 2013. Portugueses: Deslocamentos, Experiências e Cotidiano - São Paulo nos séculos XIX e XX é o mais recente livro de Maria Izilda Santos de Matos, historiadora que, há muitos anos, vem contribuindo para a historiografia com relevantes pesquisas sobre a experiência dos imigrantes em São Paulo, a partir da convergência entre as óticas da história do cotidiano e da história cultural. Nestes “Portugueses” a autora reúne uma década de pesquisas e diálogos encetados com estudiosos do tema da imigração em diferentes contextos sociais, resultando na apresentação de uma reflexão densa sobre o perfil do grupo estudado, seus deslocamentos e, ainda, sobre sua experiência social. Ora, falar do imigrante português no Brasil poderá parecer rotineiro para o leitor. Mesmo considerando que na atualidade as pós-graduações já produziram uma quantidade razoável de dissertações de mestrado e teses de doutorado sobre o tema, não são muitos os estudos sobre este grupo que ganham as livrarias. Assim, o livro de Maria Izilda tem o mérito de atestar, afirmar e, principalmente, demonstrar o processo migratório português, sua complexidade e, também, os enraizamentos deste grupo na sociedade de acolhimento, bem como sua territorialização em São Paulo. Tais questões são abordadas pela autora, com a devida consideração à diversidade existente no interior dessa imigração, sobretudo às questões de gênero e, ainda, as transformações enfrentadas por uma cidade que, ao longo do século XX, veio a se constituir na grande metrópole da América do Sul. Nos dois primeiros capítulos Maria Izilda aborda a historiografia sobre o tema e apresenta um estudo sobre as fontes de pesquisa disponíveis na Hospedaria de Imigrantes de São Paulo, explicando seu conteúdo, tabulando seus dados e fornecendo um quadro completo do grupo pesquisado. Nos capítulos seguintes questões de gênero, trajetórias de vida e formas de resistência são abordadas e destacadas. Em particular, aquelas Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 203-204 referentes ao envolvimento político dos portugueses, imigrantes que por longo tempo foram subestimados em sua militância política e taxados como passivos. Nesse sentido a atuação dos portugueses nas Docas de Santos e na Construção Civil foi lembrada, assim como ações individuais como a de Maria de Lourdes Prestes Maia, a “Maria portuguesa”, que transitou do mundo das artes à filantropia, da luta feminista ao engajamento político. Vida que ultrapassou o assistencialismo-maternalista da Era Vargas para inserir-se na gênese da luta feminista. Diários, folhas operárias, as famosas listas negras elaboradas pelo patronato, prontuários do DEOPS, e processos de expulsão são exumados no texto, devassando o duro cotidiano 204 dos trabalhadores imigrantes em São Paulo, ao mesmo tempo em que informam a acerca da percepção do Estado sobre eles. Por fim, a autora brinda o leitor com uma história cultural das tradições, gastronomia e sensibilidades dos portugueses: cores, rezas, cantos, cheiros, comidas, afetos. Brinda também - e isso merece ser dito - com o rigor das notas de rodapé que percorrem os capítulos e, por si só, perfazem outro texto. Esse estudo certamente irá subsidiar e inspirar novas pesquisas sobre imigração. Andréa Telo da Côrte Museu do Ingá Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015. Resenhas TUCCI CARNEIRO, Maria Luiza. Weltbürger Brasilien und die jüdischen Flüchtlinge, 1933-1948 Wien: LIT Verlag, 2014 No livro Cidadão do Mundo. O Brasil diante do Holocausto e dos judeus refugiados do nazifascismo 1933-1948, publicado em 2010 no Brasil e lançado em 2014 na Alemanha, Maria Luiza Tucci Carneiro, L. D. do Departamento de História da USP e coordenadora do LEER/USP, busca responder à pergunta crucial do porquê muitos países e nações ficarem indiferentes diante de milhares de refugiados do nazismo, nas décadas de 1930 e 1940, restringindo, muitas delas, os regulamentos de imigração, especialmente com relação aos judeus. Após explicar os problemas referentes à apatridia e às regras de imigração vigentes no Brasil até 1933, Tucci Carneiro expõe minuciosamente as circunstâncias políticas e históricas responsáveis pela política imigratória restritiva e de cunho antissemita do governo de Getúlio Vargas, revelando contextos históricos até hoje desconhecidos. As pesquisas da autora baseiam-se em uma documentação ampla, que inclui fontes inéditas que ela encontrou, compilou e analisou em arquivos brasileiros e internacionais. Tucci Carneiro demonstra que, ainda que não configurassem exceção no quadro mundial, os países latino-americanos, que surgiam como possíveis países de acolhimento, adotaram restrições vigorosas em seus regulamentos de imigração, justamente nos anos em que milhares de refugiados do nazismo precisavam de um abrigo seguro no exterior. No caso específico do Brasil, a politica para com os refugiados do nazismo foi caracterizada pela ambiguidade e pela omissão, com o regime Vargas mantendo uma politica de conveniência perante o Terceiro Reich e junto aos EUA, na busca por um bom relacionamento econômico com ambos os países. Por um lado, o governo brasileiro alinhava-se ao propósito humanitário dos EUA; por outro, deixava claro que não desejava a imigração de “indesejáveis”, desenvolvendo uma politica que se voltava para a proibição da imigração legal de judeus. Sob a influência das teorias raciais disseminadas a partir da Europa, o governo do Brasil buscava promover uma política de branqueamento. Assim, no contexto da busca de “melhoria” do homem brasileiro foi que os Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 205-208 Resenhas Weltbürger Brasilien und die jüdischen Flüchtlinge, 1933-1948 Marlen Eckel judeus foram “indesejáveis”. considerados A discriminação sistemática aos judeus por parte do regime teve o apoio, mantido em sigilo, da Igreja Católica, bem como a colaboração dos ministros responsáveis pela execução das medidas. Os efeitos foram perceptíveis em todos os níveis de governança: da diplomacia ao campo militar. O antissemitismo manifestou-se de forma mais grave e persistente nas regras de imigração que, nos anos 19371950, alcançaram o auge do detalhamento e de sua aplicação pelas diplomatas e pela Policia Politica. Nesse contexto, o livro dá aos leitores uma ideia das visões de mundo e das ideias que afetavam os burocratas responsáveis pela imigração e as elites políticas. Muitos diplomatas em missão nos países ocupados pelos nazistas reproduziram, em seus ofícios, convicções xenófobas e antissemitas. Como demonstra a autora, a ambivalência da atuação política refletiu-se de vários modos. Por um lado havia o grupo americanófilo, cujo representante mais proeminente era Oswaldo Aranha, embaixador brasileiro no EUA de 1934 a 1937 e ministro das relações exteriores entre 1937 e 1945. Por outro havia o grupo 206 dos germanófilos declarados, simpatizantes dos nazistas. Dentre estes podem ser citados: Francisco Campos, ministro dos Negócios Interiores e da Justiça entre 1937 e 1942; Pedro Aurélio de Gois Monteiro, Chefe do Estado-Maior, e Filinto Strubling Müller, Chefe da Policia Política do DF (Rio de Janeiro). Ademais havia antissemitas convictos, como os diplomatas Cyro de Freitas Valle e Jorge Latour, que atuavam em Berlim e em Varsóvia. Na grande maioria dos casos, a negação de vistos aos judeus era defendida não como um caso de racismo, mas como uma prestação de serviço ao país. Como é demonstrado no livro, os judeus tiveram sobre si a vigilância continuada do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS). Nesse contexto de vigilância e controle, foram acusados de comunistas, sionistas revolucionários, conspiradores e hipócritas. Apesar de terem enfrentado grandes desafios, é preciso salientar que, graças à grande força assimilativa da sociedade e às possibilidades que o país ofereceu aos exilados no sentido de seu estabelecimento, a maioria achou um novo lar e pode iniciar uma nova vida. Ilustrando as consequências da política imigratória restritiva Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Resenhas Weltbürger Brasilien und die jüdischen Flüchtlinge, 1933-1948 Marlen Eckel aplicada de maneira ambígua, a autora narra a história dos caminhos de fuga e as trajetórias descritas por alguns refugiados no Brasil. Dentre outros, de Hermann Görgen, teólogo, filosofo e deputado do Bundestag de 1957 até 1961. Com a ajuda do Cônsul-geral do Brasil em Genebra e do representante do Brasil junto à Liga das Nações, Milton Cesar de Weguelin Vieira, Hermann conseguiu receber vistos de entrada, em 1941, assim como permissão de trabalho e residência para um grupo de 48 pessoas, das quais 38 eram “não arianos”, segundo as leis de Nuremberg. A história de Johannes Schauff é outro exemplo. Graças ao esforço do ex-deputado do Reichstag, Schauff, junto ao antigo vicechanceler e ex-ministro de Negócios Interiores e da Justiça do Reich Erich Koch-Weser e ao agricultor Oswald Nixdorf, ele fundou a colônia agrícola de Rolândia/PR, que se tornou um refúgio salvador para 80 famílias de refugiados do nazismo. Mesmo após o fim da guerra, sob o governo de Eurico Gaspar Dutra, as circulares secretas, que decretavam a proibição da concessão de vistos para os judeus, foram mantidas, apesar de, nesses anos, milhares dos 207 judeus deslocados pela Guerra estarem em busca de um novo lar. Por outro lado, tal como ocorreu em outros países da América do Sul, o Brasil voltou a ser destino de fuga de nacionalsocialistas que escaparam das ações penais por seus crimes. Tratando da questão da partilha da Palestina, o livro chama atenção para o fato de que sua aprovação por parte do Brasil, em 1947, pautou-se na ideia de que essa solução resolveria a questão do acolhimento aos judeus deslocados, porque eles iriam preferir o estado Israel como futuro lar. Ao executar sua função de presidente da primeira sessão especial da Assembléia Geral da ONU, Osvaldo Aranha tinha consciência do fato de que não somente a imagem do Brasil na cena internacional estava em jogo, mas também que este punha à prova seu papel e a importância da ONU enquanto organização internacional que objetivava buscar soluções pacíficas para os conflitos. Considerando o contexto histórico, bem como o político dos países latino-americanos e analisando, de forma profunda e sob uma perspectiva nova, a ambivalência e o jogo duplo existente na política brasileira diante do Holocausto e dos Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Resenhas Weltbürger Brasilien und die jüdischen Flüchtlinge, 1933-1948 Marlen Eckel refugiados judeus do nazismo, o livro de Tucci Carneiro é uma importante contribuição aos estudos sobre a sociedade e a política brasileira no século XX, sobre o antissemitismo e sobre as migrações. Segundo Luis Roniger, o autor do prefácio, “este nos lembra que se deve evitar a 208 polarização da retórica e da demonização dos ‘outros’ em nome de uma postura política que favoreça o diálogo entre as nações e a defesa dos direitos humanos.” Marlen Eckl Historiadora e Tradutora da obra para o alemão Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Sobre os autores Alfredo Moreno Leitão - Doutor e Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Dentre seus trabalhos destacam-se: Nem todos eram mansos: o imigrante português nas lutas operárias em São Paulo 1930-1940, tese de Doutorado defendida na PUC-SP. André Nunes de Azevedo - Doutor em História Social da Cultura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2003), possui graduação em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1995) e Mestrado em Historia Política pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1998). É professor adjunto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, na área de História Moderna e Contemporânea, e no Programa de Pós-graduação em História dessa universidade. Tem experiência na área de História, com ênfase em História Social da Cultura, atuando principalmente nos seguintes temas: história das cidades, Rio de Janeiro, civilização, progresso, capitalidade, Modernidade, tradição, e cultura carioca. O foco principal de pesquisa é em História social da cultura no Rio de Janeiro entre 1808 e 1910, com preocupação especial no processo deformação da cultura carioca, com outro foco importante nos imigrantes portugueses no Rio de Janeiro, sobretudo o diálogo entre Dentre outros, publicou os seguintes trabalhos: A reforma Pereira Passos: uma tentativa de integração urbana. Revista Rio de Janeiro, UERJ, v. 1, n.1, p. 35-63, 2004; Rio de Janeiro: capital e capitalidade (org.). Rio de Janeiro: Departamento Cultural-UERJ, 2002, v. 1, p. 45-64. Eneko Sanz Goikoetxea - Mestre em História e atualmente aluno de Doutorado na Universidade do País Basco / Euskal Herriko Unibertsitatea, donde está realizando sua tese doutoral sobre o exílio do Goberno Basco ao tempo da guerra civil espanhola. Obteve várias bolsas de investigação centradas no estudo do nacionalismo basco no franquismo e na transição, na documentação histórica municipal e no exílio governamental basco. Dentre suas obras cabe destacar o volume 24 da coleção “Urazandi”: Delegaciones de Euskadi (1936-1975). Antecedentes históricos de los siglos XVI al XIX, origen y desarrollo (Vitoria-Gasteiz: Gobierno Vasco, 2010). Fernanda Paula Sousa Maia - Doutora em História pela Universidade Portucalense. Professora do Instituto de História Moderna da Universidade do Porto e Pesquisadora do Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade (CEPESE). Dentre suas publicações destacam-se O Mosteiro de Bustelo: propriedade e produção agrícola no antigo regime, 1638-1670 e 1710-1821 (Porto: Universidade Portucalense, 1991); “A Câmara dos Deputados e a(s) Representações de Cabo Verde na primeira metade de oitocentos” (Áfricana, nº 4 (Setembro 1996), p. 125/136). Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015, pp. 209-213 Isilda Braga da Costa Monteiro - Doutora em História. Recebeu o Prémio Defesa Nacional 2002 atribuído pelo Ministério da Defesa Nacional, pelo trabalho que constituiu a sua tese de doutoramento O Parlamento, os Militares, a Questão Militar e a Defesa Nacional (1851-1870). É Professora da ESEPF - Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti (Porto, Portugal). Investigadora integrada do CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade (Universidade do Porto). Tem vários trabalhos publicados no âmbito da História Contemporânea nas áreas da História Militar, História Parlamentar, História Política e História da Emigração, dentre os quais destaca-se o livro Dentre suas publicações destaca-se o livro A administração jesuíta do Mosteiro de Pedroso de 1560 aos finais do sec. XVII, publicada pela Universidade Portucalense. Marlen Eckel - Doutora em História pela Universidade de Viena/Áustria e mestre em Letras, Estudos Judaicos e Direito pela Universidade Johannes Gutenberg de Mainz/Alemanha. Pesquisadora senior do Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER) da USP. Dedica-se principalmente aos estudos sobre o exílio de língua alemã no Brasil, a história do Brasil de 1933 até 1945, a literatura judaica no Brasil e as questões da imigração alemã, austríaca e judeu para o Brasil. Autora do livro: “Das Paradies ist überall verloren.” Das Brasilienbild von Flüchtlingen des Nationalsozialismus (2010). Organizadora dos livros: “‘...olhando mais para frente do que para trás...’ O exílio de língua alemã no Brasil, 1933-1945” (2013) (junto com Sylvia Asmus); “‘...auf brasilianischem Boden fand ich eine neue Heimat.’ Autobiographische Texte deutscher Flüchtlinge des Nationalsozialismus 19331945” (2006). Tradutora de livros de Profa. Maria Luiza Tucci Carneiro (Weltbürger. Brasilien und die Flüchtlinge des Nationalsozialismus, 1933-1948 (2013)), de Moacyr Scliar, Clarice Lispector e Alberto Dines, além ser autora de imúmeros artigos sobre vários aspectos do exílio de fala-alemã no Brasil e refugiados particulares como p.e. Stefan Zweig, Otto Maria Carpeaux, Anatol Rosenfeld, Ulrich Becher, Ernst Feder e Richard Katz. Maria Eugenia Cruset - Doutora em Historia pela Universidad del País Vasco e Mestre em Relações Internacionais pela Universidad Nacional de La Plata (UNLP). Doutora em História pela Universidad del País Vasco. Professora Titular de Historia Latinoamericana da Universidad Católica de La Plata. Foi professora convidada nas seguintes universidades: Queen´s University (Belfast, Reino Unido); Universidad Vasco de Quiroga (Morelia, México;) Universidade de São Paulo; Universidade de Ottawa (Canadá) Columbus University (Estados Unidos); Universidad del País Vasco( España). Atualmente é Secretária do Instituto de História e Direito Constitucional, na Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais, na Universidad Nacional de La Plata (UNLP) e Diretora da Cátedra Libre de 210 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Pensamiento y Cultura Irlandesa, na Universidad Nacional de La Plata (UNLP). Participou em vários projetos de pesquisa no país e no exterior. Dentre as obras de sua autoria, citam-se, dentre as mais recentes: Livros - (Ed.) Migration and New International Actors: An Old Phenomenon Seen With New Eyes, Newcastle upon Tyne, Cambridge Scholars Publishing, 2012; Diplomacia de las Naciones sin Estado y de los Estados sin nación. Argentina e Irlanda: Una visión comparativa (2ª Edición revisada), Lexington KY, Editorial Académica Española, 2011; Artigos e capítulos: - “From ‘Melting Pot’ to Nation-State: the Argentinean case”, en New Balkan Politics. Journal of Politics, Issue 14, 2013, pp. 115-125; “Diáspora y sociedad de acogida. El voto de los italianos en Argentina a través de la prensa”, dossier “Italia-Argentina: due Paesi, uno specchio”, RiMe, nº 6, 2011, p. 645-659; “El Acuerdo del Viernes Santo en Irlanda del Norte y su realidad hoy”, Revista Contemporânea, Núcleo de Estudos Contemporâneos, Departamento de História, Universidade Federal Fluminense, Año 1, nº 1, febrero 2011, p.78-92. Maria Izilda Santos de Matos – Doutora em História pela Universidade de São Paulo, com Pós doutorado na Université Lumière, Lyon 2 / França. Professora Titular e Professora do Programa de Pós-graduação em História da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pesquisadora 1 do CNPq. São de sua autoria, dentre outros, os seguintes livros: Dentre suas publicações destacam-se os livros: A cidade, a noite e o cronista: São Paulo de Adoniran Barbosa (Bauru, EDUSC, 2008); Ancora de Emoções (Bauru, EDUSC, 2005); Gênero e Terceiro Setor (Ed. Catavento, 2005); Dolores Duran: Experiências Boêmias em Copacabana nos anos 50 (RJ: Bertrand Brasil, 2.ed, 2002); Meu lar é o botequim (SP: Cia Editora Nacional, 2.ed., 2002). Cotidiano e Cultura: história, cidade e trabalho (SP: EDUSC, 2002); Portugueses: Deslocamentos, Experiências e Cotidiano – São Paulo nos séculos XIX e XX. Bauru, SP: Edusc, 2013. Nadia Andrea De Cristóforis - Doutora em História (Universidad de Buenos Aires), realizou especialização na Université Paris 7 e Mestrado em Pesquisa Histórica (Universidad de San Andrés). É Professora da Universidade de Buenos Aires (UBA) e pesquisadora do CONICET. Publicou os seguintes livros, de sua autoria: Bajo la Cruz del Sur: gallegos y asturianos en Buenos Aires (1820-1870) e Proa al Plata: las migraciones de gallegos y asturianos a Buenos Aires (fines del siglo XVIII y comienzos del XIX). Como editora ou co-editora publicouLa inmigración gallega y su experiencia asociativa en Buenos Aires (1910-1965); Baixo o signo do franquismo: emigrantes e exiliados galegos na Arxentina; em co-edição com Á. Castro Montero: Entre Europa y América: circulación de ideas y debates entre las dos guerras mundiales; em parceria com M. Rodríguez Otero: Un mundo, dos guerras (1939-1991); e com Alejandro 211 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Fernández: Las migraciones españolas a la Argentina. Variaciones regionales (siglos XIX y XX). Óscar Álvarez Gila - Doutor em História e professor titular de História de América na Universidade do País Basco. Foi, durante três anos, investigador e professor visitante nas Universidades de Oxford, Reino Unido (curso 2006-2007), NevadaReno, Estados Unidos (curso 2010-2011) e Columbus State University, Georgia, Estados Unidos (curso 2013-2014). Especialista em temas de emigração basca para a América nos séculos XIX-XX, suas linhas de investigação preferenciais fora dirigidas para a Igreja basca e sua projeção no exterior, para a emigração basca para a América, para a vinculação entre política e emigração e para os aspectos visuais e a imagem dos emigrantes. Dentre suas obras mais recentes destaca-se Devoción, paisanaje e identidad. Las cofradías y congregaciones de naturales en España y America (siglos XVI-XIX), Bilbao: Universidad del País Vasco, 2014. Ruy Farías - Doutor em História pela Universidade de Santiago de Compostela. É pesquisador do CONICET e Professor da Universidad Nacional de General Sarmiento. É colaborador externo do Grupo de Pesquisa de Historia política y de los Nacionalismos” (HISPONA), Uinversidad de Santiago de Compostela e colaborador do Museo de la Emigración Gallega na Argentina (Buenos Aires) e integra projetos nacionais e internacionais. Dentre as obras de sua autoria destacam-se: (coord.), Bos Aires galega, Noia, Toxosoutos, 2010; La inmigración gallega en el sur del Gran Buenos Aires, 1869-1960, Santiago de Compostela, USC, 2010, (Editado en CD-ROM); “Unha sociedade galaica cun ámbito de referencia crioulo: O Centro Gallego de Barracas ao Sud / Avellaneda”. Estudos Migratorios: Revista Galega de Análise das Migracións (Nova Xeira). Santiago de Compostela, Consello da Cultura Galega, vol. II, nº 2, segundo semestre 2009 [2010], p. 109-32; “La integración gallega en Avellaneda: cuestión social, política e instituciones barriales (1901-1943), dossier “La inmigración y el exilio españoles en la Argentina, 19001950”, coordinado por Alejandro E. Fernández y Nadia De Cristóforis en Signos Históricos, Universidad Autónoma Metropolitana – Iztapalapa, México D. F; “Industrialización, inmigración y cuestión social: los trabajadores gallegos en Avellaneda (Argentina) y la huelga de 1917-1918 en el frigorífico La Negra”, en Historia, Trabajo y Sociedad, Madrid, Fundación 1º de Mayo, nº 4, 2013, pp. 33-61; “El exilio de los intelectuales y científicos republicanos españoles y el mundo académico argentino: mediadores institucionales y trayectorias individuales”, en Revista Uniabeu, Belford Roxo, RJ, vol. 6, nº 12, enero-abril 2013, pp. 81-96. Vanessa dos Santos Bodstein Bivar - Doutora em História pelo Programa de PósGraduação em História Econômica da Universidade de São Paulo, com intercâmbio na Université de Paris IV Sorbonne, com bolsa FAPESP (2008). 212 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015 Bacharel e Licenciada em História pela Universidade de São Paulo (2002). Professora da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Pesquisadora do Centro de Estudos de Demografia Histórica da América Latina e do LEER FFLCH/USP. Dentre suas publicações destacam-se os livros: Além das Fronteiras. O cotidiano dos imigrantes na São Paulo oitocentista: vestígios testamentais (São Paulo: Humanitas, 2008); “De l'autre côte de l'Atlantique: immigrants français à São Paulo au XIXe. Siècle”. In: VIDAL, L.; LUCA, T. (org.). Les Français au Brésil. ((Paris: Rivages des Xantons, 2011). Xosé Manoel Núñez Seixas - Doutor em História Contemporânea pelo Instituto Universitário Europeu de Florença, catedrático de História Contemporânea na Universidade de Santiago de Compostela e, desde outubro de 2012, catedrático de História Contemporânea de Europa na Universidade Ludwig-Maximilian de Munique. Foi professor convidado nas universidades de Paris VII, Paris X, Rennes, Bielefeld, Zentrum für zeithistorische Forschung (Potsdam), City University of New York, Stanford e no Colégio da Europa (Natolin, Varsovia). Especializou-se no estudo comparado dos nacionalismos europeus e ibéricos, assim como em estudos migratórios e na história sociocultural da guerra. Entre seus últimos livros destacam-se: ¡Fuera el invasor! Nacionalismos y movilización bélica durante la guerra civil española, 1936-1939 (Madrid, 2006); Imperios de muerte. La guerra germano-soviética, 1941-1945 (Madrid, 2007); Patriotas y demócratas. El discurso nacionalista español después de Franco (Madrid, 2010); Icônes littéraires et stéréotypes sociaux: L’image des immigrants galiciens en Argentine (1800-1960) (Besançon, 2013); Las utopías pendientes. Una breve historia del mundo tras 1945 (Barcelona, 2015) e Las patrias ausentes. Estudios sobre migraciones y exilios ibéricos, 1850-1960 (Oviedo, 2015). 213 Navegar, vol. 1, nº 1, Jul.-Dez. 2015